I - Por força da resolução do contrato, as relações obrigacionais simples que constituiu extinguem-se, mas a relação obrigacional complexa, modifica-se ou transforma-se, convolando-se numa relação de prestação secundária – relação de restituição ou liquidação, integrada por obrigações recíprocas de restituição das prestações realizadas em cumprimento do contrato resolvido, em espécie, ou caso a restituição em espécie não seja possível, em valor.
II - O preço convencionado da empreitada não pago pelo dono da obra deve ser considerado, não para lhe impor um dever de cumprimento, excluído pela eficácia liberatória da resolução daquele contrato, mas, apenas, para o cálculo da compensação e da obrigação correspondente de restituição em valor, resultante da impossibilidade de restituição em espécie da obra realizada pelo empreiteiro, em que o dono da obra se constituiu, atento o efeito restitutivo ou restitutório da resolução.
III - O resolvente, sob pena de enriquecimento indevido, não pode ser colocado, com a resolução do contrato, complementada com indemnização pelo interesse positivo ou de cumprimento, numa posição melhor do que aquela que resultaria do simples ou normal cumprimento pontual pelos contraentes das obrigações a que, por força dele, se vincularam.
1. Relatório.
A Sra. Juíza de Direito do Juízo Central Cível de Aveiro, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, por sentença de 30 de Julho de 2024, declarou parcialmente procedente a acção declarativa, com processo comum, proposta por AA contra Duna Amarela – Construções, Lda. e:
- Julgou resolvido o contrato – de empreitada - celebrado entre as partes;
- Condenou a Ré Duna Amarela – Construções Lda. a pagar ao Autor a quantia de 46.845,60 €, a título de danos patrimoniais (remoção dos defeitos e desvalorização do imóvel) e danos não patrimoniais;
- Absolveu a Ré da instância relativamente ao pedido de indemnização por dano da privação do uso do imóvel;
- Julgou procedente a reconvenção, condenando o Autor AA a pagar à Ré o valor de 27.736,33 € e,
- Operando a compensação entre os dois créditos, condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de 19.109,27 €.
O autor interpôs desta sentença recurso ordinário de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, designadamente do segmento em que o condenou a pagar á demandada a quantia de € 27 736,33 e operou a compensação com o seu crédito, com fundamento em que tem que haver desvinculação das prestações contratuais que os pedidos contendem, na medida em que a resolução dispensa o titular do direito à resolução do dever de cumprir, daqui resultando que o faltoso também não é obrigado a cumprir, pelo que o A/apelante já não tem que cumprir a prestação do preço ainda não pago e o R/apelante já não tem que concluir e executar a obra sem defeitos. Porém, aquele Tribunal, por acórdão proferido no dia 24 de Fevereiro de 2025, designadamente com fundamento, em que o autor será integralmente ressarcido pelos danos sofridos pelo incumprimento contratual da ré que ficou provado e uma parte da indemnização (fixada e ainda a liquidar) visa eliminar os defeitos da obra, pelo que não pode, como é manifesto, pretender também ser absolvido do pedido de condenação no pagamento do preço dos trabalhos executados, que obviamente que o recorrente não pode “restituir” a prestação da ré consistente na execução da obra. e que nos termos do artigo 289.º número 1 do Código Civil, aplicável por remissão do artigo 433.º do Código Civil, quando não seja possível a restituição em espécie deve ser devolvido o valor correspondente, pelo que mesmo pela via convocada pelo recorrente não podia proceder a sua pretensão sempre estando o mesmo obrigado a pagar à reconvinte o preço dos trabalhos executados, e que a cumulação da pretensão de ser indemnizado por todos os danos decorrentes do incumprimento do contrato com a de ser absolvido do pagamento do preço da obra efetivamente feita resultaria em indevido locupletamento do autor, enquanto lesado., que a procederem ambas as pretensões o mesmo ficaria numa situação patrimonial claramente superior à que para si decorreria do bom cumprimento contratual, ou seja, ficaria com a sua habitação reparada, seria indemnizado de todos os danos que resultaram da sua má execução e não teria de pagar o preço da obra feita, o que não pode ser admitido. - julgou o recurso parcialmente procedente, revogando a sentença recorrida nos seguintes termos:
1- Condena-se a ré a pagar ao autor os valores que vierem a liquidar-se ulteriormente com vista a:
a) - indemnizar o autor pelo custo que terá suportar para a reparação do defeito relativo ao isolamento térmico da habitação referido na alínea 39 dos factos provados e que vá para além do valor de 6 920, 20 € já fixado;
b) - indemnizar o autor pelo custo que terá (de) suportar para a reparação do defeito consistente no desalinhamento das cassetes das portas de correr;
c) - indemnizar o autor pelo custo que terá (de) suportar para a reparação do defeito consistente no desalinhamento do painel central da parede da sala;
d) - indemnizar o autor pela desvalorização do imóvel decorrente do desalinhamento dos pilares e das demais paredes, (com exceção, portanto, do painel central da parede da sala), valor esse que não poderá ser inferior ao montante de 500 € já liquidado na sentença;
e) - indemnizar o autor pelos danos que se venha a apurar que sofreu após a instauração da petição inicial e que entretanto tenham decorrido dos defeitos de construção alegados na petição inicial que foram julgados provados;
2. Condena-se a ré a pagar ao autor o valor de 4 000 € para ressarcimento dos seus danos não patrimoniais.
3. Absolve-se a ré do pedido formulado pelo autor na alínea b) do ponto 4 do pedido (condenação da ré no pagamento de indemnização pelos juros remuneratórios do empréstimo hipotecário contraído pelo autor).
Pedida, pelo recorrente, em requerimento autónomo, a rectificação deste acórdão, foi proferido, em conferência, novo acórdão que concluiu pelo dispositivo seguinte:
Julga-se o recurso parcialmente procedente, revogando a sentença recorrida nos seguintes termos:
1- Condena-se a ré a pagar ao autor os valores que vierem a liquidar-se ulteriormente com vista a:
a) - indemnizar o autor pelo custo que terá suportar para a reparação do defeito relativo ao isolamento térmico da habitação referido na alínea 39 dos factos provados e que vá para além do valor de 6 920, 20 € já fixado;
b) - indemnizar o autor pelo custo que terá suportar para a reparação do defeito consistente no desalinhamento das cassetes das portas de correr.
c) - indemnizar o autor pelo custo que terá suportar para a reparação do defeito consistente no desalinhamento do painel central da parede da sala;
d) - indemnizar o autor pela desvalorização do imóvel decorrente do desalinhamento dos pilares e das demais paredes, (com exceção, portanto, do painel central da parede da sala), valor esse que não poderá ser inferior ao montante de 500 € já liquidado na sentença;
e) - indemnizar o autor pelos danos que se venha a apurar que sofreu após a instauração da petição inicial e que entretanto tenham decorrido dos defeitos de construção alegados na petição inicial que foram julgados provados;
f) indemnizar o autor, mediante pagamento de valor a liquidar ulteriormente, pelo dano decorrente da privação do uso do imóvel.
2. Condena-se a ré a pagar ao autor o valor de 4 000 € para ressarcimento dos seus danos não patrimoniais.
3. Absolve-se a ré do pedido formulado pelo autor na alínea b) do ponto 4 do pedido (condenação da ré no pagamento de indemnização pelos juros remuneratórios do empréstimo hipotecário contraído pelo autor).
O autor interpôs do acórdão objecto de rectificação, recurso ordinário de revista, normal ou comum e, subsidiariamente, de revista excepcional, no qual pede a sua revogação e substituição por outro que decida que tendo sido decretada a resolução do contrato de empreitada não deve o A/Recorrente ser condenando a pagar o respetivo preço, já que da resolução resultam efeitos retroativos.
Os fundamentos da revista, expostos nas conclusões, são os seguintes:
a. Pretende o Recorrente junto de V. Exa. ver resolvida a questão da compensação operada entre o valor que o Recorrente tem direito a receber pelos defeitos na obra e o valor que tem (no seu entendimento, não tem) a pagar à sociedade empreiteira Recorrida.
b. Resulta dos factos provados que:
i. A Ré / Recorrida é uma sociedade por quotas que tem como objeto social: construção, restauro e ampliação de edifícios residenciais e não residenciais, obras de engenharia civil e outras obras publicas e privadas e tem como gerentes BB e CC.
ii. O Autor / Recorrente adquiriu um lote de terreno para construção, no qual veio a ser (parcialmente) construída uma casa destinada à habitação, unifamiliar, sita na Rua 1, na freguesia de Vilarinho do Bairro, em Vilarinho do Bairro,
iii. Em maio de 2016, Autor / Recorrente e Ré / Recorrida celebraram um acordo verbal mediante o qual o segundo se comprometeu perante o primeiro a proceder à construção do imóvel referido
iv. O A./ Recorrente solicitou à Ré um orçamento global de obra, para efeitos de pedido de empréstimo, o qual foi elaborado e entregue em maio de 2016 e que orçava pelo preço de € 140.090,00 acrescido de IVA.
v. Deste valor o Autor/ Recorrente contraiu empréstimo bancário para o efeito e entregou à Ré a quantia total de 67.000,00
vi. As obras (de construção civil) iniciaram-se a setembro de 2016.
vii. Em fevereiro de 2018 a Ré abandonou a obra
viii. Em 04 de Julho de 2018 o Autor enviou uma carta à Ré comunicando-lhe a existência de diversas anomalias de acordo com o relatório efetuado por uma engenheira civil.
ix. Esta carta, na parte final refere o seguinte:
x. O Autor / Recorrente, através de outro mandatário enviou uma carta em 06.09.2019 onde dava conta dos prejuízos causados pelo atraso na conclusão da obra, carta essa que foi recebida pelo gerente da ré – o Sr. BB em 09.09.2019.
c. Ficou amplamente provado que a moradia padece vários e graves defeitos devido à forma como a Autora executou os trabalhos que lhe estavam adjudicados
d. O tribunal de primeira instância refere que a Ré/ Recorrida tem que pagar ao autor o valor total de 46.845,60 € (valor que depois é alterado pelo Tribunal da Relação do Porto, uma vez que aumenta o valor dos danos não patrimoniais para a quantia de 4.000,00€ e que será certamente superior, dado que foram relegados valores para liquidação de sentença).
e. Por sua vez, refere também o tribunal de primeira instância quanto ao pedido reconvencional que a Ré vem pedir o valor das obras orçamentadas, feitas e não pagas, sendo que 10.602,50 € se referem a obras já faturadas e 17.253,83 € (14.027,50 € mais IVA), a obras ainda não fraturadas.
f. A Ré vem pedir igualmente o valor de trabalhos a mais realizados e ainda não pagos. Esses trabalhos, foram do valor de 2400,00€.
g. E conclui que o Autor / Recorrente é devedor dessa quantia, no valor global de 30.256,33 €, como preço pelas obras realizadas. A esse valor há que descontar o valor de 2.520,00 € (ponto 28 dos factos provados) relativo aos sacos de cimento pagos pelo Autor. Assim deve o Autor à Ré o valor de 27.736,33 €.
h. Operando-se, desde já, a compensação entre as duas quantias deve a Ré pagar ao Autor a quantia de 19. 109,27 €.
i. É importante desde já salientar que o tribunal de primeira instância configura o contrato celebrado entre as partes como um contrato de empreitada de consumo (“ Ora, em causa está um contrato celebrado com um consumidor final, o dono da obra, pelo que se aplica ao caso presente o DL n.º 67/2003, de 08 de abril vigente no momento da celebração do contrato e no momento da propositura da ação.”
j. Diz o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, que ora se recorre que : “ O autor pediu que os defeitos – que deveria ter sido a ré a reparar -, fossem por ela custeados porque a mesma não procedeu a tal reparação, apesar de lhe ter sido solicitada, e tal pretensão procedeu. Ou seja, a ré está obrigada a pagar ao autor a reparação dos defeitos considerados reparáveis. Também procedeu o seu pedido de indemnização pelos defeitos não suscetíveis de reparação, na medida em que se manterão e desvalorizam o imóvel. Procederam também as suas pretensões de ser indemnizado pelos danos que se provou que teve e previsivelmente terá por causa do incumprimento da ré consubstanciado na má execução dos trabalhos a que estava obrigada. Ou seja, o autor será integralmente ressarcido pelos danos sofridos pelo incumprimento contratual da ré que ficou provado e uma parte da indemnização (fixada e ainda a liquidar) visa eliminar os defeitos da obra. Pelo que não pode, como é manifesto, pretender também ser absolvido do pedido de condenação no pagamento do preço dos trabalhos executados.”
k. Sucede que, com o devido respeito, há um pormenor a ter em atenção: é que o A / Recorrente pagou parte do preço acordado – veja se a matéria de facto provada.
l. É certo que o orçamento foi de € 140.090,00 acrescido de IVA, mas para efeitos meramente bancários.
m. Também é certo e ficou provado que o A pagou o valor de e 67.000,00€ (sessenta e sete mil euros)
n. Mas, também ficou provado que as obras iniciaram-se a setembro de 2016 e que em fevereiro de 2018 a Ré abandonou a obra.
o. Também ficou provado que em 05 de fevereiro de 2018 o A. era “ devedor” a Ré da quantia de € 15.602,50 €.
p. A Ré / Recorrida abandona a obra com uma suposta dívida por parte do Autor de 15.602,50
q. Após isso, em julho de 2018, o Autor envia uma carta à Recorrida a denunciar os defeitos da obra.
r. Como é natural, com o devido respeito, com tantos defeitos da obra ( que ficaram provados), não se sentia o A. obrigado a pagar o remanescente do preço quando não só o recorrido tinha abandando a obra como o que estava feito até então estava mal ( pessimamente mal) feito.
s. Pelo que não se percebe, com o devido respeito como é que no final o A tem que pagar ao R o valor de 27.736,33 €.
t. Conforme referido supra é mister voltar a frisar que estamos perante um contrato celebrado com um consumidor final, o dono da obra, pelo que se aplica ao caso presente o DL n.º 67/2003, de 08 de abril.
u. Refere o art. 4º n.º 1 deste diploma que “1 - Em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato.
v. Estabelece também o art. 5 n.º 1 que “O consumidor pode exercer os direitos previstos no artigo anterior quando a falta de conformidade se manifestar dentro de um prazo de dois ou de cinco anos a contar da entrega do bem, consoante se trate, respetivamente, de coisa móvel ou imóvel.
w. Os direitos do dono da obra, seja relação de consumo ou não, são os mesmos quer no regime especial quer na lei geral: são, de acordo com o art. 4.º/1 do DL 67/2003, o direito de reparação das faltas de conformidade, o direito de substituição da obra, o direito à redução adequada do preço e o direito à resolução do contrato;
x. Exatamente os mesmo dos art. 1221.º e 1222.º do C. Civil (sendo aqui os dois primeiros designados como direito à eliminação dos defeitos e à realização de obra nova).
y. Enquanto no regime do C. Civil vigoram regras relativamente rígidas que estabelecem várias relações de subsidiariedade e de alternatividade entre aqueles direitos, que limitam e condicionam o seu exercício,
z. No âmbito do DL 67/2003 os direitos do dono da obra consumidor são independentes uns dos outros,
aa. Ou seja, perante o caso dos autos, onde ficaram provadas faltas graves de conformidade na obra realizada,
bb. O Recorrente, dono desta, pode exercer livremente qualquer um dos direitos conferidos pelo art. 4.º/1 do DL 67/2003
cc. No presente caso, os defeitos provados são graves, o empreiteiro abandonou a obra, não concluiu a obra no tempo que se comprometeu, não corrigiu os defeitos, o que levou, naturalmente, o A proceder à resolução contratual.
dd. E aqui, operada a resolução, a relação de contas entre as partes, tem obrigatoriamente, na opinião do A., que entrar na relação de liquidação, tal como é explicado no Acórdão fundamento.
ee. Como sabemos não podemos aplicar literalmente a lei porque em último caso levaria a uma demolição total da obra ( face aos graves defeitos provados).
ff. Facto que, aliás, o Sr. Perito refere no seu relatório pericial que em muitos casos ( a título de exemplo, desalinhamento de paredes interiores e acabamentos de esquadrias, pilar Sul/Poente), a única solução passaria mesmo pela demolição….
gg. Afirmando ainda o Sr. Perito no seu Relatório e nos diversos esclarecimentos prestados ao longo do processo o evidente incumprimento do projeto de betão/estrutural frisando que inexiste solução (situação que assim permanece, com o futuro incerto quanto à própria estrutura da moradia em causa)
hh. Mas nem foi esse, naturalmente, o pedido do A. / Recorrente.
ii. O A. / Recorrente pediu a resolução do contrato de empreitada celebrado com a recorrida.
jj. Com o objetivo de se desvincular do pagamento do remanescente do preço acordado, pois que
kk. Face a todo o historial de problemas que já tinha com o empreiteiro (entre abandono da obra e invocação de defeitos graves).
ll. É irrazoável, com o devido respeito, obrigar o A. a pagar o remanescente do preço quando o que o empreiteiro executou mal os trabalhos, abandonou a obra e não corrigiu os defeitos!
mm. Operada a resolução contratual só existe, no entendimento do A., um caminho a seguir: dispensa o titular do direito à resolução do dever de cumprir, daqui resultando que o faltoso também não é obrigado a cumprir.
nn. É caso para questionar: então se a empresa Recorrente não elimina os defeitos, é justo que o A. pague o resto do preço ? Não é.
oo. O que significa que o A / Recorrente não tem que cumprir a prestação do preço ainda não pago;
pp. E, por sua vez, a R/apelante já não tem que concluir e executar a obra sem defeitos.
qq. Como bem salienta o acórdão fundamento que se junta:
“ Trata-se duma consequência/efeito da mera função (liberatória) de desvincular os contraentes das prestações contratuais ainda não cumpridos[13]; com o que apenas extraímos as inevitáveis consequências decorrentes da resolução dispensar o titular do direito à resolução do dever de cumprir e, por consequência, também o faltoso.
rr. O tribunal de primeira instância resolve o contrato celebrado entre as partes.
ss. Mas, com o devido respeito, a resolução já tinha operado e produzido os seus efeitos a partir do momento que o A. envia a primeira carta que chegou a conhecimento do Re, reúne com ele para corrigir efeitos, envia nova carta e tudo continua na mesma - com defeitos.
tt. Estando resolvido o contrato de empreitada, esta resolução tem uma dupla função – liberatória e restitutória – embora a questão dos seus efeitos só ganhe significado quando assume a função restitutória, quando se entre verdadeiramente na “relação de liquidação”.
uu. Efetivamente, pressupondo a resolução, via de regra (de que a relação de consumo é em certa medida um desvio), uma prévia situação de incumprimento definitivo, deste resulta – sem necessidade do exercício da faculdade alternativa do art. 801.º/2 do CC – a função liberatória (cfr. art. 795.º/1 do CC).
vv. Parece evidente que o empreiteiro, por força da sua função liberatória/desvinculativa”, já não tem que concluir e deixar a execução da obra sem defeitos.
ww. Razão pela qual, naturalmente, o dono da obra pode impedir o empreiteiro de entrar na obra e executar nela quaisquer trabalhos (a resolução extinguiu a relação contratual, que, repete-se, entrou em “relação de liquidação”).
xx. Então e o A / Recorrente tem de pagar o resto do preço ?
yy. Tendo por base este raciocínio, a lei geral prevê expressamente a cumulação da resolução com a indemnização (art. 801.º/2, 802.º/1 e 1223.º, todos do CC);
zz. Indemnização que tem a sua previsão, quanto às empreitadas de consumo, no art. 12.º/1 da LDC (na redação dada pelo DL 67/2003)
aaa. E aqui radica a diferença que foi assumida pelo Tribunal Da Relação do Porto e que o recorrente não aceita, sobretudo depois de o tribunal de primeira instância ter classificado o contrato como uma empreitada de consumo.
bbb. Isto porque, na lei geral, há um direito claramente residual, isto é, o dono da obra só tem direito a ser indemnizado, nos termos do art. 1223.º, relativamente aos prejuízos que não obtiverem reparação através dos direitos conferidos pelos art. 1221.º e 1222.º do C. Civil, pelo que pode ser exercido cumulativamente com o exercício desses direitos, ou isoladamente, nas hipóteses em que se revele o único meio de reparação do prejuízo resultante da existência do defeito.
ccc. Contudo, bem sabe o recorrente que esta cumulação poderá ter diversas interpretações tendo por base o seguinte:
ddd. A indemnização deve colocar o credor na situação em que estaria se o contrato tivesse sido cumprido (tese do ressarcimento do interesse contratual positivo ou interesse de cumprimento, visando colocar o lesado na situação em que estaria se o contrato tivesse sido cumprido) OU
eee. Visa apenas compensar o credor pelas desvantagens sofridas com a conclusão do contrato (tese do ressarcimento dos danos correspondentes ao interesse contratual negativo, isto é, uma indemnização que o coloque na situação em que estaria se não tivesse sequer celebrado o contrato).
fff. Para responder importa trazer novamente à colação o acórdão fundamento que refere: “
Como observa Paulo da Mota Pinto[20], “uma irrestrita retroatividade da resolução poria evidentemente em causa, não só o fundamento de uma indemnização por não cumprimento, como, mesmo, o fundamento da resolução, isto é, a existência de um não cumprimento, já que o parâmetro contratual teria desaparecido ex tunc. É, com efeito, a própria fundamentação do direito de resolução no não cumprimento que já pressupõe uma limitação da retroatividade pelo fundamento da resolução. Ora, uma posição dogmaticamente consistente deve ligar o fundamento à finalidade da resolução. A resolução como remédio sinalagmático para o inadimplemento (…), não deve pôr em causa outras consequências do não cumprimento não consumidas por aquele, contrariando-as, nem atribuir uma posição ao resolvente que já aparece sem qualquer relação com o fundamento (como uma posição melhor do que aquela em que o lesado estaria com o cumprimento). A contenção da retroatividade da resolução por não cumprimento é, pois, justificada porque um efeito retroativo ilimitado iria contrariar o fundamento e própria finalidade da resolução (que é reagir a um inadimplemento, afastando as suas consequências sobre o sinalagma contratual)”. Enfim, “ (…) se o argumento da retroatividade não poderia nunca, pois, ser levado às últimas consequências, sob pena de contrariar o próprio fundamento da resolução (…), a verdade é que tal argumentação passa também ao lado da questão, decisiva, do fundamento para a atribuição de uma indemnização ao credor, e a sua relação com a medida desta”[21].
Dito doutro modo, a resolução e a indemnização constituem distintos “remédios” para o inadimplemento contratual: “o primeiro, com origem no sinalagma das prestações, permitindo a restituição do prestado; o segundo com fins ressarcitórios, conduzindo ao ressarcimento dos prejuízos (sendo que existe, evidentemente, interferência do primeiro no segundo por com o cumprimento das obrigações de restituição ficar reduzido o dano)”[22]. Assim, a “resolução possibilita ao credor afastar as consequências, no plano qualitativo, do inadimplemento, obtendo a restituição da sua contraprestação, sem, porém, pôr o credor perante a alternativa de ter de renunciar ao lucro cessante do contrato – sendo certo, aliás, que as referidas dimensões (o lucro económico do contrato e o interesse na prestação que lhe era devida em espécie) não estavam colocadas em alternativa no programa do contrato não cumprido, antes este proporcionava às partes a satisfação simultânea de ambas (e que é apenas por causa do não cumprimento que tal satisfação é impossibilitada)”[23]
Em conclusão, concordando-se com Paulo Mota Pinto, impõe-se reconhecer e considerar que não é possível desligar a resolução contratual do fundamento que esteve na sua origem e que é, nem mais nem menos, um incumprimento contratual; e impõe-se observar e considerar que, em caso de não cumprimento imputável ao devedor, a “solução” que dá expressão ao acordo contratual nas suas dimensões qualitativa e quantitativa é, inquestionavelmente, a que impede que o credor tenha de efetuar a sua contraprestação junto do devedor inadimplente para receber uma indemnização pelo lucro que o contrato lhe proporciona.
E, por tudo isto, também temos entendido ser admissível, em casos como o presente, a cumulação da resolução do contrato com o pedido de indemnização pelo interesse positivo.
Não há/havia pois, em tese e a nosso ver, nenhum obstáculo jurídico ao 2.º pedido de danos patrimoniais do A/apelado – em que este pede a quantia necessária à conclusão das obras e à reparação dos defeitos – pedidos que claramente visam colocar o A/apelado na situação em que estaria se o contrato tivesse sido cumprido e que por isso correspondem ao interesse contratual positivo ou interesse de cumprimento”.
ggg. Impõe se assim, concluir como conclui o acórdão fundamento:
1. Não é possível desligar a resolução contratual do fundamento que esteve na sua origem e que é, nem mais nem menos, um incumprimento contratual;
2. Impõe-se observar e considerar que, em caso de não cumprimento imputável ao devedor, a “solução” que dá expressão ao acordo contratual nas suas dimensões qualitativa e quantitativa é, inquestionavelmente, a que impede que o credor tenha de efetuar a sua contraprestação junto do devedor inadimplente para receber uma indemnização pelo lucro que o contrato lhe proporciona.
3. E, por tudo isto, também temos entendido ser admissível, em casos como o presente, a cumulação da resolução do contrato com o pedido de indemnização pelo interesse positivo.
hhh. Resolvido o contrato, o A/Recorrente não tem que cumprir a prestação do preço ainda não pago e a Ré não tem que concluir e/ou executar a obra sem defeitos.
iii. Trata-se duma consequência/efeito da mera função (liberatória) de desvincular os contraentes das prestações contratuais ainda não cumpridos, com o que apenas se extraem as inevitáveis consequências decorrentes da resolução dispensar o titular do direito à resolução do dever de cumprir e, por consequência, também o faltoso.
Não foi oferecida resposta.
A Sra. Juíza Desembargadora Relatora, notando que o objecto do recurso incide apenas sobre a decisão relativa ao pedido reconvencional, em que o acórdão recorrido confirmou a sentença de primeira instância sem fundamentação essencialmente diferente, o que o torna irrecorrível nos termos do artigo 671.º, número 3 do Código de Processo Civil, admitiu-o, todavia, como revista excepcional.
2. Delimitação do âmbito objectivo do recurso, individualização da questão concreta controversa que deve ser resolvida e determinação da espécie da revista.
Como o âmbito objetivo da revista é delimitado, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, pelo objecto da acção, pelos casos julgados formados nas instâncias, pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, e pelo recorrente, ele mesmo, designadamente nas conclusões da sua alegação, é uma só a questão concreta controversa que importa resolver: a de saber se o recorrente deve ser desvinculado do cumprimento da obrigação de pagamento, á recorrida, do remanescente do preço da empreitada a que as instâncias o adstringiram e, consequentemente, se o crédito correspondente não deve ser incluído nos créditos de que a recorrida é credora e que a decisão da 1.ª instância, confirmada nessa parte, pelo acórdão recorrido, declarou extintos, por compensação, com aqueles de que é credor o recorrente (art.ºs 635.º n.º 4, 639.º, n.º 1, e 608.º, n.º 2, ex-vi art.º 663.º, n.º 2, do CPC).
A dilucidação do problema enunciado vincula, naturalmente, ao exame dos efeitos da resolução contrato de empreitada indubitavelmente concluído entre o recorrente e a recorrida.
Previamente, porém, importa resolver uma questão puramente procedimental: a de saber qual é a espécie adequada da revista: se a revista normal ou comum, interposta a título principal, se a revista excepcional, subsidiariamente interposta.
2.1. Admissão do recurso como revista normal ou comum.
A recorrente interpôs do acórdão que julgou o seu recurso de apelação recurso de revista normal ou comum e, subsidiariamente, recurso de revista excepcional. A Sra. Juíza Desembargadora, com fundamento em que o recurso tem por único objecto a decisão de condenação do recorrente no pedido reconvencional e que o acórdão confirmou essa condenação, sem uma fundamentação essencialmente diferente, admitiu o recurso como revista excepcional.
O recurso de revista excepcional só é admissível se a revista, ordinária ou comum, o não for por força da causa de exclusão da recorribilidade dos acórdãos da Relação, de largo espectro, representada pela chamada dupla conforme, de harmonia com a qual não é admitida revista daqueles acórdãos, sempre que confirmem, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância (art.º 671.º, n.º 3, do CPC). Com este causa de irrecorribilidade visa-se racionalizar o acesso ao Supremo e acentuar a função que é característica dos tribunais supremos: a uniformização de jurisprudência. A restrição pode também justificar-se quer pela suficiência e a adequação da actividade do tribunal, que – numa perspectiva abstracta e formal - parte do princípio de que é suficiente a decisão acorde de dois tribunais e abstrai da importância da decisão para as partes, em especial, para o eventual recorrente, e da relevância dos fundamentos da sua impugnação – diversos daqueles que justificam que o recurso de revista seja sempre admissível – quer pela falta de interesse processual do recorrente: a parte que viu a sua pretensão ser julgada de modo idêntico pelas duas instâncias, não carece mais de interesse processual1. No entanto, em certos casos excepcionais, a revista é admissível (art.ºs 671.º, n.º 3, in fine, e 672.º. n.º 1, do CPC)
Como a conformidade das decisões das instâncias exclui o recurso de revista que, doutro modo, seria admissível, o que importa determinar é se essas decisões são conformes – duae conformes sententiae - não se são desconformes, pelo que se aquelas decisões não forem inteiramente coincidentes, o que interessa determinar é se essa não coincidência equivale a uma não-conformidade. As decisões das instâncias podem ser conformes, mesmo que entre elas se registe alguma desconformidade, o que é confirmado pela regra de que as decisões das instâncias são conformes se as respectivas fundamentações, apesar de distintas, não forem essencialmente diferentes (art.º 671.º, n.º 3, do CPC). Para verificar se o acórdão da Relação é conforme ou desconforme perante a decisão da 1.ª instância há que considerar os elementos das duas decisões. E entre os elementos das duas decisões, interessantes para a avaliação ou aferição daquela conformidade releva, desde logo, a fundamentação: se a fundamentação das decisões das instâncias for homótropa ou não for essencialmente diferente, a revista é inadmissível; se, porém, a motivação do acórdão da Relação for essencialmente distinta, aquele recurso ordinário é admissível.
Apesar de alguma flutuação de formulações, por fundamentação essencialmente diversa este Tribunal tem entendido, não aquela que seja divergente no tocante a aspectos marginais, subalternos ou secundários - mas a que assente numa ratio decidendi inteiramente distinta, como sucede quando radica em institutos ou normas jurídicas completamente diferenciadas ou quando, movendo-se embora no âmbito do mesmo instituto ou norma jurídica, os interpreta de modo inteiramente divergente, aplicando ao objecto do processo um enquadramento jurídico marcadamente diferenciado que se repercuta, decisivamente, na solução jurídica da controvérsia2.
Pode compreender-se que a lei retire de uma dupla sucumbência da parte, a inadmissibilidade do recurso de revista, normal ou comum. Mas é também compreensível que a lei exija para que se verifique essa dupla sucumbência a conformidade, tanto da decisão como da fundamentação das decisões das instâncias, como a unanimidade ou o sentido concordante dos votos dos juízes que intervieram no julgamento da apelação, quer quanto à decisão, quer quanto aos fundamentos.
No caso, é clara essa conformidade no plano da decisão em sentido estrito, dado que ambas as instâncias são acordes ou convergem na conclusão de que o recorrente deve ser condenado a pagar parte do preço convencionado da empreitada de que é devedor. Mas, comprovadamente, as instâncias divergem quanto ao fundamento dessa condenação. Ao passo que a 1.ª instância, sem nunca ponderar sequer os efeitos, desvinculantes e restituitório, da resolução do contrato de empreitada que ela mesma, constitutivamente declarou, assentou essa condenação no simples dever de cumprimento da obrigação de pagamento daquele preço que o autor não prestou voluntariamente, a Relação, diferentemente, baseou essa condenação, no efeito restitutivo ou restituitório da resolução e, de modo mais conspícuo, na proibição do enriquecimento sine causa (art.ºs 817.º, 433.º e 473.º n.º 1, do Código Civil),
É assim, patente, que no plano da motivação, as decisões das instâncias não são coincidentes, sendo distintas quanto ao fundamento com base no qual o recorrente deve ser vinculado à obrigação de pagamento daquele preço, não coincidência, que se resolve numa fundamentação essencialmente diversa e, portanto, equivale a uma não conformidade.
Tendo-se isto por certo, segue-se, como corolário que não pode ser recusado, que não verifica obstáculo à admissibilidade da revista normal ou comum representado pela duae conformes sententiae e, logo, que aquela revista é admissível e que a revista excepcional o não é.
O recurso deve, pois, ser admitido como revista normal ou comum.
3. Fundamentos.
3.1. Fundamentos de facto.
O Tribunal de que provém o recurso, na sequência do exercício das suas competências de controlo da correcção da decisão da matéria de facto, estabilizou e enunciou os factos materiais da causa nos termos seguintes:
3.1.1. Factos provados.
1 – A Ré é uma sociedade por quotas que tem como objeto social: construção, restauro e ampliação de edifícios residenciais e não residenciais, obras de engenharia civil e outras obras publicas e privadas e tem como gerentes BB e CC.
2 - O Autor adquiriu um lote de terreno para construção, no qual veio a ser (parcialmente) construída uma casa destinada à habitação, unifamiliar, sita na Rua 1, na freguesia de Vilarinho do Bairro, em Vilarinho do Bairro, inscrita na matriz predial urbana da freguesia de Vilarinho do Bairro, sob o artigo urbano número ..96 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Anadia sob o número ...........04 a favor do Autor.
3 - A fim de construir a moradia referida em 2 o Autor apresentou projeto à Câmara Municipal de Anadia o qual foi aprovado por despacho de 08.06.2016 tendo sido emitido o correspondente alvará de licenciamento administrativo de obras em 15.07.2016.
4 - Em Maio de 2016, Autor e Ré celebraram um acordo verbal mediante o qual o segundo se comprometeu perante o primeiro a proceder à construção do imóvel referido em 2.
5 - Tendo por objecto a empreitada referente ao alvoreamento da moradia, assim como aplicação de massas finas em toda a moradia.
6 - A. e Ré acordaram, pelo menos, na execução dos trabalhos preparatórios (cap. I do orçamento), a demolição e movimentos de terra ( Cap. II do orçamento), a estrutura de betão ( Cap. III do orçamento), as alvenarias ( Cap. IV do orçamento), a cobertura ( Cap. V do orçamento), as cantarias ( Cap. VI do orçamento), os revestimentos ( Cap. VII do orçamento) dos pavimentos - mas apenas o fornecimento e assentamento de betonilha de enchimento (ponto 1.1 do capitulo VII do orçamento) e revestimento de paredes – mas apenas no fornecimento e aplicação do sistema térmico (ponto 2.1 do capitulo VII do orçamento), execução de salpisco, emboço e areado fino em paredes exteriores e interiores de cave; execução de salpisco, emboço e areado fino em tectos da cave e tectos do terraço (pontos 2.2; 2.3; 2.4; 3.2 do capitulo VII do orçamento) e ainda fornecimento e aplicação de 265 m2 de isolamento térmico em cobertura do tipo “roofmate” com 5 cm de espessura (ponto 1 do capitulo VIII do orçamento), sendo o valor/preço a pagar o que constava no orçamento referente a cada capitulo em concreto.
7 - O autor adjudicou outros contratos directamente sem conhecimento ou intervenção da Ré, nomeadamente quanto a aplicação de madeiras e serviços de carpintaria, aplicação de caixilharias em alumínio, pintura, instalação elétricas, ITED, redes de abastecimento de agua, redes de drenagem de aguas residuais, redes de drenagem de aguas pluviais, redes de gás, inter comunicador, louças sanitárias, aquecimento central, serviços de serralharia.
8 - Contudo, para apresentação de orçamento e pedido de empréstimo junto de instituição bancária, o A. solicitou à Ré um orçamento global de obra, o qual foi elaborado e entregue em Maio de 2016 e que orçava pelo preço de € 140.090,00 acrescido de IVA.
9 - Deste valor o Autor contraiu empréstimo bancário para o efeito e entregou à Ré a quantia total de 67.000,00€ (sessenta e sete mil euros) da seguinte forma:
- 12.000,00€ (doze mil euros) em dinheiro;
- 55.00,00€ (cinquenta e cinco mil euros) através de cheques e transferências bancárias
10 - As obras (de construção civil) iniciaram-se a Setembro de 2016.
11 - Em Fevereiro de 2018 a Ré abandonou a obra
12 - Em 05 de Fevereiro de 2018 o A. era devedor a Ré da quantia de € 15.602,50.
13 - Em 04 de Julho de 2018 o Autor enviou uma carta à Ré comunicando-lhe a existência de diversas anomalias de acordo com o relatório efectuado por uma engenheira civil.
14 - Em 22 de Agosto de 2018 o Autor convocou uma reunião com o diretor técnico da obra (Eng. DD) o legal representante da Ré – Sr. BB; o A., o pai do A. EE e ainda um amigo do A. – FF.
15 - Essa reunião teve por objetivo demonstrar ao diretor técnico da obra os defeitos reclamados, por forma a este comprovar perante o empreiteiro que os defeitos existiam e que tinham que ser corrigidos ou eliminados.
16 - Após a visita à obra, os defeitos foram constatados e ficou agendada nova reunião com o legal representante da Ré para o dia 24.08.2018 de forma a dar soluções para a eliminação e correção de todos os defeitos.
17 - No dia 24 de Agosto de 2018 foi realizada nova reunião em obra onde estiveram presentes, o legal representante da Ré, o Autor e o pai deste.
18 - Dessa reunião surgiu um acordo para a correção / eliminação de defeitos que a Ré, acordo este depois reduzido a escrito e que a Ré não assinou.
19 - Nesse seguimento, a Ré comprometeu-se que entre Setembro / Outubro de 2018 retomava a construção da obra com a eliminação dos defeitos.
20 - No entanto, a correção dos defeitos só se iniciou após diversas insistências da Autora, por mails, como aconteceu em 07.09.2018 e em 21 de setembro de 2018, em 19.10.2018 e em 28.
21 - Nos dias 19 e 20 de Novembro de 2018 foi iniciada a correção de defeitos, nomeadamente com a correção do piso da sala.
22 - Do valor referido em 13 foi pago pelo autor a 27 de Outubro de 2018 o valor de 5000,00 €.
23 - Para além do valor referido em 13 e 23 o Autor executou trabalhos no valor de €14.027,50 (valor sem IVA), ainda não facturados e que não se encontram pagos.
24 - Em 05.01.2019 o Autor enviou email à Ré com o assunto piso das varandas –reclamação e com o seguinte conteúdo “Verifiquem o que aqui está bem”.
25 - Em 04.02.2019 o Autor remete novo email à Ré dando lhe conta que a chaminé da casa do forno tem cerca de 2 cm fora de esquadria em relação as outras paredes.
26 - O Autor, através de outro mandatário enviou uma carta em 06.09.2019 onde dava conta dos prejuízos causados pelo atraso na conclusão da obra, carta essa que foi recebida pelo gerente da ré – o Sr. BB em 09.09.2019.
27 - Para além dos trabalhos realizados conforme orçamento, a Ré/ Reconvinte ainda efectuou, pelo menos, os seguintes serviços “extras” na obra do Autor/reconvindo, a pedido deste:
- aplicação de tela na parede exterior: € 600,00;
- Vão de abertura e pedras na janela da Cozinha do Forno: 200,00 €;
- Cassetes das portas de correr: € 400,00;
- Telhado: € 1.000,00;
- Chaminé maior – forno e fogão: 200,00 €;
28 - O Autor comprou, a expensas suas, 1000 sacos de cimento no valor de 2520,00 €, a descontar no valor devido pelo Autor.
29 - A moradia tem vários defeitos devido à forma como a Autora executou os trabalhos que lhe estavam adjudicados, anomalias descritas nos pontos 30 a 32 dos factos provados. Assim;
30 - Na cave:
a) - Existe alguma fissuração nas paredes mais predominantemente no exterior que no interior.
b) - Constata-se a existência de matéria orgânica nas massas finas, com evidente desintegração desses compostos, o que conduzirá à formação de ocos ou chochos e a desagregação prematura das superfícies.
c) - Os tectos e paredes interiores e exteriores não tem acabamento perfeito, sendo evidentes a falta de uniformidade da textura da superfície, as marcas de ferramentas utilizadas, os desvios de planaridade das superfícies, com consequências meramente estéticas.
d) - Assinala-se uma diferença de esquadria generalizada entre paredes e tectos devida ou à falta de verticalidade das paredes ou à falta de horizontalidade dos tectos.
e) - Os tectos e paredes da cave mostram sinais de humidade causadas por infiltrações, para além de manchas denotando falta de controlo e distribuição homogénea de água, ligantes e inertes na aplicação das argamassas.
f) - Os pilares encontram-se ligeiramente desaprumados, havendo um desvio de cerca de 2,5 cm da base ao capite de um dos pilares em relação ao outro.
g) - Não foi executada a ombreira na porta da “casa do forno” e a ombreira do portão da cave.
h) - O piso da cave encontra-se em adiantado estado de desagregação e aparenta falta de coesão, tendo sido aplicada betonilha de regularização com uma dimensão de 3 cm em vez dos 5 cm previstos, sendo a base de assentamento da betonilha em saibro amarelo (material sem aglutinantes) e não uma argamassa com inertes com ligantes adequados, como deveria ter sido.
h)i - O piso aplicado, que se destina à recepção de material cerâmico, não apresenta características razoáveis e suficientes de resistência para suportar cargas e para resistir moderadamente à erosão provocada pelo uso, o que provocará a fendilhação e quebra (precoce) de qualquer material de revestimento que vier a ser aplicado no pavimento.
i) Há evidências de descontinuidade da tela pitonada junto à parede norte da habitação o que poderá levar à falta de drenagem de águas superficiais para o dreno de saneamento de águas da fundação e agressão com potencialidade de danos por parte do material do solo à membrana protectora e impermeabilizante dos elementos da fundação da edificação, com consequências de darem origem a fenómenos de infiltrações por ascensão, por capilaridade.
j) Há uma generalizada falta de esquadria nos vãos abertos (projecções no plano vertical) e falta de esquadria das ombreiras e padieiras (projecções no plano horizontal) dos vãos, afirmação consolidada na falta de coincidência dos remates entre caixilharias e vãos, o que causará problemas de vedação e afectando a estética.
31 - No rés-do-chão:
a) - Identificam-se ligeiros desalinhamentos de panos de parede descontínuos por interposição de vãos de portas interiores, e consequente perda de alinhamentos, com consequências meramente estéticas.
b) - As ombreiras e vergas ou padieiras das portas e janelas não se encontram perpendiculares com os planos das paredes, nem as arestas da intersecção dos planos, lineares, com consequências meramente estéticas com possibilidade de alguma disfuncionalidade.
c) - O acabamento de paredes no interior da moradia não foi feito conforme orçamento "massas projetadas", foi sim realizado reboco tradicional, massa fina de saco e barramento de gesso.
d) - São visíveis formações de calcites e compostos derivados de sais solúveis em meio aquoso com reacções adversas de inertes cálcicos (vulgo salitre), em algumas zonas das argamassas especialmente junto a pavimento, o que causará a desagregação das argamassas a médio/longo prazo, formação de calcites ou carbonatos de cálcio, normalmente designados por “saínha” e ou formação de musgos, fungos e outros microrganismos.
e) - As paredes exteriores registam pequenas imperfeições no acabamento, com pouco impacto visual.
f) - Os tectos exteriores apresentam alguma irregularidade fruto de intervenções efectuadas no ajuste de posicionamento e dimensão das luminárias embutidas e de outras intervenções, estando os tectos estão remendados junto aos pontos de luz.
g) - O pilar sul/poente da construção apresenta-se desalinhado da construção na empena poente, variação de dimensão ao longo do seu desenvolvimento e falta de verticalidade das suas faces.
h) - A parede de protecção norte da varanda encontra-se fissurada por assentamento da varanda, que é um elemento em balanço e que cedeu com a carga da parede, resultando daí consequências meramente estéticas.
i) Não foi executada uma ombreira no rés-do-chão que estava projectada.
j) Há evidências de desnível do pavimento do quarto norte/nascente com pendente de nascente para poente.
32 - Cobertura
a) Foram identificadas 2 vigas do telhado que apresentam fissuras/rachas e outras tantas ripas, sem consequências no que se refere às vigas e podendo causar aluimento de telhas com consequente empoçamento e dar origem a infiltrações, no caso das ripas.
b) há um nítido desalinhamento na entrega do telhado às cumeeiras e na fixação dos “tamancos” o que poderá causar infiltrações, especialmente pelo excesso de argamassa usada nos remates.
c) O revestimento das chaminés esta fissurado na generalidade da sua superfície, causando mau aspecto estético.
d) A telha aplicada no beirado não é telha de beirado, mas antes telha de cobertura, com consequências apenas estéticas.
e) Há telhas que se encontram levantadas pela existência de argamassa em excesso no posicionamento das ripas com a consente interferência no posicionamento das telhas,
f) Constata-se a existência de pequenas variações no comprimento do beirado, de água para água, cerca de 2.5 cm (máx. 16.5 e min 14 cm) mas com uniformidade dentro do mesmo alinhamento do beirado, sem consequências.
g) Não foi respeitado o projecto de isolamento térmico que previa uma laje aligeirada de 20 cm de espessura revestida inferiormente com estuque projectado e superiormente com XPS (poliestireno extrudido) de 9 cm de espessura
g.1) - A cobertura exibe, actualmente, a laje de 20 cm encontrando-se revestida inferiormente com placas de gesso cartonado de 1.2 cm, encimada por manta de lã de rocha de 4 cm de espessura, caixa-de-ar com cerca de 15 cm, e superiormente por XPS de 5 cm.
g.2) - Há algumas pequenas zonas, junto aos beirados, que não apresentam material de isolamento.
g.3) – No orçamento estava previsto o uso de Pladur e a aplicação de Roofmate de 5 cm
33 - A correcção das anomalias referidas nos pontos 30 a 32 (com excepção das referidas em 30 f), 31 a) e 31 g)) tem um valor de 28.511,50 €.
34 – A Ré não respeitou o projecto de isolamento térmico nas paredes exteriores e na laje do rés-do-chão. Assim:
35 - As paredes exteriores deveriam ser constituídas por parede dupla de tijolo 30x20x15 e 30x20x11 com 6 cm de XPS (material isolante), com correcção de pontes térmicas lineares, e rebocos de 2 cm por face, totalizando 36 cm.
37 - O orçamento apresentado e aceite previa quanto a paredes exteriores em tijolo 30x20x15 + 30x20x11 e no que se refere a revestimentos ETICS com 40 mm.
38 - As paredes exteriores foram construídas com os seguintes layers, do exterior para o interior:
i - Pintura Exterior
ii - Massas finas (0,5/0,7cm
iii - Reboco de argamassa (2 cm)
iv - Tijolo de barro vermelho com as dimensões 30x22x15, incorporando a estrutura de betão armado com a espessura de 22 cm
v - Poliestireno extrudido (XPS) de 2 cm de espessura
vi- Tijolo de barro vermelho com as dimensões de 30x20x11
vii- Reboco (2 cm)
viii - Estanhado de cimento (0,5/07 cm)
ix - Pintura interior.
39 - Com esta constituição, a estrutura da parede tem um coeficiente de transmissão térmica de 0,46 W/m2, superior ao valor de referência que tem como valor máximo 0,40, pelo que carece de uma solução complementar de isolamento térmico.
40 - Essa solução poderá passar pelo reforço do isolamento pelo exterior, através da colocação de capoto (utilização adicional de material isolante, EPS com 2mm de espessura), com um acabamento superficial de protecção.
41 - Tal aplicação, considerando os remates dos vãos com respectivos acessórios de prolongamento de soleiras, parapeitos e outros terá um custo de cerca de 6920,00 € mais IVA.
42 - No pavimento do rés-do-chão sob o material de revestimento (pavimento flutuante) e a laje aligeirada, foi usado um argamasso de regularização com 9/10cm de espessura sem aditivação de qualquer material de baixa densidade, como é o caso de argila expandida (Leca) ou EPS granulado.
43 - Não existe qualquer solução de isolamento térmico deste pavimento, sobre o espaço não útil da habitação, sendo que o projecto de isolamento térmico previa a colocação de XPS com 8 cm de espessura.
44 - A correcção deste defeito orçará em 5.750,00 € mais IVA.
45 - As obras de isolamento térmico descrito têm de ser objecto de um projecto de isolamento e comportamento técnico de edifícios que terá um custo de cerca de 750,00 €.
46 - O muro de contenção de terras do jardim no seguimento da parede da frente da casa, construído pela Ré, encontra-se deformado e exibe patologias que evidenciam a sua falta de estabilidade e eminência de colapso.
47 – A reparação passa pela demolição e construção de novo muro com um custo de 4.000.,00 €
48 – Relativamente às portas aplicadas nas cassetes existem diferenças nos alinhamentos com os aros, fruto de má aplicação das cassetes, uma vez que a verticalidade das portas é garantida pela gravidade função do peso e do sistema de suspensão na calha de rolamento da guia, o que causará que as portas começarão a roçar nos aros, com prisão do movimento, poderão começar a emitir ruído de atrito e a ficar com as faces danificadas nas zonas de contacto, não havendo garantia de fecho efetivo das portas.
49 – A reparação passa pela desmontagem e montagem das cassetes com um custo de 2000,00 €.
50 - O desalinhamento dos pilares referido em 30 f) e 31 g) bem como os das paredes não são reparáveis, com exceção do painel central da parede da sala entre as duas portas ali existentes, que pode ser picado e refeito para eliminar o desalinhamento de que padece.
51 - Tais problemas / defeitos referidos põem em causa a qualidade de vida que o Autor almejava encontrar na nova casa que viu perturbada a sua possibilidade de, em tempo útil, gozar a esperada tranquilidade e serenidade da casa
52 - Esta situação provocou e provoca grande desgosto no Autor.
3.1.2. Factos não provados.
a) Fosse acordado verbalmente que a obra ficaria terminada até Abril de 2018.
b) A primeira reclamação (verbal) ocorresse em Abril/Maio de 2017, altura em que o Autor invocasse os defeitos sobre o telhado.
c) No dia 22.01.2019 o Autor se dirigisse a casa do legal representante da Ré reclamar das cassetes (portas de correr) que estavam acima do piso acabado, 4/5 cm
d) Em fevereiro de 2019 a Ré abandonasse a obra e até à presente data nada mais dissesse, não atendendo mais os telefonemas ao Autor.
e) O autor tenha estado em obra a executar trabalhos até Julho de 2019.
f) Relativamente aos trabalhos extra tenha sido acordado:
O valor de 700,00 € pela aplicação de tela na parede exterior;
- O valor de €250,00 relativamente ao vão de abertura e pedras na janela da cozinha do Forno;
- O valor de 400,00 € pelo isolamento da cobertura;
- O valor de 500,00 € pelo enchimento do piso térreo da cave;
- O valor de 500,00 € pela colocação de um tubo de drenagem;
- O valor de 1500,00 €, relativamente ao telhado;
- O valor de € 500 € relativamente à chaminé maior;
g) Ao valor referido em 28 a Ré/reconvinte acordasse descontar a quantia de €350,00;
h) O betão aplicado não seja betão certificado como definido no projecto e orçamento;
i) Os rufos tenham sido mal aplicados;
j) O Autor tenha efectuado a reparações urgentes no valor de 1000,00 €;
k) O muro referido em 46 e 47 estivesse previsto no orçamento.
3.2. Fundamentos de direito.
É incontroverso que entre o recorrente e a recorrida foi concluído um – típico - contrato de empreitada, contrato de troca para a prestação de obra, no qual o primeiro figura na posição jurídica de dono da obra e, a segunda, na de empreiteiro, e do qual emergiu para aquele o direito de receber a obra que constitui o seu objecto mediato, nos moldes convencionados e, para esta, a de perceber o preço convencionado (art.º 1207.º do Código Civil). Trata-se, num esforço de maior concretização, de um contrato de empreitada de consumo, regulado, ao tempo da sua conclusão, pelas disposições combinadas da Lei de Defesa do Consumidor, aprovada pela Lei n.º 24/96, de 31 de Julho e pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, entretanto revogado pelo Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de Outubro, mas que não é aplicável aos contratos de empreitada celebrados antes da sua entrada em vigor – 1 de Janeiro de 2022 (art.ºs 2., n.º 1 e 3.º, a) e f) da LDC, 1-A, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, e 53.º, n.º 3, 54.º, al. b), e 55.º do Decreto-Lei n.º 84/21, de 16 de Outubro). Entre as especialidades de regime da empreitada de bens de consumo contam-se, designadamente, além da indiscutível ressarcibilidade dos danos não patrimoniais, as presunções da falta de conformidade – bastando a verificação de uma qualquer das situações indicadas para que se presuma a falta de conformidade (art.º 2, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril) e o carácter objectivo da responsabilidade do empreiteiro pela falta de conformidade, excepto no tocante ao direito de indemnização (art.ºs 3., n.º 1, e 4 do Decreto-lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, e 12.º, n.º 1, da LDC, na redacção que lhe foi conferida pelo art.º 13.º do primeiro diploma legal). A qualificação precisa da espécie do contrato de empreitada concluído entre o recorrente e o recorrido é, no caso, inane, dado que os efeitos da resolução são, tanto no tipo geral da empreitada, como no subtipo da empreitada de consumo, inteiramente homótropos.
O contrato de empreitada é, caracteristicamente, um contrato bivinculante e sinalagmático, visto que dá lugar a obrigações recíprocas, ficando as partes, simultaneamente, na situação de devedores e de credores e coexistindo prestações e contraprestações.
Nas obrigações, o devedor está adstrito a uma prestação. A inobservância do dever de prestar pode ocorrer por uma de duas vias: pela simples não realização da prestação, o que dá lugar ao incumprimento definitivo em sentido estrito (art.º 798.º do Código Civil); pela violação de uma situação tal que a prestação em causa não mais possa ser realizada, originando a sua impossibilidade (art.º 801.º, n.º 1, do Código Civil). É, contudo, possível, uma terceira forma de violação do direito do credor: o cumprimento imperfeito, cumprimento defeituoso ou mau cumprimento, dito, também, violação positiva do contrato (art.º 799.º, nº 1, do Código Civil).
O Código Civil não tratou, ao menos com carácter de generalidade, o cumprimento imperfeito; prevê, porém, hipóteses específicas de cumprimento defeituoso em vários contratos, entre as quais se conta, precisamente, o de empreitada (art.º 1218.º e ss.). De uma maneira deliberadamente simplificadora, pode dizer-se que o empreiteiro, adstrito ao dever de realizar uma obra, pode violar o seu dever de prestar por uma de duas formas: ou pelo puro e simples incumprimento ou impossibilitando a prestação (art.ºs 798.º e 801.º, n.º 1, do Código Civil). Existe, no entanto, uma terceira possibilidade, que, relativamente ao contrato de empreitada, é objecto de previsão específica: a de ter havido um cumprimento defeituoso ou inexacto (art.º 1218.º e ss. do Código Civil). O empreiteiro não está vinculado apenas à obrigação de realizar uma obra, de obter certo resultado; ele encontra-se ainda vinculado executar uma obra isenta de vícios e conforme com o convencionado, quer dizer, sem defeitos (art.ºs 1218.º, n.º 1, e 1219.º, n.º 1 do Código Civil). Obra defeituosa é, portanto, aquela que tiver um vício ou se mostrar desconforme com aquilo que foi acordado. O vício corresponde a imperfeições relativamente à qualidade normal das prestações daquele tipo; a desconformidade representa uma discordância com respeito ao fim acordado .
No tipo geral do contrato de empreitada, a lei assinala à prestação de obra defeituosa, várias consequências jurídicas que assentam num plano comum: a culpa, ainda que meramente presumida do empreiteiro: a responsabilidade deste pelo cumprimento defeituoso é necessariamente subjectiva (art.º 799.º, n.º 1, do Código Civil). Diferentemente, no subtipo da empreitada de consumo, aquela responsabilidade, excepto quanto ao direito de indemnização, é objectiva (art.º 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, e 12.º, n.º 1, da LDC).
Em caso de cumprimento defeituoso, atribui-se ao dono da obra, além da indemnização, o direito de exigir a eliminação dos defeitos, a realização de nova obra, a redução do preço e a resolução do contrato de empreitada (art.ºs 1221.º, 1222.º, 1223.º e 1224.º do Código Civil e 4.º do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril)).
Qualquer cessação do contrato, e salvo determinadas excepções legais, acarreta a extinção das obrigações dele emergentes, o mais das vezes complexas. A figura que deve ser isolada, dado o problema que o acórdão deve resolver, é a da resolução.
A resolução é uma forma condicionada, vinculada e retroactiva de extinção dos contratos: condicionada por só ser possível quando fundada em lei ou convenção; vinculada por requerer que se alegue e demonstre determinado fundamento e retroactiva por operar desde o início do contrato (art.º 433.º do Código Civil). Fala-se também por vezes em rescisão: esta equivale à resolução, sendo utilizada, preferencialmente, para designar a resolução fundada na lei. Este esquema é meramente tendencial: a própria lei introduz algumas variantes, sendo certo que as partes, dentro de certos limites, podem também incluir adaptações. Assim, por exemplo, a resolução pode ser não retroactiva (art.º 434.º, n.º 2, do Código Civil). É o que sucede nos contratos de execução continuada e com trato sucessivo – v.g., os contratos de locação, de fornecimento e de seguro – em que a resolução não afecta as prestações já efectuadas, a não ser que a sua interligação com a causa resolutiva legitime uma resolução plena.
A resolução pode operar em casos previstos pelo contrato ou pela lei (art.º 432.º, n.º 1, do Código Civil). O caso mais nítido de resolução com base legal é o que ocorre perante o incumprimento definitivo do contrato: quando uma das partes não cumpra um contrato bivinculante - ou na expressão da lei, bilateral – tem a outra direito à resolução. O Código Civil fala na resolução por incumprimento a propósito da impossibilidade culposa imputável ao devedor (art.º 801.º, n.º 1, do Código Civil). A ideia é a de que perante o incumprimento definitivo, o interesse do credor desvanece-se e o contrato é, juridicamente, impossível. Em qualquer caso, dúvida não resta que a lei visa, com aquela disposição, permitir a um contraente livrar-se de um contrato que o outro incumpriu.
A resolução por incumprimento implica o chamado incumprimento definitivo (art.º 801.º, n.º 1, do Código Civil). O não cumprimento simples apenas levaria à mora; só quando fosse ultrapassado o prazo razoavelmente fixado pelo credor ou, quando objectivamente, desaparecesse o interesse deste na prestação, se poderiam transcender as consequências da mora. O credor pode, então, resolver o contrato, entre outras medidas, com relevo para a indemnização.
A lei equipara – problematicamente - a resolução, quanto aos seus efeitos entre as partes, à nulidade ou anulabilidade. Por virtude dessa equiparação, a resolução tem, portanto, eficácia retroactiva, i.e., extingue ab initio, as relações contratuais (art.º 433.º do Código Civil).
Assim, em primeiro lugar, por força do princípio da equiparação à anulação, a resolução do contrato bivinculante sinalagmático tem como efeito a extinção dos deveres de prestação ainda não cumpridos (art.º 433.º do Código Civil). Em segundo lugar, a resolução produz o efeito de extinção dos deveres de prestação já cumpridos e, extinguindo-se retroactivamente os deveres de prestação cumpridos, a resolução do contrato tem como efeito a constituição do dever de restituição das prestações realizadas, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não se mostrar possível, o valor correspondente (art.ºs 289.º, n.º 1, 433.º e 801.º n.º 2, do Código Civil). O cumprimento das obrigações de restituição resultantes da resolução deve ser simultâneo, sendo aplicáveis, por extensão de regime, as normas relativas à excepção do não cumprimento (art.º 290.º, ex-vi art.º 433.º, 428.º a 431.º do Código Civil). Por força da resolução, as relações obrigacionais simples, constituídas pelo contrato, extinguem-se, mas a relação obrigacional complexa, modifica-se ou transforma-se, convolando-se numa relação de prestação secundária – relação de restituição ou liquidação3. Relação de liquidação que pode, afinal, resolver-se numa relação de compensação, como, sucederá, caracteristicamente, por exemplo, no caso de resolução de um contrato de arrendamento: devendo o arrendatário restituir o valor relativo ao gozo da coisa, o que, evidentemente, não é possível, e o senhorio o das rendas – que equivale àquele gozo – ambas as prestações restituitórias devem extinguir-se por compensação, o que, em última extremidade, acaba por excluir a eficácia retroactiva da resolução (art.º 289.º, nºs 1 e 2, e 847.º do Código Civil).
Ao credor é lícito cumular, com a resolução do contrato bilateral, o pedido de indemnização, sendo-lhe ainda autorizado, se já tiver realizado a sua prestação, exigir a restituição dela por inteiro (art.ºs 798.º e 801.º, n.º 2 do Código Civil)
Problema particularmente espinhoso é o de saber se o ressarcimento pós-resolutório, compreende o chamado interesse positivo ou de cumprimento ou se limita ao denominado interesse negativo, i.e., aos danos que o credor não teria sofrido se não tivesse celebrado o contrato. Na verdade, uma orientação tradicional entende que, resolvido o contrato, a parte lesada apenas tem direito a ser indemnizada do dano da confiança – quer o credor tenha ou não efectuado a sua prestação: uma vez que o credor não quer mais o contrato, a indemnização deve compensá-lo apenas das desvantagens sofridas com a sua conclusão. Uma orientação mais recente entende, contudo, que a parte lesada é confrontada com a resolução não por livre opção, mas pelo incumprimento da outra parte: a indemnização deve, por isso, ser calculada nos termos gerais, abrangendo danos emergentes e lucros cessantes. A indemnização, neste caso, tem por escopo colocar o credor resolvente na situação em que estaria se o contrato tivesse sido cumprido e, portanto, deve atender a todos os danos; o interesse positivo seria, também, contemplado4.
O regime da resolução pode, assim, condensar-se nas proposições seguintes5: a resolução extingue os deveres de prestar principais; a obrigação contratual originária subsiste, apoiada, todavia, em eventuais deveres de prestar secundários e em deveres acessórios; os deveres de prestar são substituídos por deveres de restituição, moldados, ainda que pela negativa, sobres os deveres de prestação principais; os deveres de restituição podem ser substituídos por deveres de entrega de valores equivalentes; na obrigação, no seu conjunto, podem ser inseridos deveres de indemnização quanto o facto justificativo da resolução seja, também, ilícito, culposo e danoso. Proposições que mostram que a resolução tem uma dupla eficácia: uma eficácia liberatória – desvinculativa – e uma eficácia recuperatória, e permite, ou pode permitir, ao contraente fiel, uma reconformação ou recomposição contratual6. Os efeitos da resolução, por força da sua equiparação à invalidade do contrato, correspondem, assim, no fundo, a um contrato sinalagmático de sentido inverso7.
A sentença da 1.ª instância foi terminante em declarar resolvido o contrato de empreitada concluído entre o recorrido, decisão que, por não ter sido objecto de impugnação, transitou em julgado (art.ºs 627.º e 635.º, n.º 5, do CPC). Por sua vez, o acórdão recorrido, foi peremptório em reconhecer ao recorrente o direito de ser indemnizado dos danos patrimoniais que suportou, pelo interesse contratual positivo ou de cumprimento, decisão que, por também não ter sido impugnada, adquiriu, igualmente, a qualidade de res judicata (art.ºs 627.º e 635.º, n.º 5, do CPC).
É neste contexto que o recorrente, querendo fazer-se prevalecer da eficácia liberatória da resolução do contrato de empreitada, sustenta que deve ser desvinculado da sua obrigação de pagamento do remanescente do preço convencionado naquele contrato. Esta pretensão do recorrente esquece, porém, desde logo, que a par da eficácia liberatória, a resolução produz, do mesmo passo, um efeito restitutivo ou restituitório resultante da sua função recuperatória, que a relação de liquidação consequente à resolução do contrato é integrada por obrigações recíprocas de restituição, em espécie ou em valor, caso a restituição in genus não seja possível, sujeitas, quanto ao cumprimento, ao princípio da simultaneidade temporal.
Realmente, por força da relação de liquidação a que resolução daquele contrato de troca para a realização de obra deu lugar, o recorrente ficou vinculado a uma prestação restituitória – a de devolver ou restituir à recorrida os materiais da obra que foram sucessivamente incorporados no solo, e que o recorrente adquiriu e, bem assim, a actividade ou o trabalho despendido para essa incorporação, restituição que, pela natureza das coisas, não é facticamente possível (art.º 1213.º, n.º 2, do Código Civil).
Na verdade, o típico efeito retroactivo da resolução do contrato conhece, indiscutivelmente, no caso, uma limitação ou restrição particularmente relevante, por estarmos confrontados com edificação construída em terreno pertencente ao dono da obra, pelo que não é, deste modo, possível, pela natureza das coisas – a irreversível incorporação da construção realizada no prédio pertencente ao recorrente, sendo, face ao estado da obra, completamente injustificada a sua demolição – colocar, de modo pleno e integral, as partes na situação em que estariam se o contrato não tivesse sido concluído, devolvendo-se ao autor a totalidade do preço já pago e revertendo todos os materiais incorporados no prédio pelo empreiteiro à esfera jurídico-patrimonial deste. Efectivamente, o aproveitamento da construção já realizada, embora com defeitos vários, impede que a eficácia do contrato de empreitada resulte plenamente apagada ou precludida pelo efeito resolutivo, sendo necessário converter a relação contratual resolvida numa relação de liquidação, em que se ponderem, adequada e proporcionalmente, os interesses das partes, em especial do contraente a que não pode assacar-se a responsabilidade pelo incumprimento8.
Não sendo a restituição em espécie da obra possível, o recorrente, ficou vinculado à obrigação de restituir à recorrida, empreiteiro, o valor da obra realizada, valor que equivale ao do preço convencionado e que, assim, corresponde, tanto à parte do preço que pagou, como à parte remanescente desse mesmo preço a cujo pagamento, comprovadamente, não procedeu. Dito doutro modo: dado que não é possível o cumprimento em espécie da obrigação de restituição da obra realizada pelo empreiteiro, a que o recorrente ficou adstrito por força da resolução do contrato - nem uma tal restituição corresponde sequer à sua vontade - essa obrigação é substituída pela de entrega do respectivo valor, correspondente, tanto à parte do preço já liquidado pelo recorrente como ao remanescente desse mesmo preço que não pagou, resíduo do preço que, portanto, deve ser atendido, não para impor ao recorrente um dever de cumprimento, mas para computar o valor da compensação devida pelo recorrente à recorrida em consequência da impossibilidade do cumprimento da obrigação de restituição in genus, da obra realizada a que, como efeito da resolução do contrato de empreitada, ficou adstrito. Obrigação de compensação que, assim, por um lado, impede o recorrente de pedir a restituição do preço convencionado da empreitada que pagou - devolução que, aliás, não pediu - e, por outro, exige que nela seja considerado o valor remanescente do preço que o recorrente não satisfez. Consequência jurídica que é, alias, inteiramente homótropa àquela a que chegou o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo 4581/15.6T8VIS.C1 – e que, notoriamente, constitui o lastro em que o recorrente faz assentar, com prodigalidade, os fundamentos da revista. Efectivamente, aquele acórdão, depois de observar que, além da eficácia liberatória tem a resolução uma eficácia retroactiva/restituitória, que não pode significar uma total identificação aos efeitos da invalidade negocial, que não pode ser uma retroactividade tout court, que poderia levar à demolição da obra à custa do empreiteiro, em vez de, como é mais razoável (a única coisa razoável), à compensação do empreiteiro pelo que prestou, conclui que o valor a deduzir (pelo que o empreiteiro prestou), não será enquanto preço não pago, mas enquanto compensação a que o empreiteiro (…) terá direito pelo que prestou, direito esse em consequência da eficácia retroactiva/restitutória da resolução.
Visto o problema por este prima, a decisão das instâncias não é correcta enquanto condenam o recorrente no cumprimento da obrigação de pagamento do remanescente do preço convencionada da empreitada que não pagou – que, porém, logo declararam extinta por compensação com o crédito a recorrida titula relativamente ao recorrente – considerada a indiscutível eficácia liberatória da resolução. Mas é correcta quanto à consequência ou ao resultado, para a qual a fundamentação exacta é dada, antes, pelo efeito restitutivo ou restitutório da resolução: o valor do preço não pago deve ser considerado no cômputo da compensação devida ao empreiteiro pela obra realizada que, pela natureza das coisas, é insusceptível de lhe ser restituída, consideração que exige, naturalmente, o reconhecimento da permanência daquela obrigação de pagamento do preço, ainda que logo deva ser declarada extinta por compensação.
E mesmo que, ex-adverso, o contrário se devesse entender, sempre se imporia recusar ao recorrente a desvinculação da sua obrigação do pagamento da parte remanescente do preço da empreitada de que, comprovadamente, se constituiu devedor. É que essa desvinculação importaria o enriquecimento indevido do recorrente (art.º 473.º do Código Civil).
Realmente, como o acórdão recorrido salientou, a cumulação da pretensão de ser indemnizado por todos os danos decorrentes do incumprimento do contrato com a de ser absolvido do pagamento do preço da obra efetivamente feita resultaria em indevido locupletamento do autor, enquanto lesado. A procederem ambas as pretensões o mesmo ficaria numa situação patrimonial claramente superior à que para si decorreria do bom cumprimento contratual, ou seja, ficaria com a sua habitação reparada, seria indemnizado de todos os danos que resultaram da sua má execução e não teria de pagar o preço da obra feita. O que não pode ser admitido. O argumento – no tocante ao qual o recorrente não escreveu nas numerosas conclusões com que rematou a sua alegação uma só palavra que fosse, ordenada para demonstrar a sua falta de bondade - é inteiramente procedente.
A resolução do contrato surge como remédio sinalagmático, não podendo atribuir ao resolvente uma posição que não tenha qualquer relação com o seu fundamento, como, por exemplo, uma posição melhor do que aquela em que o contraente lesado estaria com o cumprimento, efeito que só pode ser evitado, nos casos em que o resolvente retém a prestação de obra realizada pelo empreiteiro inadimplente, contrariando a eficácia retroactiva da resolução, e é indemnizado pelo interesse de cumprimento, incluindo no cômputo da compensação devida ao empreiteiro pela não restituição da obra realizada, o valor do preço não pago pelo dono da obra . Não tendo uma finalidade sancionatória, nem um escopo compensatório do prejuízo, a resolução visa tutelar, na fase do cumprimento, o equilíbrio recíproco e a conexão entre prestação e contraprestação, tal como foi avaliada pelos contraentes no momento da conclusão do contrato. O direito de resolução constrói-se, deste modo, como um instrumento destinado a reagir racionalmente contra uma crise superveniente da força vinculativa do contrato, exercendo uma função de autotutela contra os riscos do seu incumprimento e, enquanto poder dispositivo e potestativo do contraente legitimado, a resolução, procura tutelar, na fase do cumprimento, o vínculo entre atribuições patrimoniais interdependentes estabelecida pelo contrato, e a respectiva relação de proporcionalidade – e não assegurar ao resolvente um enriquecimento. A resolução reage à destruição da auto-regulamentação de interesses das partes disposta no contrato e cumpre, do mesmo passo, uma função preventiva, evitando-se o agravamento dos danos decorrentes da perturbação do primitivo programa do cumprimento estabelecida no contrato, que resultaria do prolongamento da sua execução. É, assim, uma medida defensiva e preventiva de danos futuros mais extensos e não - quando conjugada com a indemnização, para mais, pelo interesse positivo ou de cumprimento - um instrumento ordenado para colocar o resolvente numa situação mais favorável do que aquela que resultaria do simples ou normal cumprimento pontual das prestações a que, as partes, por força do contrato resolvido, se vincularam.
Como este Tribunal Supremo tem, repetidamente, posto em relevo, a liquidação do contrato, consequente à sua resolução, deve ter em conta o princípio da justiça comutativa, no sentido de manter relativamente às obrigações de restituição a mesma correspectividade que as partes procuraram entre as prestações realizadas em execução do contrato resolvido9. Aquele princípio exclui, decisivamente, que a parte que resolveu o contrato, obtenha um resultado mais vantajoso do que aquele que decorreria da sua execução pontual; solução contrária transformaria o contrato de sinalagmático em unilateral, uma vez que determinaria a liquidação num só sentido.
O recurso não dispõe, pois, de bom fundamento. A única saída juridicamente correcta é, assim, julgá-lo improcedente.
Do percurso argumentativo percorrido extraem-se, como proposições conclusivas mais salientes as seguintes:
- Por força da resolução do contrato, as relações obrigacionais simples que constituiu extinguem-se, mas a relação obrigacional complexa, modifica-se ou transforma-se, convolando-se numa relação de prestação secundária – relação de restituição ou liquidação, integrada por obrigações recíprocas de restituição das prestações realizadas em cumprimento do contrato resolvido, em espécie, ou caso a restituição em espécie não seja possível, em valor;
- O preço convencionado da empreitada não pago pelo dono da obra deve ser considerado, não para lhe impor um dever de cumprimento, excluído pela eficácia liberatória da resolução daquele contrato, mas, apenas, para o cálculo da compensação e da obrigação correspondente de restituição em valor, resultante da impossibilidade de restituição em espécie da obra realizada pelo empreiteiro, em que o dono da obra se constituiu, atento o efeito restitutivo ou restitutório da resolução;
- O resolvente, sob pena de enriquecimento indevido,: não pode ser colocado, com a resolução do contrato, complementada com indemnização pelo interesse positivo ou de cumprimento, numa posição melhor do que aquela que resultaria do simples ou normal cumprimento pontual pelos contraentes das obrigações a que, por força dele, se vincularam.
O recorrente sucumbe no recurso. Essa sucumbência torna-o objectivamente responsável pela satisfação das respectivas custas (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC)
4. Decisão.
Pelos fundamentos expostos:
1. Admite-se o recurso como revista normal ou comum;
2. Nega-se a revista.
Custas pelo recorrente.
2025.09.30
Henrique Antunes (Relator)
Maria Clara Sottomayor
Jorge Leal
_____________________________________
1. Rui Pinto, Repensando os requisitos da dupla conforme (art.º 671.º, n.º 3, do CPC), Julgar, Online, Novembro de 2019, pág. 4.
2. Acs. do STJ de 12.10.2023 (1901/21), 30.11.2023 (1120/20), 29.09.2022 (19864/15), 19.02.2015 (302915/11) e de 30.04.2015 (1583/08); Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7.ª edição, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 425.
3. Nuno Manuel Pinto de Oliveira, Princípios de Direito dos Contratos, Coimbra Editora, págs. 884 a 886.
4. Acs. do STJ de 28.09.2021 (344/18), 15.02.2018 (7461/11) e 17.05.2018 (567/11), Paulo Mota Pinto, Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, vol. II, Coimbra, 2008, págs. 1604 e ss., e José Carlos Brandão Proença, Lições de Cumprimento e Não Cumprimento das Obrigações, Coimbra Editora, págs. 303 a 306. A orientação dominante na doutrina e na jurisprudência foi, durante muito tempo, a de vedar a indemnização pelo interesse contratual positivo ou por interesse no cumprimento em caso de resolução contratual por não cumprimento: cfr. sobre, sobre o ponto, Paulo Mota Pinto, Resolução do contrato e indemnização por não cumprimento, Anotação ao Ac. do STJ de 10.12.2020 (15940/16.7T8LSB.L1.S1), RLJ, Ano 150, 2021, págs. 329 e ss.
5. António Menezes Cordeio, Da Resolução do Contrato, disponível em https:/portal.pa.pt/media/132086/antonio-meneses-cordeiro.pdf.
6. João Carlos Brandão Proença, A Resolução do Contrato no Direito Civil, do Enquadramento e do Regime, reimpressão, Coimbra Editora, pág. 65.
7. Ac. de 30.05.2023 (135/21).
8. Ac. do STJ de 28.11.2013 (268/03).
9. Acs. de 22. 06.2021 (1901/17), 20.05.2023 (135/21) e 23.04.2024 (4357/10); Maria Clara Sottomayor, As obrigações de restituir o preço e o nominalismo das obrigações pecuniárias, in Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Jorge Ribeiro de Faria, UP, 2003, pág. 554, e H. Hörster/Eva Sónia Moreira da Silva, A Parte Geral do Código Civil Português, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 658.