EXECUÇÃO
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
CAUSA PREJUDICIAL
INADMISSIBILIDADE
Sumário

1. Na execução não se desenvolve uma apreciação de mérito, pois aquela visa realizar um direito já declarado em título executivo, pelo que não é admissível a suspensão da instância executiva com fundamento em causa prejudicial.
2. Assim, não pode estender-se à instância executiva a suspensão da instância com fundamento em causa prejudicial decretada nos embargos de executado apensos.
(Sumário da Relatora)

Texto Integral

Apelação n.º 44/23.4T8ODM-C.E1
(1ª Secção)

Sumário: (…)

(Sumário da responsabilidade da Relatora, nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil)


***

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:


I - Relatório
1. (…), Lda., intentou execução para pagamento da quantia de € 18.720,27, contra (…) – Sociedade Portuguesa de (…), Sociedade Unipessoal, Lda., e (…), apresentando como título executivo uma letra.

2. O Executado (…) deduziu embargos de executado, que correm termos no apenso A, peticionando a extinção da execução, tendo invocado, para tanto, a exceção dilatória da ilegitimidade e a exceção dilatória da litispendência, e impugnou ainda o capital em dívida e os juros de mora.

3. A Executada (…) – Sociedade Portuguesa de (…), Sociedade Unipessoal, Lda., deduziu embargos de executado, que correm termos no apenso B, peticionando a extinção da execução, tendo invocado, para tanto, a exceção dilatória da ilegitimidade e a exceção dilatória da litispendência, e impugnou ainda o capital em dívida e os juros de mora.

4. A Exequente pugnou pela improcedência dos embargos.

5. Foi realizada audiência prévia conjunta nos dois apensos de embargos, onde o Tribunal a quo suscitou oficiosamente a questão da suspensão da instância com fundamento na pendência de causa prejudicial, tendo dado a palavra às partes para se pronunciarem sobre a mesma.

Após a pronúncia das partes, foi proferida decisão sobre a questão enunciada, da qual ficou a constar a seguinte fundamentação e dispositivo:

B. Da Fundamentação

Conferido contraditório os embargantes, concordaram com a suspensão da instância por causa prejudicial.

Conferido o contraditório, a embargada discordou da suspensão da instância, tendo em conta a natureza da letra e não há fundamento para a oposição, nos termos dos artigos 728.º, 729.º e 731.º, todos do Código Processo Civil, em especial, tendo em conta que os fundamentos admissíveis em sede de embargos são os mesmos que podem ser invocados em processo de declaração, nos termos da parte final do artigo 731.º do Código Processo Civil pelo que, os meios de defesa não ficam prejudicados. (…)

No caso dos autos, o aqui Exequente simultaneamente intentou uma ação declarativa de condenação, tendo em vista o reconhecimento de um crédito, num montante total de € 26.690,96, contra a aqui executada e embargante Sociedade e; uma ação executiva fundada numa letra, contra a Sociedade e contra (…) onde pretende executar € 18.082,92 dos € 26.690,96 de que se arroga titular e cujo reconhecimento requereu em sede de ação declarativa, conforme decorre expressamente do requerimento do Exequente, datado de 03.09.2024, formulado na ação declarativa sob forma de processo comum.

Ou dito de outro modo, a Exequente pretende o reconhecimento judicial do crédito, na sua totalidade, por o mesmo se encontrar controverso, mas, ao mesmo tempo, pretende ir executando parte do mesmo, enquanto se discute a existência e a extensão do mesmo.

Nessa medida, estando em causa o mesmo crédito e na sua totalidade/extensão, impõe-se considerar existir uma causa prejudicial, relembrando que a ação declarativa foi proposta em primeiro lugar, que os aqui executados foram nessa mesma ação citados em primeiro lugar, bem como, que os fundamentos de oposição em ambas as ações são exatamente os mesmos.

De facto, estando pendente o reconhecimento judicial do crédito na sua plena extensão, afigura-se-nos inexistir condições nos presentes autos para prosseguir com os embargos de executado, enquanto não se esclarecer, primeiramente, a situação do crédito relativo ao qual é apresentada uma letra, tendo em vista a sua cobrança coerciva.

Na verdade, o objeto da ação declarativa é a declaração de existência ou não da obrigação exequenda, pugnando a Ré e os aqui executados pela sua inexistência, o que a proceder terá clara influência na marcha destes autos pelo que, esta que é pressuposto da extinção da execução almejada na oposição à execução – veja-se, no sentido ora pugnado o Acórdão da Relação de Lisboa de 17.09.2013, processo n.º 6706/10.9TCLRS-A.L1-7, em www.dgsi.pt.

No que concerne aos fundamentos da oposição, relembre-se que os mesmos foram liminarmente admitidos por despacho liminar, sendo que, o mérito dos mesmos apenas se poderá apreciar a final.

Por fim, no que concerne à parte final do artigo 731.º do Código Processo Civil, de facto assiste razão à Exequente, tanto que, foram invocados os mesmos e exatos fundamentos quer em sede de oposição à injunção (em primeiro lugar), quer em sede de embargos (em segundo lugar), donde decorre precisamente a prejudicialidade.

No que concerne quanto à natureza jurídica da letra, a mesma não é de modo algum posto em causa; o que sucede é que se verificar existir uma relação de prejudicialidade entre os presentes autos e os autos de ação declarativa sob forma de processo comum.

Por conseguinte, pode entender-se, assim, que aquela ação é prejudicial em relação à presente oposição, havendo motivo para suspender a instância.

Deverão, assim, estes autos aguardar a prolação de uma sentença transitada em julgado, a ser proferida na ação declarativa sob forma de processo comum que corre termos neste Juízo, Juiz 2, sob o n.º de processo n.º 21503/23.3YIPRT.”

C. Decisão

Com base nos fundamentos supra expendidos, declaro suspensa as presentes instâncias de embargos de executado (apenso A e apenso B), nos termos do artigo 272.º, n.º 1, do Código Processo Civil, até que seja proferida sentença transitada em julgado no âmbito do processo n.º 21503/23.3YIPRT.

Notifique, inclusive o Sr. Agente de Execução.

Remeta certidão da presente ata ao processo n.º 21503/23.3YIPRT.

Solicite a tais autos a remessa da certidão da sentença transitada em julgado.”

6. Nos autos principais de execução foi posteriormente proferido o seguinte despacho:

Resposta de 14.11.2024

Informe o Sr. Agente de Execução de que a decisão apenas determinou a suspensão da instância dos embargos de executado e não da instância (principal) executiva, até porque é inadmissível legalmente a suspensão desta última com fundamento em causa prejudicial – Acórdão da Relação de Guimarães de 17.02.2022, processo n.º 391/17.4T8VCT-D.G1, em www.dgsi.pt.

Notifique, as partes e o Sr. Agente de Execução.”

7. Inconformados com este despacho, vieram os Executados interpor recurso do mesmo, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

a. Devem os presentes autos de execução ser suspensos pelos embargos, que por sua vez se encontram suspensos até que seja proferida sentença transitada em julgado no âmbito do processo n.º 21503/23.3YIPRT.

b. Devem os presentes autos principais de execução ser suspensos até ser a excepção dilatória por ilegitimidade constante do embargo do executado (…) ser analisada, ser julgada procedente, por provada, sendo o Executado absolvido da instância.

b. Devem ser suspensas todas e quaisquer penhoras, evitando o prosseguimento de uma cobrança coerciva de um valor que ainda não é certo, líquido nem justificado.

c. Devem os presentes autos principais de execução ser suspensos até decisão dos embargos.

d. Os executados que nos embargos impugnam a exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda, justificam a suspensão da execução ao suportar essa alegação numa versão factual consistente, verosímil, conforme às regras da experiência e do comportamento humano e apresente logo meios de prova com forte valor probatório que se anteveja difícil de superar em sede de audiência de julgamento – os aqui recorrentes cumprem todos estes requisitos.

e. a executada não aceitou a cobrança apresentada pela exequente e não reconhece o valor reclamado nos presentes autos e apresentou atempadamente estes fundamentos à Exequente, quando requereu a correção das facturas.

f. O prosseguimento dos autos de execução e a imediata cobrança coerciva coloca os executados numa irreversível posição de incumpridores perante todas as entidades que o Ilustre Agente de Execução já notificou para penhora.

g. De qualquer forma, deve a acção ser julgada improcedente, por não provada, e em consequência ser os executados absolvidos do pedido”.

8. Não foram apresentadas contra-alegações.

9. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II – Questões a Decidir

1. O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, não sendo objeto de apreciação questões novas suscitadas em alegações, exceção feita para as questões de conhecimento oficioso (artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).

Não se encontra também o Tribunal ad quem obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes, sendo livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil).

2. Antes de mais, verificamos que em parte das suas conclusões, os Executados, apesar de não invocarem qualquer norma jurídica, desenvolvem argumentação que em substância se reporta à redação do artigo 733.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil.

Por outro lado, lido o corpo das alegações, constata-se também aí a mesma omissão de indicação de norma, limitando-se os Exequentes a citar o sumário de um aresto onde se aborda o tema da suspensão da execução com fundamento no artigo 733.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil.

Acresce que os Executados nada requereram a este respeito e o Tribunal a quo não proferiu qualquer decisão sobre esta matéria, sendo evidente que o despacho sindicado no recurso não trata da mesma.

Apenas nas alegações de recurso, e desta forma pouco clara, os Executados vêm argumentar no sentido exposto.

Assim, a eventual questão da suspensão da execução com fundamento no artigo 733.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, consubstancia questão nova, cujo conhecimento está vedado a este Tribunal da Relação.

Efetivamente, os recursos não se destinam à prolação de decisões sobre questões novas, mas sim à reapreciação das decisões proferidas pelo tribunal de 1ª instância, isto é, “tradicionalmente temos seguido um modelo de reponderação, que visa o controlo da decisão recorrida, e não um modelo de reexame no sentido da repetição da instância no tribunal de recurso” (Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 8ª ed., Coimbra, 2024, pág. 165).

Consequentemente, no caso em apreço importa apenas apreciar se deve ser suspensa a instância executiva, com fundamento em causa prejudicial.

III – Fundamentação

1. Os factos relevantes para a decisão são os constantes do relatório.

2. O objeto do despacho em recurso, proferido nos apensos A e B de embargos, foi a suspensão das respetivas instâncias, com fundamento na pendência de causa prejudicial, nos termos do artigo 272.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Com o presente recurso pretendem os Executados a suspensão dos autos principais de execução.

Desde logo, não se afigura correta a afirmação dos Executados de que no despacho sindicado o Tribunal a quo veio “interpretar” a decisão proferida nos apensos de embargos (ponto 2 das alegações).

A decisão proferida nos apensos de embargos não diz respeito à instância executiva, mas tão somente aos próprios apensos de embargos, como decorre claramente do seu teor, encontrando-se, por isso, a instância executiva fora do seu objeto.

O despacho sindicado conheceu, pois, de uma questão diferente daquela que foi versada nos apensos de embargos, ainda que conexa, e cuja resposta suportou no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17.02.2022 (Jorge Santos) (Processo n.º 391/17.4T8VCT-D.G1, in http://www.dgsi.pt/), com o seguinte sumário:

“- Não é de ser suspender a acção executiva com fundamento na pendência de causa prejudicial, porquanto na mesma não há lugar a decisão sobre o mérito da causa (pois o direito que se pretende efectivar já está declarado), não se verificando, por isso, a relação de dependência exigida no artigo 272.º, n.º 1, do CPCivil.

- A lei admite a suspensão da instância executiva com fundamento na 2ª parte do n.º 1 do artigo 272.º do CPC, ou seja, “por outro motivo justificado”, desde que não se trate do caso de ter havido oposição à execução ou embargos de terceiro, pois em princípio a execução só pode ser suspensa nos termos previstos nos artigos 733.º e 347.º do CPCivil.

- Para se ordenar a suspensão de uma acção executiva com base em ocorrência de motivo justificado é necessário que o motivo invocado seja outro que não a pendência de uma qualquer outra causa autónoma, caso contrário estar-se-ia, na mesma a funcionar, no fundo, como uma verdadeira causa prejudicial, o que a lei não permite.”

Da leitura integral do aresto citado decorre que no mesmo se perfilha a orientação de que a instância executiva não é suscetível de ser suspensa com fundamento na pendência de causa prejudicial, ou seja, ao contrário do que advogam os Executados, não se trata aqui de “jurisprudência relativa a manobras meramente dilatórias” (ponto 4 das alegações).

Com efeito, os dois aspetos são distintos, isto é, existem razões que depõem no sentido de não ser admitida a suspensão da instância executiva com fundamento na pendência de causa prejudicial, o que, por sua vez, se mostra alinhado com as considerações de política legislativa nas quais radica a atual restrição das possibilidades de suspensão da instância executiva, assim explicadas por Marco Carvalho Gonçalves (Lições de Processo Executivo, 5ª ed., Coimbra, 2024, pág. 295): “a consagração da regra geral, segundo a qual o recebimento dos embargos de executado não suspende a execução, encontra justificação na opção, de política legislativa, de se favorecer a celeridade do processo executivo e a satisfação do crédito exequendo, bem como na necessidade de se impedir a dedução de embargos de executado com finalidades meramente dilatórias, isto é, visando apenas a suspensão da execução.”

Aliás, a orientação adotada no aresto citado pelo Tribunal a quo corresponde àquela que tem vindo a ser sufragada de modo consensual na jurisprudência, como ressalta das seguintes decisões (todas in http://www.dgsi.pt/):

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04.04.2024 (Nuno Ataíde das Neves) (Proc. n.º 401/22.3T8SEI-A.C1.S1):

“Mantém-se a jurisprudência fixada no Assento de 24-05-1960, que considerou não ser aplicável na acção executiva a suspensão da instância com fundamento na pendência de causa prejudicial, continua a não fazer sentido a invocação de uma causa prejudicial no confronto com o exercício do direito sustentado num título com força executiva, tanto mais que o artigo 733º. prescreve agora a suspensão potestativa mediante a prestação de caução e legitima que noutros casos seja decretado o mesmo efeito.”

- Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 25.01.2024 (Mário Branco Coelho) (Processo n.º 4231/22.4T8STB-A.E1):

“1. A acção executiva não pode ser suspensa com fundamento na pendência de causa prejudicial, dado não haver ali decisão sobre o mérito da causa (o direito a efectivar já está declarado), não existindo assim a relação de dependência prevista no artigo 272.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.”

- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa 09.11.2023 (Adeodato Brotas) (Processo n.º 480/05.8TBAMD.L1-6):

“1–O nexo de prejudicialidade só pode ocorrer entre acções declarativas, não sendo, por conseguinte, aplicável às acções executivas porque estas não têm por fim qualquer julgamento e, a definição do direito das partes está previamente definido, rectius, delimitado, objectiva e subjectivamente.

2–Assim, não é aplicável à acção executiva o disposto no artigo 272.º, n.º 1, 1ª parte, ou seja, não é admissível a suspensão da instância executiva com fundamento na pendência de causa prejudicial.”

- Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 14.06.2022 (Vítor Amaral) (Processo n.º 806/18.T8GRD-D.C1):

“A suspensão da instância com fundamento na pendência de causa prejudicial não é aplicável à acção executiva, vista a natureza desta, em cujo âmbito não há que proferir decisão sobre o fundo da causa, por já se encontrar declarado o direito à prestação a realizar coactivamente.”

Também José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre (Código de Processo Civil Anotado, vol. 1º, 3ª ed., Coimbra, 2014, págs. 536-537), assim como Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3ª ed., Coimbra, 2024, pág. 350) se pronunciam no mesmo sentido.

José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre (idem, pág. 538) afirmam, adicionalmente, que sendo diferentes a pendência de causa prejudicial e o motivo justificado que surge também mencionado no n.º 1 do artigo 272.º do Código de Processo Civil, não pode considerar-se que a pendência de ação autónoma integre este motivo justificado.

Assim, esta orientação louva-se nos seguintes argumentos:

- na execução não se desenvolve uma apreciação de mérito, pois aquela visa realizar um direito já declarado em título executivo, pelo que não é admissível a suspensão da instância executiva com fundamento em causa prejudicial;

- os executados podem requerer a suspensão da instância executiva, mas devem fazê-lo no quadro traçado especificamente para esse efeito pelo artigo 733.º do Código de Processo Civil, ou seja, mediante a prestação de caução ou a invocação de um motivo de entre os elencados no n.º 1 daquele dispositivo legal;

- a suspensão da instância por motivo justificado apenas poderá verificar-se em circunstâncias que não consubstanciem a invocação de uma causa prejudicial.

3. Esta questão convoca, pois, o artigo 272.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, onde se diz que “O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado.”

A suspensão da instância por virtude da pendência de causa prejudicial reconduz-se, assim, à situação em que a decisão proferida num processo constitui um pressuposto da decisão a proferir noutro processo ou afeta a decisão a proferir nesse outro processo, pelo que este último fica parado, a aguardar o trânsito em julgado do primeiro (Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, idem, pág. 535; Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ibidem).

A economia e a coerência de julgados constituem, deste modo, a razão de ser deste instituto (Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ibidem).

A leitura global e integrada do n.º 1 do artigo 272.º do Código de Processo Civil, à luz da sua génese, conduz à conclusão de que a razão da suspensão aí prevista é a existência de um motivo justificado, constituindo a causa prejudicial uma específica modalidade de motivo justificado (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.09.2023 (Nuno Oliveira), Processo 18/21.0YQSTR.L1.S1, in http://www.dgsi.pt/).

Os moldes do instituto tornam, pois, claro que aquilo que se previne através do mesmo é a produção de decisões de mérito repetidas ou contraditórias, o mesmo é dizer, ambas as ações envolvidas nesta apreciação devem destinar-se à prolação de uma decisão de mérito.

Ora, nada disso sucede no âmbito da ação executiva, a qual, por definição, é o meio processual “em que o credor requer as providências adequadas à realização coativa de uma obrigação que lhe é devida” (artigo 10.º, n.º 4 do Código de Processo Civil).

Como afirmam Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo (A Ação Executiva Anotada e Comentada, 4ª ed., Coimbra, 2025, pág. 31), “se o credor recorreu a juízo, será porque o seu devedor não cumpriu com a obrigação a que estava adstrito, servindo a ação executiva para colocar ao serviço daquele os órgãos coativos do Estado, compelindo o devedor ao cumprimento. Em bom rigor, a ação executiva não é mais do que a possibilidade do uso da força, com regras.”

Tanto assim que a execução tem por base um título, que delimita o fim e os limites da ação executiva (artigo 10.º, n.º 5, do Código de Processo Civil), isto é, na ação executiva o peticionante não requer ao tribunal que declare o direito, antes requer que lhe seja satisfeito o direito que invoca com base no título que apresenta.

Não obstante, está previsto na lei um mecanismo adequado a facultar ao devedor a discussão da obrigação exequenda, mas por isso mesmo é no âmbito deste mecanismo no qual se desenvolve uma apreciação de mérito que pode haver lugar à suspensão da instância, como sucedeu no caso em apreço, em que o Tribunal a quo decretou a suspensão da instância nos dois apensos de embargos de executado.

Não pode, deste modo, estender-se à ação executiva a suspensão decretada nos apensos de embargos, atendendo a que o fundamento dessa suspensão foi a pendência de causa prejudicial e na ação executiva não se procede a uma apreciação de mérito.

Em face do exposto, deve confirmar-se a decisão recorrida, improcedendo o recurso.

4. Ficando os Executados vencidos, suportam as custas do recurso (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

IV – Dispositivo

Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Cível deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida.

Custas pelos Executados.

Notifique e registe.

Sónia Moura (Relatora)

Ana Pessoa (1ª Adjunta)

Ricardo Miranda Peixoto (2º Adjunto)