I. Acórdão da Relação que confirmou sentença absolutória não admite recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
II. Os erros-vício e nulidades não sanadas, não são pressuposto de admissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdãos da Relação, proferidos em recurso.
O arguido AA foi absolvido em 1.ª instância da prática, na forma continuada, de um crime de contrafação, p. e p. e artigo 196.º, do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos. e artigos 26.º e 30.º, n.º 2 n.º 1, ambos do Código Penal.
Foi julgado totalmente improcedente o pedido de indemnização cível formulado pela demandante BB contra o arguido/demandado AA e, em consequência, foi o mesmo absolvido do pedido.
O Ministério Público e a assistente BB recorreram da sentença para o Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão de 4 de junho de 2025, negou provimento aos recursos, confirmando a decisão recorrida.
Inconformada, a assistente e demandante civil BB interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Recurso que não foi admitido por despacho de 27 de junho de 202, tendo em conta que o acórdão proferido está abrangido pela irrecorribilidade penal e civil constante da alínea d) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 400.º do CPP, uma vez que é absolutório e confirmatório da decisão da 1.ª instância que absolveu o arguido e demandado civil do crime imputado e do pedido de indemnização civil deduzido, sendo que o valor deste pedido (€15.000) é inferior à alçada do Tribunal recorrido.
A recorrente apresentou reclamação do despacho que não admitiu o recurso, nos termos do artigo 405.º do CPP, extraindo dela as seguintes conclusões:
“I. O despacho reclamado errou ao aplicar a regra da "dupla conforme absolutória" do artigo 400.º, n.º 1, al. d) do CPP, porquanto não atendeu à natureza do recurso interposto, o qual se fundava em questões de direito, a saber, os vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2 do CPP.
II. A invocação destes vícios, quando configurados como erros de lógica internos à própria decisão, constitui fundamento autónomo e legalmente admissível para a interposição de recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, sendo a sua cognoscibilidade uma questão de direito complexa e controversa que justifica a admissão do recurso.
III. O despacho reclamado errou, igualmente, ao interpretar de forma excessivamente restritiva, formalista e constitucionalmente desconforme a norma do artigo 400.º, n.º 2 do CPP, violando o espírito da lei e os princípios constitucionais da proporcionalidade e do acesso à justiça.
IV. Verificam-se, pois, todos os pressupostos legais para a admissão do recurso de revista interposto pela assistente, quer na sua vertente penal, quer na sua vertente cível, impondo-se a revogação do despacho reclamado.”
1. O acórdão recorrido, proferido em 4 de junho de 2025 confirmou a decisão absolutória da 1.ª instância.
A recorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça de decisões penais está prevista, específica e autonomamente, no artigo 432.º do CPP, dispondo a alínea b) do n.º 1 que se recorre “de decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas Relações, em recurso, nos termos do artigo 400.º”.
Deste artigo destaca-se a alínea d) do seu n.º 1, que determina a irrecorribilidade de “acórdãos absolutórios proferidos, em recurso, pelas Relações, exceto no caso de decisão condenatória em 1.ª instância em pena de prisão superior a 5 anos”.
Destarte, o acórdão da Relação que confirmou a sentença absolutória não admite recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
2. No que concerne ao pedido de indemnização civil também o recurso não é admissível, nos termos do artigo 400.º, n.º 2, do CPP, desde logo, por o valor do pedido (€ 15.000) não ultrapassar o valor da alçada da Relação, daí que o despacho reclamado não tenha violado os princípios constitucionais da proporcionalidade e do acesso à justiça, conforme vem invocado.
3. Quanto ao artigo 410.º do CPP também invocado tem como epígrafe “Fundamentos do recurso”. Entre os quais se incluem os erros-vício (n.º 2).
No respeitante aos erros-vícios do artigo 410.º, n.º 2, do CPP, era jurisprudência uniforme e sedimentada do Supremo Tribunal de Justiça que, na redação do art.º 434º do CPP que que vigorou até 20 de março de 2022, os vícios do artigo 410.º, n.º 2, do CPP, não podiam fundamentar recurso para o mais Alto Tribunal da ordem judiciária comum.
Com a alteração operada pela Lei n.º 94/2021 de 21712, que entrou me vigor um 21 de março de 2022, os erros-vício e a nulidades previstos e referidas no artigo 410 n.ºs 2 e 3, do CPP podem legitimar recurso para o Supremo Tribunal de Justiça mas apenas quando em recurso é de decisão da Relação proferida em 1ª instância (portanto, em recurso em 1º grau para o Supremo, em que poderá/deverá conhecer de facto e de direito) e no recurso per saltum, de acórdãos de tribunal coletivo de 1.ª instância ou do juri contanto tenha aplicado pena de prisão em medida superior a 5 anos.
Com fundamento nos referidos erros-vicio e nulidades não sanadas, não se admite recurso de acórdãos da Relação, tirados em recurso.
Sendo este o caso dos autos, o acórdão recorrido não admite recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
4. Pelo exposto, indefere-se a reclamação deduzida pela assistente BB.
Custas pela reclamante fixando-se a taxa de justiça em 3 UCs.
Notifique-se.
O Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça
Nuno Gonçalves