INVENTÁRIO
PARTILHA ADICIONAL
RECLAMAÇÃO CONTRA A RELAÇÃO DE BENS
Sumário

1 - O Tribunal da Relação pode, dentro dos seus poderes oficiosos, anular a decisão proferida na primeira instância quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação desta (artigo 662.º, n.º 2, alínea c), do CPC). Este poder-dever do tribunal de segunda instância incide não apenas sobre o elenco dos factos julgados provados pelo tribunal a quo, mas igualmente sobre a existência de factos alegados pelas partes que integrem os elementos constitutivos da causa de pedir (ou das exceções invocadas) e que o tribunal de primeira instância haja desconsiderado na sentença, bem como sobre os factos que, integrando-se no disposto no artigo 5.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, devessem ter sido considerados na sentença e não o tenham sido.
2 – Embora o artigo 665.º do CPC consagre a regra da substituição do tribunal recorrido, visando, em primeira linha, conduzir a uma resolução célere do litígio no pressuposto de que o Tribunal da Relação dispõe dos elementos necessários para tal, este valor da celeridade deve ceder perante a garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto, o que implica a anulação decisão recorrida e a remessa dos autos ao tribunal de primeira instância para que este proceda a um novo julgamento de forma a suprir os vícios de julgamento de facto da primeira sentença.
(Sumário da Relatora)

Texto Integral

Apelação n.º 1237/20.1T8TMR.E2
(2.ª Secção)

Relatora: Cristina Dá Mesquita
1.º Adjunto: Canelas Brás
2.ª Adjunta: Eduarda Branquinho


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora:

I. RELATÓRIO

I.1.

(…) e mulher, (…), interessados no inventário para partilha adicional da herança aberta por óbito de (…), interpuseram recurso do despacho proferido em 1 de maio de 2024, pelo Juízo Local Cível de Tomar, do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, o qual julgou totalmente improcedente o incidente de reclamação por eles deduzido contra a relação de bens apresentada pela cabeça-de-casal(…).

(…), filha da inventariada (…) e de (…), instaurou os presentes autos para partilha adicional da herança aberta por óbito de sua mãe, (…), alegando para tal desiderato, e em síntese, que a sua mãe faleceu no dia 23 de novembro de 2018, no estado de viúva, tendo deixado como seus herdeiros os dois filhos – ela/requerente e seu irmão (…); que, no dia 21 de dezembro de 2018, no Cartório Notarial de Tomar, foi outorgada uma escritura pública de habilitação de herdeiros e partilha por óbito dos seus pais, a referida (…) e (…), que faleceu no dia 26 de maio de 2017; através de tal escritura procedeu-se à partilha de todos os bens imóveis pertencentes à herança; porém, nessa escritura de partilhas foi omitida a existência de saldos de contas bancárias; apesar de constar da referida escritura de partilha que a requerente era a cabeça de casal foi sempre o seu irmão (…) quem, após a morte do pai, exerceu efetivamente as funções de cabeça-de-casal e ficou a zelar por todos os bens deixados em herança uma vez que a mãe se encontrava muito doente e debilitada e ela residia em França. À data da morte de (…) existia uma conta bancária n.º (…) do Banco (…), titulada por (…), a qual apresentava, em 31 de maio de 2017, um saldo de € 55.734,67; era o seu irmão (…) quem movimentava essa conta, possuindo para o efeito um cartão multibanco e códigos de acesso à mesma. Após a escritura de partilha acima mencionada, a requerente solicitou ao irmão esclarecimentos sobre o saldo das contas bancárias existentes à data do óbito da mãe e aquele disse-lhe que o saldo era de € 15.000,00, tendo-lhe entregue € 7.500,00; no início do ano de 2019, o Banco enviou-lhe todos os extratos bancários da conta bancária supra mencionada e, tendo ela confrontado o irmão com esses extratos, o mesmo afirmou que “não tinha mexido no dinheiro e que ia ao Banco saber para onde aquele tinha desaparecido”. O seu irmão sempre lhe ocultou o saldo bancário da conta da mãe de ambos, com o intuito de sonegar bens à herança e apropriar-se indevidamente do valor de cerca de € 38.675,77.

Notificada para o efeito, a requerente juntou aos autos a escritura de partilha acima mencionada, extratos da conta n.º (…) reportados ao período compreendido entre o mês de maio de 2017 e 30 de outubro de 2018 e a relação de bens com uma verba única descrita da seguinte forma: «a quantia de trinta e oito mil, seiscentos e setenta e cinco euros e setenta e sete cêntimos (€ 38.675,77) depositada na conta n.º (…) NIB: (…) do (…) Banco, titular (…)».

Citados, os interessados (…) e mulher (…) deduziram oposição ao inventário, alegando, por um lado, a «manifesta inviabilidade da ação» porquanto o óbito da inventariada ocorreu em 23 de novembro de 2018 e a escritura de habilitação e partilha junta pela requerente foi outorgada em 20 de dezembro de 2017, pelo que se esta não for retificada a pretensão da requerente não pode proceder, e impugnaram toda a factualidade alegada pela requerente, com exceção daquela que consta dos artigos 1º, 2º e 6º do requerimento inicial, bem como «os documentos que porventura lhe sirvam de suporte». Sustentaram ainda aqueles interessados que os valores transferidos e as transferências efetuadas o foram por vontade da autora da herança e até com a concordância da requerente por ter sido o irmão que tratou da mãe e que a requerente ficou com o bem mais valioso da partilha, a saber, a casa de habitação sita na Rua das (…), 191, em (…), Ferreira do Zêzere, alegando ainda que após a outorga da partilha ele e a irmã foram ao Banco e dividiram entre si o saldo ainda existente, pelo que nada há a partilhar.

Notificada para responder, nos termos previstos no artigo 1105.º do CPC, a cabeça de casal alegou que a escritura pública de partilha foi celebrada em 20 de dezembro de 2018 e que a referência a 20 de dezembro de 2017 se deve a um notório lapso de escrita da sra. notária, não carecendo a referida escritura de qualquer retificação para ser válida; reafirmou que após a morte do pai, foi o interessado (…), seu irmão, quem ficou a zelar por todos os bens deixados em herança, ficando inclusive com todo o negócio do pai, e que as transferências e levantamentos efetuados pelos requeridos que não foram para pagar o Lar, medicamentos, água e luz da casa da mãe não foram consentidos pela requerente que só deles teve conhecimento no início de 2019, nem pela sua mãe, que não os podia ter autorizado; negou ainda que tivesse ido ao Banco com o interessado depois da escritura de partilhas, reafirmando os requeridos sonegaram bens à herança, invocando a aplicação do artigo 2096.º do Código Civil «com todas as consequências legais daí advindas».

Notificada para esclarecer quais os bens para além dos mencionados na escritura que pretende ver partilhados, a cabeça-de-casal informou que pretende proceder à partilha adicional da quantia de € 38.675,77 acima indicada, após o que os requeridos apresentaram novo requerimento impugnando a existência da referida quantia.

Foi produzida a prova oral arrolada pela cabeça de casal e pelos requeridos, após o que foi proferida a decisão da qual foi interposto recurso para o Tribunal da Relação de Évora.

Mediante acórdão prolatado em 2 de março de 2023, transitado em julgado, o Tribunal da Relação de Évora anulou a decisão proferida pelo tribunal de 1ª instância e ordenou que este proferisse nova decisão, com enunciação dos factos provados e dos factos não provados, com a concretização dos meios probatórios produzidos perante si relevantes para a decisão.

Descidos os autos à primeira instância, foi proferida de imediato nova decisão, da qual foi interposto o presente recurso.

I.2

Os recorrentes formulam alegações que culminam com as seguintes conclusões:

«A) Logo, na oposição que apresentaram, à exceção da dos artigos 1º, 2º e 6º, os ora apelantes impugnaram toda a matéria constante do requerimento da requerente, como consta do artigo 5º da oposição referida e consubstanciada no então documento 1.

B) Tendo o pedido de partilha adicional sido formulado pela ora apelada, estritamente, com base nos extratos bancários que ela própria juntou (docs. 1 a 19), verifica-se que em lado algum desses extratos surge documentada ou quantificável tal quantia (€ 38.675,77);

C) Apenas, incompreensível e infundadamente, o tribunal a quo seguiu a insegura e incerta versão da ora apelada (artigo 31º) quando esta arbitrariamente se limitou a referir “valor que importa em cerca de € 38.675,77);

D) Isto, numa alusão a uma carta (doc. 10) que a ora apelada havia dirigido ao ora apelante e que este, reportando-se, estritamente e como é óbvio, ao total das transferências que haviam sido feitas para a sua conta, no valor global de € 25.000,00 (doc. 11 do requerimento daquela), por ordem da ora inventariada (como compensação por dela e do marido ter tomado conta), respondeu (doc. 1 da oposição apresentada), inexistindo, como é notório, qualquer outra transferência nesse sentido ou, o mínimo indício de que o apelante tenha tomado posse de qualquer outra quantia;

E) Daí não possa colher o argumento constante do § 5.º da Motivação de facto de que o reclamante não contestou a existência, à data do óbito da inventariada, a quantia de € 38.675,77, depositada na conta daquela, quando aquele só se reportava, como é evidente, à quantia dos € 25.000,00 transferidos, até porque a primeira nem sequer existia e não constava (nem pouco mais ou menos) dos extratos bancários invocados, nem minimamente estava documentada;

F) Ou seja, dos extratos bancários referidos não consta qualquer quantia (nem de perto nem de longe) que se aproxime dos reclamados € 38.675,77, sendo que, ao tempo, o saldo (capital + juros) verdadeiramente existente na conta da inventariada (€ 15.000,00) foi efetivamente dividido na escritura de habilitação e partilha (artigo 20º do requerimento da apelada);

G) Aliás, se na escritura foi omitida a existência de saldos de contas bancárias (que não foi) tê-lo-iam sido, precisamente, pela cabeça-de-casal, a ora apelada;

H) E, se à morte do (…) existia uma conta bancária titulada pela inventariada, com o saldo de € 55.734,67, tal é totalmente irrelevante para o caso aqui em apreço, porquanto aquele faleceu em 26 de maio de 2017 e a referida inventariada sobreviveu-lhe aproximadamente 18 meses, até 23 de novembro de 2018, dele retirando, naturalmente, durante esse período, os valores necessários à sua subsistência;

I) Donde, para além dos transferidos € 25.000,00 tidos em conta na partilha, tenham procedido à divisão do saldo então existente (Capital + juros) no montante de € 15.000,00;

J) De resto, quer se retira à quantia referida (€ 55.734,67) o saldo de € 15.000,00 como a partilha destes (€ 7.500,00), não se compreende como é que o tribunal a quo alcançou os “eleitos” € 38.675,00, senão, por ter seguido, sem mais, a tese da ora apelada;

L) Tudo isto, por o Tribunal a quo, notória e incompreensivelmente, não ter de facto atendido e valorado a única prova consistente e inequívoca constante dos autos, curiosamente, tratando-se, até, de prova trazida a Juízo e junto pela própria ora apelada (cfr. citados Docs. 1 a 19 do requerimento);

M) Devendo, consequentemente, para tal efeito, com suporte nos motivos aduzidos, serem elevados aos factos provados os factos constantes dos capítulos II, III e IV dos factos não provados e os constantes dos pontos 7 e 10 dos factos provados serem levados aos factos não provados;

N) Porquanto, a assim não ter procedido, o Tribunal violou, designadamente, os artigos 342.º, 376.º, n.ºs 1 e 2 e 2079.º do Código Civil e 615.º, n.º 1, alíneas c) e d), do Código de Processo Civil.

Termos em que, face a quanto invocado e ao quanto demonstrado, com as legais consequências, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença proferida, or a recorrida (tando mais por até ter cabido à ora apelada o desempenho das funções de cabeça de casal), substituindo-se por outra que julgue integralmente realizada a partilha em apreço;

Alternativamente, caso não seja este o douto entendimento do venerando Tribunal ad quem 2, atenta a particular especificidade e o familiar sentimento dos interesses em causa, ordenar-se a anulação da partilha extrajudicial realizada, no sentido dos bens objeto da mesma serem levados e integrados na partilha que originou a douta decisão recorrida;

Subsidiariamente, no limite, por nenhuma outra quantia para o efeito se mostrar transferida para a conta do apelante, nem de que este tenha tomado posse, como evidenciam os documentos invocados (extratos bancários), juntos pela própria apelada, determinar-se que a presente partilha adicional recaia apenas sobre os € 25.000,00 transferidos a título de compensação para a conta do ora apelante, como provado, mas nunca, naturalmente, sobre os € 38.675,77, arbitrária e infundadamente reclamados, fazendo-se assim (mínima) Justiça».

I.3

A apelada apresentou resposta ao recurso, pugnando pela respetiva improcedência.

O tribunal de primeira instância, mediante despacho proferido em 12.12.2024, pronunciou-se sobre a nulidade invocada, julgando não verificada a nulidade arguida.

O recurso foi admitido pelo tribunal de primeira instância.

Corridos os vistos em conformidade com o disposto no artigo 657.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1.

As conclusões do recurso fixam o respetivo objeto de acordo com o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, nº 1, ambos do CPC, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigos 608.º, n.º 2 e 663.º, n.º 2, ambos do CPC), não havendo lugar à apreciação de questões cuja análise se torne irrelevante por força do tratamento empreendido no acórdão (artigos 608.º, n.º 2, e 663.º, n.º 2, ambos do CPC).

II.2.

As questões a apreciar são as seguintes:

1 – Avaliar se o despacho recorrido padece das nulidades invocadas.

2 – Avaliar se existe erro de julgamento de facto.

3 – Reapreciação do mérito da decisão.

II.3.

FACTOS

II.3.1.

O tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos:

1. A inventariada (…) faleceu, sem deixar testamento, no estado de viúva, em 23 de novembro de 2018, sendo o seu último domicílio em (…), concelho de Ferreira do Zêzere.

2. Foi casada com (…), que faleceu em 26 de maio de 2017.

3. Deixou dois filhos, ambos maiores: a) …, ora cabeça de casal, e …, ora reclamante.

4. No dia 21 de dezembro de 2018, no Cartório Notarial de Tomar, foi celebrada Escritura Pública de Habilitação de Herdeiros e Partilha por óbito de seus pais (…) e (…).

5. Tendo sido partilhados bens imóveis pertencentes à herança.

6. A referência, constante da dita escritura, de que a mesma foi celebrada em 20 de dezembro de 2017, tratou-se de lapso de escrita.

7. Nesta escritura foi omitida a existência de saldos de contas bancárias.

8. À data da morte de (…), existia uma conta bancária, a saber: - conta n.º (…), NIB: (…) do (…) Banco, titular (…), que em 31 de maio de 2017 apresentava um saldo de € 55.734,67 (cinquenta e cinco mil e setecentos e trinta e quatro euros e sessenta e sete cêntimos).

9. Do saldo dessa conta bancária, o reclamante entregou à cabeça de casal € 7.500,00 (sete mil e quinhentos euros).

10. Pertence à herança a quantia de € 38.675,77 (trinta e oito mil e seiscentos e setenta e cinco euros e setenta e sete cêntimos) em dinheiro, depositada na conta n.º (…), NIB: (…) do (…) Banco, titular (…).

II.3.2.

O tribunal de 1ª instância julgou não provado que:

I. A escritura de habilitação e partilha foi celebrada em 20 de dezembro de 2017.

II. Os valores transferidos da conta bancária n.º (…), NIB: (…), do (…) Banco foram tidos em conta na partilha extra-judicial em “acerto” ou “encontro” de contas.

III. No lugar das tornas que teria de dar ao reclamante, a cabeça de casal, para além do prédio rústico com o artigo (…), secção A, ficou com o prédio misto com casa de habitação, sito na Rua das (…), 191, (…), Ferreira do Zêzere.

IV. A cabeça de casal estava inteirada e consciente das transferências efetuadas por vontade da inventariada e deu a sua.

II.4.

Apreciação do objeto do recurso

II.4.1.

Nulidade da decisão

As causas de nulidade da sentença encontram-se previstas no n.º 1 do invocado artigo 615.º, nos termos do qual é nula a sentença quando: a) não contenha a assinatura do juiz; b) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

Neste segmento do seu recurso os apelantes arguem o vício previsto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas c) e d), do Código de Processo Civil.

No que respeita ao vício previsto na alínea c) do artigo 615.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, ele verifica-se quando: i. os fundamentos estejam em oposição com a decisão; ii. ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.

A situação prevista na primeira parte da alínea c) – oposição entre os fundamentos e a decisão – ocorre quando os fundamentos, seguindo um raciocínio lógico, devam conduzir a resultado decisório diverso. Conforme explicam António Santos Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta / Luís Filipe Pires de Sousa[1], a nulidade em causa ocorre «quando existe incompatibilidade entre os fundamentos de direito e a decisão, ou seja, quando a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado. Situação que, sendo violadora do chamado silogismo judiciário, em que as premissas devem condizer com a conclusão, também não se confunde com um eventual erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide contrariamente aos factos apurados ou contra norma jurídica que lhe impõe uma solução jurídica diferente». Note-se que eventuais vícios da decisão sobre a matéria de facto não configuram, sem mais, a invocada causa de nulidade, desde logo porque, conforme explicam José Lebre de Freitas/Isabel Alexandre[2], «a invocação de vários dos vícios que a esta dizem respeito é feita nos termos do artigo 640.º e porque a consequência desses vícios não é necessariamente a anulação do ato (cfr. os n.ºs 2 e 3 do artigo 662.º)». Ainda a propósito deste vício de sentença escreveu-se no Ac. RL de 04.10.2011, processo n.º 107/2001.L1-7, consultável em www.gsi.pt., o seguinte: «(…) a oposição entre os fundamentos e a decisão só releva como vício formal, para os efeitos da nulidade cominada na alínea c) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, quando se traduzir numa contradição nos seus próprios termos, num dizer e desdizer desprovido de qualquer nexo lógico positivo ou negativo, que não permita sequer ajuizar sobre o seu mérito da causa. Se a relação entre a fundamentação e a decisão for apenas de mera inconcludência, estar-se-á perante uma questão de mérito, reconduzida a erro de julgamento e, por isso, determinativa da improcedência da ação».

Quanto ao vício previsto no segundo segmento do preceito legal – ininteligibilidade da decisão – ele decorre de uma “ambiguidade” e/ou “obscuridade” as quais, por sua vez, devem ser afirmadas quando se mostra impossível compreender o sentido e/ou o alcance do segmento decisório da sentença, por este ser suscetível de mais do que uma interpretação (ambiguidade) e/ou não se apresentar claramente expresso (obscuridade). Nas palavras de Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[3], «[…] a obscuridade ou ambiguidade, limitada à parte decisória, só releva quando gera ininteligibilidade, isto é, quando um declaratário normal, nos termos do artigo 236.º, n.º 1 e do artigo 238.º, n.º 1, ambos do Código Civil, não possa retirar da decisão um sentido unívoco, mesmo depois de recorrer à fundamentação para a interpretar».
No caso sub judice, os apelantes não curaram de concretizar como os vícios acima referidos se revelaram na decisão que impugnam. De qualquer modo sempre se dirá que a decisão recorrida não padece de qualquer dos vícios previsto no normativo legal que acabámos de analisar pois que o segmento decisório do despacho recorrido – improcedência da reclamação da relação de bens - constitui a decorrência lógica dos enunciados de facto e do respetivo enquadramento jurídico, sendo inequívoco o sentido daquele segmento decisório.

*
No que respeita ao vício previsto na alínea d), do artigo 615.º, n.º 1, do CPC, ele ocorre quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Concatenando este preceito legal com o disposto no artigo 608.º/2, do mesmo diploma normativo, de acordo com o qual o juiz deve conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, ou seja, de todos os pedidos deduzidos, de todas as causas de pedir e exceções invocadas e, ainda, de todas as exceções de conhecimento oficioso, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, concluir-se-á que para efeitos de verificação do vício omissão de pronúncia, “questões” a decidir são os pedidos deduzidos pelo autor / reconvinte, as respetivas causas de pedir e as exceções invocadas ou de conhecimento oficioso.
Por força do princípio do dispositivo, e ressalvadas as questões que sejam de conhecimento oficioso, o tribunal apenas deve conhecer das questões que lhe sejam colocadas pelas partes, não podendo dirimir litígios sem que tal lhe seja pedido por uma das partes (artigos 3.º/1 e 608.º/2, ambos do CPC). Os factos que integram a causa de pedir são apenas aqueles que individualizam a situação objetiva alegada pelo autor [e os factos que integram a exceção (perentória) são os factos impeditivos, modificativos ou extintivos que a fundamentam)]. Em síntese, o julgador está obrigado a apreciar a ação com base na causa de pedir e no fundamento das exceções invocadas pelas partes, sob pena de nulidade da sua decisão, por excesso de pronúncia.
No caso sub judice para além de os apelantes não terem concretizado as manifestações dos vícios ora em apreço na decisão recorrida esta não padece efetivamente dos vícios acima referidos pois que o julgador a quo prenunciou-se (apenas) sobre a questão que foi submetida à sua apreciação, a saber, se o valor de € 38.675,77 depositado na conta – n.º (…) NIB: (…) do (…) Banco, titulada por (…) deverá ser, ou não, objeto da partilha adicional que foi requerida pela cabeça-de casal, ora apelada.
*
Por conseguinte, não se verificando os vícios imputados à decisão recorrida, improcede este segmento do recurso.

II.4.2.

Impugnação da decisão de facto

Os apelantes pretendem que este tribunal de segunda instância:
- julgue provados os factos constantes do elenco dos factos não provados sob os n.ºs II. - Os valores transferidos da conta bancária n.º (…) NIB: (…), do (…) Banco foram tidos em conta na partilha extra judicial em “acerto” ou “encontro” de contas –, III. - No lugar das tornas que teria de dar ao reclamante, a cabeça de casal, para além do prédio rústico com o artigo (…), secção A, ficou com o prédio misto com casa de habitação, sito na Rua das (…), 191, (…), Ferreira do Zêzere – e IV. - A cabeça de casal estava inteirada e consciente das transferências efetuadas por vontade da inventariada e deu a sua;
e
- julgue não provados os pontos de facto do elenco dos factos provados enunciados sob o n.º 7 - Nesta escritura foi omitida a existência de saldos de contas bancárias – e n.º 10Pertence à herança a quantia de € 38.675,77 (trinta e oito mil e seiscentos e setenta e cinco euros e setenta e sete cêntimos) em dinheiro, depositada na conta n.º (…), NIB: (…), do (…) Banco, titular (…).
Apreciando.
É consabido que na impugnação da decisão de facto visa-se obter uma reapreciação da decisão proferida pelo tribunal de primeira instância, ou seja, apurar se determinados factos foram incorretamente julgados, quer por terem sido indevidamente considerados assentes, devendo julgar-se não provados, quer por terem sido considerados não provados quando deveriam ter sido considerados assentes (artigo 662.º do CPC), de forma a alterar o sentido da decisão de mérito.
Na sua avaliação o tribunal de segunda instância deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, dentro dos seus poderes de livre apreciação da prova dos meios probatórios (artigo 607.º/5, do CPC), deve introduzir na decisão de facto concretamente impugnada as modificações que se imponham.
Como é entendimento pacífico na jurisprudência, a sentença deve estar despida de expressões de conteúdo puramente valorativo ou conclusivo destituídas de qualquer substrato factual, e que, além do mais, integrem a solução do litígio. Com efeito, nos termos do disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC, o juiz deve declarar quais os factos que julga provados e os factos que julga não provados, sendo que para efeitos daquele preceito legal, factos são os acontecimentos externos e internos ou psíquicos, os factos reais ou os simplesmente hipotéticos e são eles que são objeto de prova.
Tão pouco poderão figurar no elenco dos factos provados as afirmações de natureza conclusiva que encerrem em si mesmas o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo a componente jurídica que suporta a decisão. Donde, sempre que um ponto da matéria de facto integra uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, tal ponto da matéria de facto deve ser eliminado – assim, entre outros, Ac. do STJ de 19.04.2012, processo n.º 30/80.4T8TLSB.L1.S1 e Ac. da RP de 09.03.2020, processo n.º 3789/15.9T8VFR.P1, ambos consultáveis em www.dgsi.pt.
Embora não conste do Código de Processo Civil vigente uma norma como a do artigo 646.º, n.º 4, do Código de Processo Civil de 1961, que considerava não escritas as respostas do tribunal coletivo sobre questões de direito, decorre do disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC que são de afastar, na sentença, expressões de conteúdo puramente valorativo ou conclusivo, destituídas de qualquer suporte factual; e resulta do disposto no artigo 662.º, n.º 2, alínea c), do CPC que o tribunal da relação deve considerar não escritos os enunciados da matéria de facto que contenham juízos conclusivos e genéricos e matéria de direito.
Atentos os considerados que antecedem, diremos que o ponto de facto provado n.º 10 - Pertence à herança a quantia de € 38.675,77 (trinta e oito mil, seiscentos e setenta e cinco euros, setenta e sete cêntimos) em dinheiro, depositada na conta n.º (…), NIB: (…) do (…) Banco, titular (…) – tem de ser excluído do elenco dos factos provados porquanto para além de conter uma afirmação de natureza conclusiva que não tem suporte factual quer no próprio enunciado quer nos enunciados que o antecedem e nos enunciados que se lhe seguem (em síntese, nos restantes enunciados que integram o elenco da factualidade provada), o mesmo encerra a resposta à questão a dirimir no presente incidente de reclamação da relação de bens que é justamente a de saber se a quantia de € 38.675,77 depositada na conta n.º (…) do (…) Banco deve ser objeto de partilha adicional (por fazer parte da herança da inventariada).

Quanto ao ponto de facto provado n.º 7na escritura referida no ponto de facto provado n.º 4 foi omitida a existência de saldos de contas bancárias – cumpre aferir se os apelantes cumpriram os ónus de impugnação previstos no artigo 640.º do CPC, os quais visam, por um lado, delimitar o âmbito do recurso e, de outro, a permitir o exercício do contraditório pela parte contrária porquanto só quando se sabe especificamente o que é impugnado e qual a lógica de raciocínio expendido na valoração/conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita a contraparte a poder contrariá-lo.
Sob a epígrafe Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, dispõe o artigo 640.º do CPC o seguinte:

«1 – Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnada diversa da requerida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravadas, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3- O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º».

O regime legal previsto no normativo legal supra citado impõe que o recorrente especifique os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados relativos a cada um dos factos impugnados que imporiam uma solução diversa e o resultado pretendido relativamente a cada um dos pontos de facto impugnados, sob pena de rejeição da impugnação da decisão de facto, logo, sem possibilidade de convite ao aperfeiçoamento. Não basta, por conseguinte, que o apelante impugne em bloco factualidade julgada provada ou não provada, tendo, ao invés, de concretizar quanto a cada um dos factos impugnados os concretos meios probatórios que, quanto a cada um dos factos imporiam um julgamento diverso. E aquele diploma legal impõe, igualmente, a enunciação das razões que, atentos os meios de prova produzidos – e que têm de ser especificado – imporiam uma solução diversa.
Dito isto, e no que respeita ao ponto de facto provado ora em apreço, os apelantes não cumprem o ónus de impugnação previsto na alínea b), do n.º 1 do artigo 640.º e, consequentemente, o previsto no n.º 2, alínea a), do artigo 640.º. Donde se impõe rejeitar a impugnação relativa a este ponto de facto.

Finalmente no que respeita aos pontos de facto não provados impugnados (II, III e IV), os apelantes impugnam-nos em bloco, dizendo que o tribunal a quo «desrespeitou o “valor hierárquico” da prova ao relevar os depoimentos da apelada cabeça-de-casal e do seu marido em detrimento da consistente prova documental constante dos extratos bancários juntos pela própria, como se esta e aquele, diretamente interessados, alguma vez dissessem coisa diversa do que disseram», que o «tribunal a quo não viu ou ignorou que os (interessados) depoimentos prestados pela ora apelada e pelo seu marido contrariam os documentos bancários que ela própria juntou, apontando para uma decisão diversa e totalmente oposta à tomada», sem concretizarem, portanto, e como se lhes impunha, a indicação, quanto a cada um deles, dos concretos meios probatórios que imporiam um julgamento diverso, incumprindo, desta forma, o ónus previsto no artigo 640.º, n.º 1, alínea b), do CPC.
Acresce que o enunciado II do elenco dos factos não provados contém uma afirmação de natureza conclusiva que não tem suporte factual no enunciado em questão, ou no elenco dos factos provados, pelo que atentos os considerandos supra expostos, nunca poderia transitar para o elenco dos factos provados.
Em face do exposto, rejeita-se a impugnação no que respeita aos pontos de facto não provados acima referidos.

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No presente incidente de reclamação da relação de bens, está em causa saber se o valor monetário de e 38.675,77, que a cabeça de casal pretende que seja partilhado, pertence ao acervo hereditário da inventariada (…).

Está julgado provado que à data da morte de (…), ocorrida em 26 de maio de 2017 – o qual faleceu no estado de casado com a inventariada – existia uma conta bancária: a conta n.º (…), NIB: (…), do (…) Banco, titulada por (…), conta essa que na data de 31 de maio de 2017 apresentava um saldo de € 55.734,67 (facto provado n.º 8).

Está igualmente provado que na escritura de partilha realizada por óbito de (…) e de (…), celebrada em 21.12.2018, não foi partilhado o saldo daquela conta (facto provado n.º 7) e que do saldo da conta bancária supra referida, o apelante entregou à cabeça de casal € 7.500,00 (facto provado n.º 9).

No seu requerimento inicial, a cabeça de casal alegou que era o seu irmão, ora apelante, quem movimentava a conta bancária n.º (…) «para fazer pagamentos das despesas efetuadas pela sua mãe, concretamente, as despesas do lar, farmácia, água e luz da casa (artigo 16.º), que o irmão lhe disse que após o falecimento da mãe o saldo da referida conta era de € 15.000,00, tendo-lhe entregue metade daquele valor (artigo 20.º) e que, em finais do ano de 2019, veio a Portugal e questionou o irmão sobre aquela conta pois havia somado as despesas da mãe e «verificou que faltava muito dinheiro». Aduziu que o irmão sempre ocultou o saldo bancário da conta e que se apropriou em cerca de € 38.675,77 do valor depositado naquela conta (artigos 30.º e 31.º) e que, com a sua atitude, lhe causou um empobrecimento (ilícito) de cerca de € 19.338,00.

Em síntese, a cabeça-de-casal alegou que o irmão se apropriou do montante de cerca de € 38.675,77 o qual existiria (segundo ela) na conta bancária acima referida, à data do óbito da mãe de ambos.

Apesar da natureza conclusiva do artigo em questão (artigo 31.º do requerimento inicial), os interessados e ora apelantes interpretaram perfeitamente o que a cabeça de casal pretendeu dizer pois que no seu articulado em que se opuseram à partilha adicional e reclamaram da relação de bens disseram que «nenhum bem pertença da herança jacente foi omitido da partilha efetuada» (artigo 6.º), «porquanto, desde logo, os valores transferidos e ora reclamados pela requerente foram tidos em conta na partilha referida» (artigo 7.º).

Em face da alegação, nos articulados, de enunciados conclusivos e genéricos, deve o tribunal de primeira instância convidar as partes ao seu aperfeiçoamento (artigo 590.º, n.º 4, do CPC). Como explicam Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luís Filipe de Sousa[4] «não se trata, como é óbvio, de salvar petições afetadas por ineptidão resultante da falta ou ininteligibilidade da causa de pedir (artigo 186.º), mas apenas de corrigir articulados que, cumprindo os requisitos mínimos, se revelem, contudo, insuficientes, deficientes ou imprecisos em termos de fundamentação da pretensão (mutatis mutandis, quando estiver em causa a contestação)». Quando não tenha havido tal convite ao aperfeiçoamento – e no caso não houve –, tratando-se de factos relevantes para a boa decisão da causa, impunha-se ao tribunal de primeira instância, no plano do julgamento de facto, recorrer aos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPC, considerando, nomeadamente, os factos complementares e concretizadores que hajam resultado da instrução da causa (desde que, previamente, sinalize às partes os factos que apesar de não terem sido alegados resultaram da instrução da causa, permitindo-lhes, quanto a eles, um adequado exercício do contraditório).

Por sua vez, o Tribunal da Relação pode, dentro dos seus poderes oficiosos, anular a decisão proferida na primeira instância quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação desta (artigo 662.º, n.º 2, alínea c), do CPC). Este poder-dever do tribunal de segunda instância incide não apenas sobre o elenco dos factos julgados provados pelo tribunal a quo, mas igualmente sobre a existência de factos alegados pelas partes que integrem os elementos constitutivos da causa de pedir (ou das exceções invocadas) e que o tribunal de primeira instância haja desconsiderado na sentença, bem como sobre os factos que, integrando-se no disposto no artigo 5.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, devessem ter sido considerados na sentença e não o tenham sido[5].

Não se olvidando o disposto no artigo 665.º do CPC, o qual consagra a regra da substituição do tribunal recorrido, visando, em primeira linha, conduzir a uma resolução célere do litígio no pressuposto de que o Tribunal da Relação dispõe dos elementos necessários para tal, julgamos que a este valor da celeridade deve ceder perante a garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto.

Aqui chegados, há que determinar a anulação decisão recorrida e a remessa dos autos ao tribunal de primeira instância para que este proceda a um novo julgamento de forma a nele ser incluída a matéria acima referida constante do artigo 31.º do requerimento inicial que não foi considerada na decisão ora anulada, depois de devidamente corporizada com recurso aos poderes-deveres do julgador, no plano do julgamento de facto, previstos no artigo 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPC. Tudo sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto com o fim de evitar contradições (artigo 662.º, n.º 3, alínea c), do CPC).

Sumário: (…)

III.

DECISÃO

Em face do exposto, acordam julgar a apelação parcialmente procedente e, em conformidade, anulam a decisão recorrida e ordenam a remessa do processo ao tribunal de primeira instância para que este proceda a um novo julgamento de forma a nele incluir a factualidade acima referida contida no artigo 31º do requerimento inicial e que não foi considerada na anterior decisão, lançando mão do disposto no artigo 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPC para densificação da materialidade ali referida, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto com o fim de evitar contradições.

As custas serão fixadas a final.
Évora, 25 de junho de 2025
Cristina Dá Mesquita
Mário João Canelas Brás
Eduarda Branquinho


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[1] Código de Processo Civil Anotado, Volume I, 3.ª Edição, Almedina, pág. 794.
[2] Código de Processo Civil Anotado, volume 2.º, 3.ª edição, Coimbra, Almedina, 2017, pág. 734.
[3] Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª Edição, Almedina, pág. 735.
[4] Código de Processo Civil Anotado, Volume I, 3.ª Edição, Almedina, pág. 730.
[5] Neste sentido, vd. Ac. RC de 13.12.2022, processo n.º 2687/20.9T8CBR.C1, consultável em www.dgsi.pt, tal como todos os demais que doravante se citarem.