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ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
DUPLA INDEMNIZAÇÃO
Sumário
I Na indemnização de danos não patrimoniais, fixada equitativamente, não se podem postergar os princípios da proporcionalidade e da igualdade para determinação do montante a atribuir ao lesado; mas a indemnização deve compensar o sofrimento. II O chamado dano biológico, enquadra-se na ressarcibilidade de um dano futuro, que para ser passível de indemnização (equitativa, e respeitadora daqueles princípios), tem que ser previsível. III A afetação da integridade físico-psíquica, designada precisamente como dano biológico, na medida em que tem consequências sobre a saúde, bem-estar e qualidade de vida do lesado, porque as suas consequências patrimoniais não se esgotam no reflexo direto na capacidade profissional, tem, por isso, uma dimensão patrimonial; estando a lesada reformada, releva o dano funcional, que se manifesta no exercício da atividade diária e corrente, resultado das lesões. IV O cálculo do valor adequado ao ressarcimento do dano biológico deve ser autonomamente determinado. V O Tribunal não pode valorar o mesmo dano duas vezes para efeitos de atribuição de indemnização. VI Resultando as seguintes consequências para a lesada, vítima de acidente de viação/atropelamento (na passadeira e sem qualquer culpa sua), a) fratura, internamento hospitalar, foi submetida a intervenção cirúrgica, durante o período em que se manteve internada foi sujeita a vários tratamentos médicos e medicamentosos, após a alta manteve-se muito limitada na sua capacidade de pedestação durante o período de 45 dias adicionais em que teve de utilizar tala de “...” colocada no membro operado, necessitou da ajuda de terceira pessoa para higiene e vestuário durante um período cerca de três meses, após a alta médica manteve seguimento em consultas de ortopedia, nas quais realizou controlo radiológico; o quantum doloris é fixável no grau 4/7, o dano estético é fixável no grau 3/7; o Período de Défice Funcional Temporário Total é fixável num período de 11 dias e o Período de Défice Funcional Temporário Parcial é fixável num período 386 dias; as sequelas decorrentes do acidente de viação causam-lhe desgosto, frustração, ansiedade, irritação e incómodos; b) o défice funcional permanente da integridade físico psíquica está fixado em 8 pontos, tinha 76 anos à data do acidente e estava reformada, passou a padecer de dores e dificuldades de locomoção, recorrendo ao uso permanente de canadiana, tendo deixado de poder fazer algumas tarefas do dia-a-dia e lazer que antes fazia e outras só com maior sacrifício e dor as consegue fazer, nomeadamente caminhar por tempo prolongado ou em terreno instável ou planos inclinados, subir e descer escadas, manter o equilíbrio, apanhar objectos do chão, o que afectou a sua saúde e a sua qualidade de vida, e por força das referidas limitações, deixou de poder tratar das lides domésticas sem o auxílio de terceira pessoa, bem como de desempenhar a actividade de lazer diária de jardinagem a que se dedicava; justifica-se que a indemnização por danos não patrimoniais equitativamente atribuída se situe nos € 10.000,00 e a indemnização pelo dano biológico nos € 25.000,00.
Texto Integral
Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:
I RELATÓRIO.
AA instaurou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra “EMP01... – Companhia de Seguros, S.A.” pedindo que se condene a Ré a
a) pagar-lhe a quantia de € 1.139,90, a título de reembolso das despesas já suportadas até à presente data, quantia esta que deverá ser acrescida de juros de mora calculados à taxa legal e contados desde a citação até ao efetivo e integral pagamento;
b) pagar-lhe a importância de € 25.000,00 a título de indemnização pelo dano biológico, quantia essa que deverá ser acrescida de juros de mora calculados à taxa legal e contados desde a citação até ao efetivo e integral pagamento;
c) pagar-lhe a importância de € 25.000,00 a título de indemnização por danos morais, quantia essa que deverá ser acrescida de juros de mora calculados à taxa legal e contados desde a citação até ao efetivo e integral pagamento;
d) pagar-lhe a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença para suportar as despesas médicas e de fisioterapia que a A. necessitará no futuro, acrescida daquela que decorrer dessas intervenções a título de danos não patrimoniais.
Alega, para tanto e em síntese, que quando atravessava a estrada na respetiva passadeira a tal destinada, foi embatida pela parte frontal do veículo de matrícula ..-UI-.., cujo condutor seguia distraído e imprimindo ao mesmo velocidade superior a 50 km/hora.
Descreve os danos que para si resultaram.
A responsabilidade pelo pagamento da indemnização decorrente de todos os danos descritos é da R., para quem se encontrava transferida tal responsabilidade, através da apólice nº ...52.
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Citada, a Ré contestou, assumindo a responsabilidade relativa ao acidente, mas impugnando os factos alegados quanto aos danos, concluindo por uma decisão consoante a prova a produzir.
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Foi determinada a realização de prova pericial, designadamente perícia de avaliação do dano corporal em direito cível, e elaborado o respetivo relatório.
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Foi dispensada a realização de audiência prévia. Foi fixado o valor da causa em € 51.139,00. Foi elaborado despacho saneador, com identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova. Foram admitidas as diligências instrutórias.
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Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente, por parcialmente provada, a ação, e decidiu condenar a Ré no pagamento à Autora de € 35.639,90, sendo:
- € 10.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, contados desde a prolação da presente decisão e até efetivo e integral pagamento;
- € 25.00,00 a título de dano biológico, na vertente de dano não patrimonial, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, contados desde a prolação da presente decisão e até efetivo e integral pagamento;
- € 639,90 a título de danos patrimoniais (ressarcimento por despesas efetuadas), acrescidos de juros de mora, à taxa legal, a contar da citação até efetivo e integral pagamento.
Condenou ainda a Ré a pagar à Autora a indemnização que vier a ser liquidada em execução de sentença relativa aos factos provados que constam do ponto 3.22. da respetiva sentença.
Atribuiu as custas a ambas as partes, na proporção dos respetivos decaimentos.
*
Inconformada, a Ré interpôs recurso, apresentando as suas alegações que terminam com as seguintes
-CONCLUSÕES-(que se reproduzem)
“1. Não resultou provado que o défice funcional permanente de Integridade Físico-psíquica fixável em 8 pontos para a Recorrida, tivesse implicado a perda de rendimentos laborais, já que, à data do acidente não exercia qualquer atividade profissional.
2. Resultou provado nos autos que, a final, a Autora ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 8 pontos, sendo que a mesma se encontrava na altura aposentada, pelo que as sequelas descritas não têm repercussão permanente na atividade profissional, devendo assim ser consideradas para efeitos de dano biológico na sua vertente de dano não patrimonial.
3. Assim, no caso em concreto, é claro que tendo a Recorrida à data do acidente a idade de 76 anos e estando reformada, é possível afirmar que o dano biológico sofrido pela Recorrida encara uma componente patrimonial diminuta, face à significativa componente não patrimonial (desgosto, frustração, ansiedade, irritação e incómodos, dores e dificuldades de locomoção).
4. Gerando-lhe sim, de forma manifesta, sofrimento e acarretando um maior esforço no exercício de qualquer atividade profissional, mas não uma repercussão, direta ou indireta na sua situação profissional, tanto em termos de remuneração como de carreira.
5. Razão pela qual, no entendimento da Recorrida[i], andou bem o Tribunal a quo a considerar apenas o dano biológico na vertente de dano não patrimonial.
6. Contudo, as quantias apuradas pelo Tribunal a quo, no que concerne aos danos biológicos, revela-se excessiva e deverá ser alterada.
7. O montante de € 10.000,00 a título de danos não patrimoniais, e o montante de € 25.00,00 a título de dano biológico, na vertente de dano não patrimonial, destinam-se a ressarcir o mesmo dano – dano não patrimonial.
8. O valor de € 10.000,00 a título de danos não patrimoniais, e o valor de € 25.00,00 a título de dano biológico, na vertente de dano não patrimonial atribuído é desajustado, tendo em consideração os factos dados como provados e, ainda, orientação que vem sendo seguida pela nossa recente Jurisprudência em casos semelhantes ao dos autos.
9. Considerando, que apenas está em causa o dano biológico na sua vertente não patrimonial este deveria apenas ser fixado para os danos não patrimoniais, isto é no montante de 10.000,00€.
10. Ainda que assim não fosse, na possibilidade de se autonomizar o dano biológico como fez o Tribunal a quo, nunca as quantias arbitradas a título de dano não patrimonial e de dano biológico, também na vertente não patrimonial, poderiam ser fixadas num montante tão expressivo.
11. A quantia valor de € 25.00,00 a atribuir a título de dano biológico, revela-se extremamente excessiva e não se fez um juízo equilibrado nas quantias a fixar, devendo a referida quantia ser reduzida para um montante próximo de 5.000 euros.
12. Tanto mais que a A/Recorrida contava, à data do acidente, 76 anos de idade.”
Conclui pelo provimento do recurso, e revogação da sentença recorrida e proferindo-se acórdão em conformidade com as alegações formuladas.
*
A Autora apresentou contra-alegações que terminam com as seguintes
-CONCLUSÕES-(que se reproduzem)
“1. Defende a R. recorrente que os valores atribuídos de € 25.000,00 a título de dano biológico na vertente de dano não patrimonial e de € 10.000,00 a título de danos não patrimoniais, são desajustados tendo em consideração os factos considerados como provados e a orientação que vem sendo seguida pela recente Jurisprudência em casos semelhantes.
2. Em função da factualidade considerada provada, o valor da indemnização fixada até pecará por escasso.
3. A Douta Sentença fundamentou devidamente a razão pela qual fixou a indemnização de € 25.000,00 pelo dano biológico.
4. Estando em causa um dano biológico, traduzido numa incapacidade funcional ou fisiológica de 8 pontos, a repercussão negativa centra-se na diminuição da condição física e numa penosidade, dispêndio e desgaste físico acrescido na execução de tarefas antes desempenhadas, sem o mesmo esforço, no seu dia-a-dia.
5. Resultou apurado que a Autora padeceu um Défice Funcional Temporário Total fixável por um período de 11 dias e o de Défice Funcional Temporário Parcial por um período 386 dias.
6. O recente Acórdão do STJ de 30.04.2024, proferido no âmbito do Proc. 1548/21.9T8PVZ.P1.S1, (disponível para consulta em www.dgsi.pt), dispõe que não é desconforme com os atuais padrões da jurisprudência, a indemnização de € 40.000,00 pelo dano biológico de uma lesada, (com 60 anos à data do acidente), atropelada na passadeira, que foi submetida a uma operação e fisioterapia durante quase um ano, apresenta uma IPG de 18 pontos, quantum doloris de 4/7, dano estético 2/7, e terá de ser submetida a medicação e consultas o resto da sua vida.
7. Tal Acórdão refere que um outro Acórdão do STJ de 04.07.2023, (Proc. 342/19.1T8PVZ.P1.S1), que determina que um lesado com 62 anos de idade, que ficou afetado de défice funcional permanente de 9,71%, e em que foi considerado equitativo o valor indemnizatório de € 32.000,00 (STJ, 29.10.2020, Proc. 111/17.3T8MAC.G1.S1);
8. Não poderá deixar de se considerar ajustada a indemnização de € 25.000,00 a atribuir à recorrida pelo Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica fixado em 8 pontos, atendendo às demais circunstâncias do sinistro e aos factos considerados provados.
9. Devem ser atendidas as acentuadas limitações na realização das tarefas diárias da recorrida, (dificuldade em cozinhar; dores ao efetuar praticamente todas as atividades em casa; muita dificuldade em subir e descer escadas; muita dificuldade em caminhar e precisa de parar para descansar frequentemente e vai sempre com canadiana; deixou de praticar a jardinagem).
10. A indemnização fixada na Douta Sentença recorrida não se afasta dos valores arbitrados pelo STJ em casos similares e, por isso, não há qualquer justificação para ser reduzida.
11. Como consta do sumário do Acórdão do STJ citado, estando em causa a fixação de indemnização orientada por critérios de equidade, apenas haverá fundamento bastante para censurar o juízo formulado e alterar o decidido, nas situações em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, as regras legais fixadas para esse julgamento, e mais concretamente para o cálculo da indemnização em causa ou quando os montantes finais encontrados colidam, de forma patente, com os critérios ou valores adotados/seguidos pelo STJ, numa perspetiva atualista.
12. No que se refere à indemnização de € 10.000,00 atribuída a título de danos não patrimoniais também não assiste qualquer razão à recorrente na sua pretensão de redução.
13. O mesmo Acórdão do STJ, (Proc. 1548/21.9T8PVZ.P1.S1), na análise de uma situação análoga à dos presentes autos, (atropelamento na passadeira com fratura, intervenção cirúrgica e fisioterapia), descreve os elementos da indemnização dos danos não patrimoniais.
14. Considerando para esse cálculo o susto, medo e angústia da simples eclosão do acidente, a submissão a uma operação e o período de incapacidade, o quantum doloris, o dano estético, os tratamentos médicos regulares e a medicação para o resto da vida.
15. Fixando a indemnização de € 40.000,00 à lesada a título de danos não patrimoniais, ou seja, o quádruplo do montante que o tribunal recorrido atribuiu à recorrida.
16. Também no que se refere à indemnização pelos danos não patrimoniais esta aproxima-se e até é inferior a casos semelhantes, tratando de maneira aproximada situações potencialmente idênticas.
17. Cumprindo os princípios da proporcionalidade e da igualdade e os critérios e valores usualmente acolhidos na jurisprudência em casos similares.
18. Os Acórdãos citados pela recorrente, para além de se debruçarem em situações significativamente diferentes daquela que se encontra em apreço nos autos, referem-se a decisões proferidas há cerca de 8 anos.
19. Não assiste qualquer razão à recorrente na sua pretensão de redução dos valores indemnizatórios.”
Pede que o recurso seja julgado improcedente.
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O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo, o que foi confirmado por este Tribunal.
Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II QUESTÕES A DECIDIR.
Decorre da conjugação do disposto nos art.ºs 608º, n.º 2, 609º, n.º 1, 635º, n.º 4, e 639º do Código de Processo Civil (C.P.C.) que são as conclusões das alegações de recurso que estabelecem o thema decidendum do mesmo. Impõe-se ainda ao Tribunal ad quem apreciar as questões de conhecimento oficioso que resultem dos autos.
Impõe-se, por isso, no caso concreto e face às elencadas conclusões decidir se o valor de € 25.000,00 atribuído a título de dano biológico deve ser mantido, ou se pelo contrário deve ser eliminado porque englobado o seu ressarcimento no valor atribuído a título de danos não patrimoniais, ou, se considerado autonomamente, diminuído para um valor próximo dos € 5.000,00, bem como, neste caso, ser diminuído o valor da indemnização de € 10.000,00 por danos não patrimoniais.
***
III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
O Tribunal a quo considerou o seguinte:
“A) Da matéria de facto provada
Os factos provados, com interesse para a decisão da causa, são os seguintes:
[Da dinâmica do acidente]
3.1. No dia ../../2021, por volta das 15h35, na Rotunda ..., em ... ocorreu um acidente de viação, no qual foi interveniente o veículo de matrícula ..-UI-.., propriedade de EMP02..., Lda., era conduzido por BB, que seguia na Rotunda ..., pretendendo aceder à Avenida ..., (Acesso Norte a esta Avenida).
3.2. Aquele condutor, nas circunstâncias de tempo e lugar acima descritas, porque imprimia ao veículo uma velocidade superior a 50 Kms/h, (velocidade máxima permitida no local) e o fazia sem prestar qualquer atenção ao trânsito e circulação de peões que no local se fazia sentir, não se apercebeu que a Autora atravessava a estrada da esquerda para a direita (Sul/Norte), atento o sentido de marcha do veículo que conduzia, e na passadeira existente nesse local, pelo que foi embater, sem sequer travar, com a parte frontal do veículo naquela.
3.3. Por força do embate, a Autora foi projetada ao solo, caindo na estrada e próximo da identificada passadeira para peões, aí permanecendo até ser socorrida e transportada por ambulância do INEM para a Unidade Local de Saúde do ....
3.4. A faixa de rodagem, no local onde se deu o descrito acidente, tem cerca de 3,70 m de largura, com um único sentido de trânsito, sendo que o piso, no momento do sinistro, se encontrava em bom estado.
3.5. O acidente deu-se por culpa única e exclusiva do condutor do veículo automóvel de matrícula UI, o que é aceite pela Ré seguradora.
3.6. A Ré seguradora tem vindo a tem vindo a suportar as despesas nas quais a Autora incorre como resultado do sinistro, nomeadamente, médicas e medicamentosas.
[Da responsabilidade da Ré]
3.7. Estava transferida para a Ré, EMP01... – Companhia de Seguros, S.A., a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pelo veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-UI-.., através de contrato de seguro, válido e eficaz, titulado pela apólice nº ...52, em vigor à data da ocorrência dos factos que estão na origem da presente ação.
[Dos danos sofridos pela Autora]
3.8. Na sequência do acidente, a Autora foi assistida no local, sem perda de consciência, e conduzida ao ULS... – Hospital ..., em ..., tendo sido observada no SU de Ortopedia.
3.9. Diagnosticada com fratura dos pratos tibiais tipo Schatzker Vi à esquerda, a Autora foi internada naquela unidade hospitalar, onde, a 26.11.2021 foi submetida a intervenção cirúrgica para redução aberta e osteossíntese com placa posteromedial e lateral da tíbia esquerda.
3.10. Em 03.12.2021, a Autora teve alta hospitalar e, em ../../2022 teve alta da consulta de Ortopedia.
3.11. Durante o período em que se manteve internada, a Autora foi sujeita a vários tratamentos médicos e medicamentosos.
3.12. Após a alta, a Autora manteve-se muito limitada na sua capacidade de pedestação durante o período de 45 dias adicionais em que teve de utilizar tala de “...” colocada no membro operado.
3.13. A Autora necessitou da ajuda de terceira pessoa para higiene e vestuário durante um período cerca de três meses.
3.14. Após a alta médica manteve seguimento na consulta de ortopedia na ULS..., até ../../2022, e no Hospital ... no ..., nas quais realizou controlo radiológico.
3.15. Como queixas, a Autora apresenta:
A nível funcional:
Postura, deslocamentos e transferências: dificuldade em caminhar por mais de 10 min fica com dores e vai sempre com canadiana. Muita dificuldade em caminhar e precisa de parar para descansar frequentemente. Dificuldade em permanecer na posição de pé durante longos períodos de tempo;
Fenómenos dolorosos: fenómenos dolorosos intensos no joelho esquerdo, tomando paracetamol em SOS;
A nível situacional:
Atos da vida diária: tem dificuldade em cozinhar devido à posição de pé por dores ao nível do joelho e perna esquerdos. Refere dores ao efetuar praticamente todas as atividades em casa. Muita dificuldade em subir e descer escadas, principalmente em descer;
Vida afetiva, social e familiar: deixou de praticar a jardinagem. Refere que a leitura que é uma atividade que lhe era muito gratificante, agora é menos gratificante. Refere que agora "fica a ver";
Vida profissional ou de formação: reformada à data do evento.
3.16. Como sequelas das lesões sofridas, a Autora apresenta:
Membro inferior esquerdo: cicatriz arciforme do lado interno e externo do joelho. Mobilidade do joelho do 0-120º. Crepitante exuberante na mobilidade da rótula. Atrofia muscular da coxa de 1cm comparativamente ao contralateral.
3.17. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 21/12/2021.
3.18. O Período de Défice Funcional Temporário Total é fixável num período de 11 dias e o Período de Défice Funcional Temporário Parcial é fixável num período 386 dias.
3.19. O Quantum Doloris é fixável no grau 4/7.
3.20. O Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica é fixável em 8 pontos.
3.21. O Dano Estético Permanente é fixável no grau 3/7.
3.22. Quanto a ajudas técnicas permanentes, a Autora necessitará, no futuro, de ajudas medicamentosas; tratamentos médicos regulares, designadamente sujeição a intervenções cirúrgicas de artroplastia total por revisão de prótese e osteossíntese da fratura bituberositária ou da fratura da extremidade proximal.
3.23. À data do sinistro, a Autora tinha 76 anos de idade e era aposentada.
3.24. As sequelas decorrentes do acidente de viação causam à Autora desgosto, frustração, ansiedade, irritação e incómodos, na medida em que a mesma passou a padecer de dores e dificuldades de locomoção, recorrendo ao uso permanente de canadiana, tendo deixa de poder fazer algumas tarefas do dia-a-dia e lazer que antes fazia e outras só com maior sacrifício e dor as consegue fazer, nomeadamente caminhar por tempo prolongado ou em terreno instável ou planos inclinados, subir e descer escadas, manter o equilíbrio, apanhar objectos do chão, o que afectou a sua saúde e a sua qualidade de vida.
3.25. Por força das referidas limitações, a Autora deixou de poder tratar das lides domésticas sem o auxílio de terceira pessoa, bem como de desempenhar a actividade de lazer diária de jardinagem a que se dedicava.
3.26. Após alta, para fazer face às suas necessidades de recuperação, a Autora socorreu-se dos serviços privados de tratamento fisiátrico, no domicílio, desde fevereiro de 2022 a maio de 2022, no que despendeu o valor de € 600,00.
3.27. Teve, ainda, a Autora de despender a quantia de € 39,90 em medicamentos para fazer face à sua condição.
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B) Da matéria de facto não provada
Não resultaram provados quaisquer outros factos, com interesse para a decisão da causa, sendo designadamente os factos não provados os seguintes:
a) Para aceder às consultas/tratamentos médicos a que submeteu, a Autora despendeu a quantia de, pelo menos, € 500,00.”
***
IV MÉRITO DO RECURSO.
A recorrente limitou o objeto do recurso ao valor arbitrado a título de ressarcimento pelo dano biológico, ora dizendo que, estando no caso em causa a sua vertente não patrimonial, ele deve considerar-se incluído no valor (de € 10.000,00) atribuído a título de reparação do dano não patrimonial. Caso se entenda autonomizá-lo, então o seu valor peca por excessivo, devendo situar-se perto dos € 5.000,00; neste caso, questiona também o valor de € 10.000,00 mencionado, por excessivo.
Para o efeito, diz, releva:
“- Considerando os factos provados nestes autos, com relevância para a fixação de uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela Recorrida;
- Considerando o teor das decisões proferias recentemente pela nossa Jurisprudência, em situações mais relevantes em termos de dano não patrimonial, consideradas as respetivas gravidades de dano; e
- Ponderando a demais jurisprudência proferida em casos semelhantes aos dos presentes autos, entende a Recorrente que a decisão aqui posta em crise ofende a equidade de forma frontal e deve ser alterada, por ser excessiva tendo em conta os danos não patrimoniais sofridos pelo Recorrente.”
*
Em matéria de indemnização civil por danos provocados vigora, como princípio geral, a regra da reposição ou reconstituição natural consagrada no art.º 562º do C.C., que se consubstancia no dever de reconstituir a situação anterior à lesão, ou seja, o dever de reposição das coisas no estado em que estariam se não se tivesse produzido o dano (cfr. também o art.º 563º do C.C.). Segundo o art.º 564º do C.C. para o cálculo da indemnização, o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão, e na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros desde que sejam previsíveis. Por outro lado, são indemnizáveis os danos que estejam com o facto praticado pelo agente numa relação de causalidade, de modo que se possa afirmar, à luz do direito, que o dano é resultante da conduta. A indemnização em dinheiro tem carácter excecional ou subsidiário, tendo apenas lugar quando a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor -art.º 566º do C.C., que dispõe ainda que a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal (ou seja, o momento do encerramento da discussão em primeira instância), e a que teria nessa data se não existissem danos; a indemnização tem aqui como critério básico a situação concreta do lesado que deve medir-se por uma diferença: a existente entre a situação real em que o facto deixou o lesado e a situação hipotética em que ele se encontraria sem o dano sofrido, conforme resulta do disposto no art.º 566º, n.º 2, do C.C. consagrando a teoria da diferença.
Quanto aos danos não patrimoniais, a indemnização visa atribuir uma compensação que contrabalance o mal sofrido. O art.º 496º, º. 4, do C.C., manda atender ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e às demais circunstâncias do caso que resultem da matéria provada (-art.º 494º do C.C.), entre elas as lesões sofridas, o sofrimento, sem esquecer os dados da jurisprudência de modo respeitar-se o princípio constitucional da igualdade (art.º 13º da CRP). A justa medida terá de ser encontrada através de um juízo equitativo. Deste modo tenta ressarcir-se as dores físicas e psíquicas, as situações que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito (n.º 1, art.º 496º).
A indemnização por danos não patrimoniais tem natureza reparatória e sancionatória. Na sua ponderação não se pode deixar de atender a critérios de proporcionalidade e, como dissemos, de igualdade (cfr. art.º 8º, n.º 3, do C.C.). Também não se pode ficar por valores meramente simbólicos, devendo efetivamente restaurar a situação, do ponto de vista moral, de quem é vítima de uma determinada atuação.
O chamado dano biológico, enquadra-se na ressarcibilidade de um dano futuro, que para ser passível de indemnização, tem que ser previsível.
Praticamente não se questiona que a lesão corporal sofrida em consequência de um acidente de viação constitui em si um dano real ou dano-evento, designado por dano biológico, na medida em que afeta a integridade físico-psíquica do lesado, traduzindo-se em ofensa do seu bem “saúde”. Trata-se de um “dano primário”, do qual podem derivar, além das incidências negativas não suscetíveis de avaliação pecuniária, a perda ou diminuição da capacidade do lesado para o exercício de atividades económicas, como tais suscetíveis de avaliação pecuniária. Trata-se, assim, neste âmbito de ressarcir danos que ainda não se concretizaram, mas que, de acordo com o curso normal das coisas, de acordo com o que é previsível em face das circunstâncias, sempre virão a concretizar-se no futuro. Tal dano consiste numa “incapacidade funcional ou fisiológica que se centra, em primeira linha, na diminuição da condição física, resistência e capacidade de esforços, por parte do lesado, o que se traduz numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo, no desenvolvimento das atividades pessoais, em geral, e numa consequente e, igualmente, previsível maior penosidade, dispêndio e desgaste físico na execução das tarefas que, no antecedente, vinha desempenhando, com regularidade” -cfr. Ac. desta Relação de 26/5/2022, relator Alcides Rodrigues (consultável em www.dgs.pt, como todos os que se citarão sem outra menção).
E prossegue, explicando que é questão controversa a natureza do dano biológico - patrimonial, não patrimonial, mista ou tertium genus. A afetação da integridade físico-psíquica, designada como dano biológico, pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e de natureza não patrimonial. Na primeira categoria não se compreende apenas a perda de rendimentos pela incapacidade laboral para a profissão habitual, mas também as consequências da afetação, em maior ou menor grau, da capacidade para o exercício de outras atividades profissionais ou económicas, suscetíveis de ganhos materiais. Na sua dimensão patrimonial o dano biológico tem sido perspetivado na vertente de lucros cessantes, enquanto perda de capacidade de ganho ou, como hoje se designa, défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, na medida em que respeita a incapacidade funcional. Afirma-se, repetidamente, que esta incapacidade funcional, mesmo que não impeça o lesado de continuar a trabalhar e que dela não resulte perda ou diminuição de vencimento, importa necessariamente dano patrimonial (futuro), que deve ser indemnizado, já que a força do trabalho do homem, porque lhe propicia fonte de rendimentos, é um bem patrimonial, sendo certo que essa incapacidade obriga o lesado a um maior esforço para manter o nível de rendimentos auferidos antes da lesão.” (…) Em suma, o dano biológico abrange um leque alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, compreendendo igualmente a perda ou diminuição de capacidades funcionais que, mesmo não importando uma repercussão negativa no salário ou na atividade profissional do lesado, impliquem ainda assim esforços suplementares no exercício dessa atividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expectável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual. Além de que não pode deixar de se atribuir relevância económica ao trabalho das “lides domésticas”, seja em si mesmo considerado, seja pelos custos da sua realização por terceiro.
E conclui, sumariando: I - A limitação funcional ou dano biológico, em que se traduz uma incapacidade, é apta a provocar no lesado danos de natureza patrimonial e de natureza não patrimonial. II - Na primeira categoria não se compreende apenas a perda de rendimentos pela incapacidade laboral para a profissão habitual, mas também as consequências da afetação, em maior ou menor grau, da capacidade para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, suscetíveis de ganhos materiais.
Também o Ac. desta Relação de 21/10/2021 (relator Pedro Maurício) aborda esta matéria, sumariando: I - O «dano biológico» tem sido entendido pela Jurisprudência como dano-evento, reportado a toda a violação da integridade físico-psíquica da pessoa, com tradução médico-legal, ou como diminuição somático-psíquica e funcional do lesado, com repercussão na sua vida pessoal e profissional, independentemente de dele decorrer ou não perda ou diminuição de proventos laborais. II - O dano biológico é sempre ressarcível, como dano autónomo, independentemente do seu específico e concreto enquadramento nas categorias normativas de dano patrimonial ou de dano não patrimonial, sendo pacífico o entendimento do STJ de que mesmo as pequenas incapacidades ainda quando não impliquem directamente uma redução da capacidade de ganho, constituem sempre um dano indemnizável: nesta vertente, a indemnização do «dano biológico» visa compensar o lesado da privação ou restrição de futuras oportunidades profissionais ou de índole pessoal no decurso do tempo de vida expetável (mesmo fora do quadro da profissão habitual), precludidas irremediavelmente pela capitis deminutio de que passou a padecer, bem como do custo/esforço acrescido que o já relevante grau de incapacidade fixado irá envolver para o exercício de quaisquer tarefas da vida profissional ou da vida pessoal. III - Quando o «dano biológico» não implica incapacidade parcial permanente para o exercício da actividade profissional habitual e/ou não implica uma directa redução da capacidade de ganho, envolvendo apenas esforços suplementares, a determinação do seu quantum indemnizatório realizar-se com recurso à equidade, ao abrigo do disposto no art. 566º/3 do C.Civil, em função das circunstâncias concretas de cada caso e tendo em consideração os critérios jurisprudenciais vigentes e aplicáveis a situações semelhantes, em face do disposto o art. 8°/3 do C.Civil.
Efetivamente, o STJ no Ac. de 13/04/2021 (relator Fernando Baptista), veio dizer que “uma incapacidade permanente parcial não se esgota na incapacidade para o trabalho, constituindo em princípio um dano funcional mas sempre, pelo menos, um dano em si mesmo que perturba a vida da relação e o bem-estar do lesado ao longo da vida, pelo que é de considerar autonomamente esse dano, distinto do referido dano patrimonial, não se diluindo no dano não patrimonial, na vertente do tradicional pretium doloris ou do dano estético. O lesado não pode ser objecto de uma visão redutora e economicista do homo faber. A incapacidade permanente (geral) de que está afectada a vítima constitui, nesta perspectiva, um dano em si mesmo, cingindo-se à sua dimensão anátomo-funcional. A incapacidade permanente geral (IPG) corresponde a um estado deficitário de natureza anatómica-funcional ou psicosensorial, com carácter definitivo e com impacto nos gestos e movimentos próprios da vida corrente comuns a todas as pessoas. Pode ser valorada em diversos graus de percentagem, tendo como padrão máximo o índice 100. Esse défice funcional pode ter ou não reflexo directo na capacidade profissional originando uma concreta perda de capacidade de ganho”.
É também este o nosso entendimento, sendo que, de qualquer modo, importante é destacar que o Tribunal o que não pode é valorar o mesmo dano duas vezes para efeitos de atribuição de indemnização (cfr. Ac. da Relação do Porto de 27/09/2016).
Veja-se a explicação das duas posições, e como se deve evitar a dupla valoração, no Ac. da Relação do Porto de 09/12/2014, e no Ac. do STJ de 18/9/2018.
Certo será que só ocorre dupla valoração se a dimensão considerada do dano for a mesma, mas já não quando o dano se manifesta de formas diferentes ou tem reflexos em diferentes dimensões.
Como vimos, a recorrente não discute a ressarcibilidade deste(s) dano(s), pelo que importa essencialmente debruçar sobre o cálculo da sua indemnização.
No caso dos autos estamos precisamente numa situação em que a perda da capacidade geral de ganho não se traduz na perda de rendimentos da profissão. Atenta a idade da lesada e a sua situação de reformada, também não é expetável que se venha a revelar o efeito negativo da sua limitação em expetativas laborais.
Todavia, como resulta do exposto, daí não resulta a irrelevância da limitação, muito pelo contrário. Também não será adequado fundir tudo nas consequências não patrimoniais derivadas das lesões. Importa antes aferir da repercussão das consequências futuras das lesões na sua vida pessoal, a afetação das suas capacidades funcionais, indemnizável, em todo o caso, autonomamente, como dano biológico (no caso que nos ocupa). Na medida em que limita o padrão de vida expetável da lesada, é suscetível de ser avaliado numa vertente patrimonial.
A afetação da integridade físico-psíquica, na medida em que tem consequências sobre a saúde, bem-estar e qualidade de vida do lesado, porque as suas consequências patrimoniais não se esgotam no reflexo direto na capacidade profissional, tem, por isso, uma dimensão patrimonial; estando a lesada reformada, releva o dano funcional, que se manifesta no exercício da atividade diária e corrente, resultado das lesões.
Isso mesmo foi destacado no Ac. desta Relação de 18/12/2017, relatado pelo aqui 1º adjunto (José Alberto Moreira Dias), em que, optando pela corrente jurisprudencial que diz que o dano biológico deve ser sempre valorado em sede patrimonial (e citando abundante jurisprudência em prol de cada uma das teses), independentemente da pessoa lesada com esse tipo de incapacidade, na altura do acidente, desempenhar ou não atividade remunerada, designadamente, por estar reformada, destaca em seu abono (no que se reporta á concreta situação de reformado): após uma vida de trabalho, estando reformado, o ser humano tem de continuar a trabalhar, agora dedicando-se às suas lides domésticas e familiares; pretender-se que as domésticas ou os reformados não trabalham, é reduzir o valor do trabalho doméstico que os mesmos têm, necessariamente, de desempenhar para prover às suas necessidades diárias e as do seu agregado familiar; no entanto, esse trabalho doméstico – educação dos filhos, limpeza da casa, confecionar as refeições, cuidar dos filhos ou dos netos, etc. -, tem indiscutivelmente um valor pecuniário, tanto assim que quando ambos os membros do casal trabalham ou em caso de impossibilidade, designadamente, por via das incapacidades funcionais que os afetam, não conseguem satisfazer esse trabalho doméstico e têm de se socorrer de terceiros para o executar, os mesmos têm de pagar a esses terceiros remuneração correspondente a essa atividade que lhes prestam.
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Não sendo possível quantificar a indemnização em termos exatos, não sendo suscetível de uma avaliação pecuniária exata (cfr. art.º 562º do C.C.), o tribunal deve fazer um juízo segundo a equidade –cfr. art.º 566º, n.º 3, do C.C..
Relativamente ao cálculo da indemnização, o Ac. do STJ de 24/02/2022 (relatora Maria da Graça Trigo) indica valiosos fatores a ponderar no juízo equitativo, com pertinente aplicação quanto estão em causa lucros cessantes: a idade do lesado e a sua esperança média de vida; o seu grau de incapacidade geral permanente (isto é, a percentagem do défice funcional permanente da integridade físico-psíquica); as suas potencialidades de ganho e de aumento de ganho, anteriores à lesão, tanto na profissão habitual, como em profissão ou actividades económicas compatíveis com as suas qualificações e aquele défice; conexão entre as lesões psicofísicas sofridas e as exigências próprias de atividades profissionais ou económicas do lesado, compatíveis com as suas habilitações e/ou formação; e jurisprudência anterior (por referência a decisões temporalmente próximas e nas quais estejam em causa situações fácticas essencialmente similares).
Veja-se ainda a distinção entre dano evento e dano consequência, conforme o que diz esse Ac. do STJ supra citado, na sequência do estudo feito pela Exmª Srª Juíza Conselheira relatora: “(…) Temos, pois, que o sentido em que a expressão “dano biológico” foi utilizada pela Relação não corresponde ao sentido invocado pela Recorrida em sede de contra-alegações («Por dano biológico deve entender-se qualquer lesão da integridade psicofísica que possa prejudicar quaisquer atividades, situações e relações da vida pessoal do sujeito, não sendo necessário que se refira apenas à sua esfera produtiva, abrangendo igualmente a espiritual, cultural, afetiva, social, desportiva e todas as demais nas quais o indivíduo procura desenvolver a sua personalidade. O que significa que, o dano biológico é constituído pela lesão à integridade físico-psíquica, à saúde da pessoa em si e por si considerada, independentemente das consequências de ordem patrimonial» - negrito nosso). Não quer dizer que este significado seja, em si mesmo, incorrecto, mas apenas que o mesmo corresponde ao uso da expressão “dano biológico” como dano-evento, ao passo que as instâncias a utilizaram no sentido de dano-consequência (de natureza patrimonial).
E diz ainda: “Coexistem na doutrina e na jurisprudência diferentes aceções de dano biológico. Na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, atualmente o significado com que mais frequentemente tal expressão é aquele que correspondente à de consequências patrimoniais da incapacidade geral ou genérica do lesado, aferida em função das Tabelas de Incapacidade Geral Permanente em Direito Civil. Mas este significado coexiste com outros, designadamente com o de dano biológico como consequência não patrimonial de uma lesão psicofísica. É, por isso, conveniente que, ao fazer-se uso da dita expressão (seja num texto de índole doutrinal seja numa decisão judicial), se comece por definir a aceção em que a mesma é utilizada.” - in “O conceito de dano biológico como concretização jurisprudencial do princípio da reparação integral dos danos – Breve contributo”, Revista Julgar, n.º 46, págs. 268 e ac. STJ citado.
Em suma, considerando ou não o dano biológico como dano patrimonial ou dano não patrimonial, ou até mesmo como tertium genus ou ainda como uma entidade híbrida participando de uma e outra de tais dicotómicas modalidades, no cômputo dos danos sofridos não podem deixar de acrescer aqueles que jurisprudencialmente têm vindo a ser considerados como configuradores do direito indemnizatório em conformidade com o estatuído nos art.ºs 494º, 496º e 566º do C.C.: o quantum doloris – que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária –, o “dano estético” – que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima –, o “prejuízo de afirmação social” – dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado nas suas variadíssimas vertentes (familiar, profissional, sexual, afetiva, recreativa, cultural e cívica) – o “prejuízo da saúde geral e da longevidade” – aqui avultando o dano da dor e o défice de bem estar, valorizando-se os danos irreversíveis na saúde e no bem estar da vítima e corte na expectativa da vida. – cfr. Acs.- STJ de 18/10/2018 (relator Hélder Almeida), e de 7/3/2023 (relator Manuel Capelo).
Como se sumaria no Ac. desta Relação de 19/9/2024 (relatado por Sandra Melo), “3- Para a determinação da indemnização pelos danos não patrimoniais causados por um acidente de viação importam essencialmente as consequências que as lesões têm na vida do lesado, considerada esta em todas as suas dimensões em que se realiza o ser humano, incluindo todos os sofrimentos que o lesado padeceu e previsivelmente padecerá.
4- Desde que, seguindo critérios lógico-jurídicos coerentes, se atendam a todas as consequências originadas pelo evento lesivo e sejam contemplados todos os danos passíveis de indemnização, sem duplicação na sua valoração, é racionalmente admissível e de aceitar diferentes categorização dos danos: estas classificações mais não são que instrumentos de trabalho, de cariz teórico, que auxiliam na fixação e atribuição da indemnização ou da compensação ao lesado, em função das consequências nefastas do ato na esfera patrimonial e pessoal do lesado.”
Igualmente no Ac. desta Relação de 11/7/2024 (este relatado pelo aqui 2º adjunto, Fernando Barroso Cabanelas) tal como nos Acs. (do mesmo relator) de 27/6/2024) e de 4/4/2024, assume-se posição quanto ao modo de encarar e calcular o dano biológico, bem como os danos não patrimoniais, seguindo idêntica argumentação.
Assente, pois, que a compensação do dano biológico (também) inclui a acrescida penosidade e esforço no exercício da atividade diária e corrente do lesado, de modo a compensar e ultrapassar as deficiências funcionais de maior ou menor gravidade que constituem sequela irreversível das lesões sofridas. A perda relevante de capacidades funcionais - mesmo que não ou não totalmente refletida no valor dos rendimentos obtidos pelos lesado - constitui uma redução no trem de vida quotidiano com reflexos de indemnização em termos patrimoniais uma vez que a esperança de vida supõe precisamente atividade que se não confina à denominação de vida ativa com rebate exclusivo no exercício de uma profissão. (…). Continuando a seguir as palavras daquele último acórdão do STJ citado (de 7/3/2023), se “…é verdade que ao ressarcimento do dano biológico inclui o sobre esforço no exercício da atividade diária e corrente do lesado e visa compensar e ultrapassar as deficiências funcionais que resultaram como sequela irreversível das lesões, deve aceitar-se igualmente que a fixação da indemnização deste dano, quando só esta afetação esteja presente e não já a reportada a uma atividade profissional, condiciona em termos de equidade o montante a fixar, cerzindo a indemnização a uma dimensão essencialmente não patrimonial mas distinta dos danos morais de acordo com a distinção clássica que se realizava quando não se procedia à avaliação do dano biológico, nos termos que no início desta exposição decisória enunciamos.”
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Aqui chegados já ficam respondidas as questões do recurso (restando a verificação do acerto dos valores encontrados): o cálculo do valor adequado ao ressarcimento do dano biológico, tem uma vertente patrimonial, e deve ser autonomamente determinado; não está incluído no valor atribuído a título de indemnização pelo dano não patrimonial.
De facto, na sentença recorrida teve-se o cuidado de distinguir: “Resultou provado nos autos que, a final, a Autora ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 8 pontos, sendo que a mesma se encontrava na altura aposentada, pelo que as sequelas descritas não terão repercussão permanente na atividade profissional, devendo assim ser consideradas para efeitos de dano biológico na sua vertente de dano não patrimonial. Na verdade, estando em causa um dano biológico, traduzido numa incapacidade funcional ou fisiológica de 8 pontos, a repercussão negativa centra-se na diminuição da condição física e numa penosidade, dispêndio e desgaste físico acrescido na execução de tarefas antes desempenhadas, sem o mesmo esforço, no seu dia-a-dia. Neste ponto, deverá ainda atender-se ao facto de ter resultado apurado que a Autora padeceu um Défice Funcional Temporário Total fixável por um período de 11 dias e o de Défice Funcional Temporário Parcial por um período 386 dias. Assim sendo, entendemos que, na ponderação dos fatores que ficaram apontados, a indemnização justa e adequada em referência deve situar-se nos peticionados € 25.000,00.”
E por outro lado, a título de danos não patrimoniais: “Resultou provado que, além dos défices funcionais supra referidos, o quantum doloris é fixável no grau 4/7 e o dano estético permanente é fixável no grau 3/7. Ora, as lesões que se deixaram descritas, a dor física, a angústia, o transtorno, os tratamentos, a fisioterapia, os períodos de incapacidade e o défice funcional sofrido, demandam o seu ressarcimento no plano dos danos não patrimoniais. Apelando à equidade entendemos adequado fixar aqueles na quantia € 10.000,00.”
No ressarcimento do dano biológico deve ter-se em conta a esperança média de vida do lesado, uma vez que as suas necessidades básicas não cessam no dia em que deixar de trabalhar por virtude da reforma, sendo manifesto que será nesse período temporal da sua vida que as suas limitações e situações de dependência, ligadas às sequelas permanentes das lesões sofridas, com toda a probabilidade mais se acentuarão (com tendência a agravar-se, segundo as regras da experiência, no decurso dos anos da sua previsível expetativa de vida).
Como vimos, na afetação da capacidade geral de ganho deve ser tido em conta a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua atividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas (cfr. também Ac. desta Relação de 11/1/2024, relator Alcides Rodrigues).
No caso que nos ocupa o Tribunal a quo delimitou os fatores que valorou ora para a determinação de um valor, ora para a determinação do outro, de modo a, nem haver dupla valoração, nem haver fatores (erradamente) desconsiderados.
Como também já decorre do exposto, equidade não é arbitrariedade. Expostos os critérios, resta apontar os fatores a considerar em cada situação, e a ponderação de situações o mais semelhantes possível, sendo certo que cada caso tem sempre particularidades intransponíveis.
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Assim, temos, no que respeita ao dano não patrimonial:
-as fraturas sofridas, o internamento, a intervenção cirúrgica, os tratamentos médicos e medicamentosos a que foi sujeita, os períodos de limitação e a necessidade de ajuda de terceira pessoa, as consultas posteriores, o quantum doloris fixável no grau 4/7, o dano estético fixável no grau 3/7, as sequelas na perspetiva das consequências imediatas para a saúde incluindo o défice funcional fixado em 8 pontos, o bem estar físico e psicológico, da lesada, tal como resulta da factualidade assente (fratura dos pratos tibiais tipo Schatzker Vi à esquerda, internamento hospitalar; a 26.11.2021 foi submetida a intervenção cirúrgica para redução aberta e osteossíntese com placa posteromedial e lateral da tíbia esquerda; em 03.12.2021e em ../../2022 teve alta da consulta de ortopedia; durante o período em que se manteve internada foi sujeita a vários tratamentos médicos e medicamentosos; após a alta manteve-se muito limitada na sua capacidade de pedestação durante o período de 45 dias adicionais em que teve de utilizar tala de “...” colocada no membro operado; necessitou da ajuda de terceira pessoa para higiene e vestuário durante um período cerca de três meses; após a alta médica manteve seguimento em consultas de ortopedia até ../../2022, nas quais realizou controlo radiológico; a data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 21/12/2021; o Período de Défice Funcional Temporário Total é fixável num período de 11 dias e o Período de Défice Funcional Temporário Parcial é fixável num período 386 dias), e resumido na primeira parte do ponto 3.24 da matéria apurada: “As sequelas decorrentes do acidente de viação causam à Autora desgosto, frustração, ansiedade, irritação e incómodos (…)”.
No que respeita ao dano biológico temos:
- as sequelas numa perspetiva futura, o défice funcional permanente da integridade físico psíquica fixado em 8 pontos, aliado à sua idade (76 anos à data do acidente) e situação de reformada, o que tem respaldo no restante teor do mesmo ponto 3.24: “(…) na medida em que a mesma passou a padecer de dores e dificuldades de locomoção, recorrendo ao uso permanente de canadiana, tendo deixado de poder fazer algumas tarefas do dia-a-dia e lazer que antes fazia e outras só com maior sacrifício e dor as consegue fazer, nomeadamente caminhar por tempo prolongado ou em terreno instável ou planos inclinados, subir e descer escadas, manter o equilíbrio, apanhar objectos do chão, o que afectou a sua saúde e a sua qualidade de vida.”, e no ponto 3.25: “Por força das referidas limitações, a Autora deixou de poder tratar das lides domésticas sem o auxílio de terceira pessoa, bem como de desempenhar a actividade de lazer diária de jardinagem a que se dedicava.”
No que respeita à esperança média de vida, esta deve aferir-se pela esperança média de vida que, à data do acidente, têm os nascidos no ano do nascimento do lesado, e não pela esperança média de vida (geralmente superior) dos nascidos no ano em que teve lugar o acidente (como chama a atenção Maria da Graça Trigo, pág. 267 do texto citado); porém, os elementos estatísticos disponíveis permitem tal pesquisa até 1960, o que não abarca a aqui lesada. Não obstante, em Portugal a esperança média de vida à nascença para as pessoas do sexo feminino, nascidas no ano em que teve lugar o acidente (2021), era de 83,67 anos (fonte: Instituto Nacional de Estatística).
Importa ainda considerar que a lesada foi atropelada quando atravessava a via numa passadeira, sem qualquer culpa da sua parte.
Relativamente à ponderação de outras situações tratadas jurisprudencialmente, seriam inúmeras as que poderíamos elencar.
Sem prejuízo da consideração das decisões citadas pela recorrida, já que as citadas pela recorrente não se mostram devidamente identificadas de modo a ser possível a sua consulta no site indicado, destacamos:
-o Ac. de 11/1/2024 desta Relação, já mencionado, bem como a jurisprudência aí citada e que aqui nos dispensamos de reiterar;
-o Ac. da Rel. de Lisboa de 2/12/2021 (Nuno Lopes Ribeiro): défice funcional permanente de 2%, a idade de 56 anos à data do acidente e a circunstância de o lesado se encontrar já reformado por invalidez, embora realize trabalhos ocasionais não declarados, julga-se adequado fixar a indemnização devida, a título de dano biológico, em € 10.000,00; (…) as sequelas que apresenta, o sofrimento que experimentou, a afectação permanente da sua imagem corporal [dano estético] e a afectação psicológica, e concluiu que a quantia de € 17.500,00 fixada pela 1.ª instância, como compensação dos danos não patrimoniais sofridos, revela-se ajustada;
-o Ac. desta Relação de 26/9/2024 (Eva Almeida): 6.000,00, € 11.000,00 por danos não patrimoniais, tratando-se de um indivíduo de 56 anos, reformado por incapacidade para a sua profissão, mas exercendo atividade agrícola e alguma atividade na área de construção civil, do que ficou privado; quantum doloris de 4 pontos, défice 1%;
-o Ac. desta Relação de 24/10/2024 (Raquel Baptista Tavares): “I - Tendo em atenção as lesões sofridas e os tratamentos a que a Autora foi sujeita, com particular destaque para o período temporal em que esteve afetada, bem como as sequelas de que ficou a padecer, tendo ainda em atenção que fruto dessas sequelas ficou com Incapacidade Permanente Geral de 20 pontos, que sofreu um quantum doloris de 4 pontos, numa escala de sete graus de gravidade crescente e ficou com um dano estético fixado num grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente, julgamos adequado o montante de €20.000,00 para compensar os danos não patrimoniais sofridos, tal como pretendido pela Autora. II - Tendo a Autora, à data do acidente 70 anos de idade, mas vivendo sozinha, executando as lides domésticas sozinha, participando ainda em atividades da freguesia, frequentando a igreja e fazendo convívios, e tendo ficado afetada por Défice Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica fixável em 20 pontos, sendo que as sequelas de que ficou a padecer a impossibilitam de carregar e/ou manipular objetos com o braço direito, não conseguindo efetuar tarefas que exijam movimentos do braço direito devido à rigidez muscular, ficando com limitação funcional na higiene e no vestuário, decorrente da incapacidade de movimentar o membro superior direito, sendo de prever, atendendo ao tipo e à gravidade das lesões um agravamento futuro do quadro clínico da Autora e das limitações físicas de que a mesma padece, tendo ficado, após o acidente e em consequência do mesmo, condicionada na execução das lides domésticas, como a limpeza da casa e a alimentação, bem como na sua higiene e vestuário, entende-se justa e adequada a indemnização de €30.000,00 a título de dano biológico.”:
-o Ac. desta Relação de 28/11/2024 (Fernanda Proença Fernandes) que considerou os 68 anos do lesado à data do acidente, e situação (entretanto) de reformado; o défice funcional permanente da integridade física-psíquica de 8 pontos; o facto de não ter qualquer responsabilidade na eclosão do acidente, sendo esta da inteira responsabilidade do condutor do veículo automóvel segurado; quantum doloris fixável no grau 4, numa escala de 1 a 7, dano estético permanente fixável no grau 1, repercussão permanente nas atividades desportivas e delLazer fixável no grau 1, numa escala de 1 a 7 (…), e aceitou por equitativa a indemnização de € 24.308,49 por dano biológico, e diminuiu para o valor de € 20.000,00 a indemnização por danos não patrimoniais.
De referir o seguinte: o primeiro acórdão citado pela recorrente (e que, repete-se, não encontramos publicado) indemnizou a lesada pelo dano biológico na vertente patrimonial, remetendo no mais para os danos não patrimoniais cuja indemnização fixou em € 20.000,00.
Por tudo o exposto, entende-se que, quer o valor arbitrado a título de indemnização por danos não patrimoniais (€ 10.000,00), quer o valor fixado para compensação do dano biológico (€ 25.000,000), afiguram-se dentro dos padrões que são praticados, e ajustados ao caso. Fica assim respondida a questão recursiva que faltava conhecer.
O recurso deve, por isso, improceder.
As custas são a cargo da parte vencida, no caso a recorrente, dado o critério do decaimento fixado no art.º 527º, n.ºs 1 e 2, C.P.C..
***
V DISPOSITIVO.
Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação em julgar o recurso totalmente improcedente e, em consequência, negar provimento à apelação e confirmar a sentença recorrida.
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Custas do recurso a cargo da recorrente (art.º 527º, n.ºs 1 e 2, do C.P.C.).
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Guimarães, 6 de março de 2025.
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Os Juízes Desembargadores
Relator: Lígia Paula Ferreira Sousa Santos Venade
1º Adjunto: José Alberto Moreira Dias
2º Adjunto: Fernando Barroso Cabanelas
(A presente peça processual tem assinaturas eletrónicas)
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[i] A referência a recorrida trata-se de lapso, referindo-se antes à recorrente.