I. Não constitui “decisão surpresa” o despacho do relator, de rejeição de recurso de revista, quando o recorrente previu a questão nela abordada, da inadmissibilidade da revista, sobre ela se pronunciando premonitoriamente, tendo a parte contrária respondido, inexistindo fundamento legal para que o recorrente apresente uma segunda pronúncia em réplica à resposta da parte contrária sobre a questão que ele próprio antecipou.
II. A verificação dos pressupostos da revista excecional é da competência da formação prevista no n.º 3, do art.º 672.º, do C. P. Civil, situando-se a aferição da ausência de invocação desses pressupostos na fase preliminar da admissão do recurso a que se reporta o art.º 652.º, aplicável ex vi do art.º 679.º, ambos do C. P. Civil, que é função do relator.
Acordam em conferência neste Supremo Tribunal de Justiça nos termos do disposto no n.º 3, do art.º 652.º, aplicável ex vi do art.º 679.º, ambos do C. P. Civil.
1. Relatório.
AA propôs contra BB, seu tio, esta ação especial de prestação de contas, pedindo que o mesmo preste contas do uso de procuração que lhe foi outorgada a 04.06.2001 por CC e mulher DD, falecidos a 20.04.2017 e a 31.05.2019, respectivamente, pais do primeiro e avós da segunda, filha de EE, antes falecido.
Citado, contestou o R dizendo que a procuração lhe foi outorgada para evitar deslocações dos pais a repartições públicas, bancos, entidades públicas ou privadas, relativas aos atos por estes praticados pelo que não tem o dever de prestar contas, pedindo a improcedência da ação.
1ª- Nos presentes autos o quadro factual é no âmbito de relações familiares, pessoais, chegadas, totalmente informais e que assim decorreram até à morte do Sr. CC e da D. DD, outorgantes de uma procuração ao Réu.
2a- Em tal tipo de relações de afeto e pessoais não existe formalidade, pelo que na ponderação dos factos tem o interprete que se colocar nestes pressupostos e neste circunstancialismo sob pena de fazer uma errada apreciação da prova, o que sucedeu neste caso.
3ª- Na audiência de julgamento de 15.12. 2023, por determinação do Sr. Juiz, foi de novo ouvido o Réu em declarações e após o depoimento do Réu a Autora, conforme consta dos autos, pessoa com formação superior, requereu prestar declarações, apud Ata.
4ª- O Réu, opôs-se a tal pretensão pelos fundamentos constantes do requerimento gravado porquanto a Autora assistiu desde o início do primeiro julgamento destes autos e desde o início da sessão de julgamento do dia 15.12.2023, sentada na bancada dos Advogados ao lado da sua mandatária, a todos os depoimentos das testemunhas e às declarações de parte do Réu.
5ª- Situação factual que o Sr. Juiz fez consignar na Ata, tendo, contudo, admitido a prestação de declarações á A. o que não significa aceitar o seu conteúdo.
6ª- Atentas as circunstâncias referidas supra tais declarações deviam ter sido desconsideradas por se tratar de depoimento falacioso e enfermando de nulidade absoluta por se tratar de declarações informadas da prova contrária produzida em audiências a que assistiu, e ajustado ao que lhe convinha, pelo que devia ser completamente desconsiderado.
7ª- Pelo que, as instâncias cometeram erro grave na decisão sobre a matéria de facto ao considerar as declarações de parte da Autora, factos alegados depois dos articulados, por violar o fundamento substantivo da norma do art.466º do CPC, violar o princípio da igualdade das partes e da boa-fé processual, arts.4º e 8º ambos do CPC, permitindo um depoimento especulativo e com alegações falsas que induziram uma interpretação errada dos factos.
8ª- Acresce que o facto dado como PROVADO em 6. não tem por base qualquer documento, sendo que, tratando-se de prova de uma venda de imóvel, negócio formal que exige documento autêntico (escritura publica) ou equivalente, tal não existe nos autos, sendo meramente o resultante de discussão em audiência entre A. e Réu, sem rigor e sem substrato documental.
9ª- Pelo que tal facto, ponto 6 dos factos provados, deve ser ELIMINADO dos factos provados, o que o STJ poderá conhecer por se tratar de facto para o qual a lei exige determinado tipo de documento, no caso, documento autêntico ou equivalente por se tratar de venda alegada venda de imóvel, forma exigida pelo art.875 do CC. e tal documento não existe nos autos.
10ª- Assim, o entendimento vertido no douto Acórdão, viola de forma frontal o disposto nos arts. 466º, nº1, 4º, 5º nº2, 8º e 411ºdo CPC e o art.875 do CC, o que se invoca.
11a- E de igual modo representa uma violação das normas supra desconsiderar os anos decorridos desde a data da procuração até ao decesso dos pais do Réu, o que é invocado pelo Réu e mormente nos seus depoimentos, referindo estarem-lhe a perguntar factos de há mais de 18 anos, 20 anos, quando nem sequer existe a obrigação de conservação de documentos ou registo por parte de instituições, (prazo geral de 10 anos).
12a- Tal será exigir prova impossível ou diabólica ao Réu, prova de que entregou tudo ao pai a quem não iria exigir recibo de entregas em numerário, pois outros pagamentos foram por transferência bancária para a conta do pai como provado e sobre essas não há quaisquer contas a prestar.
13a- E esta questão que é de pronúncia oficiosa pelo Tribunal, conjuga-se com o ónus da prova e sua inversão e o princípio da boa-fé e do abuso de direito, e o douto Acórdão ao não entender assim labora em verdadeiro erro de julgamento.
14a- Trata-se de vício que cabe ao Tribunal ad quem sanar tendo por base todos os elementos que constam dos autos e que são suficientes para decidir pela verificação de uma nulidade que vicia o Acórdão nos termos do art.615, nº1, d), 1ªparte, do CPC, a ser previamente conhecida, o que se requer e invoca.
15ª- No limite cabe oficiosamente conhecer pois a questão posta representa uma situação que clama pelo instituto do Abuso de Direito, invocável em qualquer fase do processo.
16ª- Assim violou a decisão de que se recorre o princípio da igualdade de partes e o dever de conhecimento oficioso por força do princípio do inquisitório, art.411 do CPC, pelo que deve ser revogada a decisão do Acórdão que admitiu tal facto como provado.17ª- Na matéria de facto é dado por PROVADO, o teor da procuração, facto 1. a data do falecimento dos seus outorgantes, facto 2. e a data da realização de três escrituras de compra e venda, nas quais o Réu interveio com a procuração, sendo que nelas os seus representados são adquirentes de bens imóveis.
18ª Assim como compradores não houve recebimento de preço.
19ª- Por outro lado, consta dos autos, junta pela A.com o articulado de Resposta deduzido em 01.02.2021, escritura de compra e venda realizada em 16 de outubro de 2002 na qual interveio o pai do Réu, outorgante da procuração, como comprador, meses depois de ter outorgado a procuração.
20ª- Tal facto consta de documento autêntico e é importante para a boa decisão da causa.
21ª- Apesar da força probatória conferida pelo documento, não foi dado como provado como devia.
22ª- Facto que demonstra que o outorgante não conferiu mandato ao Réu nem este ficou de administrar bens alheios, no caso, dos pais.
23ª- Ora trata-se de erro notório na decisão e que o douto Acórdão incorre em violação da lei substantiva e adjetiva no julgamento da matéria de facto e que cabe nos poderes deste Supremo Tribunal conhecer ao abrigo dos arts. 5°n°2, 8o e 411°, 674° n.° 3 e 682.° n3 todos do CPC,
24a- Finalmente, o Venerando Tribunal da Relação alterou a decisão da matéria de facto acrescentando o ponto “7. Uma parte não concretamente apurada das rendas era paga por transferência bancária para a conta do pai do réu”.
25a- Ora, apesar da manifesta insuficiência deste ponto, pois diz-se expressamente no Acórdão, sic “ tanto o réu como a sua filha deste confirmaram que a maior parte das rendas era paga por transferência bancária para uma conta titulada pelo pai do réu, o que foi parcialmente corroborado pela autora”, o que impunha uma redação mais ampla, certo é que mesmo assim tal facto plasma o recebimento direto das rendas pelo senhorio por transferência bancária na sua conta bancária, as quais pôde consultar na sua conta bancária e confirmar os pagamentos, sendo o Réu estranho a tal.
26a- Logo, é uma contradição insanável exigir prestação de contas de algo que esteve fora do domínio do Réu, pagamento de rendas ao qual o Ré é estranho e alheio ao seu conhecimento, pelo que tal facto demonstra a incongruência de exigir ao Réu a prestação de contas sobre atos jurídicos e operações que lhe são estranhas.
27a- Ergo, enferma a decisão do Acórdão de erro notório na decisão que determina a prestação de contas pelo Réu, a qual deve assim ser revogada e substituída por decisão que considere inexistir obrigação de prestação de contas.
28a- Posteriormente á procuração o outorgante da mesma celebrou negócio cuja possibilidade de ser representado pelo Réu constava da procuração significando que não confiou ao Réu a administração ou gestão de seus interesses ou negócios, apenas serviu a procuração para comodidade pessoal dos outorgantes.
29a- O pai do réu recebia as rendas por transferência bancária na sua conta no banco pelo que é uma contradição insanável exigir ao Réu prestar contas do que nem sequer passou pelo seu domínio dos factos.
30a- No Acórdão reconhece-se a “escassez dos factos alegados”.
31a- Assim, quanto ao ponto 6. dos factos dados por provados, não se apura a identidade do comprador, o preço acordado ou forma de pagamento nem consta dos autos o respetivo título!
32ª- É evidenciado assim no douto Acórdão a total incongruência e falta de base factual e legal para dar por provado o ponto 6. dos factos provados.
33ª- Mas finalmente ainda com mais relevo e que vicia toda a decisão sobre os factos provados, já eivados de nulidade por falta de prova documental e por contradições insanáveis referidas supra, o facto de se evidenciar, no douto Acórdão, ibidem, que “da prova produzida, designadamente das declarações prestadas por ambas as partes, resulta que estas escrituras não traduzem verdadeiras compras e vendas das fracções em causa e que não foram feitos os pagamentos nelas mencionados”. (sublinhado nosso).
34ª- É a própria A. quem declara que não houve recebimento de dinheiro pelo Réu nas referidas escrituras em que interveio com a procuração em nome dos seus outorgantes e isto não podia ter sido desconsiderado.
35ª- Assim, dar como provado a obrigação de o Réu prestar contas de recebimentos de preço que a A. declara que não terá existido, tal representa uma violação frontal das regras da prova e uma nulidade da decisão dos factos provados que se invoca.
36ª- E, face a estes vícios, estamos perante erro de julgamento que impõe a procedência do recurso e consequentemente seja declarado inexistir a obrigação de prestar contas por parte do Réu.
37a- Resulta que foi outorgada pelos pais do aqui demandado a procuração junta com a P.l. como mero instrumento formal com o único fim de evitar deslocações dos representados em tal procuração a repartições públicas, bancos, entidades públicas ou privadas.
38a-A procuração é um negócio formal, um acto unilateral mediante o qual se concedem poderes de representação voluntária, um instrumento jurídico que por si só não cria para o procurador uma obrigação de mandato, pois não se confundem, sendo o mandato um contrato enquanto a procuração é um acto unilateral, cfr. artigos 1157º e 262ºambos do Código Civil.
39a- Não ficou provado, por força dos vícios invocados quanto á da matéria de facto e a sua consequente alteração, um contrato de mandato e sendo assim deve ser proferida decisão a julgar inexistente o direito formalmente alegado de uma obrigação de prestar contas.
40ª- Caso prevalecesse a decisão prolatada, o decidido sancionaria uma violação do direito à defesa de qualquer cidadão por se tratar de exigir uma prestação de contas relativamente a uma generalização, por isso vaga e imprecisa, de eventuais atos passados há mais de dez anos e até vinte anos, num meio familiar, informal, rural, de confiança e boa-fé nas relações pessoais, entre pais e filho nas quais não é
41a- E agravado com o facto da impossibilidade prática de recurso a documentos bancários, documentos de outras entidades atento o prazo legal máximo de conservação de documentos de 10 anos.
42a- A A. ciente dos factos supra, tendo recebido no inventário tudo a que tinha direito e ter tomado por bom, não reclamando da Relação de bens, deduz este procedimento por saber da impossibilidade do Réu, seu tio e pessoa idosa, não ter meios formais de demonstrar que os falecidos sempre tiveram até falecer o domínio da administração e gestão dos seus bens, as contas a eles referentes e nada havendo a prestar pelo Réu aquando do seu falecimento.
43a-Assim, o peticionado representa uma autêntico Abuso de Direito porquanto excede manifestamente o princípio da boa-fé exigir, quanto a relações pessoais, familiares e informais, ocorridas há muitos anos, num círculo familiar restrito, exigir a prova de entregas de dinheiros, de contas quanto ao que terá sido entregue ao Réu. 44a- Ora, pese embora o Tribunal “a quo” considere não se verificar o alegado Abuso de Direito e não se verificar um autêntico situação de indefesa do Réu discorda-se frontalmente do aduzido e impetra-se neste Supremo Tribunal a questão que é de manifesta pertinência jurídica, social e importância suprema para situações semelhantes de quem aceita uma procuração por mera agilização de negócios por parte do dono do negócio, o qual jamais “delegou “ poderes ou incumbiu o mandatário de os celebrar.
45a- Ora, o decidido pelo tribunal “a quo” excede de forma inadmissível os princípios da boa-fé e o princípio normativo essencial que preside ao ordenamento jurídico e que pugna pela consagração da equidade e da razoabilidade na interpretação das normas jurídicas.
46a- Com efeito, sabendo a A. da inexistência de meios de prova , da impossibilidade de o Réu demonstrar por documentos que os outorgantes da procuração sempre receberam tudo que tinham que receber dos seus negócios, a atuação da A. representa um ato formal e aparentemente encaixado na norma, mas totalmente desvirtuado na sua subsunção substantiva e teleológica porquanto a atuação da A. excede manifestamente o direito e exigir do Réu a prestação de contas atentos os factos e circunstâncias dos autos representa uma clamorosa atuação em abuso de direito nos termos do art.334º do CC.
47a-Logo, não pode proceder a ação por via do funcionamento do instituto do Abuso de Direito, com os seus efeitos ex vi art.334º do C.C.
48a- Mais, a interpretação que as instâncias emprestam na interpretação dos factos e da lei viola a constituição e o direito fundamental à defesa, consubstanciando uma situação de impossibilidade prática de provar os factos que importam para o Réu se defender com igualdade, uma prova diabólica, a qual é proibida em direito tal como sucede com a prova de facto negativo.
49a- E tal contende com o princípio da proibição da indefesa que emana do direito constitucional ao acesso ao direito e aos tribunais e ao princípio constitucional da igualdade, arts. 20 º e 202º, nº2 e 13º todos da CRP.
50a- Argui-se a inconstitucionalidade da interpretação das instâncias no sentido de considerar conforme às referidas normas a decisão prolatada e que não considera existir Abuso de direito nem violação da proibição da indefesa, o que se impetra, invoca e argui para efeitos de declaração de inconstitucionalidade na aplicação concreta da lei e decorrente disto deve a decisão das instâncias ser revogada e declarada a improcedência total da ação de prestação de contas nos termos delimitados pelo Tribunal da Relação.
E, PARA A REVISTA EXCECIONAL,
51a- A questão jurídica e de facto que se discute nos autos é de suprema relevância quer ao nível da aplicação do direito, das soluções jurídicas em dissídio e da sua relevância social.
52a- Sobretudo tendo em conta que na aplicação do direito este deve ser sempre ligado a uma jurisprudência dos interesses que faça das normas uma interpretação que sustente a teleologia dos lídimos interesses da comunidade e no fim de tudo, o direito material.
53a-E prende-se com uma ponderada e sapiente decisão que pesando todos os factos, mormente os instrumentais e que ajudam a decidir os factos essenciais, repare os erros e omissões cometidas na decisão sobre a matéria de facto e repare erros de julgamento e da aplicação do Direito.
54a- Com efeito, basta atentar no facto de a própria Autora ter declarado em sede de audiência de julgamento, (vide pag.52 douto Acórdão) que quanto ao alegado pagamento das escrituras que menciona, não houve pagamentos, pelo que logo admite que não há lugar a prestar contas do que inexistiu.
55a-Acresce a violação da lei substantiva nos termos do art.5°, n°2 do CPC ao dar como provados factos relativos a compra e venda de imóvel sem que exista nos autos escritura de compra e venda ou título equivalente, necessário para tal prova.
56a- E a contradição insanável no Acórdão, entre a matéria que manteve como provada e o facto novo dado como provado “- 7. Uma parte não concretamente apurada das rendas era paga por transferência bancária para a conta do pai do réu.” pois significa isso que o pai do réu recebia na sua conta muitas das rendas dos contratos de arrendamento e obviamente que ficava pago dessas rendas, tinha a informação sobre os pagamentos dos contratos e obviamente que nada tinha a solicitar ao réu sobre tal.
57a-_E isso demonstra que a intervenção do réu era meramente formal e como mero núncio dos pais.
58a-Ergo, tal facto novo provado, que embora parcialmente quanto a demais pugnado quanto a alteração da matéria de facto, representa uma apreciação justa cuja consequência, não foi devidamente decidida.
59a- Com efeito, impunha-se e impõe-se face á contradição insanável da matéria de facto, decidir pela inexistência de obrigação de prestar contas, sendo esta decisão da Relação uma nulidade nos termos do art.615º, nº1, d) do CPC.
60a- E finalmente e sobretudo está em causa ainda a apreciação dos institutos jurídicos que são válvulas de segurança da equidade e justiça do Direito, institutos invocados pelo recorrente e não atendidos no douto Acórdão e que são o Abuso de Direito, o princípio da Boa-fé e da Proibição da indefesa.
61a- Mas resulta sobretudo provado por alteração da matéria de facto que 7. Uma parte não concretamente apurada das rendas era paga por transferência bancária para a conta do pai do réu.” pelo que é de todo insustentável assentar uma decisão de obrigação de prestar contas pelo Réu quando apenas receberia entregas avulsas de rendas em numerário em sua casa e entregues á sua filha.
62a- Não pode haver “mandato” quanto a umas quantias recebidas como mero executante material quando quanto a parte das rendas não concretamente apurado pelo tribunal e cuja concretização cabia á Autora, era recebida pelo senhorio, na sua conta bancária.
63a- Acresce que não se atenta na decisão que não é dado relevo a um facto que o Tribunal refere e consta dos autos por documento autêntico (escritura de compra e venda junto pela A. na Resposta), que o pai do Réu foi quem interveio em escritura de compra e venda celebrada em 06.10.2022, logo meses após a outorga da procuração.
64a- Plasmando assim pela sua atuação que mantinha em si a gestão do seu património, não tinha confiado ao Réu qualquer mandato, servindo a procuração como mero meio formal para o substituir em atos que o pretendesse.
65a- Por outro lado, representa uma violação do direito substantivo e adjetivo o dar-se como provado o ínsito em 6o dos factos provado porquanto inexiste nos autos qualquer escritura pública e compra e venda ou documento equivalente, necessário para a prova de tal facto.
66a- Contradições insanáveis e violações da lei que cabe nas competências do STJ pois não podem prevalecer e ficarem a formar Direito, padecendo assim o Acórdão das nulidades do art.615, nº1, c) e d) do CPC, o que se invoca.
67ª- Com efeito tem de haver uma especial ponderação na apreciação dos factos carreados para os autos, todos os factos incluindo os instrumentais, mormente documentos que não foram considerados e por isso é convocado o estipulado nos arts.411º do CPC.
68ª- Caso prevalecesse a decisão prolatada tal seria exigir uma prestação de contas relativamente a uma generalização, por isso vaga e imprecisa, de eventuais atos passados há mais de dez anos e até vinte anos.
69ª - E postergando-se na interpretação dos factos que se tratava de um meio familiar, informal, rural, de confiança e boa-fé nas relações pessoais, mormente entre pais e filho nas quais não é exigível documentos formais sobre tratos entre as partes.
70ª- E tal é agravado com o facto da impossibilidade prática de recurso a documentos representando um autêntico Abuso de Direito porquanto excede manifestamente o princípio da boa-fé exigir, quanto a relações pessoais, familiares e informais, ocorridas há muitos anos, exigir a prova de entregas de dinheiros, de contas prestadas quanto ao que terá sido entregue ao Réu.
71a- Pelo que não atendendo ao alegado pelo recorrente impetra-se que tal representa uma interpretação da lei que viola a constituição e o direito fundamental à defesa, consubstanciando uma situação de impossibilidade prática de provar os factos que importam para o Réu se defender com igualdade, uma prova diabólica, a qual é proibida em direito tal como sucede com a prova de facto negativo.
72a- E tal contende com o princípio da proibição da indefesa que emana do direito constitucional ao acesso ao direito e aos tribunais e ao princípio constitucional da igualdade, arts. 20 º e 202º, nº2 e 13º todos da CRP.
73a -O que se invoca para efeitos de considerar o decidido violador destes preceitos constitucionais de aplicação direta á concreta aplicação da lei e por via disso, a interpretação dada nos autos padece de inconstitucionalidade, o que se argui, pelo que deve ser conhecido tudo isto no recurso de revista excecional.
Assim, embora reproduzindo todas as conclusões infra tratando-se de recurso próprio esta revista excecional, por cautela,
74a- Na audiência de julgamento de 15.12. 2023, por determinação do Sr. Juiz, foi de novo ouvido o Réu em declarações e após o depoimento do Réu a Autora, conforme consta dos autos, pessoa com formação superior, requereu prestar declarações, apud Ata.
75ª- O Réu, opôs-se a tal pretensão pelos fundamentos constantes do requerimento gravado porquanto a Autora assistiu desde o início do primeiro julgamento destes autos e desde o início da sessão de julgamento do dia 15.12.2023, sentada na bancada dos Advogados ao lado da sua mandatária, a todos os depoimentos das testemunhas e às declarações de parte do Réu.
76ª- Situação factual que o Sr. Juiz fez consignar na Ata, tendo, contudo, admitido a prestação de declarações á A. o que não significa aceitar o seu conteúdo.
77ª- Atentas as circunstâncias referidas supra tais declarações deviam ter sido desconsideradas por se tratar de depoimento falacioso e enfermando de nulidade absoluta por se tratar de declarações informadas da prova contrária produzida em audiências a que assistiu, e ajustado ao que lhe convinha, pelo que devia ser completamente desconsiderado.
78ª- Pelo que, as instâncias cometeram erro grave na decisão sobre a matéria de facto ao considerar as declarações de parte da Autora, factos alegados depois dos articulados, por violar o fundamento substantivo da norma do art.466º do CPC, violar o princípio da igualdade das partes e da boa-fé processual, arts.4º e 8º ambos do CPC, permitindo um depoimento especulativo e com alegações falsas que induziram uma interpretação errada dos factos.
79ª- Acresce que o facto dado como PROVADO em 6. não tem por base qualquer documento, sendo que, tratando-se de prova de uma venda de imóvel, negócio formal que exige documento autêntico (escritura publica) ou equivalente, tal não existe nos autos, sendo meramente o resultante de discussão em audiência entre A. e Réu, sem rigor e sem substrato documental.
80ª- Pelo que tal facto, ponto 6 dos factos provados, deve ser ELIMINADO dos factos provados, o que o STJ poderá conhecer por se tratar de facto para o qual a lei exige determinado tipo de documento, no caso, documento autêntico ou equivalente por se tratar de venda alegada venda de imóvel, forma exigida pelo art.875 do CC. e tal documento não existe nos autos.
81ª- Assim, o entendimento vertido no douto Acórdão, viola de forma frontal o disposto nos arts. 466º, nº1, 4º, 5º nº2, 8º e 411ºdo CPC e o art.875 do CC, o que se invoca.
82ª- E de igual modo representa uma violação das normas supra desconsiderar os anos decorridos desde a data da procuração até ao decesso dos pais do Réu, o que é invocado pelo Réu e mormente nos seus depoimentos, referindo estarem-lhe a perguntar factos de há mais de 18 anos, 20 anos, quando nem sequer existe a obrigação de conservação de documentos ou registo por parte de instituições, (prazo geral de 10 anos).
83a- Tal será exigir prova impossível ou diabólica ao Réu, prova de que entregou tudo ao pai a quem não iria exigir recibo de entregas em numerário, pois outros pagamentos foram por transferência bancária para a conta do pai como provado e sobre essas não há quaisquer contas a prestar.
84a- E esta questão que é de pronúncia oficiosa pelo Tribunal, conjuga-se com o ónus da prova e sua inversão e o princípio da boa-fé e do abuso de direito, e o douto Acórdão ao não entender assim labora em verdadeiro erro de julgamento.
85a- Trata-se de vicio que cabe ao Tribunal ad quem sanar tendo por base todos os elementos que constam dos autos e que são suficientes para decidir pela verificação de uma nulidade que vicia o Acórdão nos termos do art.615, nº1, d), 1ªparte, do CPC, a ser previamente conhecida, o que se requer e invoca.
86a- No limite cabe oficiosamente conhecer pois a questão posta representa uma situação que clama pelo instituto do Abuso de Direito, invocável em qualquer fase do processo.
87a- Assim violou a decisão de que se recorre o princípio da igualdade de partes e o dever de conhecimento oficioso por força do princípio do inquisitório, art.411 do CPC, pelo que deve ser revogada a decisão do Acórdão que admitiu tal facto como provado.88a- Na matéria de facto é dado por PROVADO, o teor da procuração, facto 1. a data do falecimento dos seus outorgantes, facto 2. e a data da realização de três escrituras de compra e venda, nas quais o Réu interveio com a procuração, sendo que nelas os seus representados são adquirentes de bens imóveis.
89a- Assim como compradores não houve recebimento de preço.
90a- Por outro lado, consta dos autos, junta pela A.com o articulado de Resposta deduzido em 01.02.2021, escritura de compra e venda realizada em 16 de outubro de 2002 na qual interveio o pai do Réu, outorgante da procuração, como comprador, meses depois de ter outorgado a procuração.
91ª- Tal facto consta de documento autêntico e é importante para a boa decisão da causa.
92ª- Apesar da força probatória conferida pelo documento, não foi dado como provado como devia.
93ª- Facto que demonstra que o outorgante não conferiu mandato ao Réu nem este ficou de administrar bens alheios, no caso, dos pais.
94ª- Ora trata-se de erro notório na decisão e que o douto Acórdão incorre em violação da lei substantiva e adjetiva no julgamento da matéria de facto e que cabe nos poderes deste Supremo Tribunal conhecer ao abrigo dos arts. 5°n°2, 8o e 411°, 674° n.° 3 e 682.° n3 todos do CPC,
95a- Finalmente, o Venerando Tribunal da Relação alterou a decisão da matéria de facto acrescentando o ponto “7. Uma parte não concretamente apurada das rendas era paga por transferência bancária para a conta do pai do réu”.
96a- Ora, apesar da manifesta insuficiência deste ponto, pois diz-se expressamente no Acórdão, sic “ tanto o réu como a sua filha deste confirmaram que a maior parte das rendas era paga por transferência bancária para uma conta titulada pelo pai do réu, o que foi parcialmente corroborado pela autora”, o que impunha uma redação mais ampla, certo é que mesmo assim tal facto plasma o recebimento direto das rendas pelo senhorio por transferência bancária na sua conta bancária, as quais pôde consultar na sua conta bancária e confirmar os pagamentos, sendo o Réu estranho a tal.
97a- Logo, é uma contradição insanável exigir prestação de contas de algo que esteve fora do domínio do Réu, pagamento de rendas ao qual o Ré é estranho e alheio ao seu conhecimento, pelo que tal facto demonstra a incongruência de exigir ao Réu a prestação de contas sobre atos jurídicos e operações que lhe são estranhas.
98a- Ergo, enferma a decisão do Acórdão de erro notório na decisão que determina a prestação de contas pelo Réu, a qual deve assim ser revogada e substituída por decisão que considere inexistir obrigação de prestação de contas.
99ª- Posteriormente á procuração o outorgante da mesma celebrou negócio cuja possibilidade de ser representado pelo Réu constava da procuração significando que não confiou ao Réu a administração ou gestão de seus interesses ou negócios, apenas serviu a procuração para comodidade pessoal dos outorgantes.
100ª- O pai do réu recebia as rendas por transferência bancária na sua conta no banco pelo que é uma contradição insanável exigir ao Réu prestar contas do que nem sequer passou pelo seu domínio dos factos.
101ª- No Acórdão reconhece-se a “escassez dos factos alegados”.
102ª- Assim, quanto ao ponto 6. dos factos dados por provados, não se apura a identidade do comprador, o preço acordado ou forma de pagamento nem consta dos autos o respetivo título!
103ª- É evidenciado assim no douto Acórdão a total incongruência e falta de base factual e legal para dar por provado o ponto 6. dos factos provados.
104ª- Mas finalmente ainda com mais relevo e que vicia toda a decisão sobre os factos provados, já eivados de nulidade por falta de prova documental e por contradições insanáveis referidas supra, o facto de se evidenciar, no douto Acórdão, ibidem, que “da prova produzida, designadamente das declarações prestadas por ambas as partes, resulta que estas escrituras não traduzem verdadeiras compras e vendas das fracções em causa e que não foram feitos os pagamentos nelas mencionados”. (sublinhado nosso).
105ª- É a própria A. quem declara que não houve recebimento de dinheiro pelo Réu nas referidas escrituras em que interveio com a procuração em nome dos seus outorgantes e isto não podia ter sido desconsiderado.
106ª- Assim, dar como provado a obrigação de o Réu prestar contas de recebimentos de preço que a A. declara que não terá existido, tal representa uma violação frontal das regras da prova e uma nulidade da decisão dos factos provados que se invoca.
107ª- E, face a estes vícios, estamos perante erro de julgamento que impõe a procedência do recurso e consequentemente seja declarado inexistir a obrigação de prestar contas por parte do Réu.
108ª- Resulta que foi outorgada pelos pais do aqui demandado a procuração junta com a P.I. como mero instrumento formal com o único fim de evitar deslocações dos representados em tal procuração a repartições públicas, bancos, entidades públicas ou privadas.
109ª-A procuração é um negócio formal, um acto unilateral mediante o qual se concedem poderes de representação voluntária, um instrumento jurídico que por si só não cria para o procurador uma obrigação de mandato, pois não se confundem, sendo o mandato um contrato enquanto a procuração é um acto unilateral, cfr. artigos 1157º e 262ºambos do Código Civil.
110a- Não ficou provado, por força dos vícios invocados quanto á da matéria de facto e a sua consequente alteração, um contrato de mandato e sendo assim deve ser proferida decisão a julgar inexistente o direito formalmente alegado de uma obrigação de prestar contas.
111a- Caso prevalecesse a decisão prolatada, o decidido sancionaria uma violação do direito à defesa de qualquer cidadão por se tratar de exigir uma prestação de contas relativamente a uma generalização, por isso vaga e imprecisa, de eventuais atos passados há mais de dez anos e até vinte anos, num meio familiar, informal, rural, de confiança e boa-fé nas relações pessoais, entre pais e filho nas quais não é exigível documentos formais sobre tratos entre as partes.
112a- E agravado com o facto da impossibilidade prática de recurso a documentos bancários, documentos de outras entidades atento o prazo legal máximo de conservação de documentos de 10 anos.
113a- A A. ciente dos factos supra, tendo recebido no inventário tudo a que tinha direito e ter tomado por bom, não reclamando da Relação de bens, deduz este procedimento por saber da impossibilidade do Réu, seu tio e pessoa idosa, não ter meios formais de demonstrar que os falecidos sempre tiveram até falecer o domínio da administração e gestão dos seus bens, as contas a eles referentes e nada havendo a prestar pelo Réu aquando do seu falecimento.
114ª- Assim, o peticionado representa uma autêntico Abuso de Direito porquanto excede manifestamente o princípio da boa-fé exigir, quanto a relações pessoais, familiares e informais, ocorridas há muitos anos, num círculo familiar restrito, exigir a prova de entregas de dinheiros, de contas quanto ao que terá sido entregue ao Réu.
115ª- Ora, pese embora o Tribunal “a quo” considere não se verificar o alegado Abuso de Direito e não se verificar um autêntico situação de indefesa do Réu discorda-se frontalmente do aduzido e impetra-se neste Supremo Tribunal a questão que é de manifesta pertinência jurídica, social e importância suprema para situações semelhantes de quem aceita uma procuração por mera agilização de negócios por parte do dono do negócio, o qual jamais “delegou “ poderes ou incumbiu o mandatário de os celebrar.
116ª- Ora, salvo o devido respeito que é muito, o decidido pelo tribunal “a quo” excede de forma inadmissível os princípios da boa-fé e o princípio normativo essencial que preside ao ordenamento jurídico e que pugna pela consagração da
117ª- Com efeito, sabendo a A. da inexistência de meios de prova, da impossibilidade de o Réu demonstrar por documentos que os outorgantes da procuração sempre receberam tudo que tinham que receber dos seus negócios, a atuação da A. representa um ato formal e aparentemente encaixado na norma, mas totalmente desvirtuado na sua subsunção substantiva e teleológica porquanto a atuação da A. excede manifestamente o direito e exigir do Réu a prestação de contas atentos os factos e circunstâncias dos autos representa uma clamorosa atuação em abuso de direito nos termos do art.334º do CC.
118ª-Logo, não pode proceder a ação por via do funcionamento do instituto do Abuso de Direito, com os seus efeitos nos termos do art.334º do C.C.
119ª- Mais, a interpretação que as instâncias emprestam na interpretação dos factos e subsunção á lei viola a constituição e o direito fundamental à defesa, consubstanciando uma situação de impossibilidade prática de provar os factos que importam para o Réu se defender com igualdade, uma prova diabólica, a qual é proibida em direito tal como sucede com a prova de facto negativo.
120a- E tal contende com o princípio da proibição da indefesa que emana do direito constitucional ao acesso ao direito e aos tribunais e ao princípio constitucional da igualdade, arts. 20 ° e 202°, n°2 e 13° todos da CRP.
121a- Argui-se a inconstitucionalidade da interpretação das instâncias no sentido de considerar conforme às referidas normas a decisão prolatada e que não considera existir Abuso de direito nem violação da proibição da indefesa, o que se impetra, invoca e argui para efeitos de declaração de inconstitucionalidade na aplicação concreta da lei e decorrente disto deve a decisão das instâncias ser revogada e declarada a improcedência total da ação de prestação de contas nos termos delimitados pelo Tribunal da Relação.
122a- Pelo que deve ser proferida decisão pelo Venerando Supremo Tribunal de Justiça que, atentado no supra aduzido, conclua pela inexistência de obrigação de prestar contas por parte do Réu, absolvendo-o.
Termos em que,
I- Deve conhecer-se das nulidades invocadas com as consequências legais;
II- Deve o presente recurso ser julgado procedente, julgando que não existência a obrigação de prestar contas por parte do Réu, absolvendo-o do pedido.
III- Caso assim não se entenda, deve conhecer-se do Abuso de Direito invocado e ainda da violação do preceito constitucional da proibição da indefesa, declarando-se impedido o alegado direito da Autora por violação do princípio da boa-fé e representar um Abuso de Direito bem como representa uma decisão inconstitucional na aplicação concreta da lei, absolvendo o Réu do pedido, fazendo-se como sempre justiça.
I Nulidade da Decisão por falta de audição prévia
1- O colendo Sr. Juiz Conselheiro Relator antes de proferir a Decisão singular que tomou deveria ter notificado o recorrente da sua disposição para uma decisão surpresa nos termos dos arts.665º, nº3 e 3º, nº3 do CPC.
2- Não o fazendo violou tais comandos legais sendo essa violação da lei cominada com a nulidade ex vi art.195 do CPC, constituindo uma decisão surpresa que é atentatória do princípio do processo justo e equitativo, garantido no n.º4 do citado art.º 20.º, da CRP.
3- Pelo que se argui a nulidade da Decisão Singular pelas razões supra.
Acresce ainda
II Nulidade da decisão quanto à admissão da Revista Excecional
4- O recurso de revista foi também deduzido como REVISTA EXCECIONAL e como tal a apreciação sobre a sua admissão no Tribunal ad quem está reservada à formação do Supremo Tribunal de Justiça prevista no art.672º, nº3 do CPC.
5- Pois, atentando-se nas Alegações de Recurso, que por economia processual aqui se dão por reproduzidas, nelas constam os fundamentos para admitir o recurso de revista excepcional-art.672,nº2,alíneas a) e b),do CPC e cujo teor se dá aqui por reproduzido.
6- Assim, em especial, no requerimento da Revista Excecional, pag.2 e 3, invoca-se a errada e contraditória aplicação da lei substantiva e adjetiva, o relevo jurídico e social das questões discutidas nos autos para afirmar o primado do substantivo, conhecer do abuso de direito e da proibição de indefesa, invocáveis a todo o tempo, de conhecimento oficioso, para melhor aplicação do direito.
7- Para além das nulidades, art.615º, nº1, c) CPC, invocadas na Revista, o que é arguível em sede de revista excecional, art.672º, nº1 do CPC.
8- Ora, o recurso de Revista Excecional foi objeto de pronúncia em Revista ordinária por Decisão Singular, quando, s. d. r, não cabia ao Venerando
Conselheiro Relator conhecer da REVISTA EXCEPCIONAL sendo assim NULA a sua decisão por não lhe caber nas funções por tal competência estar atribuída, sem derrogação, a formação específica de Colendos Juízes Conselheiros do STJ.
9- Ergo, a Decisão Singular, no que tange á Revista Excecional, é NULA, por falta de competência para a sua prolação, nulidade que se invoca nos termos do art.615, nº1, d) 2ªparte, e nº4 do CPC, devendo no douto suprimento do Venerando Tribunal ser declarada NULA a Decisão Singular e ordenar-se o envio do recurso de Revista Excecional para a formação do Supremo prevista no art.672, nº3 do CPC.
10- Acresce como fundamento do Recurso a invocada Nulidade do Acórdão de que se recorre por contradição entre a matéria de facto, violação de lei que exige especifica formalidade para a prova de determinados factos, omissão de pronúncia sobre questão essencial, como é descrito nas Alegações de Revista por não ter sido objeto de pronúncia na Relação.
11- E, conforme interpretação do douto Ac.STJ de 20.12.2017, in www.dgsi.pt, Nhavendo lugar a recurso de revista excecional, neste articulado deve ser arguida a Nulidade, o que é feito neste Recurso de Revista Excecional e tratando-se de questão prévia a decidir no Recurso, ocorre Nulidade por omissão de pronúncia na Decisão Singular da qual aqui se reclama para a Conferência.
12- Ergo, a NULIDADE do Acórdão do Tribunal “a quo”, ex vi art.615,d) do CPC, é prévia e é nesta sede recursiva admissível suscitar seja conhecida como questão prévia, cfr. Ac. STJ P.22388/13.3T2SNT-B.L1-A.S1, de 20.12.2017.
Sem prescindir das arguidas nulidades da Decisão singular,
III QUESTÕES SUBSEQUENTES A SUBMETER À CONFERÊNCIA E SOBRE A QUAL SE REQUER RECAIA ACÓRDÃO EM CONFERÊNCIA
A- Relativamente à não admissão e conhecimento da Revista normal
13- Foi expressamente invocado que, para além de vícios de nulidades no Acórdão, ,art.615, nº1, c) e d) do CPC e arguíveis, ex vi art.615, nº4 do CPC, padece de erros de julgamento com violação de normas de direito adjetivo e da lei substantiva na decisão quer sobre a matéria de facto quer sobre a resolução material do litígio, pelo que não ocorre uma dupla conforme.
14- E invocou-se a inexistência de conformidade decisória porquanto não ocorre uma confirmação integral e irrestrita da primeira decisão pelo que não se verifica uma situação de dupla conforme, ex vi art. 671, nº3 do CPC, a qual tem natureza jurídica de pressuposto processual negativo do recurso de revista, nos termos do art.671, nº3 do CPC.
15- Logo ser admissível recurso de Revista normal recebido pelo Tribunal“ a quo” , e,s.d.r., tendo sido carreados para a Revista todos os pressupostos de recorribilidade a Decisão Singular fez uma errada apreciação e aplicação da lei e do direito e como tal deve ser revogada na Conferência.
16- Com efeito, o Acórdão do Tribunal “a quo”deu parcial procedência ao recurso de Apelação e alterou a matéria de facto, com o acrescento de um facto provado invocado no recurso como uma contradição insanável da matéria de facto.
17- Pois, acrescentou o facto provado “7. Uma parte não concretamente apurada das rendas era paga por transferência bancária para a conta do pai do réu”.
18- Ergo, s.d.r, não se verifica uma dupla conforme porquanto a decisão do Tribunal da Relação deu parcial procedência à Apelação e alterou a matéria de facto de modo que ocorre uma contradição insanável entre os factos provados e não provados como se detalha na motivação de recurso.
19- Por outro lado, invoca-se a violação do direito substantivo e adjetivo, arts.674º, nº3 cotejado com o art.875 do CC. ao dar-se como provado o ínsito em 6º dos factos provados inexistindo nos autos qualquer escritura pública ou documento equivalente, necessário para a prova de tal facto.
20- Violação de lei essencialmente plasmada no n.º 3 do art. 674.º do CPC e com a abrangência do n.º 3 do art. 682.º CPC, devendo declarar-se a ilegalidade do decidido quanto á matéria de facto por violação da lei.
21- Acresce que as instâncias cometeram erro grave na decisão sobre a matéria de facto ao considerar as declarações de parte da Autora, factos alegados depois dos articulados e após assistir ao depoimento da parte contrária, por violar o fundamento substantivo do art.466º do CPC, violar o princípio da igualdade das partes e da boa-fé processual, arts.4º e 8º ambos do CPC.
22- Assim,
“I - Existe dupla conforme quando a Relação confirma, sem voto de vencido e com base em fundamentação substancialmente idêntica a decisão da 1ªinstância.
II - A dupla conformidade exige, assim, que a questão crucial para o resultado declarado tenha sido objecto de duas decisões «conformes».
III - Tal não ocorre nos casos em que é imputado ao Acórdão da Relação a violação de normas de direito adjectivo no que concerne à apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto proferida pela 1ªinstância, nomeadamente as previstas nos arts.640º e 662º, ambos do NCPC.
IV - Efectivamente, em tais circunstâncias, ainda que simultaneamente a Relação tenha confirmado a decisão recorrida no que respeita à matéria de direito, não se verifica uma situação de dupla conformidade no que concerne ao modo como foi reapreciada a matéria de facto.” In Ac STJ de 28.01.2016 no P.802/13.8TTVNF.P1.G1-A.S1, Reclamação-4ªsecção, in www.dgsi.pt.
23 - Ora, s.d.r. o entendimento vertido no douto Acórdão, viola de forma frontal o disposto nos arts. 466º, nº1, 4º, 5º nº2, 8º e 411ºdo CPC e o art. 875 do CC, o que se invoca e a douta interpretação que deste Supremo Tribunal faz supra.
24 - Por outro lado, consta dos autos, junta pela A.com o articulado de Resposta deduzido em 01.02.2021, escritura de compra e venda realizada em 16 de outubro de 2002 na qual interveio o pai do Réu como comprador, meses depois de ter outorgado a procuração.
25 - Tal facto consta de documento autêntico e não foi dado como provado, tratando-se de erro notório na decisão e que o douto Acórdão incorre em violação da lei substantiva e adjetiva no julgamento da matéria de facto e que cabe nos poderes deste Supremo Tribunal conhecer ao abrigo dos arts. 5ºnº2, 8º e 411º, 674º n.º 3 e 682.º n3 todos do CPC.
26 - E de igual modo representa uma violação da justa apreciação da prova desconsiderar os anos decorridos desde a data da procuração até ao decesso dos pais do Réu.
27- Tal será exigir prova impossível ou diabólica ao Réu, questão que é de pronúncia oficiosa pelo Tribunal, cujo conhecimento pelo STJ se impõe para a boa aplicação do direito de acordo o ónus da prova e sua inversão e o princípio da boa-fé e do abuso de direito.
28- Trata-se de vicio que cabe ao Tribunal ad quem sanar e no limite cabe oficiosamente conhecer porquanto a questão posta representa uma situação que clama pelo instituto do Abuso de Direito, invocável em qualquer fase do processo e de conhecimento oficioso.
29- Contradições insanáveis e violações da lei que cabe nas competências do Supremo Tribunal de Justiça tal como apreciar invocado Abuso de Direito e proibição da de indefesa do Réu com violação do princípio da igualdade das partes e da inconstitucionalidade da impossibilidade de defesa efetiva.
30- Pelo que, com o devido respeito, que é muito, a Decisão singular, para além dos vícios de nulidade invocados, padece de erro na apreciação dos pressupostos do recurso da Revista Normal porquanto estão reunidos os pressupostos da admissibilidade da Revista normal e como tal deve ser revogada e proferido douto Acórdão em Conferência a admitir a Revista Normal.
B- Relativamente à não admissão da Revista Excecional
31- Dá-se aqui por reproduzida a Nulidade invocada supra sobre esta questão.
32- Sucede que para efeitos de ser admitida Revista Excecional foi invocado que a questão jurídica e de facto que se discute é de suprema relevância quer ao nível da aplicação do direito, das soluções jurídicas em dissídio e da sua relevância social, o que é expressamente alegado no requerimento de interposição e nas alegações do recurso de Revista Excecional.
33- De igual modo se alega que se exige uma ponderada e sapiente decisão que pesando todos os factos, repare os erros e omissões cometidas na decisão sobre a matéria de facto e repare erros de julgamento e da aplicação do Direito.
34- Claro que, tendo sido deduzida a Revista Excecional a título subsidiário para o caso de não ser admitida a Revista normal, os vícios apontados ao Acórdão da Relação e que se pretendem sindicar nesta sede recursiva podem ser aduzidos na Revista Excecional pelo que, s.d.r., não terá sentido aludir a alegada coincidência de factos e matéria de direito aduzidos em ambas as Revistas.
35-Acresce a violação da lei substantiva nos termos do art. 5º, nº2 do CPC ao dar como provados factos relativos a compra e venda de imóvel sem que exista nos autos escritura de compra e venda ou título equivalente, necessário para tal prova.
36- E a contradição insanável entre a matéria que manteve como provada e o facto novo dado como provado “- 7. Uma parte não concretamente apurada das rendas erapaga por transferência bancária para a conta do pai do réu.”
37- Impõe-se face á contradição insanável da matéria de facto, decidir pela inexistência de obrigação de prestar contas, enfermando esta decisão da Relação de nulidade nos termos do art.615º, nº1, d) do CPC.
38-E final mente e sobretudo está em causa ainda a apreciação dos institutos jurídicos que são válvulas de segurança da equidade e justiça do Direito invocados pelo recorrente e não atendidos no douto Acórdão e que são o Abuso de Direito, o princípio da Boa-fé e da Proibição da indefesa, que obrigam a uma decisão da última instância judicial para a boa e harmoniosa aplicação da lei e do direito e busca da justiça.
39º- Assim, ao invés do considerado na Decisão Singular, consta do requerimento de interposição e das Alegações do recurso de Revista Excecional a alegação dos pressupostos para a sua admissão.
40- Contradições e violações da lei insanáveis que cabe na competência do Supremo Tribunal de Justiça e não podem prevalecer fazendo Direito, padecendo o Acórdão das nulidades do art.615º, nº1, c) e d) do CPC, como invocado.
41-Com efeito tem de haver uma especial ponderação na apreciação dos factos carreados para os autos, mormente documentos que não foram considerados e por isso é convocado o estipulado nos arts.414º do CPC.
42- impossibilidade prática de recurso a documentos atenta o tempo decorrido e a informalidade do caso representam um autêntico Abuso de Direito porquanto excede manifestamente o princípio da boa-fé exigir, quanto a relações pessoais, familiares e informais, ocorridas há muitos anos, exigir a prova de entregas de dinheiros, de contas prestadas quanto ao que terá sido entregue ao Réu.
43- Não atender ao alegado pelo recorrente consubstancia uma situação de impossibilidade prática de provar os factos exigindo do para o Réu uma prova diabólica, a qual é proibida em direito tal como sucede com a prova de facto negativo.
44- E tal contende com o princípio da proibição da indefesa que emana do princípio constitucional da igualdade, o acesso ao direito e aos tribunais, arts. 20 ºe 202º, nº2e 13º todos da CRP, vícios de inconstitucionalidade que são arguidos no recurso e que fundamentam também a Revista Excecional.
45- Assim, o Recurso assenta, para efeitos do art.672º, nº1, al. a) e b) do CPC, essencialmente nos pressupostos da relevância jurídica e particular relevância social, logo verificado o alegado é admissível como REVISTA EXCEPCIONAL e como tal, é competente a formação prevista no art.672, nº3 do CPC, o qual deve admitido como REVISTA EXCEPCIONAL.
A) Os factos.
O acórdão recorrido julgou:
A.1. Provados os seguintes factos:
1. No dia 04 de Junho de 2001, no 1.º Cartório Notarial de Santa Maria da Feira, foi outorgada procuração por CC contribuinte nº ... ... .60 e mulher DD contribuinte nº ... ... .45, casados no regime de comunhão geral, residentes no lugar ..., em Santa Maria da Feira, constituíram seu bastante procurador o seu filho, aqui requerido, BB, a quem “...com a faculdade de substabelecer, concedem poderes forenses em geral e em direito permitidos, e ainda poderes para comprar, vender, arrendar e hipotecar quaisquer bens imóveis, nas condições que entender convenientes, movimentar quaisquer contas bancárias, outorgar contratos promessas de compra e venda, representá-los em tudo o que diga respeito ao contrato-promessa de permuta celebrado com “J..., Lda.”, concedendo-lhe também poderes para os representar junto de quaisquer Repartições Públicas, nomeadamente Repartições de Finanças, Conservatória do Registo Predial, podendo aí requerer quaisquer registos, provisórios ou definitivos, cancelamentos e averbamentos e prestar declarações complementares, praticando e assinando tudo quanto se mostre necessários aos indicados fins.”
2. Os outorgantes deste acto notarial faleceram 20.04.2017 e em 31.05.2019, respectivamente.
3. O réu, munido de procuração, interveio, em representação dos mandantes, na outorga das escrituras de compra e venda celebradas com a firma “Construções J..., Lda.” realizadas nos dias 9 de Janeiro de 2003, 3 de Julho de 2003 e 19 de Setembro de 2003.
4. O réu, munido da procuração, interveio em diversos contratos de arrendamento de imóveis propriedade dos mandantes, estipulando os termos que entendeu convenientes.
5. O réu, ao abrigo da procuração mencionada em 1, recebeu rendas em numerário.
6. O réu, munido da procuração, interveio na venda da fracção “BS”, correspondente a uma habitação número vinte e seis, no terceiro andar, lugar de garagem na cave, com entrada pelo arruamento sul, que havia sido adquirida, através da escritura pública de compra e venda datada do dia 16 de Outubro de 2002, por CC à firma “Construções J..., Lda.”.
7. Uma parte não concretamente apurada das rendas era paga por transferência bancária para a conta do pai do réu.
a) - O R. sempre entregou aos representados tudo quanto lhe foi entregue quer eventuais valores de preços de vendas, quer rendas, quer rendimentos.
b) - E sempre deu a verificar movimentos bancários, valor dos depósitos e aplicações de acordo com o definido pelos representados.
c) - Tudo sempre foi gerido, decidido e verificado pelos representados que sempre foram senhores de tudo até à sua morte, sempre souberam quem eram contrapartes, o valor dos preços, das rendas, os rendimentos e dos movimentos de dinheiros e sua disposição.
Cumpre agora conhecer da reclamação, nos termos previstos no n.º 3, do art.º 652.º, aplicável ex vi do art.º 679.º, ambos do C. P. Civil.
Importa, desde já, referir que a presente reclamação, apresentando, em geral, uma sistemática que difere do requerimento de interposição de recurso, se limita a repetir os argumentos esgrimidos nesse requerimento para o recebimento do recurso, os quais foram apreciados pelo despacho de rejeição reclamado.
Não obstante vejamos:
Sob o vetusto jargão de “decisão surpresa” invoca agora o reclamante a violação do disposto no n.º 3, do art.º 655.º, do C. P. Civil, que qualifica de nulidade em face do disposto no art.º 195.º, do C. P. Civil e atentatória do princípio do processo justo e equitativo, previsto no n.º 4, do art.º 20.ª, da Constituição da República Portuguesa.
Ora, o despacho reclamado não constitui “decisão surpresa” porque o Reclamante previu a questão nela abordada, da inadmissibilidade da revista, sobre ela se pronunciando premonitoriamente, tendo a parte contrária respondido a essa premonitoriedade, sendo certo que inexiste fundamento legal de ordem processual, para que o Reclamante possa apresentar a segunda pronúncia que se arroga, em réplica à resposta da parte contrária à questão que ele próprio antecipou.
O Reclamante não foi, pois, surpreendido com a questão porque foi ele que a levantou antecipadamente, sobre ela se pronunciando, com o que o “contraditório “ em relação a essa questão foi exercido pelo próprio Reclamante, que antecipou a versão contrária àquela por que pugnou no requerimento em que pediu a admissão da revista.
Essa circunstância foi objeto de pronúncia pelo despacho reclamado quando refere que:
- Em relação ao Reclamante:
“Confrontado com o normativo do n.º 3, do art.º 671.º, do C. P. Civil, em ordem a contrariá-lo, aduz o apelante que o acórdão alterou a matéria de facto com importância na decisão de mérito a proferir, que enferma de nulidades, que padece de erros de julgamento com violação da lei substantiva e adjetiva, assentando em matéria de facto diferente e fundamentação essencial diferente.
Tais invocados fundamentos não têm acolhimento nos autos e nenhum deles, nos precisos termos em que o Recorrente os invoca, conduz à descaracterização da dupla conforme, a qual se encontra presente nos autos e obsta ao recebimento da revista.”;
- Em relação à Reclamada:
“Nas suas contra-alegações invoca a Recorrida que a revista não é admissível pelo facto de as decisões das instâncias se encontrarem numa relação de dupla conforme, tal como previsto no n.º 3, do art.º 671.º, do C. P. Civil, porque as nulidades invocadas pelo Recorrente não constituem fundamento autónomo de admissão da revista e porque a admissibilidade da revista como excecional apenas se justificará, citando o acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 25.09.2024, proferido no proc. 3686/22.1T8FAR.E1.S2. “…em questões cujo relevo jurídico seja indiscutível, perante notória e relevante divergência doutrinária ou jurisprudencial ou quando estejam em causa perante operações exegética seja de especial complexidade/dificuldade, tendo em vista prevenir futuras dificuldades e contradições”, o que no caso não acontece”.
Subsequentemente à nulidade de “decisão surpresa” o Reclamante invoca uma outra, que consistiria agora em a revista excecional ter sido decidida em decisão singular pelo relator.
Em relação a este argumento importa, primeiramente, precisar que o despacho reclamado tem a natureza jurídica de despacho de rejeição do recurso, previsto nas als, b) e h), do n.º 1, do art.º 652.º, do C. P. Civil, como nele próprio se refere, que é diversa da decisão sumária de recurso prevista no art.º 656.º, do C. P. Civil, e em segundo lugar que esse despacho não decidiu a revista excecional como nele próprio se adverte sob a expressão “A questão que agora se coloca, de ausência de subsunção jurídico processual da pretensão de revista excecional, respeita, não já à verificação dos pressupostos da revista excecional, que é da competência da formação, mas ainda e só à aferição da ausência de invocação desses pressupostos, situando-se na fase preliminar da admissão do recurso a que se reporta o art.º 652.º, aplicável ex vi do art.º 679.º, ambos do C. P. Civil, que é função do relator e não da formação em causa.”.
O relator proferiu despacho em exercício das suas competências nessa qualidade, não se substituindo à formação prevista no n.º 3, do art.º 672.º, do C. P. Civil, configurando-se, pois, como inconsistente também esta invocada nulidade.
Subsequentemente, ainda, arguiu o Reclamante uma terceira nulidade, agora de omissão de pronúncia, de que enfermaria o acórdão recorrido e também o despacho reclamado.
Que o despacho reclamado não incorre nessa nulidade decorre da sua própria fundamentação quando, citando inúmeros acórdãos sobre essa mesma questão, nele se expende que “Com efeito, como é jurisprudência unívoca deste Supremo Tribunal de Justiça, quando a revista não é admissível por virtude da ocorrência de dupla conforme, as nulidades previstas nas alíneas b) a e), do n.º 1, do art.º 615.º do C. P. Civil só são arguíveis na revista se a mesma for interposta a título especial (art.º 629.º, n.º 2, do C. P. Civil) ou de revista excecional (art.º 672.º, n.º 1, do C. P. Civil)”.
Como se decidiu no acórdão deste Supremo Tribunal de 30-03-20221 “…as nulidades, apesar de poderem constituir fundamento de revista, nos termos do artigo 674º, nº 1, al. c), do Código de Processo Civil, não são elas próprias definidoras da admissibilidade desse recurso, a qual está prevista no artigo 671, nºs 1 e 2, do mesmo Código, ficando a sua arguição dependente da sua admissibilidade, e não prejudicando a mesma arguição a existência da dupla conformidade”.
E como exarado na fundamentação do acórdão de 02-03-20212 “…esse conhecimento das nulidades pressupõe necessariamente que o recurso ordinário (de revista, neste caso) seja admissível. E não é, enquanto revista normal. Nem enquanto revista extraordinária (art. 629º, 2, CPC, para o qual remete o art. 671º, 3), que não foi configurada”.
Ou seja, como é jurisprudência unívoca neste Supremo Tribunal, a arguição de nulidade não constitui fundamento autónomo de revista, só sendo conhecida se a revista for admitida a título de revista normal ou excecional.
Após a arguição das nulidades antes referidas, persiste o Reclamante na alegação de inexistência de dupla conforme entre as decisões das instâncias repetindo para o efeito a argumentação já expendida no requerimento e alegações da interposta revista, expendendo nessa senda que o acórdão recorrido “…acrescentou o facto provado “7. Uma parte não concretamente apurada das rendas era paga por transferência bancária para a conta do pai do réu”. …. de modo que ocorre uma contradição insanável entre os factos provados e não provados como se detalha na motivação de recurso”.
Sobre esse mesmo facto e argumento expende o despacho reclamado que:
“Com efeito, invocando o recorrente que o acórdão alterou a matéria de facto com importância na decisão de mérito a proferir, constatamos que o acórdão julgou parcialmente procedente a impugnação pelo Recorrente da decisão em matéria de facto, aditando sob o seu próprio impulso um novo facto sob o n.º 7 dos factos provados com o seguinte conteúdo:
“7. Uma parte não concretamente apurada das rendas era paga por transferência bancária para a conta do pai do réu.”.
Ora, esse facto, que terá relevância nas concretas contas a prestar não teve qualquer influência na declaração da obrigação de prestar contas, que constitui o núcleo da decisão da sentença e do acórdão que a confirmou”.
Repetindo-se também quanto ao facto provado sob o n.º 6 da respetiva espécie aduz o reclamante que “…ao dar-se como provado o ínsito em 6º dos factos provados inexistindo nos autos qualquer escritura pública ou documento equivalente, necessário para a prova de tal facto”.
Relativamente a este argumento para a inexistência de dupla conforme consta na fundamentação do despacho reclamado que:
“Aliás, as diversas violações de regras de direito probatório material que o Recorrente imputa às instâncias na fixação, na alteração e na não alteração da sentença em matéria de facto não têm o condão de descaracterizar a dupla conforme que impede o recurso de revista.
O Recorrente imputa ao acórdão recorrido um primeiro erro na decisão sobre matéria de facto, relativa ao depoimento de parte da A, que considera “violar o princípio da igualdade das partes e da boa-fé processual” (conclusões 1ª a 7ª e 78ª).
Altera em seguida a sua própria pretensão de alteração do facto provado sob o n.º 6 dos factos provados, esgrimida na apelação, pois, enquanto na conclusão 70ª da apelação pedia que a Relação alterasse o facto provado sob o n.º 6 para “ 6º O Réu, com base nessa procuração, assinou a venda da fracção “BS” correspondente a uma habitação número vinte e seis, no terceiro andar, lugar de garagem na cave, com entrada pelo arruamento sul, que havia sido adquirida através da escritura pública de compra e venda datada de 16 de Outubro de 2002, por CC à firma “Construções J..., Lda”, agindo em substituição dos vendedores e por solicitação destes.”, pretende agora nas conclusões 8ª a 10ª, 31ª e 32ª da revista que esse facto seja declarado não provado.
Sobre esse mesmo facto a 1ª instância fundamentou a sua decisão referindo que “Os itens 4, 5 e 6 advêm essencialmente das declarações de parte do Réu, o qual demonstrou um conhecimento pleno e imediato dos factos em questão, na medida em que neles teve intervenção directa, referindo nesse contexto alguns dos actos por si executados no âmbito dos poderes atribuídos pela procuração, explicitando-os.”
Tendo o acórdão recorrido julgado improcedente a impugnação do Recorrente, aduzindo que “3.4. À semelhança do que já ficou dito no acórdão por nós proferido nestes autos em 08.11.2022, as alterações que o recorrente pretende ver introduzidas nos pontos 3 e 6 dos factos provados revelam-se totalmente inócuas, pelo que devem soçobrar. Na verdade, como ali também ficou dito, para o efeito da obrigação de prestar contas, afirmar que o réu interveio em determinados contratos “em substituição dos seus pais” não é diferente de afirmar que o fez “em representação dos mandantes” e/ou “munido da procuração”.
Pelo exposto, julga-se improcedente, nesta parte, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.”.
A questão da revista relativa ao facto provado sob o n.º 6 configura-se, pois, como questão à revelia e mais do que isso, “contra factum proprium”, da apelação que, como tal não será conhecida, ainda que a revista seja admitida, não constituindo fundamento autónomo para admissão da revista, não tendo aptidão para descaracterização da dupla conforme, consagrada no n.º 3, do art.º 671.º, do C. P. Civil”.
Mais invoca agora o Reclamante para a admissão da interposta revista, que o acórdão recorrido terá incorrido em violação do disposto no art.º 662.º, do C. P. Civil, citando em abono da descaraterização da dupla conforme o acórdão deste Supremo Tribunal de 28-01-2016, proferido no P.º 802/13.8TTVNF.P1.G1-A.S1, sem todavia, substanciar essa imputação, limitando-se a exprimir a sua discordância com o acórdão recorrido e o seu desejo de acesso a um terceiro grau de decisão.
Sobre esta matéria, como exarado no despacho reclamado “Nas conclusões 19ª a 23ª e 28.ª pretende o Recorrente que seja aditado um novo facto à matéria de facto provada, cuja ausência qualifica como “de erro notório na decisão e que o douto Acórdão incorre em violação da lei substantiva e adjetiva no julgamento da matéria de facto e que cabe nos poderes deste Supremo Tribunal conhecer ao abrigo dos arts. 5°n°2, 8o e 411°, 674° n.° 3 e 682.° n3 todos do CPC” (conclusão 23ª).
Trata-se também aqui de uma questão nova, não suscitada na impugnação da decisão da primeira instância em matéria de facto, nomeadamente nas conclusões 71ª, 75ª e 76ª, apesar do expendido na conclusão 67ª, e que em si mesma, sem prejuízo do disposto no n.º 3, do art.º 682.º, do C. P. Civil, se a revista fosse admissível, também não constitui fundamento de admissão da revista, com a descaracterização da dupla conforme”.
E sobre esta matéria, ainda, não obstante a alteração de sistemática entre a interposta revista e esta reclamação, como consta na fundamentação do despacho reclamado, “Como decidido e sumariado no acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 26-11-2022, “A dupla conformidade não é descaracterizada – por não existir qualquer base legal para o efeito – nem pelos alegados erros de julgamento na aplicação de regras de direito probatório, nem pelos alegados erros na aplicação de regras de direito substantivo, nem pelas alegadas inconstitucionalidades na interpretação dessas normas de direito probatório e de direito substantivo”.
O Reclamante limita-se agora a insistir, escudando-se em violação pela Relação do poder/dever de reapreciação da decisão em matéria de facto, mas tal violação não se verifica, como demonstrado pelo despacho reclamado sobre a mesma concreta argumentação.
E assim sendo, porque estão reunidos os três pressupostos da dupla conforme estabelecidos pelo n.º 3, do art.º 671.º, do C. P. Civil, de confirmação da sentença, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, por força desse preceito processual não é admissível o recurso de revista do acórdão da Relação.
A revista poderia ser admitida a título excecional, nos termos consagrados no art.º 672.º, do C. P. Civil, impendendo sobre o Reclamante o ónus de alegação dos respectivos pressupostos legais.
Pretende o Reclamante que alegou esses pressupostos, indicando agora as als. a) e b), do n.º 1, do art.º 672.º, do C. P. Civil repetindo o já expendido nas respetivas alegações, mas tal não acontece como demonstrado pelo despacho reclamado quando refere que:
“O Recorrente declara interpor revista também a título excecional, o que fundamenta logo no introito do corpo das alegações nos seguintes termos interlocutórios:
“…a matéria que está em causa conforme infra se alega, fundamenta a interposição de revista excecional nos termos do artigo 672º do CPC.
Nesse caso, invoca-se a errada e contraditória aplicação da lei substantiva e adjetiva, o relevo jurídico e social das questões discutidas nos autos para afirmar o primado do substantivo e rejeitar a violação da lei na apreciação dos factos provados, enlevando os princípios fundamentais do Direito perseguidos pelos institutos do Abuso de Direito, Proibição da indefesa e Boa-fé, sendo que o abuso de direito e a proibição de indefesa são invocáveis a todo o tempo e de conhecimento oficioso, pelo que cotejando com as alterações da matéria de facto, o impetrado na apelação e as nulidades previstas no art.615, nº1 c) e d), referidas, tal é arguível em sede de revista excecional prevista no artigo 672º, nº1 do CPC, o que se invoca.
Assim, seguindo a “jurisprudência das cautelas”, (cfr. Abrantes Geraldes in Recursos no Novo Código de Processo Civil) permitindo em alternativa a admissibilidade do recurso, vem, junto de V. Excias, quanto ao douto Acórdão, prevenindo a possibilidade de entendimento diferente, interpor RECURSO DE REVISTA EXCECIONAL ao abrigo do artigo 672º do CPC, nos termos da fundamentação que segue infra, devendo ser admitido para ser sujeito a apreciação pela douta formação de Juízes Conselheiros prevista no art.672º, nº3 do CPC para que decida da verificação e dos pressupostos indicados no nº1 do art.672º CPC.
- Por estar em causa questão de suprema relevância jurídica e que se prende com uma justa aplicação do direito de acordo com a jurisprudência dos interesses e simultaneamente com enorme relevância jurídica e até social na aplicação do direito, conforme alegação que segue ao diante.
- Questão que exige uma ponderada e sapiente decisão que, atentando em todos os factos, mesmo os instrumentais os quais ajudam a decidir os factos essenciais, sindicando os erros e omissões cometidas na decisão sobre a matéria de facto, não deixe de atentar na manifesta insuficiência de factos alegados pela Autora.”.
Aos fundamentos de admissibilidade da revista a título excecional dedica o Recorrente as conclusões 51ª e sgts das alegações.
As conclusões 51ª a 55ª comportam um novo introito à interposição da revista a este título (excecional) nos seguintes termos:
“51a- A questão jurídica e de facto que se discute nos autos é de suprema relevância quer ao nível da aplicação do direito, das soluções jurídicas em dissídio e da sua relevância social.
52a- Sobretudo tendo em conta que na aplicação do direito este deve ser sempre ligado a uma jurisprudência dos interesses que faça das normas uma interpretação que sustente a teleologia dos lídimos interesses da comunidade e no fim de tudo, o direito material.
53a-E prende-se com uma ponderada e sapiente decisão que pesando todos os factos, mormente os instrumentais e que ajudam a decidir os factos essenciais, repare os erros e omissões cometidas na decisão sobre a matéria de facto e repare erros de julgamento e da aplicação do Direito.
54a- Com efeito, basta atentar no facto de a própria Autora ter declarado em sede de audiência de julgamento, (vide pag.52 douto Acórdão) que quanto ao alegado pagamento das escrituras que menciona, não houve pagamentos, pelo que logo admite que não há lugar a prestar contas do que inexistiu.
55a-Acresce a violação da lei substantiva nos termos do art.5°, n°2 do CPC ao dar como provados factos relativos a compra e venda de imóvel sem que exista nos autos escritura de compra e venda ou título equivalente, necessário para tal prova.”.
Ora, analisadas as conclusões subsequentes, constatamos que, apesar de a conclusão 51ª estatuir que “A questão jurídica e de facto que se discute nos autos é de suprema relevância…”, não é identificada a proposta questão jurídica e de facto, mas sim repetida a discordância do Recorrente com o acórdão recorrido (conclusões 98ª, 104ª a 113ª, 122ª) e a sentença por ele confirmada, a qual se desenrola de novo em cada um dos itens invocados como fundamento da revista tout court, como o próprio Recorrente declara entre as conclusões 73ª e 74ª, com a expressão “Assim, embora reproduzindo todas as conclusões infra tratando-se de recurso próprio esta revista excecional, por cautela,”.
E assim acontece com a discordância com o facto provado sob o n.º 6 dos factos provados (conclusões 55ª, 63ª, 64ª, 65ª, 79ª a 81ª, 102ª, 103ª), com o facto provado sob o n,º 7 dos factos provados (conclusões 56ª a 58ª, 95ª), com a nulidade por contradição insanável (conclusões 59ª, 61ª, 62ª, 66ª, 96ª, 97ª, 100ª), com o abuso de direito, a inconstitucionalidade e a proibição de indefesa (conclusões 60ª, 72ª, 73ª, 86ª, 114ª a 121ª), com o não aditamento de facto (conclusões 67ª, 90ª a 94ª, 99ª), com as dificuldades de prova (conclusões 68ª a 71ª, 82ª a 85ª, 119ª), com o depoimento da A/recorrida (conclusões 74ª a 78ª).
Ora, esta alegação feita em termos que não identificam a qual das alíneas do n.º 1, do art.º 672.º, se reporta a pretensão de interposição/recebimento de revista excecional do Recorrente, nomeadamente, se à al. a) - questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito- ou se à al. b)- interesses de particular relevância social – uma vez que não é invocado qualquer outro acórdão com o qual posse ocorrer a contradição de acórdãos a que se reporta a al. c), do mesmo n.º 1, corresponde à não invocação de qualquer fundamento para a admissibilidade da revista excecional.
O que o Recorrente pretende é que a revista seja admitida a título excecional com os mesmos fundamentos que invocou para obstar à aplicação do instituto da dupla conforme, já analisados e inábeis para o efeito pretendido, de admissão da revista (normal).”.
Com esta Reclamação para a conferência exercita o Reclamante a sua discordância com o despacho reclamado, mas essa discordância não tem nem poderia ter o condão de sanar a omissão do requerimento de interposição da revista e das respectivas alegações quanto à alegação e substanciação dos pressupostos da revista excecional.
A interposta revista a título excecional não é, pois, admissível, e também não poderia deixar de ser rejeitada pelo despacho reclamado, como foi.
Pelo exposto, acordam os juízes neste Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente a Reclamação, confirmando o despacho reclamado.
Custas pelo Reclamante, que lhes deu causa, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2, do art.º 527.º, do C. P. Civil, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC.
Lisboa, 02-10-2025
Orlando dos Santos Nascimento (relator)
Emídio Francisco Santos
Isabel Salgado
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