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EMBARGO DE OBRA NOVA
PRÉDIOS CONTÍGUOS
FRESTAS E JANELAS
DIREITO DE PROPRIEDADE
SERVIDÃO DE VISTAS
Sumário
Sumário: (da responsabilidade do relator): A existência de frestas e janelas que não obedeçam aos requisitos legais, decorrido o prazo da usucapião, podem originar a aquisição do direito de manter tais aberturas em condições irregulares, impedindo o proprietário por elas afectado de exigir que sejam modificadas e postas em conformidade com a lei, mas não o impedem de construir junto à linha divisória, ainda que as tape.
Texto Integral
Acordam os juízes na 8.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
I – RELATÓRIO
1.1. AA, BB e CC, representada pela DD, propuseram contra ..., procedimento cautelar de embargo de obra nova, ao abrigo do disposto no art. 397.º do CPC, formulando os seguinte pedidos:
«A) Condenar a R. a reconhecer os AA. como donos e legítimos proprietários das frações em discussão; B) Ordenar-se o embargo da obra da R. até à decisão final em ação a interpor que decida pela ilegalidade da construção adjacente em execução pela Requerida, devendo os trabalhos serem imediatamente suspensos sem a audição prévia da Requerida».
Para tanto, alegaram, em síntese, que:
- os Requerentes são proprietários, respectivamente, das fracções autónomas designadas pelas letras H, J, F do prédio urbano sito na Rua ..., n.º 36 em Lisboa;
- a Requerida é proprietária do prédio urbano sito na Rua ... n.ºs 24 a 30, em Lisboa, que, embora conste da matriz e da descrição predial como sendo um edifício de habitação e comércio com rés-do-chão, sobreloja, 1.º andar e águas furtadas, não existe fisicamente há alguns anos, tratando-se de um espaço totalmente aberto onde foi demolido o anterior prédio;
- os prédios referidos são contíguos, sendo que o prédio da Requerida apresentava-se ao nível da quota do 2.º andar do prédio onde se inserem as fracções dos Requerentes;
- as fracções dos 3.ºs, 4.ºs e 5.ºs andares do prédio sito no n.º 36 tinham janelas e frestas próprias e adequadas ao seu uso, que existiam desde a sua edificação, nos finais do séc. XIX/inícios do séc. XX, e faziam parte integrante do respectivo edifício;
- a Requerida solicitou e obteve licença para construção de cinco pisos e iniciou a construção de uma obra de raiz, sendo que, com essa conduta, está a tapar ostensivamente as frestas e janelas das fracções dos Requerentes nos locais que indicam e cujas características e dimensões descrevem;
- tal situação sonega o direito a vistas e retira a totalidade da salubridade e luz das fracções dos Requerentes, que deixam de ter vistas e arejamento, ficando na total penumbra.
Concluem que, com a sua conduta, a Requerida está a violar a propriedade dos AA., tapando-lhe as suas fontes de ar, luz e vistas, condicionando-a a outra configuração e desvalorizando-a.
1.2. A Requerida foi citada e deduziu oposição, pronunciando-se pela improcedência dos embargos de obra nova, alegando, em suma, que:
- o prédio da Requerida é composto por edifício de habitação e comércio com rés-do-chão, sobreloja, 1.º andar e águas-furtadas, com entrada pelos n.ºs 24 a 28, e edifícios de oficina, escritórios, logradouro e tanques de lavagens no tardoz, com entrada pelo n.º 30;
- o prédio sito no n.º 36 é composto por lojas e cinco andares, sendo que todos os seis pisos possuem janelas/e ou varandas;
- foi pedido, junto da Câmara Municipal de Lisboa, o licenciamento para a realização de obras no prédio da Requerida, incluindo a ampliação do edifício com mais um piso, o que foi deferido em 24.11.2020, tendo sido emitido alvará de obras;
- em 24.04.2023, a Requerida iniciou os trabalhos de demolição parcial do edifício habitacional e de comércio existente, mantendo a fachada principal do edifício, sendo que o edifício terá cinco pisos acima da cota soleira e um piso abaixo da quota soleira de acordo com o projecto aprovado;
- na empena lateral do prédio com o n.º 36 visualizam-se as aberturas com a localização e dimensões que descreve, cuja data de execução se desconhece e que não são compatíveis com a construção inicial, sendo que algumas sofreram alterações abusivas na sua configuração após maio de 2018.
Conclui que as aberturas existentes na empena lateral do prédio onde se inserem as fracções dos Requerentes não possuem as características necessárias para serem consideradas janelas para o efeito referido no art. 1362.º, n.º 2 do Código Civil, não podendo levar à constituição de uma servidão de vistas, não havendo, pois, qualquer violação do direito de propriedade dos Requerentes por parte da Requerida.
1.3. Logo a seguir aos articulados, foi determinada a realização de perícia, com o seguinte objecto:
«- se a obra do Requerido foi aprovada pela CML e quantos pisos estão em causa; - o prédio do Requerido apresentava-se ao nível da quota do segundo andar do prédio dos Requerentes; - se a obra do Requerido vai “tapar ostensivamente todas as frestas e janelas das frações dos Requerentes” ou apenas algumas e quais (nomeadamente, se correspondem às descritas no artigo 30.º do Requerimento Inicial); - as aberturas/janelas existentes nas fracções dos Requerentes, contíguas ao prédio do Requerido, correspondem às descritas no artigo 30.º do Requerimento Inicial; - quais as consequências da obra do Requerido quanto às janelas e frestas das fracções dos Requerentes, nomeadamente se tal vai implicar que as fracções deixem de ter arejamento, circulação de ar, entrada de luz, vistas; - se as frestas e janelas eventualmente afectadas pela obra do Requerido já existiam originalmente nas fracções de cada um dos Requerentes ou se foram construídas/abertas posteriormente e quando, caso seja possível determinar; tendo sido construídas/abertas posteriormente, aferir se respeitam as regras aplicáveis e se existe pedido/autorização para a sua realização, sendo esse o caso».
1.4. Após a realização da perícia, foi entendido pelo tribunal a quo, sem oposição das partes, que os autos continham já os elementos necessários para proferir decisão, sem necessidade de mais produção de prova ou realização de audiência final, pelo que, em 16.12.2024, foi proferida sentença que julgou o procedimento cautelar procedente e, consequentemente, determinou o embargo da obra da Requerida, sita na Rua ..., n.ºs 24 a 30, em Lisboa, sendo suspensos os respectivos trabalhos.
1.5. Inconformada, apelou a Requerida, pedindo a alteração da decisão recorrida no sentido de ser julgado improcedente o procedimento cautelar.
1.6. Por acórdão desta Relação de 27.03.2025, foi decidido: «(…) julgar verificada a nulidade da sentença, decorrente da não especificação concreta dos factos não provados e da sua concreta motivação e da omissão de pronúncia sobre os factos supra referidos no ponto 4.1.2, determinando a devolução dos autos à primeira instância, a fim de ser proferida nova decisão, precedida ou não da produção de outros meios de prova que o tribunal a quo considere indispensáveis, e na qual se pronuncie sobre os factos referidos no ponto 4.1.2., elenque os factos não provados e a sua concreta fundamentação e tenha em conta o mais exposto no ponto 4.2.».
1.7. Volvidos os autos à 1.ª instância, foi, novamente, entendido que os mesmos continham os elementos necessários para proferir decisão e foi ordenada a notificação das partes nos termos e para os efeitos do disposto no art. 3.º, n.º 3 do CPC, que nada disseram, após o que, em 29.05.2025, foi proferida sentença, julgando o presente procedimento cautelar procedente e determinando o embargo da obra da Requerida, na Rua ... 24 a 30, em Lisboa, com suspensão dos respectivos trabalhos.
1.8. Inconformada, voltou a apelar a Requerida, pedindo a alteração da decisão recorrida no sentido de se julgar improcedente o procedimento cautelar, para o que formulou as seguintes conclusões:
«A. O art. 364.º CPC impõe a apensação à ação do procedimento cautelar preliminar, quer o mesmo esteja findo, quer não, ficando o juiz da ação com exclusiva competência para os termos subsequentes à remessa. B. Atendendo a que a ação principal foi proposta em 20/02/2025 a Meritíssima Juíza não tinha competência para proferir sentença, verificando-se nos termos do artº 96 do CPC Incompetência Absoluta. C. Salientando-se que nos presentes autos a prova é meramente documental não tendo sido realizada audiência. Ainda que assim não se entenda, D. Não se pode conformar a Requerida com a douta decisão dos autos, que padece, salvo devido respeito, de erro de julgamento e de uma incorreta interpretação das normas jurídicas subsumíveis à causa. E. A sentença em recurso, decorrente da declaração de nulidade da anterior, continua a deixar inequivocamente de conhecer de todas as questões suscitadas pela Requerida, das quais dependia o decretamento da providência. F. “Porque estamos perante um procedimento cautelar, destinado, a acautelar o efeito útil da ação (dependente desta), convém que tenhamos presente certas especificidades, marcadas sobretudo pela simplicidade e celeridade, que justificam, para além do mais, que em lugar da prova do direito, o tribunal deva satisfazer-se com uma probabilidade séria da sua existência. No entanto, simplicidade e celeridade não poderão nunca redundar em ligeireza na aferição dos pressupostos de que a lei faz depender a concessão de uma tutela provisória.”; Acordão do Tribunal da Relação Do Porto de 13-07-2022 disponíveis na Base de Dados da DGSI, in www.dgsi.pt. G. Entende a Requeria que o tribunal a quo apreciou de forma incorreta a prova produzida, julgando incorretamente o facto levado à alínea r) da matéria de facto julgada como provada, “Os vãos existentes na fachada nascente são originais Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 21“, o que constituí uma alteração á matéria de facto dada como provada na anterior sentença sem recurso a qualquer outro meio de prova, claramente em contradição com o relatório pericial, pelo que não poderia ter sido dado com provado que os vãos são originais. H. Acresce que este facto se encontra em contradição com os factos constantes na aliena s) na qual se afirma que existiu um aproveitamento posterior de algumas aberturas transformadas em aberturas maiores. I. Quanto aos factos não provados (1. a 10), alegados pela Requerente, resultam da claramente da decisão do tribunal aquo de que o relatório pericial permitiu esclarecer as principais questões que se colocavam, não permitindo a resposta aos esclarecimentos suscitados, bem como a decisão de que os autos continham elementos necessários para decisão final (decisão esta que manteve após acórdão do Tribunal a quem). J. Errou o tribunal aquo ao não apurar a matéria alegada pela Requerida, nomeadamente: quanto às medições das aberturas efetuadas no exterior da fachada nascente; alterações das aberturas ao nível do 5º piso em contravenção com a lei, bem como data, ainda que aproximada, em que tais alterações foram efetuadas. K. De salientar que dos elementos constantes dos autos, nomeadamente Relatório Pericial, facilmente se comprova que se trata de aberturas que afunilando de forma que o perímetro interior é manifestamente superior ao perímetro exterior, indiciando que as mesmas terão sito feitas de dentro para fora, com aproveitamento da largura da empena. L. Errou ainda o tribunal a quo ao não se pronunciar sobre a qualificação jurídica de cada uma das aberturas em causa, concretamente se estamos perante janelas ou frestas, matéria alegada pela Requerida, tratando-se de uma questão que com mais propriedade deve ser respondida em sede de aplicação do direito aos factos, sendo esta matéria fundamental para apreciação e decisão nos presentes autos. M. De salientar que o tribunal aquo tinha elementos para se pronunciar, concretamente o Relatório Pericial que faz referência às quatro “frestas” do 5º piso, “janelas do tipo frestas” do 4º piso e “postigo elevado” do 3º piso. N. Acresce, ainda, que no entender da Requerida, o Tribunal aquo, igualmente errou, acerca do julgamento da matéria de facto, devendo ser-lhes aditados pontos de factos, essenciais para a decisão que não foram considerados provados e que constam do objecto da perícia. O. Constam dos autos meios de prova, concretamente do Relatório Pericial, que teriam permitido ao Tribunal a quo dar como provado que: “No caso em apreço e de forma genérica, o tapar das janelas e frestas das frações dos Requerentes não irá fazer com que estas deixem de ter arejamento, circulação de ar, entrada de luz e vistas. (Resposta quesito 5º). P. Nos pisos inferiores o tema das vistas não se coloca dado estarmos perante janelas do tipo fresta (piso 4) e do tipo postigo elevado (piso 3). (Resposta quesito 5º). Q. verifica-se, no entanto, o aproveitamento posterior de algumas frestas transformadas em janela, nomeadamente e conforme pode ser verificado na figura abaixo, vãos #4, #5 e #6 - fotografia de novembro de 2020. (Resposta quesito 6º). R. Este aproveitamento pode ser comprovado pela supressão, que pôde ser observada no local, do elemento central das frestas ao nível do piso 5. (Resposta quesito 7º). S. Acresce que de acordo com os elementos constantes do Relatório Pericial Fls 19 a 23 é possível comprovar que as alterações ocorreram entre 2018 e novembro de 2020. T. Os factos que ora se pretendem aditados foram alegados pela Requerida na sua oposição, sendo indispensáveis para a decisão de mérito. U. Quanto á aplicação do direito, os Requerentes identificam como direito real que pretendem proteger o direito de propriedade, que se apresenta como facto essencial no âmbito da causa de pedir. V. Os direitos reais de gozo traduzem-se no direito que assiste ao proprietário da coisa dela retirar as suas utilidades através do respectivo uso e fruição, e têm como seu expoente máximo o direito de propriedade, cujo conteúdo se encontra estabelecido no artigo 1305° do CC, estando sujeito aos limites da lei e das restrições por ela impostas. W. Tais restrições serão de direito público e de direito privado, sendo estas últimas as resultantes das relações de vizinhança, previstas e reguladas genericamente nos arts. 1344º e ss. do C.C., no capítulo respeitante à propriedade dos imóveis. X. Nos presente autos estamos no âmbito do direito privado. Y. A propriedade dos imoveis abrange o espaço aéreo que corresponde à superfície, bem como ao subsolo, com tudo o que neles se contém e não esteja desintegrado do domínio por lei ou negócio, compreendendo o direito de propriedade a faculdade de levantar edificações ou construções no respetivo prédio. Z. Estando em causa prédios contíguos a relação jurídica entre Requerentes e Requerida, enquanto titulares de direitos reais, concretamente, proprietárias de prédios confinantes, no que toca à edificação nos respectivos prédios, rege-se pelas normas do Código Civil - art°s. 1360° e seguintes, cujo escopo é regular os interesses conflituantes entre proprietários de prédios com relações de proximidade ou vizinhança. AA. Constatamos que os Requerentes não invocaram a específica violação do seu direito de propriedade à luz dos mencionados arts. 1360 a 1365 do C.C. ou de quaisquer outros normativos previstos em legislação especial. BB. Assim, do requerimento inicial não resulta que os Requerentes considerem incumpridas pela requerida quaisquer concretas regras, como as definidas no Código Civil relativamente às construções e edificações (arts. 1360 a 1365 do C.C.), tendo alegado que a ação a interpor visa a ilegalidade da construção adjacente em execução. CC. O direito dos Requerente a gozar e fruírem do seu imóvel não pode deixar de conciliar-se com idêntico direito de propriedade da Requerida relativamente ao prédio vizinho, devendo esta, por sua vez, respeitar na nova construção as regras estabelecidas no Código Civil sobre as construções e edificações e todas as demais previstas em legislação especial. DD. Razão pela qual é fundamental aferir das características das aberturas existentes e em causa nos presentes autos de acordo com o preceituado nos artºs 1362º em confronto com o disposto no artº 1363º, ambos do Código Civil, para saber se podem ser classificadas como janelas, para efeitos de aplicação do regime jurídico. EE. Sendo que a jurisprudência, se tem vindo a pronunciar no sentido de que uma abertura só pode ser qualificada como janela se permitir que um utilizador comum possa apoiar-se ou debruçar-se sobre o seu parapeito, ou sobre superfície que lhe corresponda, e como tal possa devassar o prédio vizinho. Neste sentido (Acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 01-04-2008, Processo 007A3114; Acordão do Tribunal da Relação Do Porto de 13-07-2022, Processo 132/22.4T8ILH.P1; (Acordão do Tribunal de Relação de Coimbra de 11-10-2017, Processo 107/15.0T8MBR.C1, disponíveis na Base de Dados da DGSI, in www.dgsi.pt; FF. Os elementos constantes do processo permitem concluir que, apenas ao nível do 5º piso existem janelas, as quais resultam de um aproveitamento de frestas, alteração claramente recente, seguramente sem que tenha decorrido o prazo de servidão de vistas por usucapião - cfr Relatório do Perito e registo fotográfico junto com a oposição como docs 23 a 31. GG. O tribunal aquo labora em manifesto erro ao considerar que é do próprio direito de propriedade que se trata e não de uma questão de servidão de vistas prevista nos artigos 1362º e 1363º do Código Civil. HH. Em sentido diverso os doutos Acórdãos referidos, na alínea) DD. II. Sendo que, efetivamente, não se verificam os pressupostos para a existência de uma servidão de vistas, que consiste na manutenção das janelas e na fixação de uma zona “non aedificandi”- não permissão de edificar no espaço de metro e meio, medido a partir dos limites do prédio. JJ. De salientar a desproporcionalidade entre os prejuízos alegados pelos Requerentes e os prejuízos da Requerida com a paralisação da obra, tendo em conta que existem soluções de ventilação das casas de banho, sendo ainda recorrente a existência de “quartos interiores” em edificações mais antigas. KK. A decisão proferida violou os art.º s 364º nº 2, 607º nº 4; 1363 nº 1 do Código Civil».
1.9. Os recorridos não contra-alegaram.
1.10. Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
Decorre do disposto nos arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1 do CPC, que as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial (cfr., neste sentido, Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2017, pág. 105 a 106).
Assim, atendendo às conclusões supra transcritas, as questões essenciais a decidir consistem, basicamente, em saber:
a. se o tribunal recorrido era, absolutamente, incompetente para decidir o procedimento cautelar;
b. se deve ser alterada a decisão de facto;
c. se se mostram ou não reunidos os pressupostos para o decretamento da providência.
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
3.1. A sentença sob recurso considerou, indiciariamente, provada a seguinte matéria de facto:
«a) O Requerente AA é proprietário da fracção autónoma designada pela letra “H”, correspondente ao terceiro andar esquerdo, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., n.º 36 em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo … e descrito na CRP de Lisboa sob o n.º … da freguesia de S. José (documentos 1 e 2 juntos com o Requerimento Inicial). b) O Requerente BB é proprietário da fracção autónoma designada pela letra “J” do mesmo prédio, correspondente ao quarto andar esquerdo (documentos 3 e 4 juntos com o Requerimento Inicial). c) A Herança de CC é proprietária da fracção autónoma designada pela letra “F” do mesmo prédio, correspondente ao quinto andar esquerdo (documentos 5 a 8 juntos com o Requerimento Inicial). d) Encontra-se registado a favor da Requerida o prédio urbano sito na Rua ... nºs 24, 24 A, 26, 28 a 30, composto por edifício de habitação e comércio com rés-do-chão, sobreloja, 1º andar e águas-furtadas, com entrada pelos nºs 24 a 28 e edifícios de oficina, escritórios, logradouro e tanques de lavagens no tardoz com entrada pelo nº 30 (documentos 9 e 10 juntos com o Requerimento Inicial). e) Os prédios em causa são contíguos um ao outro (admitido por acordo). f) O prédio da Requerida apresentava-se ao nível da quota do segundo andar do prédio dos Requerentes (Relatório Pericial de 04/09/2024, que se dá por reproduzido). g) A partir do 2.º andar, as fracções dos 3ºs, 4ºs e 5º andares do prédio dos Requerentes têm aberturas na fachada contígua ao prédio da Requerida (Relatório Pericial de 04/09/2024 e esclarecimentos de 24/10/2024, que se dão por reproduzidos). h) A Câmara Municipal de Lisboa deferiu o licenciamento de obras de alteração e ampliação do edifício na Rua ... 24-30, em 24 de Novembro de 2020, tendo sido emitido o Alvará de Obras (documentos 6 a 8 juntos com a Oposição). i) A Requerida solicitou e obteve licença para construção de 5 pisos (admitido por acordo). j) No pedido de licenciamento da Requerida à Câmara Municipal de Lisboa, referido no artigo h) não foi feita menção à (eventual) existência de vãos na empena/fachada lateral sobre o seu prédio (documentos 6 a 8 juntos com a Oposição e Informação da Câmara Municipal de Lisboa de 11/09/2024). k) A obra da Requerida vai tapar aberturas na fachada nascente do prédio dos Requerentes, nomeadamente: - (ID 1) Piso 3, vão único, casa de banho, com as medidas: Altura: 52, Largura: 44 Profundidade: 55 – vai ser totalmente tapado; - (ID 2) Piso 4, vão único, quarto, com as medidas: Altura: 54, Largura: 23, Profundidade: 30 – vai ser totalmente tapado; - (ID 3) Piso 4, vão único, casa de banho, com as medidas: Altura: 54, Largura: 23, Profundidade: 54 – vai ser totalmente tapado; - (ID 4) Piso 5, vão único, quarto 1, com as medidas: Altura: 67, Largura: 44, Profundidade: 47 - não vai ser tapado; - (ID 5) Piso 5, vão único, quarto 2, com as medidas: Altura: 64, Largura: 41, Profundidade: 45 – vai ser totalmente tapado; - (ID 6) Piso 5, vão único, cozinha, com as medidas Altura: 63, Largura: 48, Profundidade: 46 - não vai ser tapado; - (ID 7) Piso 5, vão único, casa de banho, com as medidas Altura: 65, Largura: 50, Profundidade:45 - não vai ser tapado. (Relatório Pericial de 04/09/2024 e esclarecimentos de 24/10/2024, que se dão por reproduzidos). l) Os vãos dos Requerentes, nomeadamente os identificados no Relatório Pericial com os ID 1 (piso 3), 2 (piso 4) e 3 (piso 4), identificados e descritos no artigo 30.º do Requerimento Inicial, irão ficar completamente tapados pela ampliação do edifício do Requerido (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 14). m) Os vãos dos Requerentes, nomeadamente os identificados no Relatório Pericial com (*) ID 4, 5, 6 e 7 do piso 5 poderão ou não vir a ser tapados total ou parcialmente, dependendo das características e revestimento da cobertura. Actualmente não se encontram obstruídos (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 14). n) O tapar das aberturas das fracções dos Requerentes afecta a ventilação, a iluminação natural e o conforto térmico do espaço respectivo (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 16, 2.º parágrafo). o) Num espaço do tipo casa de banho (pisos 3 e 4), se a abertura for tapada, ficando apenas a porta, verificar-se-á Deficiente Renovação de Ar (a porta não é suficiente para garantir uma boa circulação de ar. A humidade gerada pelos banhos e duches não terá como escapar, levando a uma acumulação de vapor de água. Isto pode resultar em bolor, odores desagradáveis e danos às superfícies, como paredes e tectos), Dependência Total da Iluminação Artificial, Acumulação de Humidade e Calor (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 16). p) No piso 5 o fecho do vão (ID 5) compromete a ventilação e iluminação natural. O ambiente pode tornar-se insalubre, desconfortável e prejudicial ao bem-estar dos ocupantes (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 16). q) As vistas serão removidas parcialmente no piso 5, vão (ID 5) (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 17). r) Os vãos existentes na fachada nascente são originais (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 21). s) Verifica-se o aproveitamento posterior de algumas aberturas transformadas em aberturas de maiores dimensões, nomeadamente os vãos #4, #5 e #6 (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 22). t) Não foi identificada a existência de nenhum pedido/autorização para o aproveitamento referido em s). (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 23). u) Na fachada tardoz do prédio da Rua ... nº 36, os seis pisos possuem aberturas e/ou varandas (documentos 10, 11 e 12 juntos com a Oposição). v) Na fachada tardoz do prédio da Rua ... nº 36, existem aberturas com gradeamento (documentos 10, 11 e 12 juntos com a Oposição). w) Não se verifica acesso às traseiras do prédio da Rua ... nº 36 (documento 12 junto com a Oposição). x) Na fachada frontal verifica-se ao nível do quinto piso - águas-furtadas - a existência de, pelo menos, uma trapeira (documentos 7 e 9 juntos com a Oposição). y) As fracções do 3º esquerdo e 4º esquerdo têm aberturas para a frente e traseira do prédio (documentos 10 e 11 juntos com a Oposição)».
3.2. A sentença recorrida considerou, indiciariamente, não provada a seguinte matéria de facto:
«1. Na empena lateral do prédio confinante com o prédio da Requerida encontram-se aberturas, que não são compatíveis com a construção inicial (artigo 36.º da Oposição - Provado apenas o que consta nos Factos indiciariamente Provados r) a t). 2. Considerando como ponto de partida o telhado do prédio da Requerida, seguindo no sentido ascendente e considerando as medições efetuadas no exterior: a) Uma abertura com aproximadamente 50 cm de altura e 45 cm de largura, com dois ferros, formando 4 espaços. b) Duas aberturas verticais com 58 cm de altura e 10 cm de largura. c) Quatro aberturas com 60 cm de altura e 40 cm de largura. d) Uma abertura retangular com cerca de 48 cm de altura e 10 cm de largura (artigo 37.º da Oposição - Provado apenas o que consta no Facto Indiciariamente Provado k) 3. A abertura identificada na alínea a) do Ponto 3. situava-se ao nível da fracção do 3º esquerdo, localizava-se abaixo da cumeeira e praticamente a tocar o telhado do prédio da Requerida, encontrava gradada com dois ferros, sendo um na vertical e outro na horizontal (artigo 39.º da Oposição - Provado apenas o que consta no Facto Indiciariamente Provado k). 4. As aberturas actualmente existentes, ao nível da fracção correspondente ao 5º esquerdo - águas furtadas - resultam de uma alteração abusiva ocorrida após Maio de 2018 (artigo 43.º da Oposição - Provado apenas o que consta nos Factos indiciariamente Provados r) a t). 5. Na data de 15 de Maio de 2018, foi efectuado um registo fotográfico do qual constam as fotografias juntas como documentos 28 e 29 (da Oposição) (artigo 44.º da Oposição). 6. Em 15 de Maio de 2018 as aberturas existentes ao nível do 5º andar esquerdo- águas furtadas, na lateral do prédio, eram oito (artigo 45.º da Oposição - Provado apenas o que consta nos Factos indiciariamente Provados r) a t). 7. Após 15 de Maio de 2018 foram efectuadas alterações que consistiram na junção de duas a duas, ficando assim as actuais 4 aberturas (artigo 46.º da Oposição - Provado apenas o que consta nos Factos indiciariamente Provados r) a t). 8. Alterações que consistiram na retirada de um pilar em cimento, com cerca de 13 cm (artigo 47.º da Oposição - Provado apenas o que consta nos Factos indiciariamente Provados r) a t). 9. As oito aberturas existentes em Maio de 2018 tinham a largura de 13,50 cm (artigo 49.º da Oposição - Provado apenas o que consta nos Factos indiciariamente Provados r) a t). 10. Com referência à fracção correspondente ao 5º esquerdo - águas furtadas - a existência de janelas a tardoz constitui alteração exterior que devia ter sido procedida de procedimento de controlo prévio municipal (artigo 50.º da Oposição - Provado apenas o que consta nos Factos indiciariamente Provados r) a t)».
IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
4.1. Da pretensa incompetência absoluta do tribunal recorrido para decidir o procedimento cautelar.
Considera a recorrente que, tendo sido instaurada em 20.02.2025 a acção principal de que o presente procedimento cautelar é preliminar, o mesmo deveria ter sido remetido para apensação a essa acção, sendo competente para os respectivos termos subsequentes o juiz da acção e carecendo a senhora juíza que proferiu a sentença recorrida de competência para o efeito (cfr. conclusões A) a C)).
Ora, efectivamente, de acordo com o disposto no n.º 2 do art. 364.º do CPC, «requerido antes de proposta a ação, é o procedimento apensado aos autos desta, logo que a ação seja instaurada e se a ação vier a correr noutro tribunal, para aí é remetido o apenso, ficando o juiz da ação com exclusiva competência para os termos subsequentes à remessa».
Como é consabido, o procedimento cautelar encontra-se dependente de uma outra acção que tenha por fundamento o direito acautelado e pode ser instaurado como preliminar ou como incidente de acção declarativa ou executiva.
Tal dependência manifesta-se, nomeadamente, na fixação do tribunal competente e na apensação do processo cautelar ao processo principal, conforme decorre dos n.ºs 2 e 3 do art. 364.º do CPC.
No caso do autos, a acção principal foi instaurada em 20.02.2025, sendo que, no dia 21.02.2015, os requerentes juntaram aos autos requerimento com o seguinte teor: «nos termos e para os efeitos do disposto no art. 373º, nº 1, al. a) do CPC, informar estes autos da propositura da ação principal, que corre termos no Juízo Central Cível de Lisboa – Juiz 15, sob o processo nº .../25.4T8LSB».
O procedimento cautelar deveria, pois, ter sido apensado à acção principal nessa data, passando o juiz da mesma a possuir a exclusiva competência para os termos subsequentes.
Sucede que o acórdão desta Relação de 27.03.2025 (cfr. ponto 1.6), anulou a sentença final proferida em 16.12.2024 (antes, portanto, da instauração da acção principal) e determinou «a devolução dos autos à primeira instância, a fim de ser proferida nova decisão, precedida ou não da produção de outros meios de prova que o tribunal a quo considere indispensáveis, e na qual se pronuncie sobre os factos referidos no ponto 4.1.2., elenque os factos não provados e a sua concreta fundamentação e tenha em conta o mais exposto no ponto 4.2.».
A nova decisão a proferir competia, naturalmente, ao juiz que proferiu a decisão anterior, sendo certo que não ocorreu qualquer circunstância que a tanto impossibilitasse.
Isso mesmo consignou a senhora juíza a quo, em despacho de 05.05.2025: «Informe o processo nº .../25.4T8LSB, Juízo Central Cível de Lisboa – Juiz 15, da pendencia do presente procedimento cautelar, que por ora não será remetido para apensação nos termos do artigo 364.º, n.º 2 do Código de Processo Civil por caber proferir decisão (pelo mesmo Tribunal que proferiu a decisão anterior)».
E, assim sendo, sem necessidade de maires considerações, improcede o recurso nesta parte.
4.2. Passemos, agora, à impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
4.2.1. A este respeito, importa não esquecer que o regime processual vigente restringe a possibilidade de revisão da matéria de facto a questões de facto controvertidas, relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente, admitindo-se, apenas, a reapreciação de concretos meios probatórios relativos a determinados pontos de facto impugnados.
Rejeitaram-se, desta forma, quer soluções maximalistas que determinam a repetição de julgamentos ou a reapreciação de todos os meios de prova anteriormente produzidos, quer a possibilidade de recursos genéricos contra a decisão de facto (cfr. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 7.ª ed., 2022, p. 194 e segs.).
Assim, versando o recurso sobre a decisão relativa à matéria de facto, o art. 640.º do CPC estabelece que o recorrente deve, obrigatoriamente, indicar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões) e, fundando-se a impugnação em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, especificar, na motivação, aqueles que, em seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos, devendo, ainda, consignar, na motivação do recurso, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos (cfr. Abrantes Geraldes, Ob. Cit., p. 197 e 198).
No caso que nos ocupa, a recorrente defende que:
a) o facto vertido na al. r) dos factos provados deve ser dado como não provado (cfr. conclusões G) e H));
b) ocorreu erro do tribunal a quo, quanto aos factos não provados sob os n.ºs 1 a 10, por «…não apurar a matéria alegada pela Requerida, nomeadamente: quanto às medições das aberturas efetuadas no exterior da fachada nascente; alterações das aberturas ao nível do 5º piso em contravenção com a lei, bem como data, ainda que aproximada, em que tais alterações foram efetuadas» (cfr. conclusões I) a K));
c) deveriam ter sido dados como provados, com base no relatório pericial e respectivos esclarecimentos, os seguintes factos (cfr. conclusões N) a T)): i. No caso em apreço e de forma genérica, o tapar das janelas e frestas das frações dos Requerentes não irá fazer com que estas deixem de ter arejamento, circulação de ar, entrada de luz e vistas. ii. Nos pisos inferiores o tema das vistas não se coloca dado estarmos perante janelas do tipo fresta (piso 4) e do tipo postigo elevado (piso 3). iii. verifica-se, no entanto, o aproveitamento posterior de algumas frestas transformadas em janela, nomeadamente e conforme pode ser verificado na figura abaixo, vãos #4, #5 e #6 - fotografia de novembro de 2020. iv. Este aproveitamento pode ser comprovado pela supressão, que pôde ser observado local, do elemento central das frestas ao nível do piso 5. v. As alterações ocorreram entre 2018 e novembro de 2020.
É nosso entendimento que a recorrente cumpriu, suficientemente, os ónus previstos no art. 640.º do CPC, pelo que cumpre conhecer do mérito da impugnação da decisão de facto, sendo certo que os aspectos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, dando-se prevalência à dimensão substancial sobre a estritamente formal (cfr. acs. do STJ, de 28.04.2014, de 08.02.2018, de 08.02.2018, de 06.06.2018, de 12.07.2018, de 13.11.2018 e de 03.10.2019, todos disponíveis in www.dgsi.pt).
4.2.2. Antes, porém, importa ter presente que, não obstante o princípio do dispositivo quanto à identificação dos pontos da discórdia, a Relação pode e deve:
- corrigir, oficiosamente, determinadas patologias que afectem a decisão da matéria de facto, como sejam contradições (cfr. art. 662.º do CPC);
- introduzir na decisão de facto impugnada as alterações que considere justificadas, ao abrigo dos poderes de livre apreciação/valoração/ponderação dos meios de prova indicados pela parte ou que se mostrem acessíveis no processo e de acordo com a convicção própria que formule
Na verdade, embora não seja permitido que a Relação, por iniciativa própria, reaprecie a generalidade dos meios de prova produzidos e que foram valorados pelo tribunal de 1.ª instância (pois que as alterações da matéria de facto devem respeitar o que o recorrente indicou nas alegações que delimitam o objecto recurso), uma vez indicados os pontos de facto controvertidos, «a Relação já não está limitada à reapreciação dos meios de prova indicados pelas pares, devendo atender a todos quantos constem no processo, independentemente da sua proveniência (art. 413.º), sem exclusão da possibilidade de efetuar a audição de toda a gravação se esta se revelar oportuna para a concreta decisão» (cfr. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 7.ª ed., 2022, p. 341).
No caso dos autos, desde logo, verifica-se clara contradição entre o conteúdo das als. k), l) e m) dos factos provados, na medida em que:
- na al. k) começa por referir-se que a obra da requerida vai tapar aberturas na fachada nascente do prédio dos requerentes, nomeadamente as aí identificadas, mas depois, relativamente a cada uma dessas aberturas, acaba por dizer-se que as identificadas como ID 4, 6 e 7 não vão ser tapadas;
- na al. l), volta a referir-se que as aberturas ou vãos identificados como ID 1, 2 e 3 irão ficar completamente tapados;
- na al. m), refere-se que as aberturas ou vãos identificados como ID 4, 5, 6 e 7 poderão ou não vir a ser tapados total ou parcialmente.
A decisão recorrida, nesta parte, baseou-se exclusivamente no teor do relatório pericial de 04.09.2024, com os esclarecimentos de 24.10.2024 (cfr. ponto IV da sentença), que, claramente, não logrou interpretar correctamente.
Assim sendo, atendendo ao teor do referido relatório pericial e respectivos esclarecimentos (que não foram postos em causa pelas partes), altera-se a redacção das referidas alíneas nos seguintes termos: k) O prédio dos Requerentes tem, nomeadamente, as seguintes aberturas ou vãos na respectiva fachada nascente (confinante com o prédio da Requerida): - (ID 1) Piso 3, vão único, casa de banho, com as medidas: Altura: 52, Largura: 44 Profundidade: 55; - (ID 2) Piso 4, vão único, quarto, com as medidas: Altura: 54, Largura: 23, Profundidade: 30; - (ID 3) Piso 4, vão único, casa de banho, com as medidas: Altura: 54, Largura: 23, Profundidade: 54; - (ID 4) Piso 5, vão único, quarto 1, com as medidas: Altura: 67, Largura: 44, Profundidade: 47; - (ID 5) Piso 5, vão único, quarto 2, com as medidas: Altura: 64, Largura: 41, Profundidade: 45; - (ID 6) Piso 5, vão único, cozinha, com as medidas Altura: 63, Largura: 48, Profundidade: 46; - (ID 7) Piso 5, vão único, casa de banho, com as medidas Altura: 65, Largura: 50, Profundidade:45. l) Os vãos identificados na alínea anterior com os ID 1 (piso 3), ID 2 (piso 4) e ID 3 (piso 4), irão ficar completamente tapados pela ampliação do edifício da Requerida; m) Os vãos identificados na alínea anterior com os ID 4, ID 5, ID 6 e ID 7, todos do piso 5, poderão ou não vir a ser tapados, total ou parcialmente,dependendo das características e revestimento da cobertura, sendo que, actualmente, não se encontram obstruídos;
4.2.3. Como se acabou de referir, a Recorrente propugna pelo aditamento aos factos provados dos seguintes factos: i- No caso em apreço e de forma genérica, o tapar das janelas e frestas das frações dos Requerentes não irá fazer com que estas deixem de ter arejamento, circulação de ar, entrada de luz e vistas. ii- Nos pisos inferiores o tema das vistas não se coloca dado estarmos perante janelas do tipo fresta (piso 4) e do tipo postigo elevado (piso 3).
Tal pretensão está relacionada com a matéria de facto que consta al. n) («n) O tapar das aberturas das fracções dos Requerentes afecta a ventilação, a iluminação natural e o conforto térmico do espaço respectivo (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 16, 2.º parágrafo)») e, por decorrência, nas als. o), p) e q) dos factos provados.
Embora na impugnação que deduz contra a decisão de facto, a Recorrente não aluda, expressamente, às als. n) a q) dos factos provados, afigura-se-nos inequívoco que, ao pretender que este tribunal ad quem considere como provados factos contrários aos que constam das referidas alíneas, tal impugnação abrange tais alíneas e a matéria de facto nelas contida.
Vejamos então.
A convicção do tribunal a quo, no que respeita à al. n) dos factos provados, assentou exclusivamente no teor do relatório pericial mencionado (cfr. ponto IV da sentença).
Sucede que, salvo o devido respeito, do referido relatório pericial não decorre a factualidade dada como provada na al. n).
Com efeito, o que consta do relatório pericial é o seguinte: «Pelas razões apontadas anteriormente, tapar uma janela ou fresta pode ter impactos significativos na qualidade do ambiente interno, afetando a ventilação, a iluminação natural, o conforto térmico e o bem-estar geral dos ocupantes. No caso em apreço e de forma genérica, o tapar das janelas e frestas das frações dos Requerentes não irá fazer com que estas deixem de ter arejamento, circulação de ar, entrada de luz e vistas. As frações possuem vãos na sua fachada principal e de tardoz. Contudo, e em particular num espaço do tipo casa de banho (pisos 3 e 4), se a janela for tapada, ficando apenas a porta como abertura, haverá consequências significativas para a ventilação, a iluminação e o conforto do espaço. (…) No piso 5 o fecho do vão #5 (ver figura 3 quesito anterior) é especialmente relevante uma vez que ao tapar a janela do quarto, deixando apenas a porta como abertura, compromete significativamente a habitabilidade do espaço (os espaços nestes pisos são explorados individualmente em termos económicos). Sem ventilação e iluminação natural, o ambiente pode tornar-se insalubre, desconfortável e prejudicial ao bem-estar dos ocupantes. Em termos de vistas, estas serão removidas parcialmente neste piso, nomeadamente e novamente numa primeira apreciação no espaço referido no parágrafo anterior (ver fotografias em anexo - piso 5 - espaço #5 - quarto 2), uma vez que o fecho total ou parcial do vão poderá depender, como já referido, das características e revestimento da cobertura. Nos pisos inferiores o tema das vistas não se coloca dado estarmos perante janelas do tipo fresta (piso 4) e do tipo postigo elevado (piso 3)» (sublinhados nossos).
Vemos, pois, que, após referir, em abstracto, as consequência do tapar de janelas e frestas, o senhor perito afirma que, no caso concreto e de um modo geral, tal não irá fazer com que as fracções dos Requerentes deixem de ter arejamento, circulação de ar, entrada de luz e vistas.
Importa, pois, alterar a redacção da al. n), dando, de igual forma, satisfação à pretensão da recorrente quanto ao facto i. que pretende ver aditado: n) O tapar dos vãos referidos na al. k) não irá fazer com que as fracções dos Requerentes deixem de ter arejamento, circulação de ar, entrada de luz e vistas, porquanto as mesmas possuem vãos na sua fachada principal e de tardoz, sem prejuízo do que consta das als. o) e p);
Também a redacção das als. o), p) e q) não poderá manter-se, quer porque as mesmas se limitam a transcrever, de forma mecânica e descontextualizada, partes do relatório pericial referido, quer porque nelas acaba por transpor-se para os factos provados realidades que o senhor perito admite, meramente, como possíveis, mas cuja efectiva verificação não se mostra comprovada no caso dos autos.
Na verdade, o senhor perito limita-se a admitir como possível que o tapar dos vãos das casas de banho dos piso 3 e 4 (que ficariam apenas com a porta como abertura) possa ter consequências ao nível da renovação e circulação do ar e vir a causar acumulação de vapor de água, bolor, odores desagradáveis e danos nas paredes e tectos, mas não assegura que tal venha, com uma probabilidade segura, a acorrer (v.g. «Sem uma janela, a única fonte de ventilação seria a porta, que não deverá ser suficiente para garantir uma boa circulação de ar. A humidade gerada pelos banhos e duches não terá como escapar, levando a uma acumulação de vapor de água. Isto pode resultar em bolor, odores desagradáveis e danos às superfícies, como paredes e tetos»).
As consequências dadas como certas sob a al. o) dos factos provados não encontram no relatório pericial o necessário suporte probatório, sendo certo que o tribunal a quo se apoiou exclusivamente no mesmo.
No que respeita ao piso 5, o senhor perito afirma que o tapar do vão retirará a ventilação e a iluminação natural do quarto 2, limitando-se, também aqui, a admitir a possibilidade de, em consequência disso, o ambiente se tornar insalubre, desconfortável e prejudicial ao bem estar dos ocupantes («Sem ventilação e iluminação natural, o ambiente pode tornar-se insalubre, desconfortável e prejudicial ao bem-estar dos ocupantes»), salientando, de forma relevante, que o espaço é explorado individualmente em termos económicos, com o que parece pretender referir-se a uma exploração em termos de alojamento local, que, dada a frequência, número e rotatividade dos ocupantes, poderá agudizar aquela possibilidade. Seja como for, essa possibilidade não foi atestada através de outros meios de prova, sendo, apenas, conjectural ou hipotética, pelo que, salvo melhor opinião, não pode ser levada aos factos provados como consequência necessária do tapamento do vão.
No que concerne à al. q), o tribunal a quo considerou que as vistas serão removidas parcialmente no piso 5, no que respeita ao vão ID 5, mas o que decorre do relatório pericial, onde, mais uma vez o tribunal a quo se apoiou exclusivamente, é que tais vistas poderão ser total ou parcialmente removias, dependendo das características e revestimento que a cobertura venha a ter.
Assim, altera-se a redacção das als. o), p) e q) nos seguintes termos: o) O tapar dos vãos referidos na al. l) com os ID 1 (casa de banho) e ID 3 (cada de banho), ficando apenas a porta como abertura, terá consequências para a ventilação, a iluminação e o conforto desse espaço; p) Otapar do vão referido na al. m) com o ID 5 (quarto 2), ficando apenas a porta como abertura, comprometerá a ventilação e iluminação natural desse espaço, que é explorado individualmente em termos económicos; q) Otapar do vão referido na al. m) com o ID 5 (quarto 2), removerá, total ou parcialmente, as respectivas vistas, consoante as características e revestimento que a cobertura do prédio das Requeridas venha a ter.
A este propósito, importa, ainda, dizer que o “facto” ii. que a recorrente pretende ver aditado (ii- Nos pisos inferiores o tema das vistas não se coloca dado estarmos perante janelas do tipo fresta (piso 4) e do tipo postigo elevado (piso 3)), constitui matéria de Direito (saber se nos pisos inferiores o tema das vistas se coloca ou não, dado estarmos perante janelas do tipo fresta (piso 4) e postigo elevado (piso 3), é algo que decorre da lei aplicável), pelo que não pode ser elencada entre os factos provados.
Com efeito, na matéria de facto, à qual se irá, em momento posterior, aplicar o direito, não pode conter-se «qualquer valoração segundo a interpretação ou aplicação da lei, ou qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica» (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Código de Processo Civil, Lex, 1997, p. 312).
Como refere Helena Cabrita, in A Fundamentação de Facto e de Direito da Decisão Cível, Coimbra Editora, Coimbra, 2015, p. 106-107, «os factos conclusivos são aqueles que encerram um juízo ou conclusão, contendo desde logo em si mesmos a decisão da própria causa ou, visto de outro modo, se tais factos fossem considerados provados ou não provados toda a ação seria resolvida (em termos de procedência ou improcedência) com base nessa única resposta».
Não desconhecemos que a mais recente jurisprudência dos tribunais superiores tem vindo a admitir a inclusão na decisão de facto de factos com alguma componente conclusiva, desde que tenham, ainda, um substrato relevante para o acervo dos factos que importam para uma decisão justa (cfr., neste sentido, por exemplo, o acórdão do STJ de 14.07.2021, in www.dgsi.pt), por se considerar ser praticamente impossível formular questões rigorosamente simples, que não tragam em si implicados juízos conclusivos sobre outros elementos de facto.
Contudo, mesmo essa jurisprudência exige que se esteja perante realidades apreensíveis e compreensíveis pelos sentidos e pelo intelecto dos homens, estando vedado ao julgador da matéria de facto a formulação de juízos sobre questões de direito.
4.2.4. A recorrente considera que o facto vertido na al. r) dos factos provados («Os vãos existentes na fachada nascente são originais Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 21») deve ser dado como não provado.
Argumenta a recorrente que tal facto se encontra em contradição com o teor do relatório pericial e com os factos que constam da al. s) dos factos provados.
O tribunal a quo sustentou a decisão, exclusivamente, no teor do relatório pericial.
Nele, quanto à origem das aberturas, o senhor perito referiu que «(…) foram consultados todos os restantes documentos constantes do processo de obra não tendo sido identificado qualquer documento escrito ou desenhado que pudesse servir o propósito pretendido. Consequentemente, afastada a hipótese da existência em arquivo dos projetos iniciais relativos à obra dos Requerentes, recorreu-se uma vez mais à ferramenta Google Maps (histórico) no sentido de perceber se as frestas e janelas eventualmente afetadas pela obra do Requerido já existiam nas frações de cada um dos Requerentes. Através da consulta a esta ferramenta é possível verificar o vão #4 já existente em julho de 2009. Da mesma forma se percebe a existência deste vão e também do vão #5 através da fotografia com outro ângulo com data de agosto de 2018. Por outro lado, se verificarmos a fachada poente do edifício dos Requerentes em julho de 2009 e tivermos em linha de conta a simetria do edifício, consegue-se identificar o padrão esperado de frestas existentes que deverá ser semelhante entre as duas fachadas. Face ao explanado, poder-se-á inferir que os vãos existentes na fachada nascente, serão originais».
Tal como já se havia salientado no acórdão de 27.03.2025, por nós subscrito, «a utilização do futuro (“serão”) tem, no caso, um sentido dubitativo, exprimindo dúvida, incerteza ou probabilidade».
O senhor perito teve, portanto, dúvidas em concluir se os “vãos” em referência são ou não originais, pelo que não se percebe como, sem a produção de qualquer outro meio de prova, o tribunal a quo ultrapassou tais dúvidas e concluiu, com a certeza e segurança indispensáveis (mesmo em procedimento cautelar), que os vãos são, efectivamente, originais.
Repare-se que, no relatório pericial, o senhor perito apenas se refere aos vãos identificados com os ID 4 e ID 5 (piso 5), nada dizendo quanto à origem dos demais, e, mesmo quanto àqueles, o senhor perito baseia-se em elementos objectivos (histórico do Google Maps) reportados a Julho de 2009 e a Agosto de 2018, quando é certo que a construção do prédio em causa tem mais de cem anos! A extrapolação feita pelo senhor perito das características da fachada poente do prédio existentes em Julho de 2009 para a respectiva fachada nascente (fundada numa suposta simetria), não se mostra, minimamente, válida e segura, porquanto se desconhece se também esta fachada poente sofreu alterações e se, por conseguinte, os vãos nela existentes eram ou não originais.
Acresce que a Requerida/recorrente juntou aos autos fotografias, sob os n.ºs 28 a 29, que afirmou terem sido obtidas em 15.05.2018, e que não foram impugnadas pelos Requerentes, quer quanto a sua correspondência com a realidade, quer quando à data em que foram colhidas, não tendo, portanto, sido posta em causa a sua veracidade espácio-temporal (contrariamente ao que se entendeu na decisão recorrida – cfr. ponto IV). Dessas fotografias pode verificar-se com clareza e segurança, por comparação com as fotografias n.ºs 30 e 31, que retratam o estado actual do prédio (e que, também, não foram impugnadas), que a configuração dos vãos do 5.º piso (ID 4 a 7) foi alterada e que, em 15.05.2018, tais vãos tinham uma configuração diversa da actual.
Das fotografias juntas pela Requerida e juntas pelo senhor perito no relatório pericial, resulta, pois, sem quaisquer dúvidas, que a configuração de cada um dos vãos em causa era o de duas aberturas separadas por um elemento central ou pilar em alvenaria (tipo frestas) e que esse elemento central foi suprimido, em data posterior a 15.05.2018, nos vãos ID 4 a 7 (piso 5), passando a abertura única (tipo janela).
Aliás, isto mesmo é referido no relatório pericial (embora limitado aos vãos com os ID 4, 5 e 6, na medida em que nas fotografias do histórico do Google Maps a que o senhor perito teve acesso, apenas, eram visíveis estes vãos) quando se escreve que «verifica-se, no entanto, o aproveitamento posterior de algumas frestas transformadas em janela, nomeadamente e conforme pode ser verificado na figura abaixo, vãos #4, #5 e #6 - fotografia de novembro de 2020», o que significa que os vãos existentes na fachada nascente, ainda que possam existir desde sempre (desde a origem do prédio), sofreram alterações em datas que não foi possível apurar.
E, assim sendo, terá de concluir-se que o facto vertido na al. r) dos factos provados não tem qualquer suporte na prova produzida, devendo ser dado como não provado.
Nessa sequência, impõe-se alterar a redacção da al. s) dos factos provados (quer porque a redacção actual não inclui a realidade subjacente à expressão algo conclusiva “transformadas em janelas”, quer porque não concretiza o elemento temporal “posterior”, que foi possível apurar), nos seguintes termos: s) Em data não apurada, mas posterior a 15.05.2018, foram suprimidos os elementos centrais, tipo pilar em alvenaria, dos vãos ID 4 a 7, que passaram a ter as dimensões referidas na al. k), para seu aproveitamento posterior como janelas.
Por esta via, também, procede a pretensão da recorrente quanto ao aditamento dos factos iii., iv. e v., que estão contidos na redacção da al. s) ora perfilhada.
4.2.5. No que tange aos factos não provados sob os n.ºs 1 a 10, considera a Recorrente que o tribunal a quo errou «…não apurar a matéria alegada pela Requerida, nomeadamente: quanto às medições das aberturas efetuadas no exterior da fachada nascente; alterações das aberturas ao nível do 5º piso em contravenção com a lei, bem como data, ainda que aproximada, em que tais alterações foram efetuadas».
Vejamos.
O n.º 1 dos factos não provados (1. Na empena lateral do prédio confinante com o prédio da Requerida encontram-se aberturas, que não são compatíveis com a construção inicial) deve manter-se (agora como n.º 2), por não ter sido feita qualquer prova de que, para além das alterações referidas na al. s), as aberturas existentes na empena lateral do prédio confinante com o prédio da Requerida “não são compatíveis com a construção inicial”. Aliás, não foi feita prova das características iniciais do prédio ao nível dos vãos existentes nas fachadas, sendo certo que a própria requerida admite desconhecer-se a data em que as alterações foram efectuadas (cfr. art. 38.º da oposição).
O n.º 2 dos factos não provados (2. Considerando como ponto de partida o telhado do prédio da Requerida, seguindo no sentido ascendente e considerando as medições efetuadas no exterior: a) Uma abertura com aproximadamente 50 cm de altura e 45 cm de largura, com dois ferros, formando 4 espaços. b) Duas aberturas verticais com 58 cm de altura e 10 cm de largura. c) Quatro aberturas com 60 cm de altura e 40 cm de largura. d) Uma abertura retangular com cerca de 48 cm de altura e 10 cm de largura) deve manter-se (agora como n.º 3), por não ter sido feita qualquer prova das medições em causa, sendo certo que o relatório pericial contém outras medições (cfr. al. k) dos factos privados) e que as fotografias juntas como documentos n.ºs 23 a 27, apesar de não impugnadas, não permitirem confirmar as medidas alegadas.
A matéria de facto vertida no n.º 3 dos factos não provados (3. A abertura identificada na alínea a) do Ponto 3. situava-se ao nível da fracção do 3º esquerdo, localizava-se abaixo da cumeeira e praticamente a tocar o telhado do prédio da Requerida, encontrava gradada com dois ferros, sendo um na vertical e outro na horizontal) encontra-se provada, por decorrente das fotografias juntas pela Requerida como documentos n.ºs 23 e 24, não impugnados pelos Requerentes e confirmados pelas demais fotografias juntas aos autos, nomeadamente, com o relatório pericial (págs. 10 e 25). Assim, adita-se aos factos provados uma al. z) com a seguinte redacção: «z. A abertura correspondente ao ID 1 (piso 3) localiza-se abaixo da cumeeira e praticamente a tocar o telhado do prédio da Requerida e encontra-se gradada com dois ferros, sendo um na vertical e outro na horizontal».
Quanto ao n.º 4 dos factos não provados (4. As aberturas actualmente existentes, ao nível da fracção correspondente ao 5º esquerdo - águas furtadas - resultam de uma alteração abusiva ocorrida após Maio de 2018), a matéria nele contida encontra-se provada sob a al. s), com excepção da expressão “alteração abusiva”, que, por ser conclusiva e encerrar um juízo técnico-jurídico, não pode figurar entre os factos provados ou não provados, nos termos já mencionados. Exclui-se, pois, dos factos não provados o n.º 4.
A matéria de facto constante do n.º 5 dos factos não provados (5. Na data de 15 de Maio de 2018, foi efectuado um registo fotográfico do qual constam as fotografias juntas como documentos 28 e 29), encontra-se provada, por falta de impugnação, por parte dos Requerentes, quer das fotografia em causa como correspondendo ao local, quer da data em que foram obtidas e que foi, expressamente, alegada pela Requerida (contrariamente ao que se entendeu na decisão recorrida – cfr. ponto IV). Aditar-se-á, portanto, aos factos provados uma al. aa), com a seguinte redacção: «aa) Na data de 15.05.2018, foi efectuado um registo fotográfico do qual constam as fotografias juntas como documentos 28 e 29 da Oposição».
No que respeita aos n.ºs 6 a 7 dos factos não provados (6. Em 15 de Maio de 2018 as aberturas existentes ao nível do 5º andar esquerdo- águas furtadas, na lateral do prédio, eram oito; 7. Após 15 de Maio de 2018 foram efectuadas alterações que consistiram na junção de duas a duas, ficando assim as actuais 4 aberturas), a matéria neles contida encontra-se já provada sob a al. s), da qual resulta que os quatro vãos/aberturas existentes ao nível do piso 5, sofreram um alteração, consistente na supressão do seu elemento central e passaram a ter as dimensões descritas na al. k). A quantificação dos vãos existentes antes da alteração como sendo oito, não se nos afigura legítima ou ter apoio na linguagem técnica da arquitectura ou da construção civil (tratavam-se de quatro vãos, embora com um elemento central, tipo pilar, em alvenaria, a fazer como que uma “divisão”), sendo, de resto, inócua para a solução do litígio. Excluem-se, pois, dos factos não provados os n.ºs 6 e 7.
A matéria de facto vertida no n.º 8 dos factos não provados (8. Alterações que consistiram na retirada de um pilar em cimento, com cerca de 13 cm), encontra-se provada sob a al. s), com excepção da expressão “com cerca de 13 cm”, que não pode ter-se por provada, por não ter sido feita qualquer prova dessa dimensão. Assim, a redacção do n.º 8 (agora como n.º 4) passará a ser a seguinte redacção: «4. O elemento central/pilar referido na al. s) tem cerca de 13cm».
O n.º 9 dos factos não provados (9. As oito aberturas existentes em Maio de 2018 tinham a largura de 13,50 cm) deve manter-se (agora como n.º 5), por não ter sido feita qualquer prova das dimensões me causa.
Finalmente, o n.º 10 dos factos provados (10. Com referência à fracção correspondente ao 5º esquerdo - águas furtadas - a existência de janelas a tardoz constitui alteração exterior que devia ter sido procedida de procedimento de controlo prévio municipal) deve ser excluído, por trata-se de matéria de direito: saber se determinada alteração de um edifício deve ou não ser procedida de procedimento de controlo prévio municipal, decorre, apenas, da lei aplicável.
4.2.6. Em consequência do supra decidido, passarão ser os seguintes os: Factos provados a) O Requerente AA é proprietário da fracção autónoma designada pela letra “H”, correspondente ao terceiro andar esquerdo, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., n.º 36 em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo ... e descrito na CRP de Lisboa sob o n.º ...da freguesia de S. José (documentos 1 e 2 juntos com o Requerimento Inicial). b) O Requerente BB é proprietário da fracção autónoma designada pela letra “J” do mesmo prédio, correspondente ao quarto andar esquerdo (documentos 3 e 4 juntos com o Requerimento Inicial). c) A Herança de CC é proprietária da fracção autónoma designada pela letra “F” do mesmo prédio, correspondente ao quinto andar esquerdo (documentos 5 a 8 juntos com o Requerimento Inicial). d) Encontra-se registado a favor da Requerida o prédio urbano sito na Rua ... nºs 24, 24 A, 26, 28 a 30, composto por edifício de habitação e comércio com rés-do-chão, sobreloja, 1º andar e águas-furtadas, com entrada pelos nºs 24 a 28 e edifícios de oficina, escritórios, logradouro e tanques de lavagens no tardoz com entrada pelo nº 30 (documentos 9 e 10 juntos com o Requerimento Inicial). e) Os prédios em causa são contíguos um ao outro (admitido por acordo). f) O prédio da Requerida apresentava-se ao nível da quota do segundo andar do prédio dos Requerentes (Relatório Pericial de 04/09/2024, que se dá por reproduzido). g) A partir do 2.º andar, as fracções dos 3ºs, 4ºs e 5º andares do prédio dos Requerentes têm aberturas na fachada contígua ao prédio da Requerida (Relatório Pericial de 04/09/2024 e esclarecimentos de 24/10/2024, que se dão por reproduzidos). h) A Câmara Municipal de Lisboa deferiu o licenciamento de obras de alteração e ampliação do edifício na Rua ... 24-30, em 24 de Novembro de 2020, tendo sido emitido o Alvará de Obras (documentos 6 a 8 juntos com a Oposição). i) A Requerida solicitou e obteve licença para construção de 5 pisos (admitido por acordo). j) No pedido de licenciamento da Requerida à Câmara Municipal de Lisboa, referido no artigo h) não foi feita menção à (eventual) existência de vãos na empena/fachada lateral sobre o seu prédio (documentos 6 a 8 juntos com a Oposição e Informação da Câmara Municipal de Lisboa de 11/09/2024). k) O prédio dos Requerentes tem, nomeadamente, as seguintes aberturas ou vãos na respectiva fachada nascente (confinante com o prédio da Requerida): - (ID 1) Piso 3, vão único, casa de banho, com as medidas: Altura: 52, Largura: 44 Profundidade: 55; - (ID 2) Piso 4, vão único, quarto, com as medidas: Altura: 54, Largura: 23, Profundidade: 30; - (ID 3) Piso 4, vão único, casa de banho, com as medidas: Altura: 54, Largura: 23, Profundidade: 54; - (ID 4) Piso 5, vão único, quarto 1, com as medidas: Altura: 67, Largura: 44, Profundidade: 47; - (ID 5) Piso 5, vão único, quarto 2, com as medidas: Altura: 64, Largura: 41, Profundidade: 45; - (ID 6) Piso 5, vão único, cozinha, com as medidas Altura: 63, Largura: 48, Profundidade: 46; - (ID 7) Piso 5, vão único, casa de banho, com as medidas Altura: 65, Largura: 50, Profundidade:45. l) Os vãos identificados na alínea anterior com os ID 1 (piso 3), ID 2 (piso 4) e ID 3 (piso 4), irão ficar completamente tapados pela ampliação do edifício da Requerida; m) Os vãos identificados na alínea anterior com os ID 4, ID 5, ID 6 e ID 7, todos do piso 5, poderão ou não vir a ser tapados, total ou parcialmente, dependendo das características e revestimento da cobertura, sendo que, actualmente, não se encontram obstruídos; n) O tapar dos vãos referidos na al. k) não irá fazer com que as fracções dos Requerentes deixem de ter arejamento, circulação de ar, entrada de luz e vistas, porquanto as mesmas possuem vãos na sua fachada principal e de tardoz, sem prejuízo do que consta das als. o) e p); o) O tapar dos vãos referidos na al. l) com os ID 1 (casa de banho) e ID 3 (cada de banho), ficando apenas a porta como abertura, terá consequências para a ventilação, a iluminação e o conforto desse espaço; p) Otapar do vão referido na al. m) com o ID 5 (quarto 2), ficando apenas a porta como abertura, comprometerá a ventilação e iluminação natural desse espaço, que é explorado individualmente em termos económicos; q) Otapar do vão referido na al. m) com o ID 5 (quarto 2), removerá, total ou parcialmente, as respectivas vistas, consoante as características e revestimento que a cobertura do prédio das Requeridas venha a ter. r) suprimido s) Em data não apurada, mas posterior a 15.05.2018, foram suprimidos os elementos centrais, tipo pilar em alvenaria, dos vãos ID 4 a 7, que passaram a ter as dimensões referidas na al. k), para seu aproveitamento posterior como janelas. t) Não foi identificada a existência de nenhum pedido/autorização para o aproveitamento referido em s). (Relatório Pericial de 04/09/2024 – página 23). u) Na fachada tardoz do prédio da Rua ... nº 36, os seis pisos possuem aberturas e/ou varandas (documentos 10, 11 e 12 juntos com a Oposição). v) Na fachada tardoz do prédio da Rua ... nº 36, existem aberturas com gradeamento (documentos 10, 11 e 12 juntos com a Oposição). w) Não se verifica acesso às traseiras do prédio da Rua ... nº 36 (documento 12 junto com a Oposição). x) Na fachada frontal verifica-se ao nível do quinto piso - águas-furtadas - a existência de, pelo menos, uma trapeira (documentos 7 e 9 juntos com a Oposição). y) As fracções do 3º esquerdo e 4º esquerdo têm aberturas para a frente e traseira do prédio (documentos 10 e 11 juntos com a Oposição). z. A abertura correspondente ao ID 1 (piso 3) localiza-se abaixo da cumeeira e praticamente a tocar o telhado do prédio da Requerida e encontra-se gradada com dois ferros, sendo um na vertical e outro na horizontal. aa) Na data de 15.05.2018, foi efectuado um registo fotográfico do qual constam as fotografias juntas como documentos 28 e 29 da Oposição. Factos não provados 1. Os vãos existentes na fachada nascente são originais; 2. Para além do que consta da al. s), na empena lateral do prédio confinante com o prédio da Requerida encontram-se aberturas, que não são compatíveis com a construção inicial; 3. Considerando como ponto de partida o telhado do prédio da Requerida, seguindo no sentido ascendente e considerando as medições efetuadas no exterior: a) Uma abertura com aproximadamente 50 cm de altura e 45 cm de largura, com dois ferros, formando 4 espaços. b) Duas aberturas verticais com 58 cm de altura e 10 cm de largura. c) Quatro aberturas com 60 cm de altura e 40 cm de largura. d) Uma abertura retangular com cerca de 48 cm de altura e 10 cm de largura; 4. O elemento central/pilar referido na al. s) tem cerca de 13cm. 5. As oito aberturas existentes em Maio de 2018 tinham a largura de 13,50 cm.
4.3. Vejamos, agora, se, em face da facticidade provada, a sentença recorrida fez uma correcta aplicação do Direito.
Recordemos que os Requerentes alicerçaram o pedido de embargo da obra iniciada pela Requerida na violação do seu direito de propriedade sobre as fracções do prédio contíguo, por tal obra tapar as fontes de ar, luz e vistas que existem desde a construção do prédio, desvalorizando-o.
Dispõe o art. 397.º, n.º 1 do CPC que «aquele que se julgue ofendido no seu direito de propriedade, singular ou comum, em qualquer outro direito real ou pessoal de gozo ou na sua posse, em consequência de obra, trabalho ou serviço novo que lhe cause ou ameace causar prejuízo, pode requerer, dentro de 30 dias, a contar do conhecimento do facto, que a obra, trabalho ou serviço seja mandado suspender imediatamente».
Desta disposição legal decorre que são pressupostos do decretamento do embargo de obra nova:
a) a titularidade de um direito por parte do Requerente;
b) a convicção do respectivo titular da verificação ou ocorrência de ofensa ao seu direito por consequência de uma obra, trabalho ou serviço novo;
c) que essa obra, trabalho ou serviço cause ou ameace causar prejuízo;
d) que o embargo seja requerido dentro de 30 dias, contados do conhecimento do facto.
Estando em causa requisitos essenciais ao deferimento da providência, a alegação e prova da verificação dos requisitos mencionados nas als. a) a c) compete ao Requerente/embargante, incumbindo-lhe, para tanto, alegar e provar factos que levem o Tribunal a concluir pelo preenchimento de tais pressupostos, sendo certo que, para tanto, basta que sumariamente (summaria cognitio) se conclua pela séria probabilidade ou verosimilhança da sua existência (fumus bonis iuris) e numa perspectiva de instrumentalidade hipotética, isto é, de a composição final e definitiva do litígio vir a ser favorável ao Requerente.
Já no que concerne ao pressuposto supra enunciado na al. d), é ao embargado que incumbe alegar e provar que o procedimento cautelar foi intentado decorridos mais de 30 dias sobre a data em que o embargante teve conhecimento da obra, trabalho ou serviço novo que lhe causa ou ameaça causar prejuízo (cfr., neste sentido, o acórdão da RL de 18.06.2019, in www.dgsi.pt), por estar em causa um prazo de caducidade (art. 298.º, nº 2 do CC), cujo decurso extingue o direito de pedir o embargo da obra (art. 342.º, n.º 2 do CC).
Ora, no caso vertente, os factos provados indiciariamente demonstram, com segurança, que os Requerentes são titulares do direito de propriedade sobre as fracções referidas nas als. a), b) e c) dos factos provados e que, no prédio contíguo, propriedade da Requerida, estão em curso obras ainda não concluídas nos seus aspectos fundamentais.
Tais obras são, claramente, obras novas, na medida em que consistem na ampliação de um edifício, cuja altura se situava ao nível da quota do segundo andar do prédio dos Requerentes e que passará a ter cinco pisos, o que, obviamente, implica uma modificação substancial do prédio, não se traduzindo numa mera modificação superficial ou numa reconstrução de uma situação preexistente.
De acordo com Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, IV, p. 228, «a “novidade” que entra na qualificação do procedimento implica que apenas possam ser embargadas obras que impliquem uma modificação substancial da coisa e não se traduzam em meras modificações superficiais ou na mera reconstrução de uma situação preexistente».
Temos, assim, que a única questão controvertida é a de saber se a obra referida causou e continua a causar ofensa efectiva ao direito de propriedade de que são titulares os Requerentes.
A decisão recorrida entendeu que o direito de propriedade dos Requerentes «…se mostra atingido em consequência das obras levadas a cabo pela Requerida», porquanto «a partir do 2.º andar (quota a que correspondia o prédio da Requerida) as fracções dos 3ºs, 4ºs e 5º andares do prédio dos Requerentes têm aberturas na fachada contígua ao prédio da Requerida» e «…todas as aberturas existentes nessa fachada do prédio dos Requerentes são ou podem ser afectadas pela obra».
Salientou-se na decisão recorrida que, «entendemos efectivamente que no caso em apreço é do próprio direito de propriedade dos Requerentes que se trata, e não (apenas) de uma questão de vistas ou de servidão de vistas, prevista nos artigos 1362.º e 1363.º do Código Civil, como pretende a Requerida. A obra inovadora que a Requerida iniciou e pretende continuar atinge o direito dos Requerentes de fruírem plenamente das fracções de que são proprietários, ficando limitados quanto à ventilação, iluminação e conforto do espaço, pelo menos nas divisões em que existiam aberturas de que dispunham e deixarão de dispor. A circunstância de as fracções possuírem vãos na sua fachada principal e de tardoz não implica que as limitações não se verifiquem, nem possibilita que as aberturas da fachada contígua à do prédio da Requerida sejam inutilizadas ou afectadas. O licenciamento da obra da Requerida não justifica a supressão das aberturas no prédio dos Requerentes, tanto mais que no pedido apresentado à Câmara Municipal de Lisboa não foi feita menção à (eventual) existência de vãos na empena/fachada lateral sobre o seu prédio. (…) Acresce que os vãos existentes na fachada nascente são originais, portanto (muito) anteriores ao próprio pedido de licenciamento da Requerida».
A Requerida/Recorrente defende (cfr. conclusões U) a KK) que a decisão recorrida labora em manifesto erro ao considerar que é do próprio direito de propriedade que se trata e não de uma questão de servidão de vistas prevista nos arts. 1362.º e 1363.º do CC, argumentando que «o direito dos Requerente a gozar e fruírem do seu imóvel não pode deixar de conciliar-se com idêntico direito de propriedade da Requerida relativamente ao prédio vizinho, devendo esta, por sua vez, respeitar na nova construção as regras estabelecidas no Código Civil sobre as construções e edificações e todas as demais previstas em legislação especial. Razão pela qual é fundamental aferir das características das aberturas existentes e em causa nos presentes autos de acordo com o preceituado nos arts. 1362.º em confronto com o disposto no art.º 1363.º, ambos do Código Civil, para saber se podem ser classificadas como janelas, para efeitos de aplicação do regime jurídico».
Que dizer?
Atentemos, antes de mais, ao que decorre, de relevante, da factualidade, indiciariamente, provada:
- O prédio dos Requerentes tem, nomeadamente, as seguintes aberturas ou vãos na respectiva fachada nascente (confinante com o prédio da Requerida): (ID 1) Piso 3, vão único, casa de banho, com as medidas: Altura: 52, Largura: 44 Profundidade: 55; (ID 2) Piso 4, vão único, quarto, com as medidas: Altura: 54, Largura: 23, Profundidade: 30; (ID 3) Piso 4, vão único, casa de banho, com as medidas: Altura: 54, Largura: 23, Profundidade: 54; (ID 4) Piso 5, vão único, quarto 1, com as medidas: Altura: 67, Largura: 44, Profundidade: 47; (ID 5) Piso 5, vão único, quarto 2, com as medidas: Altura: 64, Largura: 41, Profundidade: 45; (ID 6) Piso 5, vão único, cozinha, com as medidas Altura: 63, Largura: 48, Profundidade: 46; (ID 7) Piso 5, vão único, casa de banho, com as medidas Altura: 65, Largura: 50, Profundidade:45; - os vãos ID 1 (piso 3), ID 2 (piso 4) e ID 3 (piso 4) irão ficar completamente tapados pela ampliação do edifício da Requerida; - os vãos ID 4, ID 5, ID 6 e ID 7, todos do piso 5, poderão ou não vir a ser tapados, total ou parcialmente, dependendo das características e revestimento da cobertura, sendo que, actualmente, não se encontram obstruídos;
- o tapar dos vãos referidos não irá fazer com que as fracções dos Requerentes deixem de ter arejamento, circulação de ar, entrada de luz e vistas, porquanto as mesmas possuem vãos na sua fachada principal e de tardoz; - o tapar dos vãos ID 1 (casa de banho) e ID 3 (cada de banho), ficando apenas a porta como abertura, terá consequências para a ventilação, a iluminação e o conforto desse espaço; - otapar do vão ID 5 (quarto 2), ficando apenas a porta como abertura, comprometerá a ventilação e iluminação natural desse espaço, que é explorado individualmente em termos económicos; - otapar do vão ID 5 (quarto 2), removerá, total ou parcialmente, as respectivas vistas, consoante as características e revestimento que a cobertura do prédio das Requeridas venha a ter; - em data não apurada, mas posterior a 15.05.2018, foram suprimidos os elementos centrais, tipo pilar em alvenaria, dos vãos ID 4 a 7, que passaram a ter as dimensões supra referidas, para seu aproveitamento posterior como janelas; - não foi identificada a existência de nenhum pedido/autorização para esse aproveitamento; - na fachada tardoz do prédio dos Requerentes os seis pisos possuem aberturas e/ou varandas e existem aberturas com gradeamento; - na fachada frontal verifica-se ao nível do quinto piso - águas-furtadas - a existência de, pelo menos, uma trapeira; - as fracções do 3.º esquerdo e 4.º esquerdo têm aberturas para a frente e traseira do prédio; - a abertura correspondente ao ID 1 (piso 3) localiza-se abaixo da cumeeira e praticamente a tocar o telhado do prédio da Requerida e encontra-se gradada com dois ferros, sendo um na vertical e outro na horizontal.
Temos, portanto e desde logo, que se desconhece se a obra nova em causa irá tapar as aberturas existentes na fachada nascente do prédio dos Requerentes, ao nível do piso 5.
Com efeito, apenas se apurou que os vãos ID 4, ID 5, ID 6 e ID 7, todos do piso 5 (fracção “F”), poderão ou não vir a ser tapados, total ou parcialmente, dependendo das características e revestimento da cobertura do edifício que a Requerida está a construir, sendo certo que competia aos Requerentes a alegação e prova dessas características e revestimento (o que poderiam, facilmente, fazer através da junção aos autos dos projectos aprovados), pois que a si competia, como se viu, o ónus da prova de que a obra lhes causa ou ameaça causar prejuízo.
Certo é que, actualmente, os vãos existentes ao nível do 5.º piso não se encontram obstruídos, nem se provaram quaisquer factos que indiciem, com o mínimo de segurança, que o venham a ser, não sendo suficiente a mera possibilidade abstracta de virem a ser tapados, consoante a cobertura do edifício que venha a se construída.
Tal conclusão, dispensa, obviamente, a apreciação da questão relativa à qualificação das aberturas ou vãos do 5.º piso como sendo frestas ou janelas, bem como da questão de saber se as mesmas foram feitas “abusivamente” e se conferiam à fracção “F” o pretendido direito de vistas.
Seja como for, a entender-se que a mera possibilidade de os vãos do piso 5 virem a ser tapados preenche, suficientemente, o terceiro requisito do embargo de obra nova, por se traduzir já numa ameaça de prejuízo, valerão, então, as considerações que infra se farão a propósito dos demais vãos dos pisos 3 e 4 do prédio dos Requerentes.
No que respeita aos pisos 3 e 4 (fracções “H” e “J”), provou-se que os vãos ID 1 (piso 3- casa de banho), ID 2 (piso 4 - quarto) e ID 3 (piso 4 – casa de banho), irão ficar completamente tapados pela ampliação do edifício da Requerida.
Sucede que se provou, também, que tal tapamento não irá fazer com que as fracções dos Requerentes deixem de ter arejamento, circulação de ar, entrada de luz e vistas, porquanto as mesmas possuem vãos na sua fachada principal e de tardoz.
É certo que se provou que o tapar dos vãos ID 1 (casa de banho) e ID 3 (casa de banho), ficando apenas a porta como abertura, terá consequências para a ventilação, a iluminação e o conforto desse espaço, mas desconhece-se, por não ter sido alegado, nem provado, a concreta dimensão ou gravidade dessas consequências, bem como se comprometem ou não a habitabilidade do espaço e se são ou não susceptíveis de ser debeladas através de soluções técnicas alternativas de ventilação e iluminação.
Nada, pode, pois, ressalvada melhor opinião, extrapolar-se a respeito das consequências para a ventilação, a iluminação e o conforto das duas casas de banho em causa, sabido que é que a grande maioria das casas de banho das fracções habitacionais dos edifícios nacionais não possuem quaisquer janelas ou aberturas, sem que se defenda que não sejam operacionais, eficientes e habitáveis.
Não se vê, pois, como pode a decisão recorrida ter concluído que a obra levada a cabo pela recorrente “atinge o direito dos Requerentes de fruírem plenamente das fracções de que são proprietários”, por “ficarem limitados quanto à ventilação, iluminação e conforto do espaço”.
Dir-se-á que o direito de propriedade dos 1.º e 2.º Requerentes será “atingido” pelo mero facto de virem a ser tapadas as aberturas existentes nas fracções “H” e “J”, correspondentes aos pisos 3 e 4 (a questão não se coloca, em concreto, quanto à fracção “F”, correspondente ao 5.º piso, por se desconhecer, como se viu, se as aberturas actualmente existentes serão, efectivamente, tapadas e em que termos).
Mas, não é assim.
É que, estando em causa prédios contíguos, a relação jurídica entre os Requerentes e a Requerida, enquanto titulares de direitos de propriedade de prédios confinantes, e o conflito de vizinhança surgido, regem-se pelas normas do Código Civil, no que toca à edificação nos respectivos prédios (cfr. arts. 1360.° e segs.).
Ora, da conjugação das normas previstas nos arts. 1362.º, 1363.º e 1364.º do CC, resulta que o proprietário de prédio confinante pode nele construir edifício, ainda que vede as aberturas do prédio vizinho que constituam frestas, seteiras, óculos para luz e ar e janelas gradadas.
Por essa razão, tal como sempre defendeu a Requerida/Recorrente, mostra-se fundamental a classificação das aberturas/vãos existentes na fachada nascente do prédio dos Requerentes, para efeitos de aplicação do regime jurídico, o que foi completamente ignorado na decisão recorrida.
Tal como se salientou no acórdão da RL de 20.11.2008, in www.dgsi.pt, «a lei civil estabelece regimes diferentes relativamente às janelas, por um lado, e às frestas, seteiras ou óculos para luz e ar, e ainda às janelas gradadas, por outro, mas não define o que se deva entender por janela, sendo à doutrina e à jurisprudência que cabe o papel de definir os contornos do conceito de janela, por contraposição ao de fresta».
E a jurisprudência, largamente, maioritária vai no sentido de a distinção dever fazer-se em função das dimensões e da finalidade das aberturas.
Assim, o acórdão da RL citado entendeu que «O conceito “janela”, para efeitos do artigo 1360º, nº 1 do Código Civil, reconduz-se a aberturas que permitam não só a entrada de luz e ar, mas também a devassa sobre o prédio vizinho. Só este conceito de janela se adequa à dupla finalidade da restrição estabelecida no aludido preceito legal - evitar que o prédio vizinho seja facilmente objecto da indiscrição de estranhos, e impedir que ele seja facilmente devassado» e «São qualificadas como frestas as aberturas muito estreitas, de modo a permitirem a entrada de luz ou da claridade e, não tendo estas todas as características definidas no artigo 1363º, nº 2 do C.C., também não satisfazem a finalidade justificativa da proibição ínsita no artigo 1360º, nº 1 do mesmo diploma legal, i.e., a devassa sobre o prédio vizinho».
Escreveu-se, esclarecidamente, neste aresto que: «Elucida M. Henrique Mesquita, RLJ, nº 128, (anotação ao Ac. STJ de 03.04.91), pág. 149, que são juridicamente possíveis, relativamente às aberturas qualificáveis como janelas ou frestas, três categorias distintas: a) Janelas; b) Frestas que não excedam as dimensões legais e situadas à altura fixada na lei (frestas regulares); c) Frestas com dimensões superiores às legais ou situadas a uma altura inferior à fixada na lei (frestas irregulares). No domínio do Código de Seabra, o entendimento prevalecente era o de que devia considerar-se janela a abertura onde coubesse uma cabeça humana. Hoje, este critério não é mais defendido. As janelas distinguem-se das frestas não só pelas suas dimensões, mas também pelo fim a que umas e outras se destinam. Diz-se no Ac. R. L. de 09.03.1993, acessível na Internet, no sítio www.dgsi.pt, estabelecendo a distinção entre as frestas, seteiras e óculo, por um lado e, as janelas, por outro, que aquelas se destinam a permitir a Inspectio e, estas, a permitir a Prospectio. Entende-se, pois, comummente que as frestas são aberturas estreitas, cuja única função é permitir a entrada de ar e luz. Como refere Henrique Mesquita, RLJ 128º, pg. 151 e 152 “(…) as janelas dispõem de um parapeito onde as pessoas podem apoiar-se ou debruçar-se e desfrutar comodamente as vistas que proporcionam, olhando quer em frente, quer para os lados, quer para cima ou para baixo”. E, conclui depois que “ No conceito de janela deverá incluir-se apenas através das quais possa projectar-se a parte superior do corpo humano e em cujo parapeito as pessoas possam apoiar-se ou debruçar-se, para descansar, para conversar com alguém que esteja do lado de fora ou para desfrutar as vistas". Daqui resulta que o conceito “janela”, para efeitos do mencionado artigo 1360º, nº 1 do Código Civil, se terá de reconduzir a aberturas mais amplas do que as frestas, por forma a permitir não só a entrada de luz e ar mas também a devassa sobre o prédio vizinho. E, com efeito, só este conceito de janela se adequa à dupla finalidade da restrição estabelecida no nº. 1 do artigo 1360º do C.C. - evitar que o prédio vizinho seja facilmente objecto da indiscrição de estranhos, e impedir que ele seja facilmente devassado - v. Ac. R.C. de 28.09.2004 (Pº 1976/04); Ac. R.P. 18.06.2008 (Pº 0852720) e Ac. STJ 01.04.2008 (Pº 07A3114), todos acessíveis na Internet, no sítio, www.dgsi.pt. Tendo em conta a dimensão máxima prevista na lei para as aberturas qualificadas como frestas, poder-se-á afirmar que as frestas, tal como a lei as configura, significam aberturas muito estreitas, de modo a permitirem a entrada de luz ou da claridade, as quais não tendo (todas) as características definidas no artigo 1363º, nº 2 do C.C., também não satisfazem a finalidade justificativa da proibição ínsita no artigo 1360º, nº 1 do mesmo diploma legal, i.e., a devassa sobre o prédio vizinho».
Este mesmo entendimento foi perfilhado, por exemplo:
- no acórdão do STJ de 01.04.2008
«II – A diferença entre janelas e frestas está, além de nas suas dimensões, na finalidade de umas e outras. III – Assim, as janelas além de terem maiores dimensões, devem, em princípio, permitir através delas, a projecção da parte superior do corpo humano e ser dotadas de parapeito onde as pessoas possam apoiar-se ou debruçar-se para descansar, conversar com alguém que esteja do lado de fora ou para desfrutar as vistas, olhando quer em frente, quer para os lados, ou para cima e para baixo. IV – Por seu lado, as frestas sendo de menores dimensões, e situando-se a altura superior a 1,80 metros do sobrado e do solo do prédio vizinho, não são servidas de parapeito e não permitem a projecção através dela do corpo humano sobre o prédio vizinho. V – A existência de aberturas que não respeitando os limites previstos para as frestas no art. 1363º, nº 2 do Cód. Civil, mas que não permitem a referida projecção das pessoas sobre o prédio vizinho, apenas permitindo a entrada de ar e luz, pode levar à constituição de uma servidão predial, mas não de servidão de vistas impeditiva de o proprietário do prédio vizinho levantar construção que tape aquelas aberturas»;
- no acórdão do STJ de 26.06.2008, in www.dgsi.pt
«1. A diferença específica entre as frestas e as janelas envolve, além do seu tamanho em largura e altura, a função de umas e outras. 2. As frestas regulares são janelas muito estreitas, que permitirem a entrada de luz ou a claridade; e as janelas propriamente ditas, de maiores dimensões, visam essencialmente permitir a visão pelas pessoas de dentro para fora sobre os prédios vizinhos»;
- no acórdão da RE de 12.10.2017, in www.dgsi.pt
«Não obstante excederem quinze centímetros em todas as suas dimensões, devem ser qualificadas como frestas, embora irregulares, as aberturas, existentes na parede de um edifício, que não disponham de parapeito onde as pessoas possam apoiar-se, debruçar-se ou desfrutar de vistas, não permitam, através delas, projectar a parte superior do corpo humano, introduzir a cabeça de uma pessoa adulta, conversar com alguém que esteja do lado de fora ou visualizar o prédio vizinho, e tenham, como única função, permitir a entrada de luz e arejamento».
No caso dos autos, adiantamos, desde já, que as aberturas correspondentes aos ID 1, 2 e 3 (Pisos 3 e 4) não podem qualificar-se como “janelas” para os efeitos legais:
- as aberturas/vãos do piso 4 são, claramente, frestas, atenta a sua largura de apenas 23cm, não permitindo que uma pessoa nelas se apoie ou debruce, não se conseguindo, através delas, projectar a parte superior do corpo humano, servindo, apenas, para dar luz e ar, conforme, de resto, se percebe pelas fotografias do interior e exterior das divisões em causa, juntas ao relatório pericial;
- a abertura/vão do piso 3, apesar de ter uma largura de 44cm e um altura de 52cm, situa-se junto ao tecto da casa de banho, portanto, a uma altura superior a 180cm, o que é bem visível na fotografia junta ao relatório pericial, sendo que, dada a sua configuração de postigo elevado e o facto de se encontrar gradada, também, não permite o apoio e debruçar de uma pessoa e a devassa do prédio vizinho, servindo, de igual forma, para dar luz e ar.
Refira-se que igual entendimento teria que extrair-se quanto aos vãos ou aberturas existentes ao nível do piso 5 (ID 4 a 7), posto que, apesar das suas actuais dimensões, apurou-se que, pelo menos até 15.05.2018, tinham a configuração de meras frestas (cada um desses vãos era composto por um elemento central, tipo pilar em alvenaria, na vertical), tendo sofrido alterações, após essa data, para o seu aproveitamento como janelas.
Em face das características e finalidades das aberturas em causa, elas não podem ser qualificadas como janelas, a tanto não obstando o facto de, todas elas, terem dimensão superior à estabelecida no art. 1363.º, n.º 2 do CC (tal circunstância não impede a referida qualificação, apenas acarretando um juízo de ilicitude de tais aberturas, com consequências jurídicas próprias, distintas das de abertura de janelas em violação do artigo 1360.º, n.º 1 do CC).
Resolvida a questão da qualificação das aberturas existentes na fachada do prédio dos Requerentes que confina com o prédio da Requerida, terá de conclui-se que a sua permanência nunca poderia conduzir à constituição de uma servidão de vistas sobre o prédio da Requerida.
Com efeito, de acordo com o disposto no n.º 1 do art. 1362.º do CC, apenas a existência de janelas, portas, varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes, em contravenção do disposto na lei, pode importar, nos termos gerais, a constituição da servidão de vistas por usucapião.
Estão, pois, excluídas as frestas, qualquer que seja a sua dimensão. E compreende-se que assim seja: estando-se perante aberturas que, pelas suas dimensões e finalidade, não proporcionam vistas sobre o prédio confinante, seria um contrassenso que a sua permanência durante determinado prazo pudesse conduzir à constituição de uma servidão de vistas por usucapião.
É certo que a permanência, por largo período de tempo, de aberturas qualificáveis como frestas e janelas gradadas irregulares poderá proporcionar, por via possessória, a aquisição de uma servidão predial. Contudo, essa servidão predial traduzir-se-ia, apenas, na circunstância de o proprietário do prédio vizinho (in casu, a Requerida/Recorrente) deixar de ter o direito, que antes lhe cabia, de exigir, através de uma acção negatória, que tais aberturas fossem modificadas e harmonizadas com a lei, adquirindo, por isso, o dono do prédio dominante (in casu, os Requerentes) o direito, que não tinha até então, de mantê-las em condições irregulares. Nenhum outro efeito resultaria, todavia, da constituição desta servidão.
Temos, pois, que a frestas e janelas que não obedeçam aos requisitos legais, decorrido o prazo da usucapião, podem originar a aquisição do direito de manter tais aberturas em condições irregulares, impedindo o proprietário por elas afectado de exigir que sejam modificadas e postas em conformidade com a lei, mas não o impedem de construir junto à linha divisória, ainda que as tape.
É este o entendimento, largamente, maioritário da jurisprudência, de que são exemplos:
- o acórdão do STJ de 19.09.2002, in www.dgsi.pt
«O proprietário que abre frestas em desconformidade com a lei, fica, após o decurso do prazo para o usucapião, exactamente na mesma situação jurídica que resulta da abertura de frestas regulares, já o vizinho não pode reagir contra a violação cometida, exigindo que as frestas sejam tapadas ou modificadas, mas mantém o direito de a todo o tempo, construir no seu prédio, ainda que vede ou inutilize tais aberturas»;
- o acórdão do STJ de 01.04.2008, in www.dgsi.pt
«A existência de aberturas que não respeitando os limites previstos para as frestas no art. 1363.º, n.º 2 do Cód. Civil, mas que não permitem a referida projecção das pessoas sobre o prédio vizinho, apenas permitindo a entrada de ar e luz, pode levar à constituição de uma servidão predial, mas não de servidão de vistas impeditiva de o proprietário do prédio vizinho levantar construção que tape aquelas aberturas»;
- o acórdão da RL de 20.11.2008, já citado:
«É que, a restrição legal, criando essa zona non aedificandi, só é estabelecida, por lei, em relação à servidão de vistas regulada no artigo 1362º do CC, que apenas se aplica se estiverem em causa janelas, e já não frestas irregulares ou janelas gradadas que não obedeçam aos requisitos estabelecidos no artigo 1364º do CC. E, é só a existência de janelas, entendidas como aberturas através das quais possa projectar-se a parte superior do corpo humano e em cujo parapeito as pessoas possam apoiar-se ou debruçar-se, para descansar, para conversar com alguém que esteja do lado de fora ou para disfrutar as vistas e das outras aberturas mencionadas no art. 1362º, nº 1 do C.C. que pode conduzir à aquisição de servidão de vistas por usucapião – v. Henrique Mesquita, citada RLJ, 152»;
- o acórdão da RC de 26.04.2022, in www.dgsi.pt
«A abertura de frestas sem as características indicadas na lei pode originar a aquisição, por usucapião, de uma servidão predial, consistente em ter o seu detentor o direito a mantê-las abertas em condições irregulares, sem que o vizinho o possa compelir a torná-las com as dimensões legais, mas não adquire o direito de servidão de vistas que impeça o vizinho de as tapar com a construção que leve a cabo do seu prédio».
Enfim, não respeitando as aberturas em causa as limitações previstas no art. 1363.º, n.º 2 do CC, e carecendo as mesmas de dimensões e características para serem consideradas janelas, não podem constituir uma servidão de vistas impeditiva de o proprietário do prédio vizinho tapar essas aberturas, através da construção de um edifício no prédio contíguo.
Refira-se, ainda, que, a circunstância de, ao nível do piso 5, as aberturas em causa terem sido alteradas para o seu aproveitamento como janelas, também não importa a constituição de uma servidão de vistas, atenta, desde logo, a data em que foram levadas a cabo.
Conclui-se, pois, que os Requentes não dispõem de título que impeça a Requerida, proprietária vizinha, de exercer o direito de construir junto à linha divisória.
E, se as aberturas em causa não impedem a Recorrente de construir junto à linha divisória, não obstante, as vir a inutilizar, terá de concluir-se por inverificados os pressupostos do procedimento cautelar de embargo de obra nova, procedendo o recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida.
Os recorridos suportarão as custas do procedimento cautelar e do recurso, por terem ficado vencidos.
V – DECISÃO
Pelos fundamentos expostos, acorda-se em julgar procedente a apelação e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, absolvendo-se a Requerida do pedido de embargo de obra nova contra si deduzido.
Custas do procedimento cautelar e da apelação pelos Requerentes/Recorridos.
Notifique.
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Lisboa, 11.09.2025
Rui Oliveira
Teresa Sandiães
Marília Fontes