ALIMENTOS
PRESCRIÇÃO
SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO
Sumário

I - Apenas em relação ao progenitor que exerce o poder paternal do filho menor se verifica a causa de suspensão do prazo de prescrição prevista na alínea b) do artigo 318.º CCivil.
II - Não tendo sido alegado e não constando, por isso, do elenco dos factos provados, que o pai, devedor da pensão de alimentos, exercesse o poder paternal em relação aos filhos, que estavam à guarda da mãe, não tem aquela norma aplicação ao caso.
III - A razão de ser da suspensão do prazo prescricional prevista na 2.ª parte do n.º 1 do artigo 320.º CCivil prende-se com a menoridade do titular de alimentos e, por essa via, do especial tratamento que em função disso o legislador entendeu dever prever em termos do exercício desse direito no que concerne ao prazo prescricional.
IV - Esta razão de ser não se verifica em relação ao progenitor com quem o menor vive, já que em relação àquele nenhuns constrangimentos se verificam que o impedisse de exercer em tempo útil o direito a exigir o cumprimento das prestações alimentares vencidas.

Texto Integral

Apelação - Processo 590/08.0TBVCD-G - Embargos de Executado (2013) – do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Família e Menores de Vila do Conde - Juiz 1



Relator - Ernesto Nascimento
Adjunta - Isoleta Almeida Costa
Adjunto - Paulo Duarte Mesquita Teixeira




Acordam na 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto


I. Relatório

Por apenso à execução que lhe move AA deduziu o executado BB embargos de executado, defendendo-se,
- por impugnação,
- alegando, ainda, que,
- a suposta dívida não é exigível, certa e líquida, que a prestação se torna exigível quando a obrigação se encontra vencida e o devedor foi devidamente interpelado, o que não aconteceu, sendo que, a interpelação é o acto pelo qual o credor exige ou reclama do devedor o cumprimento da obrigação;
- por sentença proferida no dia 13-05-2023, no âmbito do processo n.º 1397/22.7STS, que corre termos pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Comércio do Porto – Juiz 7, foi declarado insolvente e, então, o local processual onde a dívida deve ser exigida será no processo de insolvência;
- e, invocando a prescrição, de 5 anos, previsto na alínea f) do artigo 310.º CCivil, bem como a prescrição prevista no artigo 307.º do mesmo Código, dado estarmos perante prestações periódicas.
Contestou a embargada, pugnando pela total improcedência dos embargos, defendendo-se por impugnação e alegando, em resumo, que,
- a declaração de insolvência do executado, por sentença transitada em julgado, não implica a extinção da obrigação alimentar, sendo que na fixação do mínimo de subsistência, seja, o rendimento que não será objeto de entrega ao Fiduciário se teve em consideração os valores pagos a titulo de pensão de alimentos, de forma a não prejudicar os superiores interesses dos menores/maiores, não sendo o pagamento da pensão de alimentos afectada pela declaração de insolvência;
- o prazo prescricional de 5 anos previsto no artigo 310.º, alínea f) CCivil, para as pensões alimentícias, não começa nem corre entre o progenitor que exerce as responsabilidades parentais e os menores a elas sujeitas, enquanto tal, de harmonia com o disposto no artigo 318.º alínea b) CCivil;
- os filhos de embargante e embargada completaram 18 anos de idade no dia 27.10.2022 e, portanto, desde essa data deixaram de estar sujeitos ao poder paternal, iniciou-se aí o prazo de prescrição de 5 anos;
- o requerimento executivo foi apresentado a 17.10.2023, quando faltavam ainda 10 dias para o prazo de prescrição previsto no artigo 320.º CCivil;
- no processo executivo as diligências da penhora precedem a citação, como é o caso dos autos em que a execução segue o processo sumário – artigos 856.º, n.º 1, do CPC – e, por isso, podem decorrer largos dias, até meses, entre o momento em que é instaurada a ação executiva e citado o devedor executado;
- nos termos do artigo 323.º/2 CCivil, “se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias”;
- o direito ao pagamento das prestações alimentícias, reclamadas nos presentes autos, não se encontra, assim, prescrito;
- a esta obrigação é aplicável a suspensão da prescrição prevista nos artigos 318.ºalinea b) e 320.º, n.º 1, do CC, não começando nem correndo a prescrição entre os menores e quem sobre eles exerce o poder paternal e, de qualquer forma, não se completando contra eles a prescrição sem ter decorrido um ano a partir do termo da incapacidade.
Percorrida a pertinente tramitação teve lugar a audiência de discussão e julgamento, que culminou com a prolação de sentença a julgar totalmente procedentes os embargos de execução, por se julgar verificada a invocada excepção de prescrição de créditos.
Inconformada recorre a exequente, embargada, pugnando pela revogação da sentença e substituição por uma outra que declare que in casu não se verifica a excepção invocada de prescrição dos créditos de alimentos, rematando o corpo da motivação com as conclusões que se passam a transcrever:
1) Na presente execução, pretende-se obter do pai, ora recorrido, o pagamento das pensões vencidas em 2011 a 2022, referentes a atualizações não pagas e as prestações de alimentos correspondentes aos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, junho, julho, agosto, setembro e outubro de 2023.
2) Os filhos de recorrente e recorrido atingiram a maioridade em 27 de outubro de 2022.
3) A recorrente não age em sub-rogação, porque tem legitimidade directa e própria, atribuída por lei, nos termos dos artigos 1880.º e 1905.º, n.º 2, do Código Civil e 989.º do Código de Processo Civil.
4) A questão essencial que o presente recurso pretende seja ponderada e analisada, consiste em saber se se encontram prescritas as pensões alimentícias devidas pelo executado relativas ao período compreendido de janeiro de 2011 a outubro de 2023.
5) A norma jurídica em apreço é a prevista no artigo 310.º, alínea f), do Código Civil, que encurta, a titulo excecional, o prazo de prescrição – “prescrevem no prazo de cinco anos as pensões alimentícias vencidas. “
6) No entanto, há que ter em consideração que a prescrição não começa, nem corre, entre quem exerça o poder paternal e as pessoas a ele sujeitas – artigo 318.º, al. b), do CC.
7) Sendo as responsabilidades parentais agora partilhadas pelos dois progenitores, passando aquela “guarda” apenas a determinar a residência habitual do menor.
8) Isto significa, no caso concreto, que o exercício das responsabilidades parentais é exercida em conjunto pelos dois progenitores, nos termos da nova redação do art.º 1906º do C. Civil.
9) Assim, relativamente às prestações de alimentos, vencidas no período da menoridade dos filhos de recorrente e recorrido, a contagem do prazo de prescrição de 5 anos, não se chegou sequer a iniciar, uma vez que o recorrido exerce conjuntamente com a recorrente, as responsabilidades parentais, nos termos do art.º 1906º do C. Civil, sendo, pois, aplicável a suspensão da prescrição prevista no art.º 318º, b), do C. Civil.
10) Deste modo, tendo os prazos de prescrição das respetivas prestações vencidas estado suspensos no período da menoridade dos filhos de recorrente e recorrido, até terem completado 18 anos, iniciando-se só nessa data (27/10/2022) a sua contagem, nenhum deles se completou até à sua interrupção com a citação do recorrido para os termos desta ação executiva - art.º 323º, n.º 1, do C. Civil -, pelo que não prescreveu o direito ao pagamento de qualquer uma das prestações alimentícias reclamadas nos presentes autos.
11) Neste contexto, o prazo de prescrição de 5 anos apenas começou a correr no dia 27 de outubro de 2022, data em que os filhos de exequente e executado completaram 18 anos e deixaram de estar sujeitos ao exercício do poder paternal.
12) Decorre do exposto que o prazo prescricional de 5 anos previsto no artigo 310.º, al. f), do CC, para as pensões alimentícias objeto dos presentes autos não começa nem corre entre o progenitor e os menores, enquanto tal, de harmonia com o disposto no artigo 318.º, al. b), do Código Civil.
13) Ora, considerando que os filhos de recorrente e recorrido completaram 18 anos de idade em 27/10/2022 e, portanto, desde essa data deixaram de estar sujeitos ao poder paternal, iniciou-se aí o prazo de prescrição de 5 anos.
14) Assim sendo, na data em que foi instaurada a execução (17/10/2023) não tinha ainda decorrido aquele prazo de prescrição.
15) Face a todo o exposto, se conclui que não tendo ainda decorrido cinco anos sobre a data em que os filhos de exequente e executado atingiram a maioridade, deveria a Mmo. Juiz a quo ter concluído pela improcedência da excepção da prescrição.
16) O Tribunal “a quo” violou, assim, o disposto nos artigos 306.º, 310.º, 318.º, 320.º e 323.º todos do Código Civil, fazendo uma incorrecta interpretação e aplicação do direito.
Por mero dever de patrocínio, ainda sem prescindir,
17) Mais uma vez, o Tribunal a quo fez uma incorrecta interpretação e aplicação do direito, pois que se limitou a aplicar o artigo 323.º, n.º 1 do Código Civil, sem atender ao estipulado no n.º 2 deste normativo.
18) O executado/recorrido foi citado no dia 13 de novembro de 2023.
19) O requerimento executivo em apreço foi junto aos autos de execução n.º 590/08.0TBVCD.1, em 17/10/2023.
20) A recorrente instaurou os presentes autos executivos dez dias antes do termo do prazo de prescrição.
21) Por conseguinte, importa apurar se o facto do executado, aqui recorrido, apenas ter sido citado em 13/11/2023 ocorreu por motivo imputável à recorrente.
22) Está, assim, em causa a aplicação do artigo 323.º, n.º 2 do Código Civil, o qual estipula que se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
23) A lei substantiva estabelece, assim, a regra de que para efeitos de interrupção da prescrição, se deve considerar como efetuada a citação decorridos cinco dias após a instauração da ação, salvo se a omissão for imputável ao autor.
24) Esta norma prevê o que se tem chamado de citação ficta e insere-se no âmbito da interrupção da prescrição promovida pelo titular do direito.
25) O n.º 2, do artigo 323.º, do Código Civil, faz operar os efeitos da citação ou notificação na interrupção da prescrição decorridos cinco dias após estas serem requeridas, impedindo que seja o credor a sofrer as consequências dos atrasos na sua realização que lhe não sejam imputáveis.
26) Com efeito, entende a lei que após o credor comprovar a sua intenção de exercer o direito, reclamando-o através da interposição de ação judicial, deixa de estar nas suas mãos o controlo referente à concreta efetivação da citação ou notificação subsequentes, pelo que, exceto se lhe forem imputáveis os atrasos na sua realização, não deve também ser onerado com a demora na sua concretização.
27) No caso concreto, estão a ser reclamadas atualizações das pensões alimentícias relativas aos anos de 2011 a 2022, bem como pensões de alimentos correspondentes aos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, junho, julho agosto, setembro e outubro de 2023.
28) Por mera hipótese académica e dever de patrocínio se admite que, o prazo prescricional de cinco anos se completa decorrido um ano após o atingimento da maioridade (27/10/2022), ora, tendo a execução sido instaurada em 17/10/2023, antes de decorrido tal prazo, e tendo a citação ocorrido em 13/11/2023, depois de decorrido aquele prazo, resulta claro que a presente execução onde teve lugar tal citação não se iniciava por este ato, face às normas em vigor mas pela penhora.
29) Nada permite que se impute à exequente/recorrente a demora na efetivação da citação: veja-se que instaurada a execução em 17/10/2023, em 25/10/2023 se realizou a penhora e só em 13/11/2023, ocorreu a citação.
30) Não se encontra nos autos qualquer ato da exequente que se possa considerar gerador da demora nesta citação.
31) A recorrente cumpriu o ónus que se lhe impunha no artigo 323º nº 1 do Código Civil, beneficiando da regra que afasta a sua responsabilidade pela demora na citação, notificação ou ato afim.
32) Como tão veementemente se afirmou no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/06/2012, no processo 7771/04.3YYLSB-A.L1-2: "É que, se a lei substantiva estabelece a regra de que para efeitos de interrupção da prescrição, se deve considerar como efetuada a citação decorridos cinco dias após a instauração da ação, salvo se a omissão for imputável ao autor, e se a lei processual prevê uma tramitação processual que inviabiliza a realização da citação naquele prazo, pois que admite - como sucede in casu - que a mesma só ocorra após a penhora, estamos perante uma circunstância não imputável ao autor, de acordo com o critério enunciado no artigo 323º, nº 2 do C.C."
33) Com efeito, no presente caso, a exequente intentou a execução muito tempo antes do terminus do prazo prescricional.
34) A mera instauração da execução implica um pedido de citação, visto que esta se insere de forma oficiosa no âmbito do seu iter processual: há que ter em conta que a simples instauração da execução implica necessariamente o pedido da citação, ainda que tácito, porquanto tal ato é, aliás, oficioso e passo exigido pelo próprio processo.
35) Nada na lei exige o pedido de citação prévia para que o executado venha a ser citado, no momento para tanto previsto na lei.
36) Veja-se ainda o douto acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional, acórdão n.º 286/2020, no âmbito do processo n.º 506/19, em que foi relatora: Conselheira Mariana Canotilho, no qual se lê o seguinte: “Não tendo havido citação, entendeu o tribunal a quo enquadrar a situação no disposto no n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil, que prevê uma solução fundada numa ficção jurídica – a interrupção do prazo prescricional como se a citação tivesse ocorrido (citação ficta), nos casos em que a sua inexistência não é imputável ao requerente/exequente. Ou seja, ficciona-se que a executada tomou conhecimento da existência do processo de execução cinco dias após a sua propositura. É, precisamente, esta interpretação – segundo a qual a inexistência de pedido expresso de citação, por parte do credor, não constitui uma “causa imputável ao requerente”, nos termos do n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil, uma vez que a simples propositura da ação executiva constitui expressão bastante da intenção de exercer o direito, valendo como requisição da citação para efeitos de interrupção do prazo prescricional (…)”
37) A douta sentença do tribunal de 1.ª instância fez, assim, uma errada interpretação e aplicação do direito, quanto à aplicação do artigo 323.º do Código Civil ora em apreço.
Ainda sem prescindir,
38) E, mesmo que, por hipótese teórica, se considere que a prescrição se completou um ano depois de ter sido atingida a maioridade – 27/10/2022.
39) No que respeita às prestações mensais dos anos de 2018, 2019, 2020, 2021 e 2022 e às prestações dos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, junho, julho agosto, setembro e outubro de 2023, as mesmas não se encontram prescritas, atendendo a que o recorrido foi citado em 13/11/2023.
40) Assim, atendendo ao prazo de prescrição de 5 anos (310.º, al. f), do CC) estabelecido para as pensões alimentícias vencidas nessa data – citação de 13/11/2023, os valores do período entre novembro de 2018 e outubro de 2023, não se encontram prescritos.
41) A douta sentença do tribunal de 1.ª instância fez, assim, uma errada interpretação e aplicação do direito, quanto à aplicação dos artigos 306.º, 310.º, 318.º, 320.º e 323.º, todos do Código Civil.
Contra-alegou o executado, embargante pugnando pela improcedência do recurso, concluindo, nos seguintes termos:
I - Não se conforma a apelante com a sentença proferida, alegando, sumariamente que:
a) Não ocorreu a prescrição da suposta dívida pela actualização de pensões alimentícias;
b) Não lhe podem ser imputáveis os atrasos na concreta efectivação da citação ou notificação e;
c) Que os valores do período entre novembro e outubro de 2023 não se encontram prescritos.
II - Relativamente ao ponto a):
“10. O executado e embargante foi citado em 13/11/2023.
11. O executado anteriormente não foi interpelado pela exequente para o pagamento das quantias referidas no requerimento executivo.”
III - Ao contrário do que vem expendido pela Recorrente, para que ocorra a interrupção da prescrição ou a suspensão da prescrição (promovida pelo titular do direito), o aqui recorrido devia ter sido constituído em mora, isto é, ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, o que não sucedeu e, tal facto não vem impugnado pela Recorrente no presente recurso.
IV - O momento da sua constituição em mora, ocorre passado mais de um ano após a maioridade dos menores.
V – O executado não foi citado para a execução dentro do prazo de um Ano, nem nos cinco dias seguintes, conforme decorre do preceituado no artigo 323.º Código Civil,
VI – Não foi promovida e ou requerida a interrupção do prazo de prescrição por quem se arroga titular do suposto direito, razão pela qual, a exequente não pode beneficiar da interrupção da prescrição, nem da suspensão da prescrição vertida no n.º 2 do artigo 320.º do Código Civil.
VII - De acordo com o plasmando na al. f) do artigo n.º 310.º do Código Civil - que encurta, a título excepcional, o prazo de prescrição -, prescrevem no prazo de cinco anos, as pensões alimentícias vencidas.
VIII - Relativamente ao ponto b): De facto, a culpa concreta na efectivação da citação ou notificação deveu-se, em exclusivo, à exequente/recorrente;
IX - Em 1.º lugar, sabia do prazo de prescrição em curso e, por esse facto, sabia que era sua obrigação, promover e requerer a citação nos cinco dias antes de decorrido o prazo de prescrição, devendo tê-lo requerido, conforme decorre do n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil:;
X - Em 2.º lugar com o respectivo requerimento executivo não foi junto o título dado à execução, isto é, a sentença só foi junta aos autos no dia 24-10-2023 (ref.ª citius 37054469), pela exequente, 7 dias após a entrada do requerimento executivo, o que logo atrasou o andamento do processo,
XI - Em 3.º lugar, a taxa de justiça inicial só foi paga no dia 20-10-2023 (ref.ª citius 37019553), isto é, três dias após a entrada do requerimento executivo, o que também atrasou o respectivo processo.
XII - Com os requerimentos da junção da Sentença e taxa da taxa de justiça devida pelo impulso processual, podia ter sido requerida a citação dentro dos cinco dias, o que não aconteceu.
XIII - Atento estes factos, houve falta culposa e, consequente omissão por parte da exequente, não podendo beneficiar da interrupção (ficta) da prescrição.
XIV - Relativamente ao ponto c): Pelo facto de ter decorrido mais de 01 (um) ano sobre a maioridade, não tem a exequente/recorrente legitimidade para a presente execução, e já decorreu o prazo prescricional 320.º do Código Civil.
O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida no spróprios autos e com efeito devolutivo, nos termos dos artigos 638.º/1, 644.º/1, 645.º, e 647.º CPCivil.
O recurso foi admitido como sendo de ordinário, de apelação, com subida nos próprios autos e com efeito devolutivo, nos termos dos artigos 627.º, 629.º/1, 631.º, 638.º, 639.º/1 e 2, 644.º/1 a), 645.º/1 a) e 647.º/1 CPCivil.
Recebido o processo nesta Relação foi proferido despacho onde se teve o recurso por próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir, uma vez que a tal nada obsta.

II. Fundamentação

II. 1. Tendo presente que o objecto dos recursos é balizado pelas conclusões da motivação apresentada pelo recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas - a não ser que sejam de conhecimento oficioso - e, que nos recursos se apreciam questões e não razões, bem como, não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, então, a questão a que a exequente/embargada reduz as suas razões de discordância para com a decisão recorrida, resumem-se em saber se,
- a decisão recorrida violou o disposto nos artigos 306.º, 310.º, 318.º, 320.º e 323.º todos do Código Civil.

II. 2. Vejamos, então, primeiramente os fundamentos da decisão recorrida.
II. 2. 1. De facto.




Factos provados.

1. CC e DD, nascidos a ../../2004, são filhos da requerente, AA, e do requerido, BB.
2. Por sentença datada de 4/12/2008, transitada em julgado, proferida nos autos principais de divórcio sob o n.º 590/08.0T8VCD, do 2º Juízo Cível, foi homologado o acordo quanto ao exercício das responsabilidades parentais da CC e DD, no qual ficou estabelecido que nos primeiros 12 meses a contar do trânsito em julgado o requerido contribuiria mensalmente a cada um dos seus filhos menores a quantia de 175,00; a partir do 13º mês e até ao 24º mês com a quantia de € 200,00 para cada filho e a partir do 25º mês a prestação seria actualizada anualmente em função dos índices dos preços do consumidor para o ano anterior e na mesma proporção mantendo-se tal prestação para além da maioridade desde que se verifiquem os pressupostos previstos no art. 1880º do Código Civil.
3. Ficou fixado na mesma sentença que tal quantia seria enviada à mãe dos menores até ao dia 8 de cada mês a que respeitar podendo o pai liquida-la através de cheque, vale de correio ou depósito bancário de que a mãe é titular na instituição bancária Banco 1... com o NIB ...2.
4. E ficou fixado que todas as despesas de carácter excepcional que se demonstrem necessárias realizar incluindo as despesas extraordinárias escolares e de saúde dos menores serão suportadas a meias pelos progenitores mediante a apresentação de recibo comprovativo, obrigações que se manterem para além da maioridade desde que os mesmos continuem a estudar. O pai obriga-se a pagar a despesa no prazo máximo de 8 dias após a apresentação do recibo por parte da mãe.
5. Por sentença proferida no dia 13/05/2022, transitada em julgado, no âmbito do processo n.º 1397/22.7STS, que corre termos pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Comércio do Porto – Juiz 7, foi declarado insolvente, conforme decorre do anúncio publicado na plataforma citius;
6. Por decisão datada de 14/12/2022, transitada em julgado, foi proferido Despacho Inicial de Exoneração Passivo Restante, bem como, foi proferida decisão de encerramento do processo por insuficiência da massa insolvente.
7. A presente execução foi instaurada no dia 17/10/2023, onde a exequente reclama quantias devidas a título de actualizações das pensões alimentícias reportadas aos anos de 2011 a 2022, no valor global de € 6.286,08 (seis mil, duzentos e oitenta e seis euros e oito cêntimos), referente a atualizações não pagas; as prestações de alimentos correspondentes aos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, junho, julho, agosto, setembro e outubro de 2023 no valor global de € 4.003,90 (quatro mil e três euros e noventa cêntimos), a que deverão acrescer juros de mora, à taxa legal em vigor, desde o vencimento de cada uma das pensões e atualizações até efectivo e integral pagamento, que até ao presente, ascendem ao montante de € 1.401,50 (mil, quatrocentos e um euros e cinquenta cêntimos, perfazendo o valor global de € 11.691,03 (onze mil, seiscentos e noventa e um euros e três cêntimos).
8. Por decisão datada de 14/12/2022, foi proferido Despacho Inicial de Exoneração Passivo Restante, bem como, foi proferida decisão de encerramento do processo por insuficiência da massa insolvente.
9. Por requerimento de 17/10/2023 junto aos autos de execução nº 590/08.0TBVCD.1 consta o seguinte: Por douta decisão proferida no âmbito dos autos do processo n.º 590/08.0TBVCD, transitada em julgado em 04/12/2008, foi homologado o acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais. 2.º Nos termos do acordo alcançado sobre a regulação do exercício do poder paternal foi convencionado o seguinte: a). O pai dos menores pagará, a titulo de alimentos, nos primeiros doze meses, contados do trânsito em julgado da douta sentença homologatória, a quantia mensal de € 175,00 (cento e setenta e cinco euros) para cada um dos filhos, num total de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros); b). A partir do 13.º mês até ao 24.º mês o pai dos menores pagará, a titulo de alimentos, a quantia mensal de € 200,00 (duzentos euros), para cada um dos filhos, num total de € 400,00 (quatrocentos euros). c).A partir do 25.º mês a prestação alimentar a pagar pelo pai aos menores, será anualmente atualizada, em função dos índices de preços ao consumidor publicado pelo I.N.E., do ano anterior e na mesma proporção, mantendo-se tal prestação para além da maioridade desde que se verifiquem os pressupostos do art. 1880.º do Código Civil. 3.º Ainda de acordo com o previsto na regulação do exercício do poder paternal, nomeadamente, na cláusula 4.ª: “Tal quantia será enviada à mãe dos menores até ao dia 08 do mês a que respeitar, (…)”. Sucede que,4.º O executado procedeu ao pagamento das prestações de alimentos referente a cada um dos seus filhos, mas fê-lo sem qualquer atualização. 5.º O executado está, assim, obrigado a liquidar as diferenças relativas à atualização de cada pensão, que não liquidou, desde janeiro de 2011 até outubro de 2023 inclusive. 6.º Assim, cumpre apurar as mencionadas diferenças referentes às pensões alimenticias: a). No ano de 2011 o valor da pensão era de € 207,40 (3,7%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 177,60; b). No ano de 2012 o valor da pensão era de € 213,20 (2,8%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 316,80; c). No ano de 2013 o valor da pensão era de € 219,10 (2,77%), pelo que é devida 6.º Assim, cumpre apurar as mencionadas diferenças referentes às pensões alimenticias:a). No ano de 2011 o valor da pensão era de € 207,40 (3,7%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 177,60; b). No ano de 2012 o valor da pensão era de € 213,20 (2,8%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 316,80; c). No ano de 2013 o valor da pensão era de € 219,10 (2,77%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 458,40; d). No ano de 2014 o valor da pensão era de € 219,70 (0,27%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 472,80; e). No ano de 2015 não houve atualização, pelo que o valor manteve-se em € 219,70, sendo assim devida a quantia de € 472,80; f). No ano de 2016 o valor da pensão era de € 220,77 (0,49%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 498,48; g). No ano de 2017 o valor da pensão era de € 222,12 (0,61%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 530,88; h). No ano de 2018 o valor da pensão era de € 225,16 (1,37%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 603,84; i). No ano de 2019 o valor da pensão era de € 227,39 (0,99%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 657,36; j). No ano de 2020 o valor da pensão era de € 228,16 (0,34%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 675,84; k). No ano de 2021 o valor da pensão era de € 228,16 (0,0%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 675,84; l). No ano de 2022 o valor da pensão era de € 231,06 (1,27%), pelo que é devida pela atualização a quantia de € 745,44. 7.º O que perfaz a quantia global em divida de € 6.286,08 (seis mil, duzentos e oitenta e seis euros e oito cêntimos), referente a atualizações não pagas.8.ºacresce ainda que, o executado não procedeu ao pagamento das prestações de alimentos correspondentes aos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, junho, julho, agosto, setembro e outubro de 2023.9.º Assim, cumpre apurar o valor das pensões vencidas e não pagas, com a devida atualização. 10.º No corrente ano de 2023 o valor de cada pensão é de € 233,55 (1,078%), encontrando-se em divida as seguintes pensões alimenticias, com a atualização: - € 467,10 – correspondente ao mês de janeiro; - € 467,10 – correspondente ao mês de fevereiro; - € 467,10 – correspondente ao mês de março; - € 467,10 – correspondente ao mês de abril; - € 267,10 (€ 467,10 - € 200,00) – correspondente ao mês de junho; - € 467,10 – correspondente ao mês de julho; - € 467,10 – correspondente ao mês de agosto; - € 467,10 – correspondente ao mês de setembro; - € 467,10 – correspondente ao mês de outubro. 11.º O que perfaz o montante global de € 4.003,90 (quatro mil e três euros e noventa cêntimos), relativo às pensões de alimentos dos ora maiores CC e DD, devidas desde janeiro de 2023.12.º Ao abrigo do disposto nos arts. 805.º, n.º 2, alínea a), 804.º, n.º 1 e 806.º, n.º 1 e 2, todos do Código Civil, são devidos juros de mora, à taxa legal em vigor, desde o vencimento de cada uma das pensões e atualizações até efectivo e integral pagamento, que até ao presente, ascendem ao montante de € 1.401,50 (mil, quatrocentos e um euros e cinquenta cêntimos.Pelo exposto, deverá o Executado ser condenado a pagar o valor das pensões de alimentos e, bem assim, o valor correspondente à atualização das pensões ocorridas anualmente, conforme acima melhor discriminado, no montante de € 10.289,98 (dez mil, duzentos e oitenta e nove euros e noventa e oito cêntimos), bem como os juros de mora à taxa legal em vigor, que se vencerem desde a data da obrigação do pagamento de cada uma delas até ao presente e que ascendem ao montante de € 1.401,50 (mil, quatrocentos e um euros e cinquenta cêntimos), o que totaliza a quantia global em divida de € 11.691,03 (onze mil, seiscentos e noventa e um euros e três cêntimos). Mais devendo o Executado ser condenado a liquidar os juros de mora vincendos calculados à taxa legal em vigor, até efectivo e integral pagamento da quantia exequenda. Ainda sem prescindir, nos termos do n.º 4 do artigo 829.º-A do Código Civil, deverá o executado pagar os juros compulsórios, a taxa de 5% ao ano, até efectivo e integral pagamento da quantia exequenda.
Dos embargos à execução
10. O executado e embargante foi citado em 13/11/2023.
11. O executado anteriormente não foi interpelado pela exequente para o pagamento das quantias referidas no requerimento executivo.

II. 2. 2. De direito.

“Face ao pedido formulado de extinção da execução e às posições assumidas pelas partes, a solução do litígio passa pela resolução das seguintes questões suscitadas:
Saber se se o executado é responsável pelo pagamento global de € 11.691,03 (onze mil seiscentos e noventa e um mil euros e três cêntimos), quantia essa reclamada no requerimento executivo.
Tendo em conta a posição assumida pelas partes enunciadas nos articulados, repartição das regras do ónus da prova e a prova documental junta aos autos constituem temas de prova apurar o seguinte:
1. Saber se se o executado é responsável pelo pagamento global de € 11.691,03 (onze mil seiscentos e noventa e um mil euros e três cêntimos).
2. Saber se ocorreu a prescrição da dívida;
3. Saber se ocorreram causas suspensivos e interruptivas de tal prescrição.
Vejamos.
Através da execução apensa, pretende a exequente obter o pagamento das quantias em dívida referentes à atualização de cada pensão, que não liquidou, desde janeiro de 2011 até outubro de 2023 inclusive. E pede, ainda, que o executado não pague as prestações de alimentos correspondentes aos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, junho, julho, agosto, setembro e outubro de 2023 e actualizações devidas. Requer ainda ao abrigo do disposto nos arts. 805.º, n.º 2, alínea a), 804.º, n.º 1 e 806.º, n.º 1 e 2, todos do Código Civil, são devidos juros de mora, à taxa legal em vigor, desde o vencimento de cada uma das pensões e atualizações até efectivo e integral pagamento, que até ao presente, ascendem ao montante de € 1.401,50 (mil, quatrocentos e um euros e cinquenta cêntimos. Pelo exposto, deverá o Executado ser condenado a pagar o valor das pensões de alimentos e, bem assim, o valor correspondente à atualização das pensões ocorridas anualmente, conforme acima melhor discriminado, no montante de € 10.289,98 (dez mil, duzentos e oitenta e nove euros e noventa e oito cêntimos), bem como os juros de mora à taxa legal em vigor, que se vencerem desde a data da obrigação do pagamento de cada uma delas até ao presente e que ascendem ao montante de € 1.401,50 (mil, quatrocentos e um euros e cinquenta cêntimos), o que totaliza a quantia global em divida de € 11.691,03 (onze mil, seiscentos e noventa e um euros e três cêntimos). Mais devendo o Executado ser condenado a liquidar os juros de mora vincendos calculados à taxa legal em vigor, até efectivo e integral pagamento da quantia exequenda. Ainda sem prescindir, nos termos do n.º 4 do artigo 829.º-A do Código Civil, deverá o executado pagar os juros compulsórios, a taxa de 5% ao ano, até efectivo e integral pagamento da quantia exequenda.
Constitui título executivo a sentença homologatória do acordo de regulação do poder paternal proferida naquele processo, quando os filhos da exequente e do executado eram menores e, mediante o qual, o executado ficou obrigado a pagar, por decisão proferida no âmbito dos autos do processo n.º 590/08.0TBVCD, transitada em julgado em 04/12/2008, nos primeiros doze meses, contados do trânsito em julgado da douta sentença homologatória, a quantia mensal de € 175,00 (cento e setenta e cinco euros) para cada um dos filhos, num total de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros); b). A partir do 13.º mês até ao 24.º mês o pai dos menores pagará, a titulo de alimentos, a quantia mensal de € 200,00 (duzentos euros), para cada um dos filhos, num total de € 400,00 (quatrocentos euros). c).A partir do 25.º mês a prestação alimentar a pagar pelo pai aos menores, será anualmente atualizada, em função dos índices de preços ao consumidor publicado pelo I.N.E., do ano anterior e na mesma proporção, mantendo-se tal prestação para além da maioridade desde que se verifiquem os pressupostos do art. 1880.º do Código Civil. Ainda de acordo com o previsto na regulação do exercício do poder paternal, nomeadamente, na cláusula 4.ª: “Tal quantia será enviada à mãe dos menores até ao dia 08 do mês a que respeitar, (…)”.
A exequente intentou a execução numa altura em que os filhos de ambos haviam já atingido a maioridade. O art. 130º do Código Civil estabelece que “aquele que perfizer dezoito anos de idade adquire plena capacidade de exercício de direitos, ficando habilitado a reger a sua pessoa e a dispor dos seus bens”. Neste sentido, sendo parte da prestação alimentar em dívida a favor dos filhos do Requerido, hoje maiores (maiores já à data da propositura do incidente de incumprimento), seriam eles filhas quem teria legitimidade para pedir em juízo tais alimentos, de acordo com a consabida norma do artº 30º CPC. A questão passou a ser, porém, olhada de modo diverso desde a publicação da obra do Prof. Remédio Marques, Algumas Notas Sobre Alimentos Devidos a Menores, 2000, designadamente a pgs. 311 e 312. Entende-se então, por acordo com a citada obra, que embora as prestações caibam jure proprio ao filho agora maior, o progenitor convivente que tenha custeado total ou parcialmente as despesas de sustento e manutenção que ao outro obrigavam, pode sub-rogar-se nos direitos de crédito do filho, por se tratar de um caso de sub-rogação legal do terceiro que cumpriu a obrigação, nos direitos do credor seu filho – artº 592º nº1 CC. Invoca-se também a identidade de razão com a norma do artº 989º CPC, ao estabelecer que “tendo havido decisão sobre alimentos a menores, a maioridade ou a emancipação não impedem que o processo se conclua”, quer por impulso processual do filho, credor de alimentos que atingiu a maioridade, quer do progenitor que o teve à sua guarda durante a menoridade e lhos prestou para além do que lhe cumpria. Neste sentido, “reconhece-se à requerente legitimidade para deduzir o incidente de incumprimento relativa às prestações vencidas durante a menoridade dos filhos, mesmo depois de estes terem atingido a maioridade, solução que, além do apoio legal referido, se considera mais adequada à realidade da vivência que envolve a problemática do incumprimento no tocante às prestações alimentares e, por isso, mais justa” – assim, Ac R.L. 5/12/02 Col.V/90, relatado pela Consª Fernanda Isabel Pereira. No mesmo sentido, veja-se o Ac. Relação do Porto de 15/1/2013, desta mesma secção da Relação do Porto, Col.I/168, relatado pela Desembª Maria João Areias, e os elementos doutrinários e jurisprudenciais que cita, em particular nas suas notas de rodapé nºs 1, 4 e 6, e cuja flagrante maioria propende para o sentido interpretativo que adoptamos. O caso dos autos é precisamente um efectivo caso de verdadeira sub-rogação legal da mãe que satisfez os créditos de seus filhos, sustentando sozinha o respectivo passadio de vida, ao longo dos anos, pelo que, nada obstando a que o direito se inscreva na esfera jurídica dela mãe, também nada obsta à respectiva legitimidade processual para a acção. A exequente é, assim, parte legítima para intentar a execução por alimentos vencidos quando os seus filhos eram ainda menores. Fá-lo, exercendo um direito de sub-rogação legal, nos termos do disposto no artigo 592.º, n.º 1 do Código Civil, uma vez que assumiu a mãe a totalidade dos encargos com o filho, neles incluídos a parte que o executado deveria ter pago e não pagou. «Se a exequente tinha a guarda dos seus filhos e o executado não cumpriu o dever de prover ao sustento dos filhos, temos de presumir, pois que nada em contrário resulta dos autos, que foi aquela quem custeou, na totalidade, as referidas despesas dos seus filhos enquanto menores. Assim sendo, a exequente “…tem um interesse directo em que a parte dessas despesas que deveria ser paga pelo outro progenitor seja efectivamente afecta a essas despesas, legitimando por isso a sub-rogação legal a que se reporta o art.º 529.º n.º 1 parte final do Código Civil” (cf. Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 03/07/2008, relatado pelo Desembargador Freitas Vieira no processo 0832459, publicado em www.dgsi.pt). Como se escreve no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/07/2003, relatado pelo Cons. Salvador da Costa no processo 03B4352 e publicado em www.dgsi.pt, em caso análogo, “A recorrida não instaurou a acção executiva contra o recorrente para realizar um direito de crédito dos filhos, mas um direito de crédito dela, por os ter tido a seu cargo, enquanto menores…”» - Acórdão desta Relação de 12/07/2011, proferido no processo n.º 2-D/1998.G1, disponível em www.dgsi.pt. A exequente dispõe assim de legitimidade para intentar a acção executiva em causa, no que concerne ás prestações alimentícias em execução que se venceram antes da maioridade do seu filho. Neste sentido veja-se os Acórdãos do STJ de 25/03/2010 (processo n.º 7957/1992.2.P1.S1), da Relação de Lisboa de 04/03/2010 (processo n.º 20002-D/1996.L1-8), da Relação do Porto de 15/01/2013 (Processo n.º 344-A/1996.P1), e 10/07/2013 (Processo n.º 1353/06.2TMLSB-D.P1), da Relação de Évora de 04/07/2000 (citado em Abílio Neto, CPC Anotado) e desta Relação já supra citado, bem como o de 22/05/2014 (Processo n.º 229/1999.G1), todos disponíveis em www.dgsi.pt. A igual conclusão chega Remédio Marques - “Algumas Notas sobre Alimentos (Devidos a Menores) «Versus» o Dever de Assistência dos Pais para com os Filhos (Em Especial Filhos Menores)”, Coimbra Editora, págs. 311 e segts. - que, a este propósito, refere expressamente que: “Admite-se que, embora as prestações caibam iure próprio ao filho (in casu maior) o progenitor convivente, que tenha custeado total ou parcialmente as despesa de sustento e a manutenção que ao outro obrigavam, possa sub-rogar-se nos direitos de crédito do filho”.
Posto isto e afirmada a legitimidade da credora para instaurar a execução dos quais os presentes embargos cumpre, agora, apreciar se a dívida reclamada pela exequente a título de alimentos, actualizações destes e juros de mora prescreveu.
Vejamos.
Na verdade, a prescrição tem subjacente a necessidade social de certeza e segurança do direito, o interesse em que as situações jurídicas não permaneçam incertas indefinidamente, e assenta na inércia do titular do direito que, ao não o exercer dentro de certo lapso de tempo, faz presumir que a ele renuncia. Recusa-se proteger a negligência do titular do direito que não o exerce durante muito tempo, o bastante para a lei entender que já não se justifica a tutela desse direito.
Conforme decorre do requerimento executivo, estará em causa nos presentes autos, uma alegada dívida de alimentos que remontará a 2011. De acordo com o plasmando na al. f) do artigo n.º 310.º do Código Civil - que encurta, a título excepcional, o prazo de prescrição - prescrevem no prazo de cinco anos, as pensões alimentícias vencidas.
Conforme ensinava, M. de Andrade, Teoria geral, 1966, pág. 452, “Não se trata, nestes casos, de prescrições presuntivas, sujeitas ao regime especial estabelecido nos artigos 312. ° e seguintes, mas de prescrições de curto prazo, destinadas essencialmente a evitar que o credor retarde demasiado a exigência de créditos periodicamente renováveis, tornando excessivamente pesada a prestação a cargo do devedor”.
Porém, ocorre como que uma excepção à excepção, ou seja, uma limitação à excepção, se sobrevier sentença transitada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo (artigo 311.º, n.º 1, do Código Civil), na medida em que o direito para cuja prescrição a lei estabelecer um prazo mais curto do que o ordinário, fica sujeito a este último. No entanto, se a sentença ou o outro título se referir a prestações ainda não devidas (como é o caso sub judice, acordo de regulação das responsabilidades parentais), a prescrição continua a ser, em relação a elas, a de curto prazo, como decorre do n.º 2 do artigo 311.º do Código Civil.
Focando-nos na situação em apreço, o direito de crédito que a exequente se arroga, vem assente na sentença homologatória do acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais dada à execução e, já transitada em julgado, sendo certo que, esse título (reportando à data) se refere a prestações futuras, ainda não devidas, pelo que a prescrição continua a ser, em relação a elas, a de curto prazo (artigo 311.°, n.º 2, do Código Civil), talqualmente, os juros associados a essa suposta dívida agora dada à execução. Tendo presente que os credores das prestações de alimentos eram os menores que estavam à guarda da progenitora aqui Exequente. O prazo de prescrição, no caso de dívida de alimentos, como aqui sucede, é de 5 anos. Sabe-se, igualmente, que a presente acção deu entrada em juízo no dia 17 -10-2023 e os menores já tinham completado 18 (dezoito) anos, em 27-10-2022. Atenta a factualidade acabada de descrever, pode ser exigido o pagamento de todas as prestações, ou apenas das que se venceram nos últimos 5 anos?
Vejamos.
De acordo com o que refere Remédio Marques (Coimbra editora, 2000, pag. 167 e segts), os alimentos são exigíveis em função da fonte dessa exigibilidade, isto é, os alimentos só serão exigíveis após o trânsito em julgado da respectiva sentença, mas no seu montante hão-de ser computadas as quantias apuradas desde a data de propositura da acção (art. 2006.º do Código Civil) ou, desde o momento em que se constituiu em mora. Assim, os alimentos são devidos desde a propositura da acção - ou estando já fixados pelo tribunal ou por acordo - desde o momento em que o devedor se constitui em mora.
O momento da constituição em mora (805.º Código Civil) ocorre depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.
No caso dos presentes autos, o aqui executado nunca foi interpelado para cumprir, tendo apenas sido citado em 13/11/2023, pelo que, o momento da sua constituição em mora, ocorre passado 01 (um) ano e 15 (quinze) dias, depois da maioridade dos menores.
Uma vez que, o executado nunca tinha sido interpelado pela exequente para o pagamento das quantias referidas no requerimento executivo, nunca se constituiu em mora, não obstante, desde já, se impugnarem tais quantias e os juros associados para os devidos efeitos legais.
Ainda que, o prazo de prescrição de 5 anos do direito a alimentos, constante da alínea f) do artigo 310.º do Código Civil, “não começa nem corre entre os cônjuges, de harmonia com o disposto no artigo 318.º, alínea a), do CC; nem entre os progenitores e o menor, credor de alimentos, nos termos da alínea b) do mesmo preceito”.
Sucede que, o executado não foi citado para a execução dentro do prazo de um ano, nem nos cinco dias seguintes, conforme decorre do preceituado no artigo 323.º Código Civil, não tendo, por esse facto, sido promovida a interrupção do prazo de prescrição pela titular do suposto direito. Razão pela qual, a exequente não pode beneficiar da interrupção da prescrição, nem da suspensão da prescrição vertida no n.º 2 do artigo 320.º do Código Civil. Pelo que, de acordo com o estipulado no n.º 2 do artigo 320.º do Código Civil decorreu mais de 01 (um) Ano, sobre a data em que os menores adquiriram plena capacidade, aplicando- se, assim, a prescrição plasmada na alínea f) do artigo 310.º do Código Civil. Ademais, na execução em apreço tendo por título executivo o acordo de Regulação do exercício das responsabilidades parentais homologado por sentença, sendo credores da obrigação de alimentos, os menores e não sua mãe, em conformidade com o estatuído no artigo 320.º, n.º 1 in fine do CC, a prescrição operou, exactamente, porque decorreu mais 01 (um) ano sobre o termo da incapacidade. Logo, se os menores completaram 18 anos no dia 27/10/2022, o prazo de prescrição ocorreu em 27/10/2023, isto é, 01 (um) Ano após a data de entrada em juízo desta execução, uma vez que, Conforme se disse, não tendo sido promovida, no termos do previsto no artigo 323.º do Código Civil, através de interpelação, citação ou notificação, por falta, exclusivamente, da exequente, não operou a interrupção da prescrição, não beneficiando da suspensão prescritiva do direito a que se arroga, não se tendo constituído em mora o exeutado.
Veja-se neste sentido Ac. da Relação do Porto de 24/3/2015, disponível in www.dgsi.pt.
Logo, a excepção invocada será procedente e prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas”.

II. 3. O enquadramento do recurso.

Através da execução pretende a exequente obter o pagamento, quer, das quantias em dívida referentes à actualização de cada pensão, que não liquidou, desde Janeiro de 2011 até Outubro de 2023 inclusive, quer, as prestações de alimentos correspondentes aos meses de Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Junho, Julho, Agosto, Setembro e Outubro de 2023.
E, a questão reside em saber se em relação a tais prestações se completou já o prazo de prescrição.
Como vimos, da decisão recorrida, para fundamentar a verificação da excepção da prescrição, considerou-se que,
- importava saber se,
- o executado é responsável pelo pagamento da quantia de € 11.691,03;
- ocorreu a prescrição da dívida;
- ocorreram causas suspensivas e interruptivas de tal prescrição;
- pode ser exigido o pagamento de todas as prestações, ou apenas das que se venceram nos últimos 5 anos;
- constitui título executivo a sentença homologatória do acordo de regulação do poder paternal, quando os filhos da exequente e do executado eram menores e, mediante o qual, o executado ficou obrigado a pagar determinados valores a título de pensão de alimentos, por decisão, transitada em julgado em 4.12.2008;
- conforme decorre do requerimento executivo, estará em causa uma alegada dívida de alimentos, sendo o prazo de prescrição de 5 anos;
- o direito de crédito que a exequente se arroga, vem assente na sentença homologatória do acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais dada à execução e, já transitada em julgado, sendo certo que, esse título (reportando à data) se refere a prestações futuras, ainda não devidas, pelo que a prescrição continua a ser, em relação a elas, a de curto prazo, artigo 311.°/2 CCivil, talqualmente, os juros associados a essa suposta dívida agora dada à execução. Tendo presente que os credores das prestações de alimentos eram os menores que estavam à guarda da progenitora aqui exequente. O prazo de prescrição, no caso de dívida de alimentos, como aqui sucede, é de 5 anos.
- a presente acção deu entrada em juízo no dia 17.10.2023 e os menores já tinham completado 18 anos, em 27.10.2022;
- os alimentos são devidos desde a propositura da acção - ou estando já fixados pelo tribunal ou por acordo - desde o momento em que o devedor se constitui em mora;
- o momento da constituição em mora, 805.º CCivil, ocorre depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir;
- no caso dos presentes autos, o aqui executado nunca foi interpelado para cumprir, tendo apenas sido citado em 13.11.2023, pelo que, o momento da sua constituição em mora, ocorre passado 1 ano e 15 dias, depois da maioridade dos menores;
- o executado não foi citado para a execução dentro do prazo de um ano, nem nos cinco dias seguintes, conforme decorre do preceituado no artigo 323.º CCivil, não tendo, por esse facto, sido promovida a interrupção do prazo de prescrição pela titular do suposto direito;
- razão pela qual, a exequente não pode beneficiar da interrupção da prescrição, nem da suspensão da prescrição vertida no n.º 2 do artigo 320.º CCivil, pelo que decorreu mais de 1 ano, sobre a data em que os menores adquiriram plena capacidade, aplicando- se, assim, a prescrição plasmada na alínea f) do artigo 310.º CCivil;
- se os menores completaram 18 anos no dia 27.10.2022, o prazo de prescrição ocorreu em 27/10/2023, não tendo sido promovida, no termos do previsto no artigo 323.º CCivil, através de interpelação, citação ou notificação, por falta, exclusivamente, da exequente, não operou a interrupção da prescrição, não beneficiando da suspensão prescritiva do direito a que se arroga, não se tendo constituído em mora o executado.
A isto contrapõe a apelante o seguinte:
- nos termos do artigo 318.º alínea b) CCivil, o prazo de prescrição, no caso de 5 anos, não começo nem correu, durante a menoridade dos filhos e, apenas se iniciou na data em que atingiram a maioridade, a 27.10.2022 e, por isso o prazo de prescrição não se completou até à sua interrupção com a citação do recorrido.
E, diz mais.
Se por mera hipótese académica e dever de patrocínio se admite que, o prazo prescricional de cinco anos se completa decorrido um ano após o atingimento da maioridade (27/10/2022), tendo a execução sido instaurada em 17/10/2023, antes de decorrido tal prazo, e tendo a citação ocorrido em 13/11/2023, depois de decorrido aquele prazo, resulta claro que a presente execução onde teve lugar tal citação não se iniciava por este acto, face às normas em vigor mas pela penhora.
O executado foi citado no dia 13 de novembro de 2023, depois de o requerimento executivo ter dado entrada em 17/10/2023 - 10 dias antes do termo do prazo de prescrição.
E, o facto de apenas ter ocorrido a 13.11, não ocorreu por motivo que lhe seja imputável, donde se terá que ter a prescrição interrompida logo que tenham decorrido 5 dias, após a instauração da acção, salvo se a omissão lhe fosse imputável.
E, continua.
Mesmo que, por hipótese teórica se considere que a prescrição se completou um ano depois de ter sido atingida a maioridade – 27/10/2022, tendo presente o prazo de prescrição de 5 anos, no que respeita às prestações mensais entre NOV2018 e OUT2023, as mesmas não se encontram prescritas, atendendo a que o recorrido foi citado em 13/11/2023.
Diz, por sua vez, o apelado,
- quanto à não verificação da prescrição:
- ao contrário do que defende a apelante, para que ocorra a interrupção da prescrição ou a suspensão da prescrição (promovida pelo titular do direito), primeiro a dívida teria que ser certa liquida e exigível, e teria que o aqui recorrido ter sido constituído em mora, isto é, ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, o que não sucedeu, cfr. ponto 11 dos factos provados - facto não impugnado;
– vindo provado que apenas foi citado a 13.11.2023, pelo que o momento da sua constituição em mora, ocorre passado mais de um ano após a maioridade dos menores – donde, pelo facto de não ter sido citado para a execução dentro do prazo de 1 ano, nem nos cinco dias seguintes, o suposto direito prescreveu;
- quanto ao facto de poder, ou não, ser imputável à exequente os atrasos na concreta efectivação da citação:
- ao contrário do que defende a exequente, a culpa concreta na efectivação da citação ficou-se a dever, em exclusivo, a ela própria, porquanto, em 1.º lugar, sabia do prazo de prescrição em curso e, por esse facto, sabia que era sua obrigação, promover e requerer a citação nos cinco dias antes de decorrido o prazo de prescrição, devendo tê-lo requerido;
- ao não ter requerido a citação, a culpa é exclusivamente sua, não podendo aproveitar a interrupção da prescrição;
- com o requerimento executivo não foi junto o título dado à execução, isto é, a sentença só foi junta aos autos no dia 24.10.2023 (ref.ª citius 37054469) 7 dias após a entrada do requerimento executivo, o que logo atrasou o andamento do processo;
- a taxa de justiça inicial só foi paga no dia 20-10-2023 (ref.ª citius 37019553), isto é, três dias após a entrada do requerimento executivo, o que também atrasou o respectivo processo;
- com os requerimentos da junção da sentença e taxa da taxa de justiça devida pelo impulso processual, podia ter sido requerida a citação dentro dos cinco dias, o que não aconteceu;
- quanto aos valores do período entre NOV2018 e OUT2023:
- pelo facto de ter decorrido mais de 1 ano sobre a maioridade, não tem a exequente legitimidade para a presente execução e já decorreu o prazo prescricional 320.º do Código Civil.

II. 4. Vejamos, desde já, o teor das normas legais invocadas, pela apelante, como tendo sido violadas.

Dispõe o artigo 306.º CCivil, que,
“1. O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido; se, porém, o beneficiário da prescrição só estiver obrigado a cumprir decorrido certo tempo sobre a interpelação, só findo esse tempo se inicia o prazo da prescrição.
2. A prescrição de direitos sujeitos a condição suspensiva ou termo inicial só começa depois de a condição se verificar ou o termo se vencer.
3. Se for estipulado que o devedor cumprirá quando puder, ou o prazo for deixado ao arbítrio do devedor, a prescrição só começa a correr depois da morte dele.
4. Se a dívida for ilíquida, a prescrição começa a correr desde que ao credor seja lícito promover a liquidação; promovida a liquidação, a prescrição do resultado líquido começa a correr desde que seja feito o seu apuramento por acordo ou sentença passada em julgado”.
O artigo 310.º que,
“prescrevem no prazo de cinco anos:
a) As anuidades de rendas perpétuas ou vitalícias;
b) As rendas e alugueres devidos pelo locatário, ainda que pagos por uma só vez;
c) Os foros;
d) Os juros convencionais ou legais, ainda que ilíquidos, e os dividendos das sociedades;
e) As quotas de amortização do capital pagáveis com os juros;
f) As pensões alimentícias vencidas;
g) Quaisquer outras prestações periodicamente renováveis”.
O artigo 318.º que,
“ a prescrição não começa nem corre:
a) Entre os cônjuges, ainda que separados judicialmente de pessoas e bens;
b) Entre quem exerça o poder paternal e as pessoas a ele sujeitas, entre o tutor e o tutelado ou entre o curador e o curatelado;
c) Entre as pessoas cujos bens estejam sujeitos, por lei ou por determinação judicial ou de terceiro, à administração de outrem e aquelas que exercem a administração, até serem aprovadas as contas finais;
d) Entre as pessoas colectivas e os respectivos administradores, relativamente à responsabilidade destes pelo exercício dos seus cargos, enquanto neles se mantiverem;
e) Entre quem presta o trabalho doméstico e o respectivo patrão, enquanto o contrato durar;
f) Enquanto o devedor for usufrutuário do crédito ou tiver direito de penhor sobre ele”.
O artigo 320.º que,
“1. A prescrição não começa nem corre contra menores enquanto não tiverem quem os represente ou administre seus bens, salvo se respeitar a actos para os quais o menor tenha capacidade; e, ainda que o menor tenha representante legal ou quem administre os seus bens, a prescrição contra ele não se completa sem ter decorrido um ano a partir do termo da incapacidade.
2. Tratando-se de prescrições presuntivas, a prescrição não se suspende, mas não se completa sem ter decorrido um ano sobre a data em que o menor passou a ter representante legal ou administrador dos seus bens ou adquiriu plena capacidade.
3. O disposto nos números anteriores é aplicável aos maiores acompanhados que não tenham capacidade para exercer o seu direito, com a diferença de que a incapacidade se considera finda, caso não tenha cessado antes, passados três anos sobre o termo do prazo que seria aplicável se a suspensão se não houvesse verificado”.
O artigo 323.º que,
“1. A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
2. Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
3. A anulação da citação ou notificação não impede o efeito interruptivo previsto nos números anteriores.
4. É equiparado à citação ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do acto àquele contra quem o direito pode ser exercido”.

II. 5. A prescrição assenta no simples decurso do tempo sem que o direito tenha sido exercido e constitui facto impeditivo desse exercício na medida em que o beneficiário da prescrição pode recusar o cumprimento, artigo 304.º/1 CCivil.
Nos termos do artigo 301.º CCivil, a prescrição aproveita a todos os que possam dela tirar proveito. Sendo estabelecida em favor do devedor ela pode assim ser invocada por este mas não apenas por este. Pode assim ser invocada por terceiros interessados na sua declaração
O fundamento do instituto da prescrição reside essencialmente na negligência do titular do direito em exercê-lo o que face à lei torna o credor menos merecedor da protecção jurídica. Mas tem igualmente relação com considerações de certeza e segurança jurídicas, e ao interesse em proteger os devedores contra a dificuldade da prova inerente ao decurso do tempo.
No caso das prestações renováveis o fundamento de um prazo de prescrição particularmente curto, maxime, de 5 anos, tem em consideração a necessidade de proteger o devedor contra o acumular da dívida que resultaria de um excessivo retardamento da exigência das prestações que se vão vencendo.
Estão nessa situação os créditos respeitantes a prestações alimentares vencidas – alínea f) do artigo 310.º CCivil.
O que prescreve nos termos deste normativo não é o direito a alimentos, o qual, sendo indisponível não prescreve, cfr. artigos 298.º/1) e 2008.º/1 CCivil, mas apenas o direito a exigir o pagamento de prestações alimentares já vencidas.
Em qualquer destes casos o prazo de prescrição começaria normalmente a contar-se, segundo a regra constante do artigo 306.º/1 CCivil, a partir do momento em que o direito possa ser exigido. Consagrou-se assim a este respeito um sistema objectivo, em que o prazo prescricional começa a correr independentemente do conhecimento que o titular do direito tenha da possibilidade de o exercer.
Este sistema e as injustiças que o mesmo necessariamente poderia implicar, são amenizados através de regras de suspensão da prescrição, tais como as que constam dos artigos 318.º a 322.º CCivil.
Nestes normativos o legislador previu um conjunto de situações em relação às quais, por considerar certa forma justificada a inércia do titular do direito, prevê a suspensão do prazo de prescrição fixado, obstando dessa forma ao início normal do prazo prescricional.
A suspensão da prescrição supõe uma causa, subjectiva ou objectiva, que constitua obstáculo de facto ao exercício do direito, ou que o torne especialmente difícil, com expressão tal que afasta a verificação de negligência do seu titular e, então, torna injusto o curso do prazo prescricional. Sendo esse o racional, escolheu o legislador não estabelecer uma regra geral, conferindo efeito suspensivo a todos os eventos ou motivos que impeçam de facto, ou dificultem significativamente, o exercício do direito pelo seu titular, optando pela consagração de certas causas suspensivas da prescrição.
Assim, foram previstas específicas causas de suspensão que resultam de uma especial relação existente entre as partes ou da especial situação do titular, de alcance bilateral, como seja a relação conjugal, alínea a) do artigo 318.º; a relação de poder paternal, tutela ou curatela, alínea b) da mesma norma; a relação de administração de bens ou de pessoa colectiva, alínea c); a relação de trabalho doméstico, alínea d) ou a relação de usufruto do crédito pelo devedor ou de penhor sobre ela, alínea e).
E, também, de natureza subjectiva, mas de outra ordem, obedecendo a razões fundamentalmente protectoras e de garantia quanto à ausência ou inércia de representante legal, consagrando-se a suspensão da prescrição relativamente a menores, interdito ou inabilitados - artigo 320.º - cfr. Prescrição extintiva e caducidade in BMJ, 106.º 175.
II. 6. Atentemos.

A questão aqui suscitada prende-se com o saber se, como se decidiu – com o aplauso do executado - se verifica o prazo de prescrição ou, como pretende a exequente, não se verifica, desde logo, em relação a todas as mensalidades aqui em causa.
Os filhos, beneficiários da pensão de alimentos, atingiram a maioridade a 27OUT2022.
A apelante intentou a presente acção executiva a 17OUT2023.
O executado foi citado a 13NOV2023.
Do mencionado regime legal resulta, no que aqui releva, que,
- o prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido;
- prescrevem no prazo de cinco anos … as pensões alimentícias vencidas;
- a prescrição não começa nem corre …entre quem exerça o poder paternal e as pessoas a ele sujeitas;
- a prescrição contra menor não se completa sem ter decorrido um ano a partir do termo da incapacidade;
- a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente;
- se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
Sem dúvida que, no caso, dada a natureza alimentar das quantias cujo pagamento aqui vem exigido, o prazo de prescrição é de 5 anos, por força da alínea f) do artigo 310.º.
Com particular interesse para a questão suscitada nos autos há que atentar nos segmentos seguintes das ditas normas.
- a alínea b) do artigo 318.º - a prescrição não começa nem corre entre quem exerça o poder paternal e as pessoas a ele sujeitas e,
- n.º 1 do artigo 320.º - ainda que o menor tenha representante legal ou quem administre os seus bens, a prescrição contra ele não se completa sem ter decorrido um ano a partir do termo da incapacidade.

II. 6. 1. Vejamos quanto à primeira norma.

Se é certo que o prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido, não menos certo é que a prescrição não começa nem corre …entre quem exerça o poder paternal e as pessoas a ele sujeitas.
Isto é, só começa a correr a partir da data em que os filhos, em relação a quem exerça o poder paternal, atingiram a maioridade.
Então começa a contagem … dos 5 anos de prazo da prescrição.
Aqui está prevista a causa bilateral de suspensão
Estamos perante uma causa subjectiva bilateral de suspensão dos prazos de prescrição, com fundamento nas relações interpessoais de confiança e proximidade entre credor e devedor.
Como refere a apelante, são múltiplas as razões que costumam ser apontadas como justificativas do travão à contagem do prazo de prescrição dos direitos dos filhos menores que têm como contraparte obrigada a pessoa a quem pertence o exercício das responsabilidades parentais:
- por um lado, procura-se evitar que, com receio do decurso do prazo prescricional, ocorra uma litigiosidade desnecessária e indesejada que desencadeie ou agrave ruturas familiares;
- na perspectiva inversa, pretende-se que os filhos não prescindam dos seus direitos, em nome da salvaguarda da harmonia familiar;
- mas, sobretudo, é a consciência de uma situação de conflito de interesses na pessoa do progenitor-devedor, que justifica que não se permita que uma inação deste o possa beneficiar em prejuízo do filho-credor.
A circunstância de que quem exerce o poder paternal se sentir tentado a sacrificar os interesses do menor em benefício dos seus, é suficiente para que o prazo de prescrição dos direitos deste último não possa correr durante a sua menoridade.
Uma vez que no exercício do poder paternal se inclua o pai, devedor, poderemos estar perante uma situação de concurso de causas de suspensão do prazo de prescrição, dado estarmos perante uma situação em que o termo do exercício do poder paternal, alínea b) do artigo 318.º, coincide com o atingir da maioridade dos filhos, artigo 320.º.
Mas, a propósito do exercício do poder paternal, importa referir o seguinte, uma vez que o apelado suscita a questão no recurso, apesar de a não ter suscitado no requerimento de embargos.
O que não é grave nem irremediável.
Incontornável é o facto de que não versando o recurso sobre a matéria de facto, a definida pela decisão recorrida se terá que ter como definitivamente fixada e por, isso, intangível e, aí não consta, que o apelado, enquanto pai, exerça o poder paternal sobre os filhos.
Como vimos, na situação aqui prevista estamos perante uma causa bilateral de suspensão através da qual se procura proteger as relações familiares entre quem exerce o poder paternal e as pessoas a ele sujeitos do clima de conflituosidade que resultaria se este tivesse que exercer o direito que lhe assista em relação àquele.
E, então, porque a norma se refere apenas a quem exerce o poder paternal, nunca teria aplicação ao caso concreto.
Isto pela simples razão de que não vem provado que o devedor, apesar de pai, exerça o poder paternal em relação aos filhos.
Não se aplica esta norma ao caso, uma vez que não vem provado que o pai exercesse o poder paternal em relação aos filhos, que estavam à guarda da mãe
Donde, improcede este segmento do recurso, atinente com a pretensão de ver afirmado, com base na alínea b) do artigo 318.º, que prevê tal situação em relação a quem exerça o poder paternal em relação às pessoas a ele sujeitas.

II. 6. 2. E, quanto à segunda.

O que está aqui em causa é aplicação ao caso concreto da moratória prevista na parte final do n.º 1 do artigo 320.º, como causa unilateral de suspensão, a favor de menores, que tem subjacente a necessidade de os proteger das consequências que para si resultariam de, por inércia ou negligência do seu representante legal, o direito que lhes assiste não ser atempadamente exercido.
Então, começa a contar 1 ano – a partir do termo da incapacidade, de ser atingida a maioridade – sem o decurso do qual a prescrição não se completa.
A questão aqui colocada reside em saber se – como pretende a apelante – a referida finalidade não está presente quando o direito às prestações alimentares vencidas durante a menoridade dos filhos, beneficiários, é exercido pelo progenitor a quem estava confiada a respectiva guarda, depois de atingida a sua maioridade.
Curiosamente, ou não, se é certo que na própria decisão recorrida se entendeu que a apelante agiu no plano da sub-rogação, prevista no artigo 592.º CCivil e que lhe assiste legitimidade activa para vir instaurar execução com vista a haver do apelado, obrigado, o valor das prestações de alimentos devidas, não o é menos, que a apelante acaba por não mostrar discordar daquele primeiro segmento, pelo menos, de forma processualmente relevante, seja no âmbito das conclusões do recurso.
A questão de saber se, na medida em que é a progenitora, que tem a guarda, quem em sub-rogação dos filhos, exerce o direito a alimentos de que estes eram titulares, não tem aplicação a moratória prevista na segunda parte do n.º 1 do artigo 320.º,
foi já, recentemente, abordada e decidida neste Tribunal e secção, através do acórdão de 11.2.2021, consultado, nesta data, no site da dgsi.
Onde se entendeu que, “a situação não está especificamente salvaguardada na norma em causa ou noutra qualquer que se lhe refira expressamente. Não sofre contestação a legitimidade do progenitor guardião para, em substituição processual do filho menor titular das prestações alimentares, e em sua representação, exigir o seu cumprimento, do outro progenitor, do obrigado ao seu pagamento.
Legitimidade que em relação à exigência dessas prestações se mantém mesmo se entretanto o seu beneficiário atingir a maioridade, conforme se vem entendendo e devendo considerar-se a aplicabilidade do disposto no artigo 989.º/2 CPCivil, na medida em que se refere ao prosseguimento de processo para fixação de alimentos devidos a menores. Nessa situação no entanto, considerando que o beneficiário das prestações adquiriu já capacidade jurídica e judiciária para demandar e exigir por si que jure próprio lhe são devidas pelo progenitor, a legitimidade do progenitor para continuar a intervir para exigir aquelas prestações só pode entender-se enquanto justificada em termos de sub-rogação deste, cfr. artigo 592.º/1 CCivil, no direito que assiste ao titular dessas prestações, por ter tido que suprir as necessidades do mesmo durante a sua menoridade em substituição do devedor faltoso de tais prestações. É evidente que neste caso o progenitor intervém movido pelo interesse em ver-se compensado pelo que pagou a mais, tendo por isso um interesse próprio no cumprimento da dívida, como de resto é exigido par que possa falar-se em sub-rogação legal, cfr. A. Varela – Das Obrigações em Geral, II, 2ª edição, 303/304.
Consequentemente tem de concluir-se existir uma identidade entre o direito do menor ao pagamento das prestações devidas em atenção à sua menoridade, e o direito exercido em sub-rogação pelo progenitor guardião no confronto com o progenitor devedor. Identidade de direitos que se estende às garantias e outros acessórios do direito transmitido - cfr. artigo 582.º CCivil, ex vi artigo 594.º CCivil.
Apesar de o direito que a apelante aqui exerce ser o mesmo direito de que beneficiam os filhos - e, já, não, um crédito novo - não se pode conceber que o prazo de prescrição seja o aplicável ao primitivo credor, pois que, não é essa a ratio da suspensão da prescrição a favor da menor prevista na referida 2.ª parte do n.º 1 do artigo 320.º.
De facto,
- se, como vimos já, a razão de ser da suspensão do prazo prescricional prevista na 2.ª parte do n.º 1 do artigo 320.º, se prende com a menoridade do titular de alimentos e, por essa via, do especial tratamento que em função disso o legislador entendeu dever prever em termos do exercício desse direito no que concerne ao prazo prescricional,
- esta razão de ser não se verifica em relação ao progenitor com quem o menor vive, já que em relação àquele nenhuns constrangimentos se verificam que o impedisse de exercer em tempo útil o direito a exigir o cumprimento das prestações alimentares vencidas, seja durante a menoridade dos filhos, titulares do direito a alimentos, seja depois de estes terem atingido a maioridade.
E, como se disse já, a prescrição não diz respeito ao direito em si, mas ao seu exercício. O que prescreve ou não prescreve não é o direito – que apesar de prescrito não se extingue – mas o direito a exigir o seu cumprimento.
Ora se o direito ao pagamento das prestações alimentares vencidas durante a menoridade do filho em que o progenitor guardião se encontra sub-rogado é o mesmo de que era titular o filho menor, ao exigir o cumprimento desse direito o progenitor guardião actua em nome próprio, pelo que se compreende que esteja sujeito às regras gerais que condicionam no tempo esse exercício”.
Acompanhando este entendimento, estando em causa prestações de alimentos vencidas durante a menoridade e durante a, entretanto atingida maioridade dos respectivos titulares, há que concluir, que não pode ter-se como aplicável a previsão contida na parte final do n.º 1 do referido artigo 320.º.
E, assim, improcede, também, este segmento do recurso atinente com a pretensão de ver afirmado, com base na 2.ª parte do n.º 2 do artigo 320.º, que o prazo de prescrição não se completa sem ter decorrido um ano a partir do termo da incapacidade, quando afinal aqui a demandar está a progenitora que tinha a guarda dos titulares do direito a alimentos, não abrangida pelo interesse jurídico subjacente a tal previsão legal.

II. 6. 3. Em resumo.

Considerando que o prazo prescricional se inicia a partir do momento em que o direito possa ser exercido e que se interrompe com a citação, tem de concluir-se que quando em 13.11.2023, o apelado foi citado na presente execução, havia já decorrido o prazo prescricional de cinco anos previsto na alínea f) do artigo 310.º, em relação às prestações referentes ao período compreendido entre os anos de 2011 e 13.11.2018.
Assim, procede, este derradeiro segmento do recurso.
Com o que fica prejudicado, naturalmente, o conhecimento da questão reportada à imputabililidade, ou não, do atraso da citação, à pessoa da exequente, apelante, que em nada releva, para o que vem de ser decidido.
Com efeito, esta questão apenas teria interesse prático se se entendesse ser de aplicar a dita moratória prevista na parte final do n.º 1 do artigo 320.º.


III. Sumário – artigo 663.º/7 CPCivil.
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IV. Decisão.

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em conceder, ainda que parcial, provimento à apelação, em função do que,
- se revoga a decisão e,
- se declara a prescrição do direito da apelante em relação, tão só, às prestações vencidas no período compreendido entre o ano de 2011 e 13.11.2018.

Custas por apelante e apelado, na proporção do decaimento, atentas as regras contidas no artigo 527.º CPCivil.


Elaborado em computador. Revisto pelo Relator, o 1.º signatário.




Porto, 23/5/2024.
Ernesto Nascimento
Isoleta de Almeida Costa
Paulo Duarte Teixeira