ARRESTO
JUSTO RECEIO DA PERDA DA GARANTIA PATRIMONIAL
Sumário

I - O decretamento do arresto, porque providência meramente conservatória, não implica a prova da exigibilidade imediata do crédito do requerente, nem a prova de minuciosos factos que clamem a conclusão do inexorável inadimplemento do requerido.
II - Com o decretamento do arresto pretende-se evitar que o direito de crédito fique insatisfeito por não se encontrarem no património do devedor bens suficientes para o respectivo pagamento.
III - O justo receio da perda da garantia patrimonial, para efeitos de decretamento do arresto, há-de aferir-se por critérios objectivos, não bastando meras conjecturas ou a mera convicção subjectiva do credor.
IV - Para o justo receio da perda da garantia patrimonial é necessário a alegação e prova de um núcleo factual que demonstre ou indicie um perigoso decréscimo da solvabilidade do devedor, a dissipação ou extravio de bens, a desproporção entre o seu activo e passivo, a natureza ocultável do património, ou a ocorrência de qualquer outra situação que aponte no sentido de que o devedor não pode solver a dívida, o que não sucede no caso vertente”.

Texto Integral

Processo: 2963/24.1T8GDM.P1



Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório

A..., Unipessoal, Ldª, com sede na Rua ..., ..., ..., ... Porto instaurou procedimento cautelar especificado de arresto contra AA, residente na Rua ..., ... ..., onde concluiu pedindo que se decrete o arresto do prédio urbano constituído em regime de propriedade total com andares ou divisórias susceptíveis de utilização independente, composto por duas casas de rés-do-chão e logradouro, sito na Rua ..., freguesia ..., concelho de Gondomar, descrito na Conservatória do Registo Predial de Gondomar com o número ...97/20140227, e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...7, da União das freguesias ... (...), ... e ..., dispensado da apresentação da Licença de Utilização por se tratar de uma construção anterior à entrada em vigor do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, e tendo ambas as casas que compõem o mencionado prédio urbano as respectivas declarações de Ruína emitidas no âmbito dos ...32 e ...29, a 21/01/2021, para garantia do crédito que invoca ser-lhe devido no montante de € 160.000,00.


*

Produzida a prova sem prévia audição do Requerido foi decretado o arresto requerido sobre o referido bem imóvel.

*

Notificado, o Requerido AA deduziu oposição, pugnando pela revogação e consequente levantamento da providência de arresto que foi decretada.

*

Procedeu-se a audiência com observância das formalidades legais.

*

Após produção de prova, o Senhor Juiz a quo manteve a providência cautelar de arresto ordenada.

*

Não se conformando com a decisão proferida, o recorrente veio interpor o presente recurso de apelação, em cujas alegações conclui da seguinte forma:

I. A douta sentença recorrida não merece a concordância do aqui Recorrente, fazendo uma errada análise critica dos factos e da prova produzida, bem como uma erra interpretação e aplicação do direito, incorrendo em manifesto erro de julgamento, razão pela qual recorre da

decisão proferida em sede do procedimento cautelar de arresto em causa nos autos.

II. Tendo em consideração a prova produzida e os factos dados como provados, sempre se impõe salientar que tendo o Recorrente, procedido à marcação de 5 (cinco) escrituras para a outorga do contrato prometido.

III. Tendo a Recorrida apenas comparecido num desses agendamentos, alegando incapacidade para pagamento do preço.

IV. Não tendo a Recorrida procedido à marcação de qualquer escritura.

V. Não tendo a Recorrida prorrogado válida e eficazmente o prazo para a outorga da escritura.

VI. Jamais poderemos aceitar que seja decretado o presente Arresto tendo por base a circunstância de que a interpelação admonitória levada a cabo pelo Recorrente foi mal feita, conduzindo a que a resolução contratual levada a cabo por este seja ilícita.

VII. O que por si só, está em cabal contradição entre aquilo que foram os factos provados e os ora infirmados nos autos.

VIII. É dado como provado na douta sentença que na data da outorga do contrato promessa de compra e venda a marcação da escritura pública de compra e venda seria feita até 31 de março de 2024, tendo ficado ainda dado como provado que tal prazo, como seja de quatro meses entre a data da outorga do contrato promessa até à escritura deveu-se unicamente ao facto de estarem os outorgantes à espera da aprovação dos projetos de especialidades.

IX. Nesta matéria chamamos à colação o entendimento do Tribunal da Relação do Porto, que muitíssimo bem decidiu no processo n.º 809/23.7T8PVZ.P1, de 12/07/2023.

X. Na esteira do referido acórdão quando as partes optam por celebrar um contrato promessa em vez de celebrar o próprio contrato prometido, é porque existem obstáculos à celebração imediata do mesmo.

XI. No caso dos autos a única circunstância que foi acordada e que conduziu à fixação de um prazo posterior para a celebração da escritura definitiva foi a condicionante da aprovação dos projetos de especialidade. Aliás como consta definitivamente dado com provado nos factos h) e i) da douta sentença.

XII. Não obstante quaisquer interpretações que se possa dar ao contrato em apreço certo é que cessou a dia 18 de janeiro de 2024 aquele que era o “obstáculo” à celebração imediata do mesmo.

XIII. Do segundo aditamento resulta como prazo para a outorga do contrato prometido “até ao dia 31 de maio de 2024”.

XIV. Certo é que até ao dia 31 de maio de 2024, a escritura do contrato prometido não se realizou, por culpa da Recorrida.

XV. Sendo certo que jamais enviou ao Recorrente qualquer comunicação a proceder à marcação da escritura pública.

XVI. No entendimento do Recorrente e do próprio Tribunal da Relação do Porto, supra elencado, a data para realização da escritura pública de compra e venda teria que ocorrer perentoriamente até ao dia 31 de maio de 2024.

XVII. Isto é, a Recorrida tinha obrigação de nos 15 dias antecedentes ao dia 31 de maio de 2024, ou seja, até ao dia 16 de maio de 2024 de proceder à marcação da escritura pública de compra e venda.

XVIII. Nesse mesmo dia 31 de maio de 2024 o Recorrente confrontado com a situação de até à data limite para outorga da escritura a mesma não ter sido realizada, enviou interpelação admonitória por meio de carta registada com aviso de receção à Recorrida, determinado que caso a escritura não fosse realizada no 5.º dia útil seguinte ao dia 31 de maio de 2024, tal como figura a cláusula 4.6. do contrato promessa, o contrato dar-se-ia por resolvido.

XIX. Andou mal o tribunal a quo ao referir que nesta altura o Recorrente incumpriu o prazo de 15 dias de antecedência para ele mesmo proceder à marcação da escritura, isto porque, o mesmo procedeu à marcação da mesma por via da cláusula 4.6 do contrato promessa, ou seja, por via do 5.º dia útil seguinte à data em que a escritura deveria ter sido realizada.

XX. Sendo certo que o Recorrente, promitente vendedor, chegado ao 31 de maio numa verdadeira interpelação admonitória em reforço daquilo que se encontra previsto na cláusula 4.6. - Cláusula automática de marcação da escritura para o 5.º dia útil seguinte caso qualquer uma das partes não comparecer na data inicialmente fixada, comunicou que a escritura se encontrava marcada para esse mesmo 5.º dia útil.

XXI. Na linha do entendimento deste douto Tribunal da Relação do Porto, sob o acórdão acima referenciado, não pode resultar outra interpretação que não seja a de que esse 5.º dia útil será contado inquestionavelmente a partir do dia 31 de maio de 2024 – sendo essa a nova data que resulta da marcação para dia 06 de junho de 2024 por parte do Recorrente.

XXII. Ora, sempre será de concluir que com isto as partes quiseram, desde logo, determinar que o de 31 de maio seria uma data limite para a outorga da escritura.

XXIII. Se não se realizasse em momento anterior ela teria que ocorrer impreterivelmente no próprio dia 31 de maio de 2024.

XXIV. Sabia o Recorrente que se não usasse da faculdade de proceder ele à marcação da escritura, sabia que a mesma inquestionavelmente teria de ser realizada no dia 31 de maio, ou em caso de não comparência da Recorrida, no 5.º dia útil seguinte.

XXV. Foi esta a vontade e declaração das partes na outorga do contrato-promessa.

XXVI. Não se pode confundir a possibilidade/faculdade de a escritura pública se puder realizar em momento anterior ao 31 de março, posteriormente 31 de maio por via do segundo aditamento, com a possibilidade de uma parte que não queria realizar a escritura utilizar do facto de no contrato constar “até dia x” para protelar a realização da mesma ad eternum.

XXVII. Isto não faria sentido de outra forma, desde logo, porque as partes acordaram na cláusula 4.6., na qual estipularam um “5.º dia útil seguinte ao prazo inicialmente fixado”, em caso de não realização no prazo convencionado.

XXVIII. Sendo inquestionável que esse prazo inicialmente fixado no segundo aditamento é, sem que haja outra data anterior ao 31 de maio, o próprio 31 de maio.

XXIX. Na esteira do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 12 de julho de 2023, sob o processo n.º 809/23.7T8PVZ.P1, confrontado com a circunstância da não realização da escritura no dia 31 de maio de 2024 o que o Recorrente fez que nem sequer tinha de o fazer porque o próprio contrato assim o determinava, foi naturalmente fazendo uso de uma interpelação admonitória salientar que a escritura se realizaria no 5.º dia útil posterior – conforme previsto no contrato, como seja, o dia 06 de junho de 2024, referindo que caso não se realizasse o contrato dar-se-ia por resolvido.

XXX. Convertendo assim a mora da Recorrida em incumprimento definitivo.

XXXI. O Recorrente - promitente vendedor - procurou em dois momentos absolutamente distintos por forma a permitir como últimas tentativas de resolução do assunto e realização da escritura, facto que foi cabal e levianamente ignorado pela Recorrida e pela douta sentença.

XXXII. Tal como resultou provado - factos oo) e qq) - o Recorrente deu nova oportunidade, para efetiva outorga do contrato definitivo comunicando via email e via carta registada com aviso de receção uma escritura para a data de 23 de agosto de 2024 às 14h30.

XXXIII. Numa derradeira e última tentativa de ver-se outorgada a escritura, por meio de Mandatário dirigiu nova interpelação admonitória à Recorrida - documento n.º 12 junto com a oposição, fixando o dia 25 de setembro de 2024, pelas 16h30, nas instalações da “B... Lda.”, para outorga da escritura pública de compra e venda, com a cominação de que se a escritura pública de compra e venda não se realizasse nesse dia e hora aprazados o contrato promessa considerar-se-ia por resolvido, e sem necessidade de proceder a qualquer outra comunicação.

XXXIV. Não obstante a Recorrida - promitente compradora - jamais se dignou a comparecer e muito menos se dignou a por qualquer meio manifestar qualquer posição.

XXXV. Na esteira do Acórdão já referenciado concluímos sem margem para dúvidas que tendo o Recorrente lançado mão de uma interpolação admonitória marcando a escritura para dia 25 de setembro de 2024, cabia à Recorrida, duas hipóteses: ou comparecer para outorga da mesma, ou proceder ela mesma ao agendamento da escritura para data anterior ao dia agendado pelo promitente vendedor.

XXXVI. Confrontado com a interpelação recebida, a Recorrida não só nada fez, não comparecendo à escritura, como nada disse, ignorando por completo a mesma.

XXXVII. O contrato promessa celebrado a 30 de novembro de 2023, com data para realização da escritura pública até 31 de março de 2024, teve aprovados os projetos de especialidade em 18 de janeiro de 2024, e não obstante tudo isto tendo o Recorrente marcado escritura para 25 de setembro de 2024 a mesma não foi realizada por única e exclusiva responsabilidade da Recorrida.

XXXVIII. Veja-se neste sentido, o entendimento do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 23/06/2022, sob o processo n.º 831/19.8T8PVZ, o qual refere o seguinte: “Há incumprimento definitivo: (...) quando o próprio devedor declara, em termos sérios e definitivos, que não irá cumprir (declaração de não cumprimento) e o credor, em consequência disso, considera obrigação definitivamente incumprida.”

XXXIX. Resultou provado nos autos, por depoimento de parte (legal representante da Recorrida) e por prova testemunhal (testemunha BB) que a Recorrida não dispõe de capital para o cumprimento integral do contrato prometido.

XL. Um dos pressupostos e até o risco do próprio negócio na posição dos promitentes compradores são a capacidade ou não de suportarem o pagamento do preço a que se haviam comprometido, sendo certo que tal factualidade impossibilita a concretização do mesmo com as legais consequências.

XLI. Mais ainda, o que se acaba de dizer tem cobro até pelo facto de pelo presente procedimento cautelar a Recorrida pretendeu sempre a devolução em dobro do sinal prestado e nunca lançar mão do mecanismo da execução específica.

XLII. Quanto ao Requerido este marcou 5 escrituras nas quais a Requerente não compareceu ou se a mesma não se realizou foi por causa imputável única exclusivamente à Requerente.

XLIII. Entende o Recorrente que andou mal o tribunal a quo, uma vez que ignorando completamente a situação económica e financeira do Recorrente, entende existir periculum in mora.

XLIV. Inquestionavelmente o douto tribunal a quo na douta sentença entra em total contradição naquele que é o segundo pressuposto essencial do arresto como seja o periculum in mora.

XLV. Prescreve a douta sentença o seguinte: “Após o julgamento da oposição, no presente procedimento cautelar não resultam provados os seguintes factos da Decisão que decretou o arresto, por terem resultados infirmados após o julgamento da oposição: (...) 18. O Requerido, estava a vender o imóvel prometido, o qual tinha começado a reconstruir para habitação própria, porque não tinha condições financeiras para o concluir. 19. O único bem conhecido do Requerido que pode responder pelo montante de € 160.000,00 (cento e sessenta mil euros) é o imóvel prometido. 21. O Requerente receia não conseguir obter o pagamento do seu crédito se o Requerido vender o imóvel identificado em 2. 22. O imóvel identificado em 2. É o único bem de valor mais significativo do património do Requerido, não lhe sendo conhecidos outros, constituindo a única possibilidade de o Requerente se ressarcir dos montantes de que se acha desembolsado.”

XLVI. Como pode o tribunal dar agora como não provados os factos supra transcritos e assumir a final que existe um receio por parte da Recorrida em não conseguir garantir a satisfação do seu eventual direito.

XLVII. Para o justo receio de perda da garantia patrimonial exige-se um juízo, senão de certeza e segurança absoluta, ao menos de probabilidade muito forte, não bastando qualquer receio, que pode corresponder a um estado de espírito que derivou de uma apreciação ligeira da realidade, num exame precipitado das circunstâncias.

XLVIII. No caso em apreço o próprio tribunal julgou como não provado a existência desse mesmo receio.

XLIX. Só existe justificado receio da perda da garantia patrimonial do crédito, quando as circunstâncias se apresentam de modo a convencer que está iminente a lesão do direito, a perspetivar, justificada e plausivelmente, o perigo de ser vir a tornar inviável, ou altamente precária, a realização da garantia patrimonial do crédito da Recorrida.

L. Neste caso se afiguram, nas palavras do Meritíssimo Juiz a quo que não resultam provados os seguintes factos da Decisão que decretou o arresto, por terem resultados infirmados após o julgamento da oposição.

LI. Não pode o douto tribunal considerar não provado que “A Requerente receia não conseguir obter o pagamento do seu crédito se o Requerido vender o imóvel identificado em 2.,” e por outro lado considerar a final que há justo receio de perda de garantia patrimonial para fazer face ao hipotético crédito.

LII. Na sequência daquilo que foi a prova produzida, atente-se em especial no depoimento do legal representante da Recorrida e do intermediário do negócio, testemunha BB, que demonstrou de forma clara e evidente que a Recorrida não tinha, nem tem capacidade para levar adiante o negócio, como seja, proceder ao pagamento do resto do preço.

LIII. Ora, se a mesma se afigurou sempre incapaz de proceder ao pagamento do preço e com isso proceder à realização da escritura, obviamente não terá intenção de vir agora lançar mão do mecanismo da execução específica, mecanismo que saliente-se nem sequer equacionou no requerimento inicial.

LIV. Será de referir que nos autos em apreço não restam dúvidas que não há qualquer aparência do direito de crédito invocado pela Recorrida, uma vez que há incumprimento definitivo do contrato por parte desta, e desde logo, nunca se colocará a questão de haver a necessidade de segurar o imóvel para que ele possa ser objeto da referida execução específica.

LV. Cremos que o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo nas suas considerações relativamente a este pressuposto - periculum in mora - desconsiderou toda a posição económica e financeira do Recorrente, uma vez que apenas quis assegurar da possibilidade de uma execução específica.

LVI. O Recorrente é o único proprietário do imóvel objeto nestes autos, imóvel esse adquirido com capitais próprios, sem qualquer tipo de hipoteca ou quaisquer ónus e/ou encargos.

LVII. O Recorrente é ainda proprietário de mais um bem imóvel, como seja, o imóvel identificado no facto qqq.) que, tal como consta nos factos provados, tem pelo menos um valor de mercado de 350.000,00€, no estado atual, sendo certo que o Recorrente encontra-se a finalizar as obras no referido imóvel também sem qualquer tipo de financiamento, tal como consta na certidão permanente do imóvel já junta aos autos.

LVIII. O Recorrente não detém qualquer tipo de empréstimos, financiamentos ou outro tipo de obrigações de natureza pecuniária perante qualquer credor.

LIX. O Recorrente é engenheiro de energias renováveis de profissão, no qual aufere um rendimento líquido mensal de 2.000,00€ - facto provado ppp).

LX. O Requerido encontra-se pessoal e profissionalmente bem inserido, com rendimentos acima daquilo que é até a média a nível nacional, sem qualquer tipo de ónus nos imóveis de que é proprietário.

LXI. Pessoa que se encontra neste momento a construir uma habitação, num segundo imóvel de que é proprietário, cujo valor de mercado, mesmo sem estar concluída ascende a cerca de 350.000,00€ (trezentos e cinquenta mil euros), mas cujo valor de mercado assim que estiver concluída se computa em cerca de 500.000,00€ (quinhentos mil euros).

LXII. Nesta matéria, e porque há contradição evidente do doutro tribunal a quo transcreve-se aquela que foi a fundamentação do Meritíssimo Juiz a quo relativamente “à situação patrimonial e rendimentos do Requerido” “O Requerido AA referiu nas suas declarações de parte credíveis e convincentes, (..) que o Requerido também tem um carro DS 5 híbrido com 12 anos e uma mota 850 cc Yamaha.XS 900, que tem cerca de 6 anos; que o Requerido trabalha há 3 anos numa empresa (onde é efectivo), auferindo mensalmente €2.000 líquidos; que o Requerido está a construir uma moradia em ..., em Matosinhos, com 4 pisos, com 325 m2 de área, que tem um valor de mercado de € 350.000, sem recurso a qualquer crédito, estando na fase de acabamentos; que depois de pronta essa casa terá o valor de € 500.000 e que o Requerido também tem 3 contas bancários com um valor entre € 90.000 a € 100.000; que o Requerido e a sua esposa têm ambos 35 anos de idade; que o Requerido consegue obter junto dos bancos € 160.000 de crédito para adquirir uma habitação.” “A testemunha CC referiu, também num depoimento claro e consistente, que é enfermeira, auferindo o vencimento de € 2.200 líquidos e que tem uma empresa de construção com o seu pai, tendo 16 fracções para vender, tendo já feito a escritura de 8 fracções; que a testemunha é sócia, tendo uma quota de 33% da empresa do seu pai, que é o gerente; que os pais da testemunha estão no ramo imobiliário; que estão a construir uma moradia em ..., encontrando-se na fase de acabamentos; que, segundo um agente imobiliário, o valor da casa, depois de estar pronta, é de € 500.000; que faltam as especialidades; que na última avaliação efectuada essa casa de ... valia € 300.000; que o irmão da testemunha também está no ramo imobiliário; que nunca fizeram nenhum empréstimo; que a testemunha e o Requerido conseguem um financiamento de € 300.000 ou € 400.000; que queriam vender o imóvel para custear a casa que estão a construir sem recorrerem a bancos; que a testemunha e o seu marido têm contas bancárias conjuntas com um saldo de € 120.000 e que o A. tem uma conta bancária dele cujo saldo ronda os € 80.000 ou € 90.000.” “A testemunha DD, num depoimento claro e consistente, referiu ter sido quem fez o projecto de arquitectura da casa de ..., estando agora a entrar na fase de acabamentos; que o valor da casa depois de pronta é de € 500.000.”

LXIII. Tendo o Meritíssimo Juiz considerado claras e consistentes, portanto credíveis, os depoimentos e declarações acima transcritas, tendo resultado das mesmas que o Recorrente é possuidor de todas e quaisquer condições para fazer face a qualquer direito de crédito que a Recorrida pudesse eventualmente deter é de uma manifesta contradição que a final conclua que existe periculum in mora.

LXIV. Merecendo a tutela dos interesses, não apenas processuais, mas acima de tudo do direito materialmente aplicável, do Recorrente o escrutínio do presente recurso, deve, em consequência, ser julgado totalmente procedente, revogando-se integralmente a decisão recorrida, com as legais consequências.

LXV. Pelo douto suprimento, deve ser julgado procedente o presente recurso, e, consequentemente, alterada a douta decisão, revogando-se o procedimento cautelar de arresto ora decretado nos presentes autos, fazendo-se a almejada Justiça!


*

Não foram apresentadas contra-alegações.

*

Colhidos que se mostram os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.


*


2. Factos

2.1 Factos provados

O Tribunal a quo considerou, após oposição, indiciariamente provados os seguintes factos:

a. A Requerente e o Requerido celebraram entre si, a 13 de Novembro de 2023, um contrato a que deram a designação de “contrato promessa de compra e venda”, junto à presente providência como doc.1.

b. Em 13/11/2023 o Requerido celebrou com a Requerente, na pessoa do seu legal representante EE, um Contrato Promessa de Compra e Venda que teve por objeto o imóvel melhor identificado no artigo 2. do requerimento inicial, pelo preço global de 140.000,00€ (cento e quarenta mil euros).

c. Por esse contrato, a Requerente prometeu comprar ao Requerido e este prometeu vender o prédio urbano constituído em regime de propriedade total com andares ou divisórias suscetíveis de utilização independente, composto por duas casas de rés-do- chão e logradouro, sito na Rua ..., freguesia ..., concelho de Gondomar, descrito na

Conservatória do registo Predial de Gondomar com o número ...97/20140227, e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...7, da União das freguesias ... (...), ... e ..., dispensado da apresentação da Licença de Utilização por se tratar de uma construção anterior à entrada em vigor do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, e tendo ambas as casas que compõem o mencionado prédio urbano as respetivas declarações de Ruína emitida no âmbito dos ...32 e ...29, ambas emitidas a 21/01/2021, tal como consta do Considerando do documento nº 1 junto nos presentes autos.

d. Do referido contrato resultou que o preço global da venda seria de 140.000,00 (cento e quarenta mil euros) – cfr. Cláusula terceira.

e. A Requerente entregou ao Requerido, a título de sinal e princípio de pagamento a quantia de 30.000,00€ (trinta mil euros) – cfr. Cláusula terceira, ponto 3.1.

f. Ficando de entregar a restante parte do preço, no montante de 110.000,00€ (cento e dez mil euros), no dia da realização da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda – cfr. Cláusula terceira, ponto 3.2

g. No referido contrato pode ler-se, entre o mais: Vd. Doc. 1

4. A escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda aqui prometida(o) será celebrada até à data de 31 de março de 2024, em data, hora e Advogado, Solicitador, Cartório Notarial ou Conservatória do Registo Predial a fixar pela Parte Promitente-Compradora, devendo notificar a Parte Promitente-Vendedora, através de qualquer meio escrito que permita confirmação de recepção, com 15 (quinze) dias de antecedência em relação àquela data. cfr. Cláusula quarta

• 4.1. As partes expressamente acordam na possibilidade da prorrogação do prazo, previsto no número anterior, para a outorga da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda, por mais 06 (seis) meses a contar do término do prazo estipulado na Cláusula 4 do contrato promessa celebrado; para tal a Parte que exercer desta possibilidade da prorrogação deverá comunicar por escrito à Parte contrária essa intenção (negrito nosso). cfr. Cláusula quarta, ponto 4.1

• 4.2. Caso a Parte Promitente Compradora não proceda ao agendamento da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda aqui prometida(o) até ao término do prazo referido na cláusula anterior, tal faculdade reverterá automaticamente para a parte Promitente-Vendedora obrigando-se a primeira a comparecer no dia, hora e local determinado e previamente comunicado por esta última, por carta registada com aviso de recepção, expedida com a antecedência mínima de 15 (quinze) dias relativamente à data da celebração do referido ato. cfr. Cláusula quarta, ponto 4.2

• 4.6. Se qualquer uma das Partes não comparecer na data inicialmente fixada para a celebração da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda aqui prometida(o), esta ficará automaticamente agendada, sem necessidade de qualquer comunicação adicional, para o mesmo local e hora do 5º (quinto) dia útil seguinte (“Nova Data”). cfr. Cláusula quarta, ponto 44.6

O incumprimento definitivo de qualquer obrigação prevista no presente contrato confere à parte não faltosa o direito de, em alternativa: cfr. Cláusula quinta

5. O incumprimento definitivo de qualquer obrigação prevista no presente Contrato confere á Parte não faltosa o direito de, em alternativa: cfr. Cláusula quinta

• 5.1. Resolver de imediato o presente Contrato e, sem prejuízo da parte não faltosa ser indemnizada pelos prejuízos sofridos,(i) receber em dobro as quantias entregues a título de sinal e seus reforços (havendo), caso a parte não faltosa seja a Parte Promitente-Compradora, ou (II) o direito a fazer suas as quantias recebidas a título de sinal e seus reforços (havendo), caso a parte não faltosa seja a Parte Promitente-Vendedora, tal como previsto no artigo 422º do Código Civil. cfr. Cláusula quinta, ponto 1

• 5.2. Alternativamente ao número anterior, a parte não faltosa pode requerer a execução especifica do presente contrato, nos termos do disposto no artigo 830º do Código Civil. cfr. Cláusula quinta, ponto 2

• 5.3 A resolução do presente contrato deverá ser efetuada por carta registada com aviso de recção. cfr. Cláusula quinta, ponto 3

h. Foi devidamente esclarecido e negociado entre as partes que, o pressuposto essencial à celebração do negócio era o facto de se pretender que os projetos de especialidades sobre aquele imóvel se encontrassem devidamente aprovados pela competente Câmara Municipal de Gondomar, conforme aliás resulta da cláusula 2.4 do Contrato-Promessa de Compra e Venda junto sob o Documento n.º 1.

i. Por esse facto e por forma a salvaguardar os eventuais atrasos na aprovação dessas especialidades, as partes, juntamente com os intermediários no negócio como sejam os Srs. BB e FF da agência imobiliária B..., ficou estipulado o prazo para a outorga da escritura de compra e venda “até à data de 31 de março de 2024.”

j. A pedido do Promitente-Vendedor, aqui Requerido, foi incluída a cláusula 4.1. na qual se previa a possibilidade da prorrogação do prazo, previsto no número 4 (“até à data de 31 de Março de 2024”), para a outorga da escritura pública/ documento particular autenticado de compra e venda, “por mais 06 (seis) meses a contar do término do prazo estipulado da cláusula 4. do contrato promessa; Para tal a parte que exercer desta possibilidade da prorrogação deverá comunicar por escrito à parte contraria essa intenção”

l. A 18 de janeiro de 2024 os projectos de especialidade foram devidamente aprovados, não se verificando qualquer entrave à outorga da escritura definitiva de compra e venda, na data aprazada.

m. Desse facto o requerido comunicou imediatamente aos mediadores da imobiliária B... com quem trocava informação acerca deste negócio, bem como ao sócio-gerente da Requerente, na pessoa do Sr. EE,

n. Sendo certo que este prontamente esclareceu que pretendia ir até ao final do prazo, ou seja, até 31 de março de 2024,

o. Contrariamente à vontade do Requerido, porque necessitava de realizar a escritura pois necessitava daquelas verbas para fazer face a algumas despesas que estava a suportar com obras num outro imóvel, de sua propriedade.

p. A pedido da Requerente que alegava não ter o capital necessário para realizar o negócio prometido, predispôs-se a mesma a reforçar o sinal em 20.000,00€ para que o Requerido acabasse por aceitar na celebração de um Aditamento ao Primitivo Contrato Promessa de compra e venda que estabelecesse uma nova data para a outorga da escritura.

q. Assim, em 27 de março de 2024, Requerente e Requerido outorgaram um Primeiro Aditamento ao Contrato promessa de compra e venda, do qual por acordo das partes resultou o seguinte:

a. O valor do negócio passou a ser de 141.000,00€;

b. A Requerente prestou um reforço de sinal no valor de 20.000,00€;

c. Que a outorga da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda, conforme melhor identificado na cláusula 4ª do contrato-promessa outorgado, será efetuada no dia 02 de Maio de 2024 pelas 15H30 nas instalações da B..., LDA, sito no Centro Empresarial ... (...), Estrada ..., ..., ..., Porto.

r. No referido aditamento ao contrato promessa de compra e venda pode ler-se, entre o mais: Vd. Doc. 2

• 1. Em alterar o valor global do negócio prometido de € 140.000,00 (cento e quarenta mil euros) para € 141.000,00 (cento e quarenta e um mil euros). cfr. Cláusula primeira

• 2. Declaram ainda as partes que na presente data a Parte Promitente-Vendedora recebeu da Parte Promitente-Compradora, o montante de € 20.000,00 (vinte mil euros) a título de reforço de sinal e de pagamento, de que dará quitação após boa cobrança, através de transferência bancária da conta bancária com o IBAN:  ...26, titulada pela Promitente-Compradora, para a conta de destino com o IBAN  ...05, titulada pela mediadora, sendo que, nos termos do previsto no ponto 1 supra, o remanescente do preço acordado, isto é, € 91.000,00 (noventa e um mil euros) será pago no momento da outorga da escritura pública/ documento particular autenticado do contrato prometido, mediante cheque bancário ou visado. cfr. Cláusula segunda

• 4. As restantes cláusulas contratuais mantêm-se inalteradas. cfr. Cláusula quarta

s. No dia 26 de abril 2024 o Requerido, mais uma vez recebeu por email o reencaminhamento de uma comunicação dirigida pelo Sr. BB, mediador imobiliário interveniente no negócio em representação da Requerente na pessoa do Sr. EE, cujo teor é o seguinte:

“Olá FF uma boa tarde,

Mais uma vez o meu cliente não vai conseguir fazer a escritura dele, porque as finanças está a atrasas na correção da áreas, com isto já falhamos a escritura que tinha para fazer e que representa 298,000€ mas neste momento não tem como cumprir o prazo que temos para escriturar sei que o teu cliente tem uma despesa mensal proponho que o meu cliente pague essa despesa para não ser suportada pelo teu cliente, por isso se for necessário proposta uma reunião entre eles se achares necessário,

Com os meus cumprimentos”

t. Em face de tal comunicação, no dia 2 de maio de 2024 o Requerido deslocou-se às instalações da B... para a outorga da escritura conforme previsto no aditamento supra transcrito.

u. A Requerente não compareceu para a outorga da escritura.

v. Volvidos cinco dias úteis após a data consignada para a outorga da escritura de compra e venda (02 de maio de 2024), como seja no dia 9 de maio de 2024, o Requerido no cumprimento do disposto na cláusula 4.6 do contrato promessa, deslocou-se uma vez mais às instalações da B... para proceder à outorga da almejada escritura.

x. Facto que uma vez mais não se verificou, em face da ausência do Sr. EE para realizar a escritura.

z. No dia seguinte, no dia 10 de maio de 2024, Requerente e Requerido outorgaram um “Segundo Aditamento ao Contrato Promessa de Compra e Venda” no qual por acordo das partes:

a. O valor do negócio passou a ser de 142.000,00€;

b. A Requerente prestou um reforço de sinal no valor de 30.000,00€;

c. Consagrou-se como prazo para a outorga da escritura “ATÉ AO DIA 31 DE MAIO nas instalações indicadas pela entidade bancária, financiadora da parte promitente-compradora.”

aa. O Requerente entregou, por isso, ao Requerido a quantia total de € 80.000,00 (oitenta mil euros), a título de sinal e princípio de pagamento.

bb. Em face da ausência de comunicação por parte da Requerente, não tendo uma vez mais procedido ao agendamento da escritura conforme se havia comprometido pela outorga do Segundo Aditamento ao Contrato Promessa em que se consignou a realização da escritura até 31 de maio de 2024,

cc. Nesse mesmo dia 31/05/2024, pelas 20:00H, o Requerido por meio de carta registada com aviso de receção, dirigiu interpelação admonitória à Requerente cujo teor aqui se transcreve:

“Exmo. Senhor,

Dado que a escritura não foi realizada no passado dia 31 de maio conforme previsto no aditamento ao contrato promessa de compra e venda por incumprimento de ausência do cheque bancário/visado como método de pagamento acordado no valor remanescente (62.000,00€) por parte do comprador, venho pelo presente notificar nova e última data para a resolução da escritura.

Informa-se que em caso de novo incumprimento de regularização da escritura pública na data abaixo indicada, dá-se o contrato como resolvido.

Segue em anexo cópia do aditamento ao CPCV.

Data da escritura: Quinta-feira (06 de junho), às 15h.”

dd. Agendando assim, novamente, a escritura para o dia 6 de Junho de 2024, às 15:00H.

ee. No dia 6 de junho de 2024, pelas 15:00H, o Requerido legalmente representado pelo seu procurador Sr. FF, compareceu para a outorga da escritura assim como a Requerente representada pelo seu gerente EE, não se tendo contudo, realizado a escritura.

ff. Tal como consta da declaração emitida pelo Solicitador GG, o documento particular autenticado de compra e venda não se realizou.

gg. Conforme declaração de presença, datada de 06 de junho de 2024, “o documento particular autenticado compra e venda não se realizou, em virtude da parte compradora não ter apresentado qualquer meio de pagamento do remanescente do preço do imóvel, que, de acordo com o indicado pela parte vendedora devia ter sido efetuado por cheque bancário ou visado de acordo com os estipulado no contrato promessa celebrado em 13/11/2023.”

hh. Também como consta da referida declaração, “Foi declarado pela Parte compradora que ao abrigo da cláusula 4.1 do referido contrato de promessa de compra e venda, remeteu em 04/06/2024, uma comunicação à parte vendedora, através de carta registada com aviso de recepção, tendo em vista a prorrogação do prazo da outorga do contrato definitivo por mais 6 (seis) meses a contar de 31 de maio de 2024.

ii. A Requerente declarou “ao abrigo da cláusula 4.1 do referido contrato promessa de compra e venda, remeteu em 04/06/2024, uma comunicação à parte vendedora, através de carta registada com aviso de receção, tendo em vista a prorrogação do prazo da outorga do contrato definitivo por mais 6 meses a contar de 31 de maio de 2024”.

jj. A Requerente, tal como referido na supra identificada declaração, remeteu ao Requerido, no dia 04 de junho de 2024, para a morada constante do contrato- promessa de compra e venda como sendo as acordadas para efeitos de notificações, tal como consta da cláusula 7ª, a carta registada com aviso de recepção, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos.

ll. A referida comunicação, remetida por correio registado com aviso de receção, não foi rececionada pelo Requerido, por não a ter levantado no posto do correio, onde ficou a aguardar o seu levantamento.

mm. A notificação da prorrogação do prazo foi feita ao Requerido no dia 06 de junho de 2024, com a recepção da declaração junta como documento 4.

nn. O Requerido pediu aos mediadores imobiliários se podiam agilizar a realização da escritura.

oo. Neste sentido foi enviado um email no dia 12 de agosto de 2024 pelo Requerido ao Sr. FF a agendar uma escritura para o dia 23 de agosto de 2024 pelas 14:30H nas instalações da B...- ... por forma a este transmitir tal marcação à Requerente.

pp. Ao que, nesse mesmo dia o Sr. FF respondeu ao referido email “Obrigado GG. Já encaminhei o seu email para quem de direito.”

qq. Tal comunicação seguiu também via carta registada com aviso de receção dirigida à Requerente, expedida no dia 16 de agosto de 2024, com o agendamento da escritura para o dia 23 de Agosto de 2024, às 14:30H.

rr. A esta comunicação, a Requerente respondeu no dia 19 de agosto de 2024 para o Sr. BB o seguinte:

“Boa tarde

Venho por este meio comunicar que não vou puder estar na escritura agendada para 23 Agosto.

Conforme carta enviada a 4 de junho o prazo ainda não terminou para a mesma ser marcada

Mal seja possível farei chegar a comunicação.”

ss. De acordo com o ponto 4.2 do contrato promessa de compra e venda, “Caso a Parte Promitente Compradora não proceda ao agendamento da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda aqui prometida(o) até ao término do prazo referido na cláusula anterior, tal faculdade reverterá automaticamente para a parte Promitente-Vendedora obrigando-se a primeira a comparecer no dia, hora e local determinado e previamente comunicado por esta última, por carta registada com aviso de recepção, expedida com a antecedência mínima de 15 (quinze) dias relativamente à data da celebração do referido ato.

tt. Em face de tal factualidade, e porque o Requerido não podia aguentar mais toda esta situação, reuniu com o seu mandatário como seja o Dr. HH, através do qual enviou nova interpelação admonitória, via carta registada com aviso de receção datada e expedida no dia 4 de setembro de 2024, em que expressamente determinou para a celebração do contrato definitivo o dia 25 de setembro de 2024 pelas 16:30H nas instalações da B..., Lda., sita no Centro Empresarial ... - Estrada ..., ..., ..., concelho do Porto, determinando nessa mesma missiva, em caso de não realização da escritura nessa data o contrato ter-se-ia por resolvido com as legais consequências.

uu. Na referida carta, também é comunicado ao Requerente que “Lamentavelmente - e tendo em conta os sucessivos atrasos e incumprimentos imputáveis, única e exclusivamente, a V. Exa.s - se a escritura de compra e venda não se vier a realizar no dia, hora e local aprazados, o n/constituinte perde, em definitivo, interesse na celebração do negócio (considerando, assim, o contrato resolvido no mencionado dia 25 de setembro e sem necessidade de proceder a qualquer outra notificação, ficando a valer o teor da presente para efeitos do consignado no ponto 5.3 do CPCV), com todas as legais consequências (designadamente, as mencionadas no ponto 5.1 do contrato promessa de compra e venda).

vv. A Requerente recebeu essa missiva a 11 de setembro de 2024, pelas 13:56H, conforme Documento n.º 14 junto com a Oposição,

xx. Assim procedeu o Requerido, apresentando-se para a realização da escritura na data estipulada não tendo, porém, a mesma sido realizada por falta de comparência da parte compradora, como seja, a Requerente.

zz. O Requerido esteve presente, no dia 25 de Setembro de 2024, pelas 16:30 horas, nas instalações da”B..., Lda”, sitas no Centro Empresarial ... – Estrada ..., ... ..., concelho do Porto, para a celebração da escritura/documento particular autenticado do contrato prometido.

aaa. O Requerente, por considerar que a isso não estava obrigado, não compareceu no dia, hora e local constantes do supra referido email para celebrar a escritura/documento particular autenticado do contrato prometido

bbb. De acordo com o previsto na cláusula 4.6 do contrato promessa de compra e venda, “se qualquer uma das partes não comparecer na data inicialmente fixada para a celebração da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda aqui prometida, esta ficará automaticamente agendada, sem necessidade de qualquer outra qualquer comunicação adicional, para o mesmo local e hora do 5º (quinto) dia útil seguinte (“Nova Data”).

ccc. No dia 02 de outubro de 2024, 5º dia útil seguinte ao dia 25 de setembro de 2024, o Requerido não compareceu nas instalações da “B..., Lda.”, sitas no Centro Empresarial ... – Estrada ..., ... ..., concelho do Porto, para a celebração da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda.

ddd. Era ao Requerente que, de acordo com o contrato-promessa de compra e venda, competia a marcação da escritura/documento particular autenticado do contrato prometido.

eee. A Requerente durante todo este processo nunca procedeu à marcação de qualquer escritura.

fff. Nesta fase o contrato está efetivamente resolvido.

ggg. Até ao dia 25 de setembro de 2024 o Requerido sempre se mostrou disponível para o cumprimento integral do contrato, tendo estado presente em todas as sessões agendadas para a outorga da escritura.

hhh. O Requerido, no dia 26 de setembro de 2024, procedeu à colocação no site do Idealista, do imóvel prometido, à venda.

iii. O Requerido, logo no dia 26 de Setembro de 2024, procedeu à colocação de anúncio com vista a promover a venda do imóvel melhor identificado no contrato promessa de compra e venda, tendo, desta feita, reduzido o preço do mesmo para € 125.000,00 (cento e vinte mil euros), tudo como pode ser consultado no link https://www.idealista.pt/imovel/.../, cuja cópia está junta aos autos como Doc. 7

jjj. O Requerido está a vender novamente o imóvel que havia prometido vender ao Requerente.

lll. O Requerido está a pedir um preço pela venda do imóvel prometido bastante abaixo do contratado com o Requerente, e de mercado, ou seja, € 125.000,00 (cento e vinte mil euros), menos €16.000,00 (dezasseis mil euros), tudo como pode ser consultado no link https://www.idealista.pt/imovel/.../, cuja cópia está junta a estes autos como Doc. 7.

mmm. Revelando estar com bastante pressa em proceder à venda daquele imóvel, fazendo-o a preço bastante abaixo do de mercado.

nnn. O Requerido vive num bairro, Rua ..., ..., casa ..., ... Porto, cujas casas têm baixo valor de mercado.

ooo. O Requerente desconhece se a casa de habitação do Requerido, sita na Rua ..., ..., casa ..., ... Porto, é propriedade dele, da esposa, com quem é casado com separação de bens ou arrendada.

ppp. O Requerido é Engenheiro de Energias Renováveis de profissão, exercendo funções na sociedade comercial C..., Lda., NIPC ...59, na qual aufere um rendimento líquido de cerca de 2.000,00€ (dois mil euros).

qqq. O Requerido é comproprietário de um bem imóvel sito na Rua ... e Lugar ..., ..., concelho ..., encontrando-se nele erigida uma moradia cujo valor de mercado é de cerca de 350.000€ em face da sua localização e estado de construção.


*

2.2 Factos não provados

O Tribunal a quo considerou não indiciariamente provados os seguintes factos da decisão que decretou o arresto, por terem resultado infirmados pelos factos provados após o julgamento da oposição:

1. A Requerente e o Requerido, no dia 25 de Março de 2024, celebraram um aditamento ao contrato promessa de compra e venda, junto a estes autos sob doc. 2.

2. Que do Primeiro Aditamento ao Contrato promessa de compra e venda, as partes tenham acordado em prorrogar o prazo para a outorga da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda, melhor identificado na cláusula 4ª do contrato promessa outorgado, até ao dia 26/04/2024.cfr. Cláusula terceira

3. O Requerente, porque não conseguiu marcar a escritura até à data prevista no aditamento ao contrato-promessa de compra e venda, 26 de abril de 2024, acordou com o Requerido, proceder ao reforço do sinal, e entregou ao Requerido, no dia 02 de Maio de 2024, a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), titulada por cheque visado nº ...40.

4. Não tendo, contudo, sido agendada uma outra data para a realização da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda.

5. O Requerido, sem que para tal estivesse ainda legitimado, procedeu ao agendamento da outorga do documento particular autenticado do contrato prometido, para o dia 06 de junho de 2024, às 17:00 horas, no escritório do Solicitador GG, com a cédula profissional nº ...79, sito na Estrada ..., ..., freguesia ..., concelho do Porto.

6. O Requerente, embora se referindo à data constante do aditamento, portanto, 26 de Abril de 2024, por lapso referiu a data de 31 de maio de 2024, sendo, obviamente, aquela data a partir da qual se deverá contar o prazo de prorrogação de 6 (seis) meses.

7. A Requerente, tal como acordado na cláusula 4.1 do contrato-promessa de compra e venda, exerceu a faculdade ali prevista de prorrogar o prazo para a outorga da escritura referente ao contrato prometido, pelo prazo de mais 6 (seis meses), a contar a data do término da data constante no aditamento, ou seja, 26 de abril de 2024.

8. Atenta a prorrogação do prazo de 6 (seis) meses de que o Requerente fez uso, a obrigação de marcação da escritura/documento particular autenticado do contrato prometido, apenas ocorreria no dia 26 de Outubro de 2024.

9. O Requerido, representado pelo seu advogado, remeteu ao Requerente a carta simples, datada de 04 de setembro de 2024, mas apenas recepcionada no dia 16 de setembro de 2024, na qual, por sua iniciativa, procedia à marcação da escritura/documento particular autenticado do contrato prometido para o dia 25 de setembro de 2024, pelas 16:30 horas, nas instalações da “B..., Lda.”, sitas no Centro Empresarial ... – Estrada ..., ... ..., concelho do Porto.

10. De acordo com o aditamento ao contrato promessa de compra e venda, a marcação da escritura/documento particular autenticado do contrato prometido, poderia ser feita até ao dia 26 de abril de 2024.

11. Com a entrega de € 30.000,00 (trinta mil euros), no dia no dia 02 de Maio de 2024, a título de reforço de sinal e princípio de pagamento, não foi acordada uma outra data para a realização da escritura pública/documento particular autenticado de compra e venda.

12. O Requerido aceitou receber o reforço de sinal, no dia 02 de maio de 2024, depois daquela data, 26 de abril de 2024.

13. O Requerente usou da faculdade de prorrogar a data da celebração da escritura/documento particular autenticado do contrato prometido, por mais 6 (seis) meses, ou seja, até ao dia 26 de Outubro de 2024.

14. O Requerido procedeu ao agendamento da escritura/documento particular autenticado do contrato prometido, sem ainda estar habilitado para o fazer, para o dia 25 de setembro de 2024.

15. A Requerente, por a isso não estar obrigado, não compareceu no dia 25 de Setembro de 2024, pelas 16:30 horas, nas instalações da “B..., Lda.”, sitas no Centro Empresarial ... - Estrada ..., ... ..., concelho do Porto, para a celebração da escritura/documento particular autenticado do contrato prometido.

16. Tal como referido, a escritura foi agendada para o dia 25 de Setembro de 2024 e o Requerente apenas recebeu uma comunicação, escrita, no dia 16 de Setembro de 2024, ou seja, sem a antecedência mínima de 15 dias.

17. Tanto o Requerente como o Requerido mantinham interesse na prestação, mesmo após a data que este unilateralmente, marcou para a realização da escritura, 25 de Setembro de 2024.

18. O Requerido, estava a vender o imóvel prometido, o qual tinha começado a reconstruir para habitação própria, porque não tinha condições financeiras para o concluir.

19. O único bem conhecido ao Requerido que pode responder pelo montante de € 160.000,00 (cento e sessenta mil euros) é o imóvel prometido.

20. Ao Requerido não são conhecidos outros bens que possam responder pelo montante de € 160.000,00 (cento e sessenta mil euros).

21. O Requerente receia não conseguir obter o pagamento do seu crédito se o Requerido vender o imóvel identificado em 2.

22. O imóvel identificado em 2. é o único bem de valor mais significativo do património do Requerido, não lhe sendo conhecidos outros, constituindo a única possibilidade de o Requerente se ressarcir dos montantes de que se acha desembolsado.


*


3. Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar e decidir:

Das conclusões formuladas pelo recorrente as quais delimitam o objecto do recurso, tem-se que a questão a resolver no âmbito do presente recurso consiste em aferir da verificação dos pressupostos da providência cautelar de arresto.


*


4. Conhecendo do mérito do recurso:

Os procedimentos cautelares são um meio destinado a garantir um direito contra uma ameaça ou um risco que sobre ele paira, e que é tão iminente que o seu acautelamento não pode aguardar a decisão de um moroso processo declarativo.

Com eles visa-se alcançar uma decisão provisória do litígio, quando esta se mostre necessária para assegurar a utilidade da decisão, o efeito útil da acção definitiva a que se refere o artigo 2.º nº 2, do Código de Processo Civil.

Designadamente prevenindo as eventuais alterações da situação de facto que tornem ineficaz a sentença a proferir na acção principal, de sorte a que essa sentença (sendo favorável) não se torne numa decisão meramente platónica[1].

Assim, são requisitos de qualquer procedimento cautelar, antes do mais, a instrumentalidade, porquanto pressupõe uma acção definitiva instaurada ou a instaurar a curto prazo - art.º. 364.º do Código de Processo Civil -; o chamado periculum in mora, ou seja, que a demora da decisão a proferir na acção principal acarrete um prejuízo grave para o requerente; e a aparência da titularidade do direito invocado - o fumus boni juris - art. 368.º do Código de Processo Civil.

Para o decretamento da providência basta que, através de um exame e instrução perfunctórios da questão (summaria cognitio), se conclua pela séria probabilidade da existência do direito invocado e pelo justificado receio de um prejuízo irreparável ou de difícil reparação, caso não sejam adoptadas as medidas cautelares que se requerem.

Convém ainda ter presente que as providências cautelares, quanto à sua finalidade e efeitos, dividem-se em conservatórias e antecipatórias.

Nas antecipatórias o tribunal antecipa, ainda que numa composição provisória, a realização do direito que previsivelmente será reconhecido na acção principal.

Destarte elas excedem a natureza simplesmente cautelar ou de garantia, aproximando-se de medidas de índole executiva, pois que garantem, desde logo e independentemente do resultado que se obtiver na acção principal, um determinado efeito.

É o caso da restituição provisória da posse, dos alimentos provisórios, da entrega de coisa móvel, em certas circunstâncias e da suspensão das deliberações sociais[2].

Já nas conservatórias pretende-se, apenas, acautelar ou garantir o efeito útil da acção principal, assegurando, para tal estádio ou momento, a subsistência da situação existente quando se despoletou o litígio.

Assim, estas providências não produzem efeitos irreversíveis na esfera do requerido, nem proporcionam ao requerente uma tutela imediata do seu direito.

Pelo que o seu decretamento pode não estar tão dependente de uma rigorosa exigência da presença dos seus requisitos, como naqueloutras, antecipatórias, se deve perspectivar, dados os seus efeitos imediatos e acutilantemente afectantes da esfera jurídica do requerido.

É o caso do arresto, do arrolamento e, regra geral, do embargo de obra nova.

Entre os meios vocacionados à conservação da garantia patrimonial do credor, conta-se o arresto que nos termos do nº 2 do artigo 391º do Código de Processo Civil consiste numa apreensão judicial de bens com valor suficiente para assegurar o cumprimento da obrigação e pode ser requerido pelo credor que tenha justo receio da perda dessa garantia (artigo 619º, nº 1 do Código Civil e 391º, nº 1 do Código de Processo Civil).

Como bem se diz na sentença em crise são requisitos do arresto: por um lado, a provável existência do crédito invocado pela requerente, e, por outro, o justo receio de perda da garantia patrimonial deste crédito - artigo 391º do Código de Processo Civil.

O arresto é a garantia especial da garantia geral (património do devedor).

Assim sendo: “só em relação a direitos de crédito é possível deduzir esta providencia, já que ela visa precisamente a garantia do seu cumprimento (…) no perigo de insatisfação de direitos de diversa natureza (v.g. direitos reais) ou que, apesar de assentarem em direitos de crédito não comunguem no especifico receio de perda da garantia patrimonial, deverão encontrar guarida noutros instrumentos, designadamente (…) alimentos provisórios ou arbitramento de reparação provisória[3]”.

Sendo, porém, certo que é indiferente a origem do crédito, podendo este resultar quer do incumprimento de uma relação contratual, quer de indemnização de corrente de facto ilícito, quer até de outras fontes como seja o enriquecimento sem causa.

E, bem assim, sendo indiferente que o crédito seja, ou não, exigível (isto é, haja, ou não, incumprimento ou mora) podendo a providência ser decretada, desde que, em qualquer caso, se prove o periculum in mora[4].

Já no que tange ao justo receio da perda da garantia patrimonial o mesmo pode derivar dos mais diversos factores ou causas tais como: o acentuado decréscimo da solvabilidade do devedor, a dissipação ou extravio de bens, a desproporção entre o seu activo e passivo, a natureza ocultável do património, a ocorrência de procedimentos anómalos reveladores do propósito de não cumprir, etc.[5].

Constituem, pois, requisitos do arresto, para além da existência (ou probabilidade de existência ou aparência) do direito de crédito da titularidade do requerente - fummus boni juris -, o fundado receio de perda de garantia patrimonial do mesmo “como é o caso de ele temer uma próxima insolvência do devedor, ou uma sonegação ou ocultação de bens que impossibilite ou dificulte a realização coactiva do crédito[6]” ou que “com a expectativa da alienação de determinados bens ou a sua transferência para o estrangeiro, o devedor torne consideravelmente difícil a realização coactiva do crédito, ficando no seu património só com bens que, pela sua própria natureza, dificilmente encontrem comprador ou cujo valor seja acentuadamente inferior ao do crédito[7]”.

Como refere Antunes Varela[8] “para que se prove o justo receio (como quem diz o receio justificado e não apenas o receio) de perda da garantia patrimonial, não basta a alegação de meras convicções, desconfianças, suspeições de carácter subjectivo. É preciso que haja razões objectivas, convincentes, capazes de explicar a pretensão drástica do requerente, que vai subtrair os bens ao poder de livre disposição do seu titular”.

O receio justificativo do arresto deve fundar-se, por conseguinte, em factos objectivos e concretos e ser avaliado de um ponto de vista objectivo e em relação ao valor, quer do crédito, quer dos bens exequíveis (património) do devedor, quer do comportamento deste relativamente ao respeito pelos compromissos assumidos, tudo segundo critérios racionais de um credor medianamente cauteloso e prudente, por forma a criar neste o temor de ver insatisfeito o seu crédito, se o tribunal não intervier imediatamente e com urgência, prevenindo não só a morosidade inerente à máquina judiciária e o possível comportamento lesivo do devedor[9].

O “justificado receio” identifica-se com o chamado “periculum in mora” inerente a todo o procedimento cautelar - evitar a lesão grave e dificilmente reparável (artigo 381º, nº 1 do Código de Processo Civil) proveniente da demora na tutela da situação jurídica. O direito só será justificado, fundado ou justo quando cria o perigo da insatisfação do direito de crédito, colocando o credor perante a ameaça de lesão daquilo que lho garante - o património do devedor.

Não se trata, pois, de qualquer receio, escreve A. dos Reis[10] - é necessário que este receio seja justo/justificado, ou seja, traduzido em factos positivos e concretos que apreciados no seu verdadeiro valor, façam admitir como razoável a ameaça de insolvência próxima.

Ou seja, para efeitos de decretamento do arresto, o justo receio há-de aferir-se por critérios objectivos, não bastando meras conjecturas ou a mera convicção subjectiva do credor.

Com o decretamento do arresto pretende-se, pois, evitar que o direito de crédito fique insatisfeito por não se encontrarem no património do devedor bens suficientes para o respectivo pagamento.

À luz da factualidade indiciariamente assente, que não se mostra impugnada com observância dos pressupostos legais previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil, não colocamos em causa a probabilidade de existência ou aparência do crédito da requerente no montante de € 160.000,00 (sinal em dobro) emergente do incumprimento do contrato promessa.

Porém, não acompanhamos a decisão recorrida quando sustenta a existência de prova indiciária de factos concretos que consubstanciem o receio justificado de perda de garantia patrimonial.

Com efeito, compulsada a factualidade indiciariamente assente, verifica-se que nenhum facto se mostra provado donde se possa concluir que o requerente está a desfazer-se de todo o seu património seja bens materiais ou dinheiro, por forma a furtar-se ou a pôr em risco a satisfação do crédito da requerente concluindo-se pelo justo receio de perda de garantia patrimonial.

Ora, conforme atrás referimos, o requisito em causa reveste duas vertentes: uma subjectiva, que é o receio propriamente dito que se sente de perder a garantia patrimonial; e outra, objectiva, traduzida em factos externos que conduzem a que qualquer pessoa mediana pudesse razoavelmente sentir tal receio. Este conceito enquadra inúmeros casos, como o de receio de fuga do devedor, de sonegação ou ocultação de bens, de situação deficitária.

Dos factos indiciariamente provados resulta que:

“nnn. O Requerido vive num bairro, Rua ..., ..., casa ..., ... Porto, cujas casas têm baixo valor de mercado.

ooo. O Requerente desconhece se a casa de habitação do Requerido, sita na Rua ..., ..., casa ..., ... Porto, é propriedade dele, da esposa, com quem é casado com separação de bens ou arrendada.

ppp. O Requerido é Engenheiro de Energias Renováveis de profissão, exercendo funções na sociedade comercial C..., Lda., NIPC ...59, na qual aufere um rendimento líquido de cerca de 2.000,00€ (dois mil euros).

qqq. O Requerido é comproprietário de um bem imóvel sito na Rua ... e Lugar ..., ..., concelho ..., encontrando-se nele erigida uma moradia cujo valor de mercado é de cerca de 350.000€ em face da sua localização e estado de construção.”.

Ou seja, resulta dos autos que o Apelante é o único proprietário do bem imóvel objecto dos autos, imóvel esse adquirido com capitais próprios, sem qualquer tipo de hipoteca ou quaisquer ónus e/ou encargos.

O Recorrente é, ainda, proprietário de mais um bem imóvel, como seja, o imóvel identificado no facto qqq. que, tal como consta nos factos indiciariamente provados, tem, pelo menos, um valor de mercado de € 350.000,00, no estado actual, sendo certo que o Apelante encontra-se a finalizar as obras no referido imóvel também sem qualquer tipo de financiamento, tal como consta na certidão permanente do bem imóvel junta aos autos, as quais, à luz do actual contexto do mercado imobiliário, irão potenciar o seu valor.

Além disso, o Apelante tem um veículo automóvel de sua propriedade e não resulta dos autos que detém qualquer tipo de empréstimos, financiamentos ou outro tipos de obrigações de natureza pecuniária perante qualquer credor.

Ademais, o Recorrente é engenheiro de energias renováveis de profissão, no qual aufere um rendimento líquido mensal de €2.000,00.

Destarte, o Requerido encontra-se pessoal e profissionalmente bem inserido, sem qualquer tipo de ónus nos bens imóveis de que é proprietário, encontrando-se, neste momento, a construir uma habitação, num segundo bem imóvel de que é proprietário, cujo valor de mercado, mesmo sem estar concluída ascende a cerca de € 350.000,00, mas cujo valor de mercado assim que estiver concluída e dada a sua localização ascenderá a um valor superior, à luz do actual contexto do mercado imobiliário.

Por sua vez, após o julgamento da oposição, não resultou indiciariamente provado:

“18. O Requerido, estava a vender o imóvel prometido, o qual tinha começado a reconstruir para habitação própria, porque não tinha condições financeiras para o concluir.

19. O único bem conhecido do Requerido que pode responder pelo montante de € 160.000,00 (cento e sessenta mil euros) é o imóvel prometido.

21. O Requerente receia não conseguir obter o pagamento do seu crédito se o Requerido vender o imóvel identificado em 2.

22. O imóvel identificado em 2. é o único bem de valor mais significativo do património do Requerido, não lhe sendo conhecidos outros, constituindo a única possibilidade de o Requerente se ressarcir dos montantes de que se acha desembolsado.”

Conforme atrás referimos, relativamente ao justo receio de perda da garantia patrimonial exige-se um juízo, senão de certeza e segurança absoluta, ao menos de probabilidade muito forte, não bastando qualquer receio, que pode corresponder a um estado de espírito que derivou de uma apreciação ligeira da realidade, num exame precipitado das circunstâncias.

Além de que, o critério de avaliação deste requisito não pode assentar em simples conjecturas, devendo, ao invés, basear-se em factos ou em circunstâncias que, de acordo com as regras de experiência, aconselhem uma decisão cautelar imediata, como factor potenciador da eficácia da acção pendente ou a instaurar posteriormente.

Assim, só existe justificado receio da perda da garantia patrimonial do crédito, quando as circunstâncias se apresentam de modo a convencer que está iminente a lesão do direito, a perspectivar, justificada e plausivelmente, o perigo de ser vir a tornar inviável, ou altamente precária, a realização da garantia patrimonial do crédito da Recorrida.

Mas, pese embora a maior simplicidade que se impõe pelas regras próprias e pelos objectivos específicos de qualquer procedimento cautelar, o juízo acerca do justificado receio de perda da garantia patrimonial não deve ser fruto de arbitrariedade, antes deve ser tomado a partir de factos.

Por outro lado, e no concernente ao justo receio da perda da garantia patrimonial, certo é que este se não revela apenas por meras convicções pessoais e subjetivas e /ou alicerçadas em teóricas ou genéricas considerações.

Mostrando-se suficiente a alegação e prova de um núcleo factual que demonstre ou indicie um perigoso decréscimo da solvabilidade do devedor, a dissipação ou extravio de bens, a desproporção entre o seu ativo e passivo, a natureza ocultável do património, ou a ocorrência de qualquer outra situação que aponte no sentido de que o devedor não pode solver a dívida.

Afigura-se-nos, por isso, que o Tribunal a quo não ajuizou adequadamente ao considerar a final que há justo receio de perda de garantia patrimonial para fazer face ao hipotético crédito.

De resto, no requerimento inicial da presente providência cautelar nunca a Apelada sequer alegou da possibilidade de lançar mão do mecanismo da execução específica.

Além disso, consta da motivação da convicção do Tribunal a quo que “O Requerido AA referiu nas suas declarações de parte credíveis e convincentes, (..) que o Requerido também tem um carro DS 5 híbrido com 12 anos e uma mota 850 cc Yamaha.XS 900, que tem cerca de 6 anos; que o Requerido trabalha há 3 anos numa empresa (onde é efectivo), auferindo mensalmente €2.000 líquidos; que o Requerido está a construir uma moradia em ..., em Matosinhos, com 4 pisos, com 325 m2 de área, que tem um valor de mercado de €350.000, sem recurso a qualquer crédito, estando na fase de acabamentos; que depois de pronta essa casa terá o valor de €500.000 e que o Requerido também tem 3 contas bancários com um valor entre €90.000 a €100.000; que o Requerido e a sua esposa têm ambos 35 anos de idade; que o Requerido consegue obter junto dos bancos €160.000 de crédito para adquirir uma habitação.”

“A testemunha CC referiu, também num depoimento claro e consistente, assim considerado pelo Tribunal a quo, que é enfermeira, auferindo o vencimento de €2.200 líquidos e que tem uma empresa de construção com o seu pai, tendo 16 fracções para vender, tendo já feito a escritura de 8 fracções; que a testemunha é sócia, tendo uma quota de 33% da empresa do seu pai, que é o gerente; que os pais da testemunha estão no ramo imobiliário; que estão a construir uma moradia em ..., encontrando-se na fase de acabamentos; que, segundo um agente imobiliário, o valor da casa, depois de estar pronta, é de €500.000; que faltam as especialidades; que na última avaliação efectuada essa casa de ... valia €300.000; que o irmão da testemunha também está no ramo imobiliário; que nunca fizeram nenhum empréstimo; que a testemunha e o Requerido conseguem um financiamento de €300.000 ou €400.000; que queriam vender o imóvel para custear a casa que estão a construir sem recorrerem a bancos; que a testemunha e o seu marido têm contas bancárias conjuntas com um saldo de €120.000 e que o A. tem uma conta bancária dele cujo saldo ronda os €80.000 ou €90.000.”

“A testemunha DD, num depoimento claro e consistente, também, assim considerado pelo Tribunal a quo, referiu ter sido quem fez o projecto de arquitectura da casa de ..., estando agora a entrar na fase de acabamentos; que o valor da casa depois de pronta é de €500.000.”

Assim, à luz da factualidade indiciariamente provada e tendo o Tribunal a quo considerado claras e consistentes, portanto credíveis, os depoimentos e declarações acima transcritas, tendo resultado das mesmas que o Recorrente é possuidor de todas e quaisquer condições para fazer face a qualquer direito de crédito que a Recorrida pudesse eventualmente deter, afigura-se-nos que não se pode concluir a final que existe periculum in mora.

Nestes termos, não se verifica justificado o receio invocado e, consequentemente, preenchido o periculum in mora que serve de fundamento à generalidade dos procedimentos cautelares afigurando-se-nos procedente a oposição.

Afigura-se-nos, assim, que não se mostra provado, ainda que indiciariamente, a existência de perigo de o Apelante solver o crédito indiciariamente provado.

Impõe-se, por isso, o provimento da apelação.

Procede, assim, o recurso de apelação interposto, determinando-se o levantamento do arresto decretado.


*


Sumariando, em jeito de síntese conclusiva:

……………………………………………..

……………………………………………..

……………………………………………..


*


5. Decisão

Nos termos supra expostos, acorda-se neste Tribunal da Relação do Porto em julgar procedente o recurso de apelação, revogando a decisão recorrida, determinando-se o levantamento do arresto decretado.


*

Custas a cargo da parte vencida a final.


*

Notifique.

Porto, 10 de Julho de 2025

Os Juízes Desembargadores

Relator: Paulo Dias da Silva

1.º Adjunto: António Carneiro da Silva

2.º Adjunto: Isabel Peixoto Pereira

(a presente peça processual foi produzida com o uso de meios informáticos e tem assinatura electrónica e por opção exclusiva do relator, o presente texto não obedece às regras do novo acordo ortográfico, salvo quanto às transcrições/citações, que mantêm a ortografia de origem)

________________________

[1] Cf. Antunes Varela, Manual de Processo Civil, pág. 23 e Acórdão da Relação de Coimbra de 8.10.2005, proc. n.º 2692/05, in www.dgsi.pt.
[2] Cf. Abrantes Geraldes, Temas da Reforma, 3.º, 2ª edição, págs. 107 e ss.  
[3] Cf. Abrantes Geraldes, ob. cit. 4º, pág.179.
[4] Cf. Abrantes Geraldes, ob. cit., págs. 180 e 184.
[5] Cf. Abílio Neto, in Breves Notas ao Código de Processo Civil, 2005, pág. 123.
[6] Cf. Almeida Costa, Direito das Obrigações, 5ª edição, pág. 734.
[7] Cf. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 3ª edição, pág. 605.
[8] Cf. Das Obrigações em Geral, Vol. II, 4 edição, pág. 453 e nota 1.
[9] Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 28/5/97 e de 30/1/97, acessíveis em http://www.dgsi.pt.
[10] Cf. Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, p. 19.