MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
REMUNERAÇÃO
CLÁUSULA DE EXCLUSIVIDADE
Sumário

I – Na conjugação da previsão do n.º 1 com a do n.º 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro, resulta que no contrato de mediação imobiliária celebrado com o proprietário cláusula de exclusividade, a remuneração depende apenas do cumprimento da obrigação pela mediadora – de encontrar interessado efectivo na concretização do negócio nas condições acertadas no contrato de mediação e que o negócio visado só não se concretizou por causa imputável ao cliente vendedor.
II – No caso de apenas se provar a violação da exclusividade, poderá haver lugar, não ao pagamento da remuneração, mas a uma indemnização dos danos provocados por essa violação, que serão os gastos/despesas feitas pela mediadora por força da sua actividade de promoção.
(Sumário da Relatora)

Texto Integral

Proc. n.º 542/23.0T8ABT.E1

SUMÁRIO (da responsabilidade da relatora)
(…)

*
Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

I – RELATÓRIO
1.1. (…) – Investimentos Imobiliários, Lda. veio instaurar acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos contra (…) e (…) pedindo a condenação dos réus no pagamento da quantia de € 14.750,00, correspondente à comissão imobiliária acordada no contrato que celebraram, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento.
Alegou, para o efeito e em síntese, que tendo celebrado com os réus um contrato de mediação imobiliária em que foi consagrada uma cláusula de exclusividade, os Réus entregaram o imóvel a outra imobiliária para a venda, a qual consumou a venda a terceiras pessoas.
Concluiu afirmando que no caso de contrato de mediação em regime se exclusividade a remuneração é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado e ainda se o negócio visado não se concretizar por causa imputável ao cliente.
1.2. Os Réus contestaram, arguindo as excepções de incompetência territorial, erro sob a forma do processo, cumulação ilegal de pedidos, nulidade do contrato de mediação imobiliária, rescisão unilateral do contrato pelos Réus e por impugnação, alegando para o efeito, em suma, que o contrato encontrava-se rescindido quando solicitaram a outra imobiliária que vendesse o imóvel, acrescentando que a Autora não conseguiu comprador interessado na comprar o imóvel pelo preço e condições estabelecidos.
1.3. Foi realizada a audiência de julgamento, finda a qual foi proferida sentença, que julgou improcedente a acção [julgou também improcedentes a excepção de incompetência territorial, erro sob a forma do processo, cumulação ilegal de pedidos, nulidade do contrato de mediação imobiliária e rescisão unilateral do contrato] com o seguinte teor decisório: «Face ao exposto, decide-se julgar a acção totalmente improcedente por não provada e, em consequência, decide-se:
A) Absolver os Réus de todos os pedidos deduzidos pela Autora;
B) Absolver a Autora como litigante de má fé».
1.4. Inconformada com a sentença proferida, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse provido e se revogasse a sentença recorrida, condenando-se os RR. no pedido.
Concluiu as suas alegações da seguinte forma (que aqui se reproduzem):
a) A Recorrente e os Recorridos celebraram um contrato de mediação imobiliária, em regime de exclusividade, com início a 09.05.2022, por um período inicial de seis meses, como resulta dos artigos 2º, 4º e 27º dos factos provados e contrato de mediação imobiliária junto aos autos.
b) O Tribunal a quo decidiu, na apreciação de excepção deduzida pelo Recorridos em que arguiram a cessação do contrato de mediação imobiliária por rescisão unilateral dos Recorridos que “... o contrato e mediação imobiliária continuou em vigor e, em consequência julga-se por não verificada a excepção peremptória de cessação de cessão do contrato de mediação imobiliária por rescisão unilateral dos Réus”.
c) Assim, o contrato de mediação imobiliária, em regime de exclusividade, celebrado entre a Recorrente e os Recorridos manteve-se em vigor até 09.11.2022, i.e., durante seis meses após o seu início.
d) Os Recorridos procederam à venda do imóvel em 29.09.2022 tendo, nessa altura declarado que no contrato de compra e venda houve a intervenção das mediadoras “(…), Lda. e (…) – Mediação e Construção”, como resulta do artigo 32º do factos provados e do contrato de compra e venda junto aos autos (doc. 1, req. Ref.ª 977176)
e) O contrato de mediação imobiliária, em regime de exclusividade, celebrado entre a Recorrente e os Recorridos encontrava-se em vigor, quando os Recorridos concluíram o negócio com intervenção de outra imobiliária, conforme resulta dos artigos 28º e 32º dos factos provados.
f) O direito à remuneração convencionada no contrato de mediação decorre de os Recorridos terem celebrado o negócio visado por intermédio de uma outra imobiliária na vigência da mediação e, pois, em violação manifesta da cláusula de exclusividade, impossibilitando de todo a realização do negócio visado com intermediação da Recorrente.
g) Pela cláusula de exclusividade, as partes determinam que o mediador terá direito à remuneração se o contrato pretendido for celebrado durante o período de exclusividade acordado, sendo que no caso da exclusividade simples, tal acontecerá sempre que esse contrato tenha sido celebrado em consequência da atividade de outro mediador.
h) “Para além desta situação, uma outra faz incorrer o cliente da mediadora na obrigação do pagamento da remuneração acordada – aquela em que o cliente infringe a cláusula de exclusividade e celebra o contrato visado com interessado que chegou até si por intermédio de outra mediadora (ou no caso de exclusividade absoluta, com interessado por si diretamente contactado)” Acórdão da Relação de Lisboa de 30.11.2018, proc. n.º 21405/16.0T8LSB.L1-7, publicado em www.dgsi.pt/jtrl,
i) “Neste caso, a mediadora exclusiva tem direito à remuneração, mesmo não demonstrando nexo de causalidade entre a sua atividade e o negócio celebrado. Tal não decorre do artigo 19.º, n.º 2, citado, mas das regras gerais. Tratando-se de um contrato bilateral, a violação da exclusividade acordada torna a prestação da mediadora impossível por causa imputável ao cliente, não o desonerando da contraprestação, nos termos do disposto no artigo 795.º, n.º 2, do Código Civil”: Acórdão da Relação de Lisboa de 30.11.2018.
j) No caso vertente está em causa o incumprimento da cláusula de exclusividade, e por isso, a Recorrente tem direito à remuneração convencionada, pois, o facto dos Recorridos terem, na pendência do contrato de mediação com exclusividade, recorrido a outro mediador imobiliário, impossibilitou de todo em todo a prestação da Recorrente.
k) Mais, como resultou provado nos artigos 5º, 6º e 11º dos factos provados, a Recorrente na vigência do contrato, promoveu a venda do imóvel dos Recorridos por diversos meios e promoveu e acompanhou a realização de três visitas físicas ao imóvel com potenciais compradores: a primeira no dia 01.06.2022; a segunda no dia 03.06.2022; e a terceira no dia 04.06.2022.
l) Os Recorridos devem pagar à Recorrente a remuneração acordada por aplicação das regras gerais sobre o incumprimento das obrigações, uma vez que nos contratos bilaterais, se a prestação se tornar impossível por causa imputável ao credor, não fica este desobrigado da contraprestação nos termos do artigo 795.º, n.º 2, do Código Civil.
m) A Impossibilidade da prestação da Recorrente resultou da circunstância dos Recorridos terem, na pendência do contrato de mediação em regime de exclusividade que celebraram com a Recorrente, recorrido a outra mediadora imobiliária para a conclusão do negócio.
n) O Tribunal a quo fez uma incorrecta interpretação do direito aplicável aos factos dados como provados ao não considerar que a Recorrente teria direito à remuneração uma vez que o contrato pretendido for celebrado durante o período de exclusividade acordado em consequência da atividade de outro mediador e ao não aplicar o n.º 2 do artigo 795.º, n.º 2, do Código Civil».
1.5. Os Réus não apresentaram contra-alegações.
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Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II – OBJECTO DO RECURSO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do NCPC), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser as de conhecimento oficioso (artigo 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do artigo 663.º, n.º 2, in fine, ambos do NCPC).
Tendo, então, em atenção as conclusões da Recorrente a única questão submetida à apreciação deste Tribunal é a de saber se a Autora recorrente tem direito à remuneração acordada no contrato de mediação imobiliária celebrado com cláusula de exclusividade.
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
O Tribunal de 1.ª Instância, com interesse para a decisão da causa, deu como provados os seguintes factos:
1. A Autora é uma sociedade comercial que se dedica, entre outras atividades, à prestação de serviços de mediação imobiliária.
2. No exercício da sua atividade, a Autora celebrou com os Réus um contrato a 9 de maio de 2022, mediante o qual se comprometia a prestar os necessários serviços de mediação na venda do prédio urbano sito em (…), Rua (…) ou Rua do (…), n.º 6, descrito na Conservatória do Registo Predial de Queluz com o n.º (…), da freguesia de (…), e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo (…), da mesma freguesia.
3. No referido contrato ficou estabelecida uma retribuição da mediadora correspondente a 5% (+ IVA) do preço de venda do imóvel, cujo pagamento seria feito, na sua totalidade, com a assinatura do contrato-promessa de compra e venda.
4. As partes consagraram no contrato uma cláusula de exclusividade.
5. Desde a data de celebração do contrato de mediação imobiliária, a 9 de Maio de 2022, a Autora procedeu à divulgação do imóvel por diversos meios: na montra da sua loja em Odivelas, nas plataformas informáticas da ERA e no portal Idealista, em newsletter enviada por e-mail para lista de clientes qualificados.
6. A Autora efectuou marketing especial em gráfica externa, tendo inclusivamente contratado os serviços de fotógrafo profissional para elaboração de reportagem fotográfica.
7. A 25.05.2022, os Réus solicitaram à Autora algumas alterações nos anúncios divulgados, mediante mensagem escrita.
8. A Autora procurou reajustar a divulgação do imóvel em função das solicitações feitas pelos Réus, tendo inclusivamente disponibilizado, nesse momento, duas directoras comerciais da sua estrutura para conhecer o imóvel, num esforço de divulgação interna mais assertiva, encetando todos os esforços possíveis para angariar potencial comprador para o imóvel, dentro do que é admissível na actividade de mediação imobiliária.
9. O imóvel estava a ser anunciado pelo preço de € 388.000,00, tendo os Réus indicado que estariam disponíveis para negociar uma eventual redução desse valor até aos € 350.000,00.
10. A Autora manifestou junto dos Réus o seu entendimento em como a redução do preço de venda para montante inferior a € 350.000,00 seria a estratégia mais adequada a potenciar a atração de maior número de visitas ao imóvel, atendendo à própria conjuntura de mercado que se verificava na localização em causa.
11. No início do mês de Junho de 2022, a Autora promoveu e acompanhou a realização de três visitas físicas ao imóvel com potenciais compradores: a primeira no dia 01.06.2022; a segunda no dia 03.06.2022; e a terceira no dia 04.06.2022.
12. Volvidos poucos dias desde essas visitas, em 14.06.2022, os Réus remeteram comunicação escrita à Autora com o seguinte teor: “(…) facto de não querermos vender o imóvel, dado que o mercado está abaixo das nossas necessidades e uma possível venda seria por valores abaixo das necessidades. Assim, optámos por não vender o imóvel”.
13. Nesse seguimento, os representantes da Autora estabeleceram contacto telefónico imediato com os Réus, tendo estes últimos confirmado que fizeram contas e perceberam que o valor de mercado do imóvel não seria suficiente para atender às suas necessidades familiares.
14. Alguns dias depois, a Autora recebeu uma nova comunicação escrita dos Réus, datada de 20.06.2022, apresentando fundamentação totalmente divergente daquela transmitida na comunicação anterior com recurso a uma alegação de insatisfação com os serviços da Autora.
15. A haver alguma insatisfação da parte dos Réus, a mesma sempre se prendeu com fatores de mercado absolutamente alheios à Autora e não com a sua atividade de mediação.
16. Face à redução de preço sugerida pela Autora, os Réus não aguardaram pelo decurso de prazo razoável para captação de novos interessados no imóvel.
17. A 27.06.2022, a Autora respondeu à missiva dos Réus, refutando expressamente o teor dessa carta e transmitindo que não estavam reunidas as condições para a aceitação do pedido de resolução contratual com base na fundamentação apresentada e a Autora considerou que o contrato de mediação imobiliária permaneceria em vigor.
18. A Autora informou ainda os Réus de que, caso fosse sua intenção fazer cessar o contrato na data do seu termo, deveriam seguir o procedimento referido na cláusula XI do aludido contrato.
19. No início de Julho de 2022, a Autora teve conhecimento que os Réus colocaram o seu imóvel à venda noutra agência imobiliária, do grupo (...).
20. A colaboradora da Autora que acompanhava o processo de venda do imóvel dos Réus enviou mensagem escrita aos mesmos, em 09.07.2022, dando conta da insatisfação pelo sucedido e tentando obter resposta dos mesmos quanto à incongruência da sua argumentação, pois comunicaram que não tinham interesse em vender por valores abaixo de € 350.000,00, quando, algumas semanas depois, já anunciavam a venda por montante inferior a esse, sem que fosse obtida qualquer resposta dos mesmos.
21. Uma vez que os Réus não responderam a qualquer tentativa de contacto desde esse momento, a Autora, apesar de manter os seus esforços de divulgação da propriedade em questão, não conseguiu realizar qualquer visita adicional ao imóvel nem obter qualquer proposta com vista à aquisição do mesmo.
22. Nos finais de Outubro de 2022, a Autora tomou conhecimento da celebração de título definitivo de compra e venda do imóvel, assinado perante a solicitadora (…), a 29 de Setembro de 2022.
23. Após tomar conhecimento do sucedido, a Autora remeteu uma comunicação escrita, através do seu Mandatário, em 15 de Novembro de 2022, a proceder à interpelação dos Réus para pagamento do valor correspondente à comissão acordada, no prazo indicado.
24. Findo esse prazo, os Réus não procederam ao respectivo pagamento do valor acordado.
25. A 19 de Dezembro de 2022, o Mandatário da Autora viria ainda a efectuar uma última tentativa de contacto com os Réus, através de e-mail, não tendo obtido qualquer resposta à mesma.
26. Volvidos vários meses desde a prestação de serviços e a conclusão do negócio cuja promoção estava exclusivamente confiada à Autora, os Réus não pagaram o valor exigido pela Autora.
27. O contrato celebrado entre as partes a 09.05.2022 vigorou por um período inicial de seis meses e consagrava uma cláusula de exclusividade.
28. O contrato encontrava-se em vigor no momento da conclusão do negócio.
29. A Autora manteve os seus esforços de divulgação do imóvel até ao momento em que tomou conhecimento da conclusão do negócio que se projectava.
30. Essa foi a posição transmitida pela Autora aos Réus na resposta à sua comunicação escrita de 20.06.2022, que os mesmos receberam a 30.06.2022.
31. Os Réus venderam o imóvel por € 295.000,00.
32. No contrato de compra e venda, os Réus declararam haver intervenção das mediadoras “(…), Lda.” e “(…) – Mediação e Construção, Lda.” no negócio.
33. Os Réus comunicaram por escrito à Autora a intenção de pôr termo ao contrato de mediação imobiliária.
34. Os Réus enviaram mail à Autora no dia 14/06/2022, às 15:55 horas, dirigido paras os endereços eletrónicos gerencia2.(…)@(…).pt, o qual foi recepcionado no mesmo dia e com o assunto “Cancelamento da Mediação”, com o seguinte teor:
“Boa tarde,
Serve o presente email para rescindir unilateralmente o acordo de mediação do imóvel ref. (…), sito na Rua do (…), n.º 6, em (…).
O motivo pela tomada de posição, prende-se com o facto de não querermos vender o imóvel, dado que o mercado está abaixo das nossas necessidades e uma possível venda seria por valores abaixo das necessidades.
Assim, optámos por não vender o imóvel.
Aguardo confirmação da rescisão pela vossa parte.
Podem retirar os anúncios online e assim que possível, passar no local e retirar a placa.
Sem mais assunto, (…)”.
35. A referida comunicação electrónica não obteve resposta por parte da Autora.
36. No mesmo dia 14/06/2022, pelas 15:56 horas, os Réus enviaram mensagens escritas à angariadora do imóvel previsto no contrato, através da aplicação WhatsApp, com o seguinte teor:
“Boa tarde (…),
Enviei email para a Agência a suspender a venda do imóvel.
Solicitei cancelamento do acordo de mediação, pois os valores de mercado possíveis não satisfazem as nossas necessidades.
Não podemos vender a casa abaixo do valor que precisamos, logo decidimos suspender a venda e pensar noutras soluções.
Obrigado pelo vosso trabalho.
Quando quiser, pode retirar a placa.”
37. Os Réus não receberam nenhuma resposta por parte da Autora ou da sua representante angariadora.
38. No mesmo dia 14/06/2022, a Autora retirou o anúncio de venda da casa dos Réus do website (…).
39. A Autora não respondeu às duas comunicações escritas enviada pelos Réus no dia 14/06/2022.
40. A Autora retirou, do website (...), a publicidade feita online à venda da casa dos Réus.
41. Após terem sido contactados telefonicamente por um dos representantes da Autora, os Réus mantiveram a sua posição quanto à revogação do contrato.
42. Os Réus enviaram uma nova comunicação de revogação à Autora, datada de 20/06/2022 esta segunda comunicação foi entregue à Autora no dia 21/06/2022.
43. Na comunicação datada de 20/06/2022, os Réus invocaram os fundamentos já apresentados na primeira comunicação de revogação enviada a 14/06/2022, com o seguinte teor:
“Informamos mais uma vez que a rescisão contratual, é a única forma justa para com os nossos direitos e, suportada pelos factos apresentados, à data de 14/06/2022”.
44. No dia 28/06/2022, os Réus deslocaram-se à agência da Autora, tendo devolvido a placa de venda desta agência que estava afixada no imóvel dos Réus.
45. A Autora obrigou-se “a diligenciar no sentido de conseguir encontrar interessado na Compra, Trespasse, Arrendamento, Permuta, Cessão de Posição ou Outro tipo de objeto de venda que esteja assinalado na secção Identificação do Negócio (…), desenvolvendo para o efeito, ações de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e características dos respetivos imóveis” (cfr. Cláusula V, n.º 1 da Cláusulas Contratuais Gerais).
46. A Autora elaborou um “catálogo” sem data e sem título, no qual a casa dos Réus aparece na segunda página; um e-mail enviado, no dia 13/06/2022, do endereço eletrónico Odivelas(…)@(...).pt para o endereço eletrónico (…)@(…).pt, com um anúncio descritivo da venda do imóvel dos Réus e; por fim, um relatório semanal dirigido à Réu (…), que aparenta ter data de 18/12/2022 – o que não se consegue confirmar por o documento ser de difícil leitura – no qual é referido que, àquela data, o imóvel teve uma visita virtual, duas visitas físicas, cinco recomendações por email, duas campanhas de newsletters e um flyers e folheto (…).
47. A Autora contratou os serviços de fotógrafo profissional para a elaboração da reportagem fotográfica, no valor total de € 122,65 e a sessão de fotografia feita à casa dos Réus custou € 50,00.
48. As agências imobiliárias publicitam os imóveis angariados através de imagens dos mesmos, ficando ao critério das próprias agências a contratação ou não de um serviço externo de fotografias.
49. Os Réus consideraram que a mensagem do anúncio estava aquém do expectável e os próprios Réus, no dia 25/05/2022, solicitaram a alteração da mesma, com vista a atrair mais interessados.
50. Por decisão unilateral da Autora, esta alterou o anúncio da venda da casa dos Réus no que respeita ao preço, passando este a estar “sob consulta”.
51. O preço de venda acordado entre as Partes era de € 388.000,00 a € 350.000,00, sem que precisassem de autorização dos Réus para vender por este valor mínimo.
52. Por mensagem enviada a 09/07/2022, a representante da Autora admite ter recusado uma proposta de venda do imóvel por € 320.000,00 sem ter previamente consultado os Réus, sem também indicar a data da proposta.
53. A Autora só disponibilizou as suas representantes para conhecer o imóvel após ter sido contactada telefonicamente pelos Réus, no dia 08/06/2022, a demonstrar insatisfação com o serviço prestado até então.
54. A Autora só realizou uma única visita ao imóvel no dia 01/06/2022 e quase um mês após a celebração do contrato de mediação imobiliária que teve lugar no dia 09/05/2022 e, por esse motivo, os Réus estavam insatisfeitos com o serviço prestado pela Autora.
55. Os Réus não receberam qualquer proposta por parte de potenciais compradores.
56. Os Réus comunicaram à Autora, por escrito e através de e-mail, no dia 14/06/2022, que “pretendiam rescindir o contrato de mediação imobiliária, indicando que o motivo pela tomada de posição, prende-se com o facto de não quererem vender o imóvel, dado que o mercado está abaixo das necessidades e uma possível venda seria por valores abaixo das necessidades. Assim, optámos por não vender o imóvel.”
57. Este e-mail dos Réus não mereceu qualquer resposta por parte da Autora.
58. No dia 14/06/2022, os Réus comunicaram à representante da Autora, via WhatsApp, a mesma decisão de revogar o contrato de mediação imobiliária.
59. Os Réus não obtiveram resposta por parte da Autora ou dos seus representantes.
60. Nesse mesmo dia 14/06/2022, a Autora retirou do website Idealista a publicação à casa dos Réus.
61. Os Réus enviaram à Autora, por correio, uma nova comunicação datada de 20/06/2022, pela qual novamente comunicaram que pretendiam, por aquele meio, cessar o contrato de mediação imobiliária.
62. Através de carta datada de 20/06/2022, os Réus comunicaram à Autora que a pretensão de fazer cessar o contrato de mediação imobiliária se prendia com a insatisfação geral com o serviço prestado pela Autora e ainda pelos factos apresentados na comunicação anterior de 14/06/2022, explicando os Réus em detalhe, os motivos pelos quais não estavam satisfeitos com os serviços da Autora.
63. Os serviços da Autora começam com a data de celebração do contrato de 09/05/2022.
64. Volvidos mais de 40 dias, desde a data de celebração do contrato e até à data da comunicação de revogação por parte dos Réus, a Autora efetuou uma única visita com potenciais clientes ao imóvel dos Réus.
65. A 30/06/2022, os Réus receberam uma comunicação da Autora, datada de 27/06/2022, após 15 dias desde a comunicação enviada pelos Réus em 14/06/2022.
66. Através da referida missiva da Autora, esta comunicou aos Réus:
“Em suma, refuta-se expressamente o teor da V. carta datada de 20.06.2022, não estando reunidas as condições para a aceitação do pedido de resolução contratual com base na fundamentação apresentada”.
67. A 09/07/2022, uma representante da Autora enviou ao Réu (…) uma mensagem, via WhatsApp, a encaminhar uma publicação de venda da casa dos Réus numa outra agência imobiliária.
68. O imóvel foi vendido a 29/09/2022.
69. Os Réus decidiram vender o imóvel pelo valor de € 295.000,00.
70. Através de comunicação datada de 15/11/2022, a Autora interpelou os Réus para o pagamento da quantia de € 14.750,00.
71. A casa dos Réus foi vendida em Setembro de 2022.
72. Os Réus, insatisfeitos com a prestação da Autora, comunicaram-lhe por escrito, por e- mail e por mensagem via WhatsApp, a decisão de pôr termo ao contrato, em 14/06/2022, e novamente em 20/06/2022, através de carta registada com aviso de recepção.
73. A Autora não conseguiu comprador para o imóvel dos Réus.
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E deu como não provados os seguintes factos:
i) A Autora não desenvolveu os mínimos esforços para a prossecução dos objetivos a que se comprometeu pelo contrato celebrado com os Réus.
ii) Uma casa com um preço de venda “sob consulta” é bastante menos atractiva do que uma casa em cujo anúncio é indicado o respetivo preço.
iii) Os Réus, após terem cessado o contrato que os vinculava à Autora, depararam-se com uma crise no mercado imobiliário, necessitavam urgentemente do dinheiro que iriam obter com a venda do imóvel, para fazer face às despesas e ao pagamento de dívidas do agregado familiar, para matricular a filha no novo ano lectivo no jardim de infância e para custear tratamentos de problemas de saúde que se arrastavam com episódios de pneumonia.
iv) A Autora agiu de modo abusivo e actua de má-fé, porque aceitou tacitamente a revogação do contrato de mediação imobiliária e intentou a presente ação decorridos mais de 15 meses desde a cessação do mesmo e mais de 12 meses desde a venda do imóvel dos Réus.
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IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Se a Autora recorrente tem direito à remuneração acordada no contrato de mediação imobiliária celebrado com cláusula de exclusividade
A Recorrente peticionou nos autos o pagamento da remuneração acordada no contrato de mediação imobiliária que celebrou com os RR. com cláusula de exclusividade, defendendo que a mesma “é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado e ainda se o negócio visado não se concretizar por causa imputável ao cliente”.
O Tribunal a quo entendeu que para que «a Autora tenha direito à remuneração, ao abrigo do disposto no artigo 19.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2013 (…) impõe-se que tenha apresentado ao vendedor alguém que estivesse efetivamente interessado na aquisição do imóvel colocado em venda» e, não se tendo provado essa circunstância, recusou o pagamento da remuneração peticionada.
A Recorrente discorda da decisão e considera que tendo a venda sido efectuada pelos réus através de uma outra mediadora, na vigência do contrato que celebraram consigo, com violação da cláusula de exclusividade, tem direito à remuneração acordada.
Não vem posto em causa que à situação dos autos é aplicável o regime jurídico da actividade de mediação imobiliária consagrado na Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro.
E discutindo-se nos autos se a Autora tem direito ao pagamento da remuneração prevista em contrato com cláusula de exclusividade, atentos os termos em que a Autora conformou a acção, estamos remetidos para a interpretação e aplicação do artigo 19.º, n.º 2, da citada Lei.
Lê-se na referida disposição, que tem a epígrafe “Remuneração da empresa”, que: «1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
2 - É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel».
A previsão do n.º 1 corresponde ao regime geral, em que a remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação.
A previsão do n.º 2 aplica-se às situações – tipo ali previstas: i. contrato de mediação celebrado com cláusula de exclusividade; ii. a não concretização do negócio visado por causa imputável ao cliente.
Assim, na confluência da previsão do n.º 1 com a do n.º 2, temos que nos casos em que foi estipulada cláusula de exclusividade no contrato de mediação imobiliária celebrado com o proprietário, a remuneração depende apenas do cumprimento da obrigação pela mediadora – de encontrar interessado efectivo na concretização do negócio (alguém genuinamente interessado e pronto a celebrar o negócio nas condições acertadas no contrato de mediação), e de que o negócio visado só não se concretizou por causa imputável ao cliente vendedor.
Exige, então, a aplicação desta norma a existência de recusa de celebração do negócio visado pelo vendedor/cliente da mediadora, apesar de esta última ter apresentado um genuíno interessado na sua efectivação.
Assente isto, vejamos o caso dos autos.
Está provado que no exercício da sua atividade, a Autora celebrou com os Réus um contrato a 9 de Maio de 2022, mediante o qual se comprometia a prestar os necessários serviços de mediação na venda do prédio urbano ali identificado pelo prazo de 6 meses, contrato esse que consagrava uma cláusula de exclusividade.
Quanto à cláusula de exclusividade lê-se no contrato referido em 2. dos factos provados, na cláusula contratual geral VIII que “o regime de exclusividade previsto no presente contrato implica que só a Mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação mobiliária durante o respectivo período de vigência”. Na cláusula IX estabelece-se que “a remuneração será devida à Mediadora, se esta ou uma das sociedades de mediação que integram a rede (…) em Portugal conseguir encontrar interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com as excepções previstas no artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 08 de fevereiro”.
Estamos, aqui, perante uma cláusula de exclusividade que, para o que releva nos autos, impede a contratação de outras mediadoras (a jurisprudência, que se crê maioritária, perante semelhantes cláusulas tem afirmado que estas impedem a contratação de outras mediadoras [exclusividade simples], mas não o próprio cliente de procurar interessados no negócio - neste sentido, a título de exemplo, veja-se o Acórdão do TRP de 01.07.2014, Processo n.º 19005/12.2YIPRT.P1, disponível em www.dgsi.pt, tal como os demais a que se faz referência).
Trata-se, então, de uma exclusividade simples, e não reforçada, na qual tão pouco se prevê que a comissão é sempre devida no caso de violação do impedimento de contratar outras mediadoras.
Mostra-se, assim, preenchido o primeiro dos pressupostos acima referidos.
Quanto ao 2.º pressuposto, verifica-se que no contrato de mediação celebrado a 9 de Maio de 2022, o preço de venda do imóvel foi estabelecido em € 388.000,00, tendo os Réus indicado que estariam disponíveis para negociar uma eventual redução desse valor até aos € 350.000,00. São estes os termos do negócio para cuja celebração a Autora se obrigou a angariar interessado pronto a celebrá-lo.
Está também provado que a Autora procedeu à divulgação do imóvel por diversos meios: na montra da sua loja em Odivelas, nas plataformas informáticas da (…) e no portal (…), em newsletter enviada por e-mail para lista de clientes qualificados, efectuou marketing especial em gráfica externa, tendo inclusivamente contratado os serviços de fotógrafo profissional para elaboração de reportagem fotográfica.
Provou-se, ainda, que no início do mês de Junho de 2022, a Autora promoveu e acompanhou a realização de três visitas físicas ao imóvel com potenciais compradores: a primeira no dia 01.06.2022; a segunda no dia 03.06.2022; e a terceira no dia 04.06.2022. Mas está igualmente provado que os Réus não receberam qualquer proposta por parte de potenciais compradores.
Mais se provou que em 14.06.2022, os Réus remeteram comunicação escrita à Autora com o seguinte teor: “(…) não querermos vender o imóvel, dado que o mercado está abaixo das nossas necessidades e uma possível venda seria por valores abaixo das necessidades. Assim, optámos por não vender o imóvel”, e que no mesmo dia 14/06/2022, a Autora retirou o anúncio de venda da casa dos Réus do website (…).
Provou-se, por fim, que em 29 de Setembro de 2022, quando o contrato ainda se encontrava em vigor, os Réus celebraram título definitivo de compra e venda do imóvel, pelo valor de € 295.000,00, com intervenção de outras mediadoras imobiliárias.
Como decidir?
Existe jurisprudência que entende que o cliente que incumpriu injustificadamente a cláusula de exclusividade deve pagar à mediadora exclusiva a remuneração acordada independentemente do nexo causal entre a actividade da mediadora e o contrato celebrado, ainda que não reconduzam a solução à previsão do artigo 19.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2013, mas sim ao regime previsto no artigo 795.º, n.º 2, do Código Civil.
É disso exemplo o Ac. do TRL de 10.05.2016, proferido na Apelação n.º 2119/13.9TJLSB.L1-7, que decidiu: «tendo sido celebrado um contrato de mediação em regime de exclusividade, esta cláusula não pode deixar de ter repercussões em sede de remuneração, quando o contrato não se concretiza por causa imputável ao cliente da mediadora, ou, quando o cliente infringe essa cláusula e celebra o contrato com interessado que chegou até si por intermédio de outra mediadora ou encontrado pelo próprio. Nestes casos, independentemente do nexo causal entre a atividade mediadora e o contrato celebrado, o cliente que incumpriu injustificadamente a cláusula de exclusividade deve pagar à mediadora exclusiva a remuneração acordada. É o que decorre da aplicação do regime geral sobre incumprimento das obrigações. (cfr. artigo 795.º, n.º 2, do CC)».
Cumpre, contudo, referir que no caso em análise no acórdão que vem de se citar, provou-se que a mediadora «conseguiu encontrar um interessado na aquisição da casa e que, muito embora a ré não tenha aceitado a proposta que lhe foi apresentada, veio a celebrar o contrato visado, no dia 03/01/2013, com o interessado angariado pela mediadora», concluindo-se no acórdão que «sendo assim, não restam quaisquer dúvidas de que a intervenção da autora foi determinante na conclusão do negócio: foi ela quem angariou o interessado e potencial comprador, quem lhe mostrou a casa, quem recebeu e comunicou à ré as propostas de preço, tendo em vista a sua aquisição. Da mesma forma, também não subsistem dúvidas de que se tratava de alguém genuinamente interessado e pronto a celebrar o contrato, tanto mais que, logo que solicitado, fez a reserva do apartamento, com a entrega de um cheque à mediadora», fazendo-se ainda ali notar que «a circunstância de as negociações encetadas com a colaboração do mediador serem rompidas e, mais tarde, retomadas com sucesso, já sem a sua participação, desde que o seu desenvolvimento subsequente possa ser reconduzido, face a um critério de continuidade lógica, à anterior atividade do mediador, como sucede in casu, não deve excluir o nexo de causalidade adequada, nem o correspondente direito à retribuição do mediador».
Também no Ac. do TRL de 20.04.2023, Proc. 614/21.5T8MFR.L1-2, rel. Higina Castelo, se refere, ainda que «a latere, (…), o mais das vezes, as partes acordam a exclusividade da mediadora sem, no entanto, explicitarem as consequências do incumprimento da cláusula por parte do cliente da mediadora. Essa situação tem levantado dúvidas sobre o regime aplicável a esse incumprimento, uma vez que o RJAMI não tem norma para ele. A situação não se confunde com a que corresponde à aplicação do artigo 19.º, n.º 2: neste prevê-se que o cliente não celebre o contrato desejado apesar de a mediadora lhe apresentar um interessado; na situação de incumprimento, o cliente da mediadora celebra o contrato visado, mas com um interessado que não foi angariado pela mediadora exclusiva (foi angariado por uma mediadora concorrente ou foi diretamente encontrado pelo cliente, no caso de exclusividade absoluta). Para tal incumprimento, quando as partes não o disciplinam, pode encontrar-se regulação na regra do artigo 795.º, n.º 2, do CC, destinada aos contratos bilaterais (…)».
Mas também neste último acórdão resulta claro que o caso ali em apreço é distinto do caso que nos ocupa, pois que a cláusula de exclusividade estipulava expressamente que o cliente “não promoveria, publicitaria ou angariaria interessados na aquisição do negócio objecto do contrato, sob pena de pagar a comissão devida”.
E no Ac. do TRL de 09.10.2018, Proc. 20340/16.6T8LSB.L1-2, embora se tenha decidido que no âmbito de contrato de mediação imobiliária com cláusula de exclusividade, à Ré que incumpriu a cláusula de exclusividade «incumbe-lhe indemnizar a Autora (artigos 798.º e 562.º e ss., do C.C.)» o que, no caso, corresponderia ao pagamento da comissão acordada, mas isto porque assim foi «expressamente convencionado», constatando-se que também nele a cláusula 4ª, n.º 2, do contrato de mediação estipulava expressamente que “(…) só a Mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respetivo período de vigência, ficando o Segundo Contratante obrigado a pagar a comissão acordada caso viole a obrigação de exclusividade”), estipulação essa que não tem paralelo no caso destes autos.
Diferentemente, há quem entenda que o facto constitutivo do direito à remuneração previsto no artigo 19.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2013 exige prova de que a mediadora angariou alguém genuinamente interessado e pronto a celebrar o negócio nos moldes definidos no contrato de mediação e que esse negócio só não se concretizou por causa exclusivamente imputável ao cliente, e que, fora desse circunstancialismo, a (mera) violação da cláusula de exclusividade pode dar lugar, não ao pagamento da remuneração, mas de indemnização por danos causados.
Neste sentido, veja-se o Ac. do TRL de 04/10/2012, Proc. n.º 6916/10.9TBOER.L1-2, que, perante norma idêntica do Dec. Lei n.º 211/2004, decidiu que «para que a sociedade mediadora possa receber a remuneração ao abrigo deste dispositivo, esta tem de estar em condições de poder concluir o negócio, mas o mesmo não se concretiza, ou por recusa do cliente da mediadora em fazê-lo, ou por destruição do imóvel objecto da mediação, por culpa imputável ao cliente da empresa ou por qualquer outra situação a este cliente imputável. Não basta, a nosso ver, o cliente ter vendido o imóvel, com ou sem a intervenção de outra mediadora, uma vez que a venda do imóvel, só impede que a sociedade de mediação com a qual foi feito o contrato, em regime de exclusividade, a partir dali deixe de continuar a promover a angariação. Para se aplicar a alínea a), do n.º 2 do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 211/2004, a empresa mediadora já tem de ter objectivamente uma situação concreta para a conclusão do negócio, o qual não se fecha, ou celebra, por culpa imputável ao cliente da mediadora».
No mesmo alinhamento de ideias veja-se o Ac. do TRL de 05/06/2020, proc. n.º 4/19.0T8RGR.L1, publicado nos Cadernos Temáticos do TRL: «A interpretação do artigo 19.º, n.º 2, do DL n.º 15/2023, dando acolhimento ao princípio do n.º 1 da exigência da causalidade entre a actuação da mediadora na conclusão do negócio e a efectivação do seu direito à remuneração acordada impõe que se considere que só no caso da empresa mediadora ter angariado um interessado efectivo na conclusão do negócio visado é que podemos dizer que tem um prejuízo e que aquele não se concretizou por causa imputável ao cliente ao ter celebrado o contrato com interessado angariado por outra empresa, em violação da cláusula de exclusividade».
Perfilhando idêntico entendimento, o Ac. do TRL de 09.06.2022, Proc. 13910/20.0T8SNT.L1-2 (com voto de vencido), no qual se sumariou: «Mesmo que no contrato de mediação imobiliária esteja prevista a exclusividade e se tenha verificado a violação dessa cláusula pelo cliente da mediadora, que celebrou o contrato visado com cliente conseguido por mediador concorrente da primeira, está só tem direito à remuneração se tiver apresentado ao cliente / vendedor um negócio (com um certo comprador, por um certo preço) que apenas não se concretize por causa imputável ao cliente ou, pelo menos, se tiver desenvolvido alguma actividade que se possa presumir como estando ligada casualmente ao negócio visado que acabou por ser celebrado».
E neste acórdão argumentou-se que «a grande maioria da jurisprudência tem entendido que para se verificar a hipótese prevista no artigo 19.º/2, do regime da mediação imobiliária, a mediadora inicialmente contratada tem de ter apresentado ao cliente/vendedor um negócio (com um certo comprador, por um certo preço) que apenas não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel. No caso de apenas se provar a violação da exclusividade, poderá haver lugar, não à remuneração, mas a uma indemnização dos danos (que terão de ser alegados e provados) provocados por essa violação, que serão os gastos/despesas feitas pela mediadora por força da sua actividade de promoção subsequente à celebração do contrato e que foram frustrados por força daquela violação».
Também o Ac. do TRE de 08.07.2010, Processo n.º 214/08.1TBPTM.E1, perante um contrato de mediação imobiliária com cláusula de exclusividade, manifesta idêntico entendimento: «I – Para o mediador ter direito à remuneração é necessário que o negócio visado (no caso a venda de apartamentos) resulte adequadamente da sua conduta ou actividade. II – Havendo incumprimento por parte do cliente da mediadora esta terá direito a ser ressarcida dos danos que sofreu com a realização da sua prestação designadamente das despesas que realizou».
Entendimento este a que também aderimos.
Veja-se, ainda, o Ac. do TRC de 10.09.2019, proferido no Proc. n.º 4996/17.5T8LRA.C1, que decidiu, que «na previsão do n.º 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 08.02, o direito da mediadora à remuneração da comissão apenas emerge se provados factos alicerçantes de imputação de um juízo ético jurídico de censura ao comitente e, bem assim, se provado que, não fora a atuação deste, a venda a cliente por si apresentado seria realizada no período daquela vigência», acrescentando-se que «mesmo nesta situação, o mediador, se impetrar o pagamento da comissão, tem de provar, mesmo existindo exclusividade, que com a sua actividade tinha já arranjado interessado na celebração do negócio, ou que, certamente, o iria encontrar, e que este apenas não se concretizou por virtude da atuação culposa do cliente» e isto porque «efetivamente, a comissão é a contrapartida da realização do negócio resultante da atuação da mediadora, pelo que o direito à mesma apenas emerge se este se realizou por força da sua adequada intervenção, nos termos supra aludidos. Situação diversa, i. e. desnecessidade de prova da intervenção da mediadora para a consecução do negócio, apenas emergiria se, em vez da comissão, esta impetrasse indemnização por violação contratual, nos termos gerais».
Ora, em vista da factos provados acima ressaltados, não restam dúvidas que o artigo 19.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2013 não tem aplicação no caso vertente, pois que não foi apresentado aos Réus qualquer cliente interessado na concretização do negócio nos termos e condições definidos no contrato (é inoperante, para esse efeito, o facto provado sob o n.º 52º, pois que essa proposta, de valor inferior ao previsto no contrato, foi, além do mais, recusada pela Autora sem ter previamente consultados com os Réus) e, por isso, nenhum negócio que tivesse sido apresentado pela Autora veio a frustrar-se, designadamente pela celebração do contrato visado com interessado angariado por outra mediadora.
Ou seja, embora a Recorrente tenha provado que na vigência do contrato promoveu a venda do imóvel dos Recorridos por diversos meios e promoveu e acompanhou a realização de três visitas físicas ao imóvel com potenciais compradores, não provou que dessas diligências, e durante mais de 4 meses (entre 9 Maio e finais de Setembro – a escritura foi celebrada a 29.09.2022), resultou interessado na celebração do negócio visado, nem sequer que algum dos visitantes tenha manifestado interesse na aquisição do imóvel e apresentado qualquer proposta de aquisição pelo valor anunciado e que disso tenha sido dado conhecimento aos Autores, pelo que inexiste situação de recusa de celebração do negócio visado por causa imputável ao cliente.
Acompanha-se, pois, a afirmação contida na sentença recorrida de que a Autora nunca apresentou aos Réus qualquer comprador efectivamente interessado em comprar o imóvel, nem formalizou qualquer proposta de compra, como contrato-promessa de compra e venda ou outro tipo de contrato. Neste contexto, da factualidade provada resultou que a Autora não apresentou aos Réus vendedores alguém que se possa considerar como verdadeiramente interessado na aquisição do imóvel».
A Recorrente não logrou provar, de acordo com o disposto no artigo 342.º, n.º 1, do CPC, que deixou de auferir a remuneração por causa imputável aos Réus, tendo-se provado, apenas, a violação da cláusula de exclusividade por banda dos Réus, para a qual esta norma não é aplicável.
Deste modo, cai pela base o segundo pressuposto do direito à remuneração invocado pelo Recorrente na PI, prevista no citado artigo 19.º, n.º 2: a prática de actos pela mediadora idóneos à concretização do negócio visado entre o seu cliente e o interessado angariado pela sua actividade e a não concretização desse negócio por culpa do cliente da mediadora.
Entende-se, na senda do decidido no Ac. do TRL de 04/10/2012, acima citado, que a venda do imóvel a interessado angariado por outra mediadora “só impede que a sociedade de mediação com a qual foi feito o contrato, em regime de exclusividade, a partir dali deixe de continuar a promover a angariação”, e não de receber a remuneração, pois que para que esta fosse devida teria que estar em condições de poder concluir o negócio.
Tal não significa, como vimos, segundo o entendimento a que se adere, que a mediadora não tenha direito a ser indemnizada, mas não tem direito a reclamar a remuneração acordada no contrato, tanto mais que nele não foi sequer previsto que com a violação dessa exclusividade seria sempre devida a remuneração.
É que «o direito reclamado – valor das remunerações (…) - de acordo com a jurisprudência maioritária dos tribunais superiores, apenas será devido se o mediador tiver angariado o cliente e o negócio se tiver concretizado ou não o tendo sido, isso seja devido a causa imputável ao cliente da mediadora (…). Nestas circunstâncias não assiste à A. o direito reclamado. Apenas lhe assistiria o direito de ser indemnizada pela violação do seu interesse negativo ou seja os prejuízos que sofreu pela violação do seu interesse negativo designadamente as despesas que efectuou para o cumprimento da sua prestação» (ac. do TRE citado).
Precisa-se, ainda, a este respeito, que no caso vertente, como decorre da PI e do articulado de resposta à contestação, não só a Recorrente não peticionou a indemnização decorrente da violação contratual, que não pode ser exigida neste tipo de acções [circunstância reconhecida e declarada na sentença, aquando do conhecimento da excepção dilatória de erro na forma de processo: escreveu-se ali que «A Autora no exercício do seu direito ao contraditório, respondeu que o valor pedido é pela comissão imobiliária acordada e que esta acção especial é adequada para peticionar esta comissão. Apreciando, cumpre desde logo dizer que o valor peticionado pela Autora é a título de remuneração ou comissão do serviço prestado aos Réus e não a título de indemnização por eventuais danos provocados pelos Réus, a saber gastos/despesas feitas pela mediadora por força da sua actividade de promoção subsequente à celebração do contrato e que foram frustrados por força daquela violação», segmento que não foi objecto de impugnação], como não provou que os danos dali resultantes ascendessem ao montante peticionado.
Improcede, assim, o recurso de apelação.
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V – DECISÃO
Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela Recorrente e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
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Custas da apelação pela Recorrente (conforme artigo 527.º, n.º 1 e n.º 2, do CPC, por nela ter decaído).
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Évora, 16/10/2025

Maria Isabel Calheiros
Maria Emília Melo e Castro
Ana Margarida Leite (com voto de vencida)
Declaração de voto
Voto vencida o acórdão.
Diferentemente da posição plasmada no acórdão, entendo que assiste à autora o direito à remuneração acordada no contrato de mediação imobiliária celebrado entre as partes em regime de exclusividade.
Assente que, durante o período de vigência desse contrato, os réus celebraram, com intervenção de outra mediadora imobiliária, o negócio de compra e venda visado pelo contrato anteriormente celebrado com a autora, a prestação a que esta se obrigara tornou-se impossível por causa imputável aos réus.
Ao celebrarem o contrato de compra e venda com intervenção de outra mediadora imobiliária, os réus violaram o direito de exclusividade da autora, impossibilitando-a de cumprir a prestação a que se obrigara, pelo que, nos termos previstos no artigo 795.º, n.º 2, do CC, se encontram obrigados a proceder ao pagamento à autora da remuneração acordada no contrato entre ambos celebrado.
Por esse motivo, entendo que, na procedência do recurso, seria de revogar a decisão recorrida e condenar os réus a pagar à autora a quantia peticionada a título de remuneração, acrescida de juros de mora.