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MASSA INSOLVENTE
DÍVIDAS DA MASSA INSOLVENTE
PATRIMÓNIO
ENCERRAMENTO POR FALTA DE BENS
Sumário
Só o património apreendido para a massa insolvente responde pela satisfação das custas do processo e das restantes dívidas da massa insolvente. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
Processo n.º 162/24.1T8LGA.E1
Juízo de Comércio de Lagoa
Tribunal Judicial da Comarca de Faro
Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
1. Relatório
Por sentença de 02-10-2024, foi declarada a insolvência de (…), Lda., tendo sido nomeada administradora da insolvência e determinada a apreensão, para entrega à administradora da insolvência, de todos os elementos da contabilidade da insolvente e de todos os seus bens, ainda que penhorados, arrestados ou por qualquer outra forma apreendidos ou detidos.
A administradora da insolvência veio aos autos, em 21-04-2025, comunicar que constatou a insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente, requerendo o encerramento do processo, pelos motivos seguintes: (…) Na sequência do requerimento enviado hoje sobre o estado da liquidação, e tendo em conta que a nova tentativa de venda dos bens apreendidos terminou, sem que tivesse sido apresentada uma única proposta de aquisição dos bens e que continuam a vencer-se rendas respeitante ao imóvel que se encontra ocupado com os bens apreendidos, sendo tais rendas no valor mensal de € 1.850,00, e somando hoje tais rendas, o valor global de € 12.950,00, a massa insolvente não tem valores para tal pagamento, para além de que o mesmo, em nada beneficia os credores da insolvência; Além do mais, a conta bancária da massa insolvente, tem um saldo de € 4.606,67, saldo esse que é insuficiente para o pagamento das rendas e de outras despesas da massa, sendo inferior ao valor de € 5.000,00, valor que a lei considera para se presumir a insuficiência da massa, de acordo com o disposto no n.º 7 do artigo 232.º do CIRE. Tendo em conta o disposto no artigo 232.º, n.º 4, do CIRE, logo que o administrador da insolvência verifique a insuficiência da massa, é lícito interromper de imediato a liquidação. Por tal motivo, consideramos que a liquidação deve ser interrompida, pelo que requeremos a V. Exa., se digne autorizar a ora signatária, da dispensa de liquidação dos bens móveis que não se conseguiram vender, declarando o processo encerrado por insuficiência da massa insolvente, de acordo com os ulteriores trâmites legais. (…).
Foram ouvidos os credores e a devedora.
A devedora invocou a existência de um contrato de arrendamento com opção de compra, pelo valor de € 800.000,00, do bem imóvel identificado nos autos, sustentando que tal configura um ativo que deve ser valorado.
Por despacho de 16-05-2025, consignou-se que qualquer interessado no prosseguimento dos autos deverá depositar a quantia de € 17.000,00 como garantia do pagamento das custas e dividas da massa, em particular das rendas vencidas e vincendas do imóvel arrendado e ainda não entregue ao senhorio, no prazo de 10 dias.
Notificada para o efeito, a administradora da insolvência veio aos autos informar que não procedeu à resolução do contrato de arrendamento invocado pela devedora, em virtude de terem os senhorios informado, na reclamação de créditos, que o contrato já se encontrava resolvido.
Não foi depositada a quantia fixada no despacho de 16-05-2025.
Por decisão de 13-06-2025, foi declarado o encerramento do processo por insuficiência da massa insolvente, nos termos seguintes: A Exma. Administradora propôs o encerramento do processo, por insuficiência da massa para assegurar as dividas da massa insolvente e as custas do processo. Foi cumprido o disposto no artigo 232.º, n.º 2, do CIRE, em particular foi ouvido o devedor, os credores da massa e a universalidade dos credores da insolvente, que foram notificados para o efeito. Optou-se por ouvir a universalidade dos credores, por ser mais abrangente e eficaz, ao abrigo da adequação processual. Para tanto, notificaram-se todos os credores, conferindo assim uma maior possibilidade de pronúncia, o que veio a suceder, tendo o credor (…), Unipessoal, Lda., (…), (…) e (…) deduzido oposição ao referido encerramento. Sensível a essa posição, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 232.º do CIRE, conferiu-se a possibilidade do processo não encerrar, prosseguindo, mas para tanto, tendo em conta as dividas atuais da massa insolvente e as mais que prováveis futuras (indemnização pela ocupação pelo imóvel ainda não restituído equivalente a € 1.850,00 mensais, por ser esse o valor equivalente à renda) que fosse depositado no Tribunal por algum interessado no prosseguimento o valor de € 17.000,00 (valor que até peca por defeito tendo em consideração as dividas já vencidas e vincendas da massa e custas do processo). Sucede que nenhum dos interessados, mesmo aqueles que defendem o prosseguimento do processo procederam ao depósito de tal valor mínimo para assegurar o pagamento das dividas da massa e das custas do processo. Nesta medida, falta um dos pressupostos para obviar ao encerramento do processo, por insuficiência da massa insolvente. Assim, é um facto que, neste momento, e para efeitos do disposto no artigo 232.º, n.º 7, do CIRE, é insuficiente o património da insolvente, por não estar apreendido qualquer bem cujo valor seja suficiente para satisfazer as dividas da massa insolvente e as custas do processo. Os credores alegam a existência de uma potencial mais valia relevante, que é a suposta manutenção de um contrato de arrendamento e uma potencial expetativa de aquisição do imóvel por um valor de € 800.000,00. Ora, a Exma. AI não apreendeu esse direito de arrendamento, nem resolveu o contrato, por ter ajuizado que este já não estava em vigor, por ter sido resolvido por falta de pagamento de rendas, realizado por notificação judicial avulsa efetuada pelos senhorios em 08/09/2024 à sociedade insolvente. Ora, de acordo com as disposições conjugadas dos artigos 1083.º, n.º 3 e 1084.º, n.º 3, do Código Civil, quando exista mora do arrendatário por mais de 3 meses o pagamento das rendas, o senhorio pode resolver o contrato, por comunicação ao mesmo (arrendatário), a qual fica sem efeito se este puser fim a mora no prazo de um mês. Resulta dos autos que nem o insolvente, nem a administradora colocou fim a essa mora, aceitando-se a referida resolução. Nesta medida, “primae facie” o contrato foi resolvido, tendo esta resolução sido operante e aceite, por falta de pagamento das rendas. Logo, não conseguimos descortinar como se pretende manter um contrato já resolvido, cuja mora não foi cessada no mês seguinte, nem mesmo até ao presente, inclusive continua-se, sem entregar o imóvel, e nada pagando por isso. De igual modo, não se alcança, nem mesmo foi explicado, como se pretende exercer uma aquisição de um imóvel, quando o contrato em que essa expetativa de aquisição assenta não foi cumprido, nem mesmo está em vigor, por ter operado a sua resolução. Por outro lado, também não é explicitado como a insolvente pode adquirir um imóvel, no valor fixado de € 800.000,00, quando esta fruto da situação até onde foi conduzida (insolvência) dificilmente conseguirá financiamento bancário, ainda menos em tão avultada quantia. Face ao exposto, declaro encerrado, nos termos dos artigos 230.º, n.º 1, alínea d) e 232.º, n.º 2, do CIRE, por insuficiência da massa insolvente, o presente processo de insolvência. (…)
Inconformada, a devedora interpôs recurso desta decisão, pugnando pelo prosseguimento dos autos e terminando as alegações com as conclusões que se transcrevem:
«1. O presente recurso interposto da douta decisão proferida em 1ª Instância que decretou o encerramento do processo de insolvência, por insuficiência da massa insolvente, e em que tem como único fundamento o “insuficiente o património da insolvente, por não estar apreendido qualquer bem cujo valor seja suficiente para satisfazer as dividas da massa insolvente e as custas do processo”.
2. A Decisão Recorrida e a administradora de Insolvência erradamente não consideraram como activo a promessa de compra e venda do imóvel arrendado, por considerarem o contrato de arrendamento resolvido.
3. O contrato de arrendamento com opção de compra, pelo valor de € 800.000,00, é um grande ativo.
4. Devia e deve ser valorizado.
5. Nem a Sentença nem o parecer da AI justificam o facto de não ter sido fiscalizada ou indagada as verdadeiras razões e motivos da decisão.
6. A Insolvente tem o direito, de, até ao ano de 2026 comprar o imóvel, direito esse adquirido, real e efectivo.
7. O Tribunal ad quo alega que o contrato de arrendamento está resolvido por falta de pagamento das rendas.
8. Mas não justifica nem fundamente a sua decisão.
9. Como resulta do efectivo regime jurídico, não basta a falta de pagamento das rendas para um contrato de arrendamento se considerar resolvido.
10. É necessário e obrigatório, que seja invocado pelos senhorios essa resolução contratual.
11. O tribunal ad quo não se pode substituir aos interesses dos credores, sem que estes o requeiram.
12. Padecendo a Sentença a quo de nulidade.
13. Nunca os senhorios comunicaram essa resolução à arrendatária, neste caso a aqui Insolvente, nem o demonstraram nos presentes autos.
14. Os Senhorios nunca comunicaram a alegada resolução, logo a mesma não operou, nem efectivamente produz quaisquer efeitos.
15. Sem a comunicação da resolução aos arrendatários por falta de pagamento, essa resolução não tem eficácia jurídica, conforme decorre da lei e é mencionado na decisão que ora se recorre.
16. Os senhorios até à presente data não vieram exigir a cessação do contrato.
17. A decisão decorre exclusivamente da Administradora de Insolvência que decidiu pela cessação do contrato, bem como a entrega do imóvel.
18. Saiba-se lá os motivos.
19. A mesma não tem essa competência, pois o contrato não se resolve por si, é necessário que a essa resolução tenha fundamento legal e que seja efectivada também pelos meios legais.
20. Como se demonstrou, para que o contrato seja considerado resolvido é necessário que essa resolução seja invocada e comunicada aos arrendatários pelos senhorios, o que nunca sucedeu.
21. Mesmo que essa essa comunicação tivesse sido realizada, o que não foi, a Insolvente teria sempre a hipótese de manutenção do contrato com a liquidação das rendas e do acréscimo legal, conforme decorre da lei.
22. Importa ainda referir que com a entrada do processo de insolvência e sua decretação não pode haver resolução contratuais, ficam suspensos todos os processos.
23. A aqui Insolvente sempre reiterou em todo o processo que o contrato de arrendamento não está resolvido, que essa resolução e entrega do imóvel decidida pela a Administradora só iria beneficiar os senhorios, porque ficariam livres da obrigação de venda do imóvel e ficam com o imóvel livre, fazendo com que a Insolvente tenha um prejuízo em dupla via... O fim do contrato e a cessação da promessa de compra e venda incita ao contrato de arrendamento... (cfr doc. 2 que se junta).
24. Os senhorios não pediram nos autos a entrega do imóvel e muito menos a resolução do contrato, esta decisão partiu apenas da Administradora de Insolvência, sem que essa decisão fosse devidamente e legalmente justificada.
25. Decisão essa que prejudicou e está a prejudicar a Insolvente.
26. Na verdade, a Insolvente tinha todas as condições para continuar a laboral.
27. Apenas deixou de conseguir laboral porque a Administradora decidiu vender todo e equipamento e maquinaria da empresa.
28. Maquinaria essa que é e era essencial à actividade à actividade da insolvente, e por isso invalidou o cumprimento das suas obrigações.
29. A empresa é viável, tem capacidade produtiva, tem mercado para os seus produtos, e existem formas muito simples de a recuperar.
30. Por outro lado, mesmo que se considere a resolução contratual, o que não se aceita, o contrato de arrendamento não colide com o direito da opção de compra do imóvel.
31. A opção de compra do imóvel é dissociável do contrato de arrendamento. O arrendamento e a opção de compra são duas obrigações distintas, as mesmas não se confundem e não colidem por estarem no mesmo escrito.
32. Basta analisar o contrato para se confirmar que são duas obrigações/direitos distintos.
33. Não há dúvidas da existência do direito de opção de compra ao imóvel por parte da Insolvente.
34. A opção de compra é um efetivo ativo e deve ser valorado como tal.
35. A decisão recorrida refere ainda que não entende como poderá a Insolvente exercer a opção de compra, referindo que dificilmente conseguirá financiamento.
36. Ora em primeiro lugar, não foi sequer dada a hipótese à Insolvente para o referir.
37. Depois não há certeza se se consegue ou não financiamento para comprar o imóvel.
38. E de quem poderá partir esse financiamento, poderá ser bancário ou particular.
39. O que importa é a valoração desse activo, a opção de compra do imóvel.
40. Na realidade, o imóvel em causa tem um grande valor no mercado, existindo vários interessados no mesmo, como se referiu no neste processo e que existe a possibilidade de financiamento (cfr. doc. 2).
41. Consta dos Autos que um dos credores estava e está disposto a financiar a Insolvente e até mesmo a adquirir a sociedade insolvente.
42. Requereu a realização de uma assembleia de credores, pedido esse que não mereceu qualquer despacho, nem de deferimento ou indeferimento.
43. Havia e há a possibilidade de obtenção de financiamento para a compra e assim conseguir o valor para face a todas as suas obrigações e conseguir meios mais que suficientes para a empresa continuar a laboral e pagar a todos os seus credores.
44. Por fim e não menos importante, a decisão da resolução ou não do contrato de arrendamento, a decisão da existência ou não de opção de compra do imóvel deve ser analisada judicialmente e em processo autónomo, pois existem questões legais e de direito a serem analisadas e toda uma prova a ser produzida, não sendo este processo a sede própria.
45. A Sentença viola os direitos da insolvente.
46. Vai para além dos limites dos poderes de decisão do Tribunal.
47. Faz errada interpretação do regime jurídico do CIRE.
48. A Sentença recorrida não se encontra devidamente fundamentada.
49. A Sentença é nula.
50. Foram violados todos os direitos da Insolvente.»
O Ministério Público, em representação da credora Autoridade Tributária, apresentou contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido.
Face às conclusões das alegações da recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre apreciar as questões seguintes:
- da nulidade da decisão recorrida;
- do encerramento do processo por insuficiência da massa insolvente.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
2. Fundamentos
2.1. Fundamentos de facto
2.1.1. Na decisão recorrida, a 1.ª instância considerou verificados os elementos seguintes:
i) as dívidas vencidas e as prováveis dívidas vincendas da massa insolvente, tendo em conta a indemnização pela ocupação do imóvel identificado nos autos, acrescidas das custas do processo, são de valor não inferior a € 17.000,00;
ii) não se encontram apreendidos bens cujo valor seja suficiente para satisfazer o montante a que alude o ponto i).
2.1.2. Com interesse para a apreciação da questão suscitada, extraem-se dos autos, além dos elementos indicados no relatório supra, ainda os seguintes:
a) em 02-12-2024, foram apreendidos os bens móveis e o veículo automóvel identificados no auto de apreensão junto ao apenso A em 09-12-2024, aos quais foi atribuído o valor total de € 10.430,00;
b) em 10-12-2024, foi apreendido o saldo de um depósito bancário no valor de € 3.266,67, conforme auto junto ao apenso A em 02-01-2025;
c) consta do apenso B que o veículo automóvel apreendido foi vendido pelo valor de € 1.340,00 e que os demais bens móveis configuram equipamentos para a indústria alimentar com algum desgaste, relativamente aos quais não foi apresentada proposta de aquisição ou licitação.
2.2. Apreciação do objeto do recurso
2.2.1. Nulidade da decisão recorrida
No recurso interposto, a apelante arguiu a nulidade da decisão recorrida, sustentando que a sentença não se encontra devidamente fundamentada, mas não especificando a concreta causa de nulidade que invoca.
As causas de nulidade da sentença encontram-se previstas no n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, nos termos do qual é nula a sentença quando: a) não contenha a assinatura do juiz; b) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
Não esclarecendo a recorrente o fundamento legal do vício que arguiu, nem se vislumbrando que a alegação apresentada integre qualquer uma das indicadas causas de nulidade da sentença, cumpre considerar não verificada a nulidade arguida.
Sempre se dirá, porém, que o vício de falta de fundamentação, causa de nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do citado preceito, ocorre quando a sentença não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, assim incumprindo o dever de fundamentação da decisão previsto no artigo 154.º do CPC.
A nulidade em causa pressupõe se omita completamente o cumprimento deste dever de fundamentação, o que requer a total ausência de fundamentação de facto ou de direito, não se verificando perante uma fundamentação meramente deficiente, conforme invocado pela apelante, ao sustentar que a sentença não se encontra devidamente fundamentada, manifestando discordância quanto à fundamentação constante da decisão.
Não esclarecendo a recorrente o fundamento legal do vício que arguiu, nem se vislumbrando que a alegação apresentada integre qualquer uma das indicadas causas de nulidade da sentença, cumpre considerar não verificada a nulidade arguida.
Improcede, assim, a arguição de nulidade da decisão recorrida.
2.2.2. Encerramento do processo por insuficiência da massa insolvente
Declarada nos presentes autos a insolvência da devedora, o processo prosseguiu, vindo a ser declarado encerrado com fundamento em insuficiência da massa para a satisfação das custas do processo e das restantes dívidas da massa insolvente, por se ter entendido que o património liquidado e os bens apreendidos nos autos não permitem satisfazer tais pagamentos.
Esta declaração de encerramento do processo, com fundamento em insuficiência da massa, vem posta em causa na apelação intentada pela devedora, que sustenta não se verificar a razão determinante da decisão proferida.
A apelante invoca a existência de um contrato de arrendamento com opção de compra, pelo valor de € 800.000,00, do bem imóvel identificado nos autos, sustentando que tal configura um ativo que impede se considere nesta fase verificada a insuficiência da massa, pelo que defende a revogação da decisão de encerramento do processo.
Vejamos se lhe assiste razão.
As causas de encerramento do processo, nos casos em que os autos tenham prosseguido após a declaração de insolvência, encontram-se elencadas no n.º 1 do artigo 230.º do CIRE, com a redação seguinte: 1 - Prosseguindo o processo após a declaração de insolvência, o juiz declara o seu encerramento: a) Após a realização do rateio final, sem prejuízo do disposto no n.º 6 do artigo 239.º; b) Após o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de insolvência, se a isso não se opuser o conteúdo deste; c) A pedido do devedor, quando este deixe de se encontrar em situação de insolvência ou todos os credores prestem o seu consentimento; d) Quando o administrador da insolvência constate a insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente. e) Quando este ainda não haja sido declarado, no despacho inicial do incidente de exoneração do passivo restante referido na alínea b) do artigo 237.º.
Estando em questão o encerramento por insuficiência da massa insolvente, cumpre atender ao disposto no artigo 232.º do CIRE, preceito que estatui, além do mais, o seguinte: 1 - Verificando que a massa insolvente é insuficiente para a satisfação das custas do processo e das restantes dívidas da massa insolvente, o administrador da insolvência dá conhecimento do facto ao juiz, podendo este conhecer oficiosamente do mesmo. 2 - Ouvidos o devedor, a assembleia de credores e os credores da massa insolvente, o juiz declara encerrado o processo, salvo se algum interessado depositar à ordem do tribunal o montante determinado pelo juiz segundo o que razoavelmente entenda necessário para garantir o pagamento das custas do processo e restantes dívidas da massa insolvente. (…) 7 - Presume-se a insuficiência da massa quando o património seja inferior a € 5.000,00.
Importa aferir, no presente recurso, se ocorre a situação prevista na alínea d) do n.º 1 do citado artigo 230.º, isto é, se constam dos autos elementos que permitam concluir que a massa insolvente não é suficiente para a satisfação das custas do processo e das restantes dívidas da massa insolvente.
A massa insolvente abrange, salvo disposição em contrário, todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 46.º do CIRE; esclarece o n.º 2 do indicado preceito que os bens isentos de penhora só são integrados na massa insolvente se o devedor voluntariamente os apresentar e a impenhorabilidade não for absoluta.
Abrangendo a massa insolvente, em princípio, todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos pelo mesmo adquiridos na pendência do processo, cumpre averiguar se o património da devedora não se mostra suficiente para a satisfação das custas do processo e das restantes dívidas da massa insolvente.
Considerou a 1ª instância que o património liquidado e os bens apreendidos à ordem dos presentes autos não permitem satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente, o que não vem posto em causa na apelação.
Mais se considerou que não se encontra apreendido qualquer direito decorrente do contrato de arrendamento invocado pela apelante, consignando-se que a administradora da insolvência não apreendeu esse direito de arrendamento, nem pôs fim ao contrato, por ter entendido que o mesmo já não estava em vigor, tendo cessado por resolução operada pelos senhorios com fundamento na falta de pagamento de rendas.
Discordando deste entendimento, a apelante pugna pelo prosseguimento do processo de insolvência, defendendo que a opção de compra do imóvel que identifica, prevista no contrato de arrendamento que invoca, configura um ativo que impede se considere verificada a insuficiência da massa, motivo pelo qual defende a revogação da decisão de encerramento do processo.
Porém, não se encontrando apreendido qualquer direito decorrente do contrato a que alude o apelante, tal impede se considere verificada a existência do ativo que invoca, o que prejudica a apreciação dos efeitos que dele pudessem decorrer.
Considerando que só o património apreendido para a massa insolvente responde pela satisfação das custas do processo e das restantes dívidas da massa insolvente, afastada se encontra a relevância da argumentação apresentada pelo apelante.
Aqui chegados, sempre se dirá que não se vislumbra que a apelante seja titular de qualquer direito suscetível de ser violado ou limitado pelo imediato encerramento do processo de insolvência, não lhe assistindo o direito substantivo ao prosseguimento do processo de insolvência, numa situação em que se considerou, o que não vem posto em causa na apelação, que o património liquidado e os bens apreendidos não permitem satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente.
Improcede, assim, a apelação.
Em conclusão: (…)
3. Decisão
Nestes termos, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
Notifique.
Évora, 16-10-2025
(Acórdão assinado digitalmente)
Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite (Relatora)
Maria Isabel Calheiros (1ª Adjunta)
Cristina Dá Mesquita (2ª Adjunta)