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CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA
DECLARAÇÃO DE CONTUMÁCIA
EMISSÃO DE MANDADOS DE DETENÇÃO
COMPETÊNCIA MATERIAL
ABRANGÊNCIA
Sumário
I – Verificado o circunstancialismo previsto no artigo 97º do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade (aprovado pela lei nº 115/2009, de 12/10 e doravante, abreviadamente, CEPMPL), compete ao Tribunal de Execução de Penas (doravante, abreviadamente, TEP), além do demais do previsto no artigo 138º daquele diploma, nos termos do disposto na sua alínea x) do nº 4, proferir a declaração de contumácia. II – Ora, nos termos do artigo 337º do Código de Processo Penal, e quanto aos efeitos da contumácia, a declaração desta implica para o arguido, além do mais ali consignado, a passagem imediata de mandado de detenção. III – Ademais assumindo o TEP a competência para a declarar, é contraditório afirmar que depois de declarada a contumácia inexiste qualquer ato processual a praticar e sustentar que a emissão do mandado de detenção, subsequente a essa declaração, compete ao tribunal da condenação. IV – Tratando-se de arguido a deter por força da declaração de contumácia proferida pelo TEP para cumprimento de pena no caso em que o tribunal da condenação já tinha emitido os mandados de detenção antes da declaração de contumácia, resta apenas a este tribunal sustar o cumprimento dos mandados por si emitidos, já que prejudicados pela sobredita declaração de contumácia e inerente obrigação do TEP na emissão dos correspondentes mandados. V – A este tribunal incumbirá posteriormente, após a detenção do arguido, tendo aqui implícitas as diligências que deverá previamente encetar com vista à sua localização e detenção, proceder à ulterior tramitação dos autos, procedendo nomeadamente à subsequente liquidação da pena de prisão.
Texto Integral
Processo: 9/21.0GDVFR-A.P1
Importa conhecer e decidir o conflito negativo de competência entre o Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo Local Criminal de Santa Maria da Feira, Juiz 2 e o Tribunal de Execução de Penas da Comarca do Porto, Juiz 5, tendo vem vista saber a quem compete emitir os mandados de detenção subsequentes à declaração de contumácia já efetuada pelo TEP.
Na verdade, no âmbito do processo supletivo nº 109/24.5TXPRT-A instaurado ao arguido/condenado AA, a referida Juiz 5 do TEP proferiu despacho no sentido de que, “…tendo transitado em julgado a decisão que impôs o cumprimento de prisão e não se tendo logrado efectivar a subsequente captura, nos termos do estabelecido nos artigos 335.º e 337.º, do CPP, 97.º, n.º 2, e 138.º, n.º 4, alínea x), do CEP, o último com a alteração introduzida pela Lei n.º 40/2010, de 3 de Setembro, declaro o(a) condenado(a) contumaz, no quadro da pena aplicada no processo da condenação em referência nestes autos (Processo 9/21.0GDVFR), com os seguintes efeitos (…), tendo terminado determinando “Comunique ao processo da condenação, consignando-se que, no quadro dos presentes autos, não será emitido qualquer mandado de detenção, desde logo, porque existem já mandados de detenção pendentes emitidos pelo tribunal da condenação, inexistindo qualquer outro acto processual a praticar, cumprindo somente proceder à captura do(a) condenado(a)”.
Em face de tal, a juiz 2 de Santa Maria da Feira, disso discordando, declarou-se incompetente em razão da matéria para os ulteriores termos da execução da pena, nomeadamente para a emissão de mandados de detenção e condução do condenado ao Estabelecimento Prisional, das necessárias diligências tendentes à localização do condenado, bem como para a subsequente liquidação da pena de prisão, por ser, para tanto, competente o Juízo do Tribunal de Execução de Penas do Porto – Juiz 5.
Já neste tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer para anotar que, se bem entendia a questão, “tanto mais que o TEP não declarou expressamente a sua incompetência, mas, atribuindo-a ao tribunal da condenação, interpreta-se, com recurso aos princípios regedores da interpretação das declarações negociais, que quis declarar a incompetência funcional do Juízo de execução de penas para emissão dos mandados de detenção do arguido condenado que declarou contumaz”, concordava com a posição assumida pelo juízo local de Santa Maria da Feira.
Por seu turno, e ao abrigo do disposto no artigo 36º, nº 2, do Código de Processo Penal, a juiz 5 do TEP veio responder para reiterar que não estamos na presença de um conflito de competência, uma vez que aquele tribunal, em momento algum se declarou incompetente em razão da matéria para a emissão de mandados de detenção ou realização de diligências para localização e captura do condenado, sendo a sua decisão de mérito,concluindo pela desnecessidade da emissão de novos mandados de detenção, uma vez que estão necessariamente pendentes os mandados de detenção para cumprimento de pena já emitidos pelo tribunal da condenação, concluindo que, estando ali pendentes mandados de detenção do condenado, aquele tribunal tem obrigatoriamente que diligenciar pelo seu cumprimento, reiterando, subsidiariamente, tudo o que consta do despacho proferido nos autos, em termos que especifica.
Apreciando.
Pese embora a Juiz 5 do TEP tenha entendido que não estaria em causa a questão da incompetência material, o certo é que veio a ser suscitado perante este tribunal o presente conflito negativo de competência, e bem, pois que, conforme já antes se sublinhou, destacando igual posição exarada no sobredito parecer, a posição da Juiz 5 do TEP encerra, implicitamente, uma denegação de competência material.
Assim sendo, convém recordar que ficou claro que a questão a dirimir é a de saber qual dos dois tribunais aqui em apreço será o materialmente competente para os ulteriores termos da execução da pena, nomeadamente para a emissão de mandados de detenção e condução do condenado ao Estabelecimento Prisional, das necessárias diligências tendentes à localização do condenado, bem como para a subsequente liquidação da pena de prisão.
Ora, posto que nos revemos totalmente na decisão proferida pelo então Presidente desta Secção Criminal, datada de 12/06/2019, no âmbito do processo nº 593/13.2PAESP-A.P1, na qual reiterava duas decisões anteriores, limitar-nos--emos a reproduzir a argumentação ali contida e que rezava o seguinte (transcrição):
“Assumindo o TEP a competência para declarar a contumácia a questão que é posta é de resposta clara a intuitiva. Importa averiguar se o legislador seguiu, ou não, esse caminho.
É consabida a finalidade das alterações introduzidas pelo CEPMPL em matéria de distribuição de competência entre tribunal da condenação e da execução quando é o TEP. Sobre esta matéria já muito se escreveu pelo que temos por adquirida a intencionalidade legislativa.
Dispõe o artigo 97.º do CEPMPL (…):
2 - Ao condenado que dolosamente se tiver eximido, total ou parcialmente, à execução de pena de prisão ou de medida de internamento é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 335.º, 336.º e 337.º do Código de Processo Penal, relativos à declaração de contumácia, com as modificações seguintes:
a) Os editais e anúncios contêm, em lugar da indicação do crime e das disposições legais que o punem, a indicação da sentença condenatória e da pena ou medida de segurança a executar;
b) O despacho de declaração da contumácia e o decretamento do arresto são da competência do tribunal de execução das penas.
E o artigo 138.º, em tema de competência material:
4 - Sem prejuízo de outras disposições legais, compete aos tribunais de execução das penas, em razão da matéria: x) Proferir a declaração de contumácia e decretar o arresto de bens, quanto a condenado que dolosamente se tiver eximido, total ou parcialmente, à execução de pena de prisão ou de medida de internamento;
Finalmente diz o artigo 337.º do CPP quanto aos efeitos da contumácia: 1 - A declaração de contumácia implica para o arguido a passagem imediata de mandado de detenção (…).
É contraditório afirmar que depois de declarada a contumácia, inexiste qualquer ato processual a praticar e sustentar que a emissão do mandado de detenção, subsequente a essa declaração, compete ao tribunal da condenação.
Vigorando na ordem jurídica portuguesa o princípio de que o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, art.º 9º do CC, do conjunto normativo citado apenas se pode concluir que, cabendo ao juiz do TEP a competência para declarar contumaz o condenado que dolosamente se tiver eximido à execução de pena de prisão, sendo correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 335.º, 336.º e 337.º do Código de Processo Penal, é também o juiz do TEP competente para emitir os subsequentes mandados de detenção contra o condenado. Esta a solução intuitiva, mas é também a que resulta claramente da lei, da sua letra e do seu contexto sistemático, e a única que respeita a vontade expressa do legislador.
Perante tanta clareza e inequívoca intencionalidade legislativa é insustentável a posição sufragada pelo Ex.mo juiz do TEP.
Conclui-se que proferida pelo TEP declaração de contumácia, nos termos do art.º 138.º, n. 4, al, x) do CEPMPL, quanto a condenado que dolosamente se tiver eximido à execução de pena de prisão, compete também ao TEP a emissão dos subsequentes mandados de detenção. Neste sentido anterior decisão de 1-10-2017, disponível no sítio do TRP (RP20171001170/12.5GALSD-B.P1), e de 4.5.2019”.
Esta decisão vai de encontro ao que, de essencial, vinha igualmente vertido no despacho do tribunal da condenação para estribar a sua declarada incompetência em razão da matéria, tese a que o parecer aderiu, fundamentação em ambos os casos, por economia, que aqui temos como renovada, pelo que, e adaptando tal solução ao caso vertente, impõe-se que o tribunal da condenação suste o cumprimento dos mandados por si emitidos, já que prejudicados pela sobredita declaração de contumácia e inerente obrigação do TEP na emissão dos correspondentes mandados, tribunal este a quem incumbirá posteriormente, após a detenção do arguido, tendo aqui implícitas as diligências que deverá previamente encetar com vista à sua localização e detenção, proceder à ulterior tramitação dos autos, procedendo nomeadamente à subsequente liquidação da pena de prisão.
Decisão:
Em consonância, e sem outros considerandos, pois que ostemos como desnecessários, declara-se competente o TEP do Porto, concretamente a Juiz 5.
Observe de imediato o disposto no n.º 3 do artigo 36.º do Código de Processo Penal.