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NÃO PONDERAÇÃO NA SENTENÇA CONDENATÓRIA DA EVENTUAL APLICAÇÃO DO PERDÃO PREVISTO NO ARTIGO 3.º
N.º 1
DA LEI N.º 38-A/2023
DE 2 DE AGOSTO
NULIDADE DA DECISÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário
A não ponderação, na sentença que condena arguido em pena (única) de prisão suspensa na sua execução, com sujeição a regime de prova, da eventual aplicação do perdão previsto no artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, não determina a nulidade da decisão por omissão de pronúncia, ex artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal.
(Sumário da responsabilidade do Relator)
Texto Integral
Processo n.º:24/22.7PEMTS.P1 Origem: Juízo Local Criminal de Matosinhos (...)
Recorrente: AA
Referência do documento: 19464822
I
1. O aqui recorrente impugna, com o presente recurso, decisão proferida no Juízo Local Criminal de Matosinhos (...) do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, que o condenou, (1) «pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º nº 1 do Código Penal, na pena parcelar de 4 (quatro) meses de prisão», (2) «pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º nºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, com referência aos artigos 121º a 123º do Código da Estrada, na pena parcelar de 3 (três) meses de prisão», (3) pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelos artigos 291º nº 1 al. b) e 69º nº 1 al. a) do Código Penal, na pena parcelar de 4 (quatro) meses de prisão e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 5 (cinco) meses», e, em cúmulo jurídico destas penas, na pena única (4) na «pena única de 7 (sete) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano, mediante regime de prova».
2. Este é, na parte aqui relevante, o texto da decisão recorrida: «i. relatório O Ministério Público deduziu acusação, em processo comum e para julgamento pelo Tribunal Singular, contra: BB, [...], e AA, [...], imputando ao primeiro a prática, em co-autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º nº 1 do Código Penal; de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º nº 1 e 204º nº 1 al. b) do Código Penal, e de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, 23º, 203º nº 1 e 204º nº 1 al b) do Código Penal, e imputando ao segundo a prática, em concurso efectivo, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º nº 1 do Código Penal; de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º nº 1 e 204º nº 1 al. b) do Código Penal, de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, 23º, 203º nº 1 e 204º nº 1 al b) do Código Penal, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º nº 2 ex vi o nº 1 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, com referência aos artigos 121º, 122º e 123º do Código da Estrada, e de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo artigo 291º nº 1 al. b) e 69º nº 1 al. a) do Código Penal.
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O arguido BB apresentou contestação – requerendo, a título de questão prévia, a extinção do procedimento criminal, nos termos e nos efeitos da Lei n.º 38- A/2023, de 2 de Agosto, invocando que todo o arguido é presumido inocente até que a sentença condenatória transite em julgado e oferecendo o merecimento das suas declarações em audiência de julgamento – e arrolou testemunhas. A questão prévia suscitada na referida contestação foi decidida por despacho datado de 24 de Junho de 2024, tendo-se consignado que não estavam verificados os pressupostos da aplicação da amnistia prevista no artigo 4º da citada Lei e que, quanto à eventual aplicação do perdão de penas aludido no artigo 3º do mesmo diploma, a mesma não poderia ser apreciada naquele momento, em que os arguidos ainda nem tinham sido submetidos a julgamento. Assim, foi indeferida a pretensão do arguido BB. O arguido AA também apresentou contestação – invocando presumir-se inocente até sentença condenatória transitada em julgado e oferecendo o merecimento das suas declarações em audiência de julgamento – e arrolou testemunhas.
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ii. fundamentação de facto
A. Factos provados:
Da discussão da causa, e com relevo para a decisão final, resultaram provados os seguintes factos: 1. Em data não concretamente apurada, mas em momento anterior ao sucedido em 2., os arguidos AA e BB congeminaram um plano que consistia em subtrair veículos que se encontrassem estacionados na via pública e/ou introduzir-se no seu interior, subtraindo objectos de valor que aí se encontrassem; 2. Na execução de tal plano, em momento situado entre o dia 17 de Setembro de 2022 e as 03h00m do dia 18 de Setembro de 2022, os arguidos AA e BB, introduziram-se no veículo marca Fiat, modelo ..., cor ..., com a matricula ..-..-II, com o valor comercial aproximado de €1.000,00, que se encontrava estacionado na Rua ..., em Matosinhos, utilizando para o efeito um canivete e uma chave de fendas; 3. Após, os arguidos AA e BB ausentaram-se do local na posse do referido veículo de matrícula ..-..-II, que fizeram seu, circulando com o mesmo por varias artérias do município de Matosinhos, designadamente, cerca das 03h00m, na Rua ..., em Matosinhos; 4. Com efeito, nessa madrugada, cerca das 03h00m, na Rua ..., ..., Matosinhos, os arguidos AA e BB circularam com o veículo ..-..-II com as luzes desligadas, altura em que pararam junto ao veículo marca Fiat, modelo ..., cor ..., com a matricula ..-..-LB que aí se encontrava estacionado; 5. Motivados a subtrair do interior de tal veículo bens que aí se pudessem encontrar, um dos arguidos estroncou uma das portas do mesmo e, quando se iam introduzir no seu interior, foram surpreendidos pela testemunha GG que fez notar a sua presença, gritando; 6. Temendo ser identificados, os arguidos AA e BB colocaram-se em fuga no veiculo ..-..-II e nada subtraíram do interior do veículo ..-..-LB; 7. Após, cerca das 04h30m, os arguidos AA e BB abandonaram veiculo de matrícula ..-..-II no Bairro ..., em ..., subtraindo do seu interior os seguintes objectos, que fizeram seus, de valor não concretamente apurado: a) Um tampão de combustível; b) As palas de protecção do sol; c) O aro que circundava o auto-rádio; 8. Nessa madrugada do dia 18 de Setembro de 2022, entre as 03h00m e as 04h30m, os arguidos AA e BB introduziram-se no interior do veículo marca Honda, modelo ..., cor ..., com a matricula ..-..-EO, quando este se encontrava estacionado na Praceta ..., ..., em ..., Matosinhos, utilizando para o efeito um canivete e uma chave de fendas, ausentando-se do local na posse do mesmo, fazendo-o seu; 9. Cerca das 04h30m, quando os arguidos AA e BB se encontravam no interior do veículo ..-..-EO, no Bairro ... em ..., foram surpreendidos pelos agentes da PSP, HH e II, que se identificaram proferindo a palavra “Policia”; 10. Apercebendo-se disso, o arguido AA, que se encontrava ao volante do veículo ..-..-EO, onde o arguido BB ocupava o lugar do pendura, arrancou a grande velocidade, em direcção ao centro de ..., por várias artérias daquela cidade; 11. Em tal fuga, o arguido AA não parou no sinal vertical “STOP” que se encontravam na Travessa ...; 12. Após, o arguido AA entrou em sentido proibido na Rua ..., onde circulou cerca de 500 metros em contramão, altura em que um veículo que circulava nessa via no sentido permitido teve necessidade de se desviar para o lado direito da faixa de rodagem de forma a evitar um embate frontal com o veículo tripulado pelo arguido; 13. Ao chegar ao cruzamento formado com a Rua ..., o arguido AA, na sequência da velocidade excessiva com que conduzia, perdeu o controlo do veículo ..-..-EO, acabando por embater no veículo marca Ford, modelo ..., cor ..., com a matricula ..-XM-.. que aí se encontrava estacionado, causando danos em ambos os veículos; 14. Nessa ocasião, encontravam-se no interior do veículo ..-..-EO – entre outros – os seguintes objectos: a. Uma chave de fendas, com cabo preto, que os arguidos utilizaram para facilitar a abertura dos veículos subtraídos; b. Uma carteira, cor preta, marca Desen, contendo no seu interior, entre outras coisas, 1 cartão de sócio do ginásio “...” de AA; c. Um canivete, que os arguidos utilizaram para facilitar a abertura dos veículos subtraídos; d. Um cartão de cidadão do arguido AA; 15. Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas supra, o arguido AA não era titular carta de condução ou outro documento que lhe permitisse o exercício da condução dos mencionados veículos; 16. Os arguidos AA e BB actuaram sempre em comunhão de esforços, na execução de um plano prévio delineado entre ambos, bem sabendo que os veículos que subtraíram e fizeram seus, bem como os objectos descritos em 7., não lhes pertenciam e que causavam prejuízo patrimonial aos seus legítimos proprietários, contra cuja vontade agiram; 17. Os arguidos AA e BB actuaram em comunhão de esforços e na execução de um plano previamente delineado entre ambos, com o propósito concretizado de subtrair objectos que se pudessem encontrar no interior do veículo ..-..-LB, bem sabendo que tal veículo e objectos não lhes pertenciam e que, com a sua conduta, causariam prejuízos patrimoniais ao seu legítimo proprietário contra cuja vontade agiram, só não tendo concretizado os seus planos por razões alheias à sua vontade, designadamente porque foram detectados e tiveram que fugir do local para não serem identificados; 18. O arguido AA sabia que para conduzir na via pública veículo com as características do supra descrito, tinha de estar, para tanto, habilitado com carta de condução ou outro documento que para tal o habilitasse nos termos previstos no Código da Estrada, bem sabendo que não era possuidor de tal documento e, ainda assim, quis e conduziu o referido veículo na via pública; 19. O arguido AA sabia que estava a obrigar a respeitar os sinais verticais de cedência de passagem e de indicação de sentido da via, designadamente os sinais de STOP e de sentido proibido e a adequar a velocidade a que circulava às condições da via e que, ao não o fazer, colocava, como colocou, em perigo para a vida ou integridade física quem ali transitava pela via pública, bem como o passageiro que transportava no veículo, o arguido BB, o que não o impediu de levar a cabo tal condução, bem sabendo ainda que poderia causar prejuízos de valor elevado e, ainda assim, quis actuar da forma supra descrita; 20. Ao conduzir da forma descrita, este arguido colocou em sério perigo a vida e integridade física o arguido BB e quem ocupava o veículo que circulava na via referida em 12, só não tendo existido uma colisão frontal porque aquele se desviou atempadamente e o arguido BB, na sequência do embate descrito, não sofreu lesões físicas por mera sorte; 21. Os arguidos AA e BB agiram sempre de forma livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei;
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B. Factos não provados:
Não resultou provado que: A. O veículo de matricula ..-..-LB tinha no seu interior bens de valor superior a €102,00; B. A porta do veículo de matricula ..-..-LB que foi estroncada foi a da frente, do lado esquerdo; C. Foram ambos os arguidos que estroncaram a porta do veículo de matricula ..-..-LB; D. Os objectos subtraídos do veículo ..-..-II tinham o valor global de €125,00 (sendo de €50,00 o valor do tampão de combustível, de €25,00 o valor das palas de protecção do sol, e de €50,00 o valor do painel/aro do auto-rádio); E. O veículo de matricula ..-..-EO tinha o valor comercial de €1.500,00; F. No momento descrito em 12., houve mais do que um veículo a circular nessa via no sentido permitido e a ter necessidade de se desviar para o lado direito da faixa de rodagem de forma a evitar um embate frontal com o veículo tripulado pelo arguido AA; G. O canivete e a chave de fendas referidos em 14. eram propriedade do arguido AA.
iii. motivação da decisão de facto
iv. enquadramento jurídico-penal dos factos
Ao arguido BB é imputada a prática, em co-autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º nº 1 do Código Penal; de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º nº 1 e 204º nº 1 al. b) do Código Penal, e de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, 23º, 203º nº 1 e 204º nº 1 al b) do Código Penal. Por sua banda, o arguido AA vem acusado da prática, em concurso efectivo, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º nº 1 do Código Penal; de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º nº 1 e 204º nº 1 al. b) do Código Penal, de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, 23º, 203º nº 1 e 204º nº 1 al b) do Código Penal; de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º nº 2 ex vi o nº 1 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, com referência aos artigos 121º, 122º e 123º do Código da Estrada, e de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo artigo 291º nº 1 al. b) e 69º nº 1 al. a) do Código Penal.
Relativamente aos crimes de furto:
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Volvendo à situação sub judice, e analisada a factualidade provada à luz das considerações tecidas supra, conclui-se que se mostram preenchidos os tipos objecto e subjectivo do crime de furto simples perpetrado pelos arguidos, em co-autoria (a qual consubstancia uma das formas de comparticipação contempladas no artigo 26º do Código Penal, na parte em que se refere “ou tomar parte directa na execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros”), relativamente ao veículo de matrícula ..-..-EO, devendo os mesmos ser condenados pelo cometimento deste ilícito, uma vez que inexistem causas de exclusão da ilicitude ou da culpa. Já no que concerne aos demais crimes de furto imputados aos arguidos – o crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º nº 1 e 204º nº 1 al. b) do Código Penal, relativamente ao veículo de matrícula ..-..-II, e o crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, 23º, 203º nº 1 e 204º nº 1 al. b), do Código Penal, relativamente ao veículo de matrícula ..-..-LB – não poderão aqueles ser condenados pelo cometimento de tais ilícitos. Com efeito, quanto ao veículo de matrícula ..-..-II, observa-se que, com as suas condutas, os arguidos preencheram os elementos objectivos e subjectivos do crime que lhes vem imputado, mas não se provou o valor dos objectos subtraídos pelos mesmos. Ora, a circunstância de não ter ficado demonstrado este facto leva a que não se possa imputar aos arguidos a prática do crime qualificado, atento o disposto nos artigos 202º al. c) e 204º nº 4, ambos do Código Penal. É que, como se frisou no sumário do acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 24 de Maio de 2018, no processo nº 16/16.5GGPTG.E1, acessível em www.dgsi.pt, “Não resultado provado o valor dos objectos furtados pelo arguido, face ao princípio in dubio pro reo e ao disposto no artigo 204.º, n.º 4, do Código Penal, não pode aquele ser condenado pela prática de um crime de furto qualificado, mas tão só de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 daquele compêndio legal”. Em tal aresto, explicita-se o seguinte: “A respeito do princípio in dubio pro reo: Estamos perante um princípio geral do processo penal relativo à prova da questão de facto. Ora, o princípio da investigação, por seu lado, obriga o Tribunal a reunir as provas necessárias à decisão, pelo que, a falta das mesmas, não pode de forma alguma desfavorecer a posição do arguido. Como refere o Professor Figueiredo Dias, in Direito Processual Penal, volume primeiro, pg. 213, ‘um non liquet na questão da prova - não permitindo nunca ao juiz, como se sabe, que omita a decisão - tem de ser sempre valorado a favor do arguido. É com este sentido e conteúdo que se afirma o princípio in dubio pro reo’. Como tal, e por força do disposto no nº 4, do artigo 204º do Código Penal, não há lugar à qualificação do ilícito, que deverá ser considerado, por defeito, como respeitante a coisa furtada de diminuto valor”. No mesmo sentido, podem ainda ser consultados o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 2 de Abril de 2014, no processo nº 393/12.1GCTND.C1, e o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28 de Fevereiro de 2012, no processo nº 318/10.4PAAMD.L1-5 (igualmente disponíveis em www.dgsi.pt). É precisamente esta a situação que se coloca no caso em análise, sendo de aplicar ao mesmo as referidas considerações. Contudo, in casu, os arguidos não deverão ser condenados pela prática de um crime de furto simples, uma vez que o mesmo reveste natureza semi-pública, como resulta do disposto no artigo 203º nº 3 do Código Penal, e que o denunciante JJ manifestou que pretendia desistir da queixa apresentada nestes autos contra os arguidos. A esta desistência os arguidos não se opuseram, restando homologá-la, por ter sido apresentada por quem tem legitimidade e oportunamente (porque antes da sentença em primeira instância). Assim sendo, será de homologar esta desistência de queixa e de extinguir, nesta parte referente aos factos atinentes ao veículo de matrícula ..-..-II, o procedimento criminal contra os arguidos. E relativamente ao veículo de matrícula ..-..-LB, cumpre somente mencionar que não resultou provado que o mesmo contivesse no seu interior bens de valor superior a €102,00, pelo que também se aplicam as considerações supra tecidas no que tange à aplicação do nº 4 do artigo 204º do Código Penal, sendo certo que, neste caso, não chegou a ser apresentada queixa quanto aos factos atinentes a tal veículo, pelo que, revestindo o crime de furto simples natureza semi-pública, apenas restará absolver os arguidos do crime que lhes vem imputado tendo como objecto este veículo.
Relativamente ao crime de condução sem habilitação legal:
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Debruçando-nos sobre o caso em apreciação nestes autos, constata-se que resultou provado que, nas descritas circunstâncias, o arguido AA conduziu na via pública um veículo automóvel sem que estivesse legalmente habilitado para o fazer. Por outro lado, provou-se que este arguido sabia que para conduzir na via pública veículo com as características do supra descrito, tinha de estar habilitado com carta de condução ou outro documento que para tal o habilitasse nos termos previstos no Código da Estrada, bem sabendo que não era possuidor de tal documento e, ainda assim, quis e conduziu o referido veículo na via pública, tendo agido de forma livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei. Por conseguinte, mostram-se verificados os elementos objectivos e subjectivos do crime de condução de veículo sem habilitação legal, inexistindo qualquer causa de justificação ou desculpação, pelo que o arguido AA deverá ser condenado pela prática de tal ilícito.
Relativamente ao crime de condução perigosa de veículo rodoviário:
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Revertendo ao caso concreto, dúvidas não restam de que, com a sua conduta, o arguido AA preencheu todos os elementos objectivos e subjectivos do ilícito-típico contemplado no artigo 291º nº 1 al. b) do Código Penal, cumprindo sublinhar que existiu a criação de um perigo concreto – designadamente para a integridade física de quem seguia na viatura supra mencionada, que circulava na mesma via, mas no sentido permitido, e que teve necessidade de se desviar para o lado direito da faixa de rodagem de forma a evitar um embate frontal, bem como para a integridade do próprio arguido BB, passageiro, não se olvidando ainda que o arguido AA veio efectivamente a embater num veículo estacionado na via pública, causando danos no mesmo e no veículo que tripulava e que havia subtraído – em virtude de este arguido ter violado as regras da circulação rodoviária, tais como aquelas que se reportam à prioridade e à obrigação de parar. Nestes termos, e não se verificando qualquer causa de justificação ou desculpação, o arguido AA deverá ser condenado pelo cometimento do crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo artigo 291º nº 1 al. b) do Código Penal.
v. escolha e determinação da medida da pena
Decorre do supra exposto que o arguido BB cometeu um crime de furto simples e que o arguido AA cometeu, em concurso efectivo, um crime de furto simples, um crime de condução de veículo sem habilitação legal e um crime de condução perigosa de veículo rodoviário. Conjugando os artigos 203º nº 1 e 291º nº 1 al. b) com os artigos 41º nº 1 e 47º nº 1 e 2, todos do Código Penal, verificamos que a moldura penal abstracta dos crimes de furto e de condução perigosa de veículo rodoviário terá como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 3 anos de prisão e, optando-se pela pena de multa, terá como limite mínimo 10 dias e como limite máximo 360 dias, devendo o quantitativo diário ser fixado entre os €5,00 e os €500,00. Por sua banda, o crime de condução sem habilitação legal previsto no nº 2 do artigo 3º do Decreto-Lei nº 2/98, de 3 de Janeiro, é abstractamente punido com pena de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias. Assim, conjugando esta norma com os artigos 41º nº 1 e 47º nº 1 e 2 do Código Penal, verificamos que a moldura penal abstracta deste crime terá como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 2 anos de prisão e, optando-se pela pena de multa, terá como limite mínimo 10 dias e como limite máximo 240 dias, devendo o quantitativo diário ser fixado entre os €5,00 e os €500,00. Uma vez que nestas incriminações se admite a aplicação, em alternativa, das duas penas principais – a pena de prisão e a pena de multa – o primeiro passo a dar pelo julgador consiste na escolha do tipo de pena. Desde logo, há que atender ao disposto no artigo 40º do Código Penal, que estabelece que a aplicação de penas ou medidas de segurança tem como finalidade da protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. Este preceito indica-nos que o escopo que subjaz à aplicação da pena se reconduz, por um lado, a reforçar a confiança da comunidade na norma violada e, por outro lado, à ressocialização do delinquente. Quanto ao critério de escolha da pena a utilizar, dispõe o artigo 70º que: “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”. Através deste normativo o legislador deixou claro que a pena de prisão deve ser perspectivada como a ultima ratio, à qual só se recorrerá se, de outra forma, não for possível ir ao encontro das finalidades de prevenção geral positiva ou de reintegração e de prevenção especial positiva aludidas no já referido artigo 40º. Posto isto, cumpre aquilatar se, na concreta situação sobre a qual nos debruçamos, as exigências de prevenção geral e especial encontram resposta adequada na aplicação da pena de multa ou se, diversamente, é necessário lançar mão da pena privativa da liberdade. No caso sub judice, justifica-se distinguir a situação dos dois arguidos já neste passo de escolha da pena, pois não se conclui em termos semelhantes relativamente às exigências da prevenção especial. De facto, o arguido BB, além de não ter sofrido qualquer condenação criminal, apresenta actualmente um maior grau de inserção – designadamente a nível profissional – e menos vulnerabilidades no que concerne ao seu percurso. Ademais, no caso do arguido AA, não se pode deixar de mencionar que o mesmo cometeu diversos crimes na mesma noite, de diversas naturezas, o que não deixa de ser revelador de uma personalidade já marcadamente desconforme com o direito. Assim, diversamente do que acontece com o arguido BB, a pena de multa não será adequada para dar resposta às exigências de prevenção geral e especial que se fazem sentir no caso do AA. Nestes termos, opta-se pela aplicação da pena de multa, quanto o arguido BB, devendo ser aplicada pena de prisão ao arguido AA, no que tange aos diversos crimes praticados pelo mesmo.
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Do artigo 71º do Código Penal se retira que a determinação da medida concreta da pena é feita em função das categorias da culpa e da prevenção (especial e geral), sendo nomeadamente as circunstâncias mencionadas no nº 2 desse normativo importantes, quer para a culpa, quer para a prevenção. Saliente-se que a culpa constitui o factor limitativo máximo superior da pena. Por outro lado, e como deriva dos artigos 40º nº 2 do Código Penal e 1º da Constituição da República Portuguesa, não há pena sem culpa e a medida da pena não pode ultrapassar a medida da culpa. Posta esta barreira, a medida da pena há-de ser dada pela necessidade de tutela dos bens jurídicos (prevenção geral positiva de integração). Por fim, dentro da moldura penal assim encontrada, a exacta medida da pena advirá das exigências de prevenção especial que se fizerem sentir. Diga-se ainda que, tendo-se optado pela aplicação da pena de prisão ao arguido AA, no que concerne aos diversos crimes praticados pelo mesmo, e tendo em conta que, à data dos factos, este arguido tinha vinte anos de idade, importa chamar à colação o artigo 4º do Regime Penal Especial para Jovens Delinquentes (Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro), aplicável a jovens com idades compreendidas entre os 16 e os 21 anos que tenham cometido um facto qualificado com crime. Dispõe o referido artigo que “se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos do artigo 73º e 74º do Código Penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”. Volvendo ao caso em apreço, consideramos que o arguido deve beneficiar deste regime, uma vez que, à data dos factos, o mesmo ainda não tinha sofrido qualquer condenação transitada em julgado. Acrescente-se que não se vê em que medida é que a aplicação de uma pena mais elevada poderia contribuir para a reinserção social dos arguidos, entendendo-se, ao invés, que poderia ter efeitos nefastos em termos de ressocialização. Nestes moldes, e nos termos do artigo 73º do Código Penal, o arguido AA incorre numa pena abstracta de 1 mês a 2 anos de prisão, no que tange aos crimes de furto e de condução perigosa de veículo rodoviário, e numa pena abstracta de 1 mês a 1 ano e 4 meses de prisão, no que concerne ao crime de condução sem habilitação legal.
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No caso em análise, as exigências de prevenção geral são relevantes, quanto a todos os crimes supra mencionados, designadamente tendo em conta a frequência com que estes tipos de ilícitos são praticados, mormente em meios urbanos, sendo prementes as exigências de revalidação das normas violadas. No que se reporta às exigências de prevenção especial, as mesmas não são ponderosas, no que respeita ao arguido BB, e mostram-se mais acentuadas no caso do arguido AA, pelas razões já expostas aquando da escolha do tipo de pena. De acordo com os princípios expostos no artigo 71º nº 2 do Código Penal, são de ponderar os seguintes factores: -o grau de ilicitude é relevante, no que tange a todos os crimes praticados (designadamente atendendo ao tipo de bem subtraído pelos arguidos, ao contexto em que o foi, ao circunstancialismo em que o arguido AA exerceu a condução, ao tipo de veículo tripulado e à forma como o mesmo conduziu a viatura em questão, infringindo diversas regras estradais e colocando em perigo diversas pessoas/bens); - os crimes foram praticados com dolo directo pelos arguidos; - cumpre ter em consideração as condições pessoais e económicas dos arguidos, reiterando-se nesta sede o que se expôs nos pontos 23. a 42. da factualidade provada; -quanto à conduta anterior e posterior aos factos, repisa-se que o arguido BB não sofreu qualquer condenação criminal, sendo que, no caso do arguido AA, há que frisar que as respectivas condenações (que se prendem com o cometimento de crimes de furto, condução sem habilitação legal e condução perigosa de veículo rodoviário) não consubstanciam antecedentes criminais, não podendo ser valoradas como tal, atenta a data do trânsito em julgado de cada uma das sentenças/acórdão em questão. Sopesados todos estes factores, o Tribunal entende ser adequado fixar: - ao arguido BB, a pena de 110 dias de multa, à taxa diária de €6,00; - e ao arguido AA, a pena parcelar de 4 meses de prisão pela prática do crime de condução perigosa de veículo rodoviário, a pena parcelar de 4 meses de prisão pela prática do crime de furto e a pena parcelar de 3 meses de prisão pela prática do crime de condução sem habilitação legal.
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Tal como consta da acusação, o crime de condução perigosa de veículo rodoviário é ainda punido, nos termos do artigo 69º nº 1 a) do Código Penal, com a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos. Para a determinação da medida concreta da pena acessória, devem ser tidos em linha de conta os supra explanados factores, nomeadamente, o grau de ilicitude manifestado na conduta do arguido, o dolo com que agiu, as suas condições pessoais, o seu grau de inserção e a sua idade. Tudo ponderado, entende o Tribunal que é adequado condenar o arguido AA na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período de 5 meses, pela prática do crime de condução perigosa de veículo rodoviário.
vi. cúmulo jurídico
De acordo com o estatuído no artigo 77º n.º 1 do Código Penal, estando os crimes praticados pelo arguido AA em concurso efectivo (uma vez que não se verificam os pressupostos que possam levar a considerar a existência de concurso aparente) e tendo sido praticados antes do trânsito em julgado de qualquer um deles, cabe agora proceder ao cúmulo das penas parcelares de prisão concretamente aplicadas. Efectivamente, encontra-se consagrado na nossa lei o sistema da pena única conjunta e não o da acumulação material, pelo que “é forçoso concluir que com a fixação da pena conjunta se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como um mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda que se considere e pondere em conjunto (e não unitariamente), os factos e a personalidade do agente” (Cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06 de Janeiro de 2010, processo nº 98/04.2GCVRM-A.S1, disponível em www.dgsi.pt). O n.º 2 do artigo 77º do Código Penal estabelece que a moldura do concurso tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas e como limite mínimo a pena concreta mais elevada. Deste modo, in casu, a moldura do concurso vai de 4 a 11 meses de prisão. Na fixação da pena conjunta deve atender-se aos critérios da culpa e da prevenção, considerando, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, de acordo com o artigo 77º n.º 1. Cumpre, assim, proceder a uma apreciação global dos factos. Tendo em atenção a necessidade de reafirmação da confiança da comunidade nas normas violadas, ou seja, as exigências de prevenção geral, bem como as exigências de prevenção geral que se fazem sentir, concluímos que a pena a aplicar não poderá situar-se perto do limite mínimo da moldura do concurso. Contudo, também devemos sublinhar que o arguido é jovem, que não deixa de beneficiar de integração familiar e, à data dos factos, era primário. Ademais, cumpre sublinhar que os três crimes foram perpetrados numa única noite. Nesta medida, afigura-se a este Tribunal que é justo e adequado aplicar ao arguido AA a pena única de 7 meses de prisão.
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Cumpre agora decidir se a pena de prisão aplicada a este arguido deve ser objecto de substituição. Efectivamente, pode ser ponderada a aplicação das penas substitutivas de multa (cfr. o artigo 45º do Código Penal), de suspensão da execução da pena de prisão (cfr. o artigo 50º) e de prestação de trabalho a favor da comunidade (cfr. o artigo 58º). À luz do disposto no artigo 45º do Código Penal, a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes. O nº 1 do artigo 58º do Código Penal estabelece que “se ao agente dever ser aplicada pena de prisão não superior a dois anos, o tribunal substitui-a por prestação de trabalho a favor da comunidade sempre que concluir, nomeadamente em razão da idade do condenado, que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”, acrescentando o nº 2 deste normativo que “a prestação de trabalho a favor da comunidade consiste na prestação de serviços gratuitos ao Estado, a outras pessoas colectivas de direito público, ou a entidades privadas cujos fins o tribunal considere de interesse para a comunidade”. Por seu turno, de acordo com o prescrito no artigo 50º do Código Penal, haverá lugar à suspensão da execução da pena de prisão quando se puder concluir que a simples censura do facto e a ameaça de pena de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades punitivas, sejam elas de prevenção geral ou prevenção especial. No que se reporta à figura da suspensão da execução da pena de prisão, cumpre mencionar que, nas palavras de Figueiredo Dias, “o pressuposto material deste instituto é que o tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente” (Vide “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, 3ª Edição revista, Aequitas, p. 342 e 343). Refira-se que tal medida pode ser aplicada tout court, como se prevê no nº 1 do referido artigo, ou ser subordinada ao cumprimento de deveres, à observância de regras de conduta ou simultaneamente ao cumprimento de deveres e observância de regras de conduta, podendo ainda aplicar-se com sujeição a regime de prova. Todavia, estando em causa condenados que não tiverem ainda completado, ao tempo do crime, 21 anos de idade, o regime de prova é obrigatório (cfr. o artigo 53º nº 3 do Código Penal). No caso sub judice, considera-se que não é necessário o cumprimento efectivo da pena de prisão supra determinada para satisfazer as mencionadas exigências de prevenção geral e especial e para lograr a reeducação deste agente para o direito. De facto, tendo em atenção que o arguido é jovem, beneficia de inserção familiar e era primário à data dos factos, entende-se que é possível fazer um juízo de prognose favorável no sentido de a censura dos factos e a ameaça de prisão realizarem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Perante este quadro e toda a factualidade apurada, considera-se que a solução mais adequada é a suspensão da execução da pena de prisão, pelo período de um ano (cfr. o artigo 50º nº 5 do Código Penal), mediante regime de prova, o que, como dito, sempre seria obrigatório neste caso, tendo-se optado pela suspensão da execução da pena de prisão, atenta a idade do arguido à data da prática dos crimes em análise.
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O canivete e a chave de fendas apreendidos, que foram utilizados na prática do crime de furto pelo qual os arguidos vão condenados, serão declarados perdidos a favor do Estado, verificando-se os pressupostos previstos no artigo 109º nº 1 do Código Penal.
vii. decisão
Em face de todo o exposto decide-se: a) Absolver o arguido BB da prática, como co-autor material, de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, 23º, 203º nº 1 e 204º nº 1 al b) do Código Penal; b) Absolver o arguido BB da prática, como co-autor material e na forma consumada, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º nº 1 e 204º nº 1 al. b) do Código Penal, por força da aplicação do nº 4 do artigo 204º, bem como julgar extinto o procedimento criminal instaurado contra este arguido pelo crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º nº 1 do Código Penal, atenta a desistência de queixa apresentada pelo denunciante, que se homologa pela presente sentença; c) Absolver o arguido AA da prática, como co-autor material, de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, 23º, 203º nº 1 e 204º nº 1 al b) do Código Penal; d) Absolver o arguido AA da prática, como co-autor material e na forma consumada, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º nº 1 e 204º nº 1 al. b) do Código Penal, por força da aplicação do nº 4 do artigo 204º, bem como julgar extinto o procedimento criminal instaurado contra este arguido pelo crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º nº 1 do Código Penal, atenta a desistência de queixa apresentada pelo denunciante, que se homologa pela presente sentença; e) Condenar o arguido BB pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º nº 1 do Código Penal, na pena de 110 (cento e dez) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis euros), o que perfaz o montante de €660,00 (seiscentos e sessenta euros); f) Condenar o arguido AA pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º nº 1 do Código Penal, na pena parcelar de 4 (quatro) meses de prisão; g) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º nºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, com referência aos artigos 121º a 123º do Código da Estrada, na pena parcelar de 3 (três) meses de prisão; h) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelos artigos 291º nº 1 al. b) e 69º nº 1 al. a) do Código Penal, na pena parcelar de 4 (quatro) meses de prisão e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 5 (cinco) meses; i) Efectuar o cúmulo jurídico das penas parcelares de prisão referidas em f), g) e h) e, consequentemente, condenar o arguido AA na pena única de 7 (sete) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano, mediante regime de prova; j) Declarar perdidos a favor do Estado o canivete e a chave de fendas apreendidos, ao abrigo do disposto no artigo 109º nº 1 do Código Penal; k) Condenar os arguidos no pagamento das custas processuais, cuja taxa de justiça se fixa em 2 UC, nos termos dos artigos 513º nº 1 do Código de Processo Penal e 8º nº 9 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III anexa.
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Após trânsito: - remeta boletins ao registo criminal, no cumprimento do disposto no artigo 374º nº 3 al. d) do Código de Processo Penal, comunique a presente sentença ao T.E.P. e à D.G.R.S.P.; - quanto ao arguido BB, abra vista ao Digno Magistrado do Ministério Público para se pronunciar sobre a eventual aplicação do perdão de penas aludido no artigo 3º nº 2 al. a) da Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, considerando a idade do arguido, a data da prática dos factos, a pena aplicada e o tipo de crime perpetrado pelo mesmo. [...]».
3. O recorrente verbera a esta decisão (reproduzem-se as «conclusões» com que termina o seu arrazoado): «1. O Recorrente foi condenado pela prática de três crimes: furto simples, condução sem habilitação legal e condução perigosa de veículo rodoviário, com penas parcelares de prisão e uma pena acessória de proibição de conduzir. 2. Foi aplicado cúmulo jurídico das penas parcelares de prisão, resultando na pena única de 7 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano, sob regime de prova. 3. Em sede de alegações finais, sede própria para suscitar a questão, foi invocada explicitamente a possibilidade de aplicação das normas constantes da Lei 38-A/2023, de 2 de Agosto — cfr. acta de audiência de julgamento do dia 22/11/2024, minuto 12:30, gravado entre as 12:35 horas e as 12:50 horas. 4. Na douta sentença recorrida, foi omitida qualquer pronúncia sobre a aplicação do regime de perdão de penas previsto nos artigos 2.º e 3.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto. 5. O Recorrente, à data da prática dos factos (18 de Setembro de 2022), tinha 20 anos, encontrando-se, assim, abrangido pelo regime de perdão de penas estabelecido na referida Lei. 6. O crime de furto simples e o crime de condução sem habilitação legal não constam das exceções previstas no artigo 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto. 7. Nos termos do artigo 2.º, n.º 1, da referida Lei, são perdoados 12 meses de prisão às penas até 8 anos, desde que preenchidos os requisitos legais, aplicáveis ao Recorrente. 8. A omissão de pronúncia sobre a questão do perdão constitui nulidade nos termos do artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal. 9. Assim, a douta sentença recorrida viola o disposto nos artigos 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal, bem como os artigos 2.º, n.º 1 e 3.º, n.º 1 do regime de perdão de penas previsto na Lei n.º 38-A/2023. Termos em que, julgando procedente o presente recurso e revogando a douta sentença impugnada, farão Vossas Excelências a habitual Justiça!»
4. Em resposta, concluiu o Ministério Público junto da 1.ª instância: «1 – A amnistia e perdão são matérias de conhecimento oficioso, que podem colocar-se em diversos momentos do processo: a amnistia, antes e depois da condenação, o perdão, na decisão condenatória ou depois. 2 - No caso vertente não se verifica qualquer omissão de pronúncia relativamente à questão destacada pelo Recorrente, tendo inclusivamente a Meritíssima Juíza a quo determinado na sentença condenatória que: “ Após trânsito:(…) - quanto ao arguido BB, abra vista ao Digno Magistrado do Ministério Público para se pronunciar sobre a eventual aplicação do perdão de penas aludido no artigo 3º nº 2 al. a) da Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, considerando a idade do arguido, a data da prática dos factos, a pena aplicada e o tipo de crime perpetrado pelo mesmo.” 3 – A Meritíssima Juíza a quo apenas diferiu tal apreciação para momento posterior ao trânsito em julgado da sentença, altura em que a pena e a sua medida se encontram definitivamente fixadas, permitindo assim a completa apreciação dos pressupostos previstos na Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto para a aplicação do perdão de penas. 4 - Neste sentido veja-se, designadamente, o Ac. do TRP de 11/12/2024, Processo n.º 9/22.3PEPRT-M.P1: “I - Não ocorre nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia relativa à questão da aplicabilidade de perdão parcial na pena de prisão imposta por força da Lei n.º 38-A/2023, de 02.08 [nos termos da al. c) do n.º 1 do art.º 379.º do CPP], pois essa questão tanto pode ser ali equacionada como em momento posterior ao trânsito em julgado do acórdão condenatório, a todo o tempo, a requerimento ou oficiosamente.” 5 - Pelo exposto, a sentença ora em crise não omitiu qualquer pronuncia sobre questão que lhe tivesse submetida, tendo voluntariamente diferido tal apreciação para momento posterior ao trânsito em julgado da mesma, o que não só era admissível, como verdadeiramente recomendado. Porque a sentença apreciou devidamente os factos em questão e efectuou uma correcta subsunção jurídica dos mesmos, deve a mesma ser mantida no seus exactos termos, sendo julgado improcedente o Recurso interposto [...]».
5. O Ministério Público junto deste Tribunal aderiu às alegações do Magistrado do Ministério Público junto da 1ª Instância, pugnando, também, pela improcedência do presente recurso.
II
6. O presente recurso não merece provimento.
7. 1. A não ponderação, na sentença que condena arguido em pena (única) de prisão suspensa na sua execução com sujeição a regime de prova, da eventual aplicação do perdão previsto no artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, não determina a nulidade da decisão por omissão de pronúncia, ex artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal.
8. De acordo com esta norma, ocorre omissão de pronúncia, geradora de nulidade do julgado, «[q]uando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar», o que, na opinião de alguns autores, inclui a «[o]missão de aplicação de perdão ou amnistia, quando aplicável» (assim, Francisco Mota Ribeiro, Vícios das sentenças e vícios do julgamento, em Centro de Estudos Judiciários, Processo e Decisão Penal – Textos, 2019, pág. 62; posição diversa adotou porém, v. g., o acórdão desta mesma Relação tirado no processo n.º 9/22.3PEPRT-M.P1, citado na resposta do Ministério Público junto da 1.ª instância).
9. No que interessa para o caso concreto, no entanto, do teor do n.º 3 do artigo 3.º da própria Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, decorre que a questão da aplicação do perdão aí previsto, em caso de penas suspensas na sua execução (desde que «subordinada[s] ao cumprimento de deveres ou de regras de conduta ou acompanhada[s] de regime de prova, como aqui sucede: cf. n.º 2, alínea d), a contrario, do preceito citado), só se coloca se e quando essa suspensão for revogada (como aí se diz, «[o] perdão previsto no n.º 1 pode ter lugar sendo revogada a suspensão da execução da pena»), razão pela qual não existia, nesta matéria, qualquer questão que ao Tribunal a quo coubesse resolver logo na sentença que proferiu.
10. Aliás, desde logo pela própria natureza das coisas, nenhum sentido faria que o julgador tomasse posição sobre um perdão que incidiria sobre uma pena que, ao menos para já, não está em execução (e, tudo correndo como desejável, não chegará a ser executada); como não faria também sentido que o julgador se pronunciasse sobre a possibilidade de perdão da pena de substituição em que efetivamente condenou o recorrente, apenas para a negar, face ao preceituado no já citado artigo 3.º, n.º 2, alínea d), a contrario, da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto.
11. Em suma, pois, não ocorre, no caso, qualquer omissão de pronúncia que conduza à nulidade da sentença recorrida.
12. 2. Face à decisão que irá ser proferida, terá o recorrente que suportar custas adequadas à atividade que desencadeou.
13. Conforme decorre do preceituado no n.º 1 do artigo 513.º do Código de Processo Penal, o arguido suporta o pagamento de taxa de justiça «quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso».
14. Sendo este o caso, terá, assim, o recorrente, de suportar as custas devidas nesta instância.
15. Considerando, nos termos previstos no artigo 8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais, a tramitação processual ocorrida, afigura-se adequado fixar em 4 Unidades de Conta a taxa de justiça devida.
III
16. Pelo exposto, acordam os da 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao presente recurso.
17. Custas pelo recorrente (artigo 513.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) Unidades de Conta.
Cidade e Tribunal da Relação do Porto, 11 de junho de 2025.