CONTRA-ORDENAÇÃO
COIMA
SUSPENSÃO
SANÇÃO ACESSÓRIA
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Sumário

I - Do art.º 223.º, n.º 1, DL n.º 298/92, de 31-12 (“Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras”) resulta que o legislador admitiu, de modo expresso, a suspensão da execução da sanção aplicada decorrente do cometimento de ilícitos de mera ordenação social previstos nesse diploma.
II - Essa suspensão não se encontra dependente do preenchimento de pressupostos de ordem formal relativos à gravidade da contra-ordenação, à coima aplicável ou ao montante da coima imposta ao agente. 
III - Todavia, exige-se o preenchimento de um pressuposto de ordem material, impondo-se que a suspensão da execução da sanção salvaguarde, de modo adequado e suficiente, as “finalidades de prevenção”.

Texto Integral

Acordam os juízes que integram a secção da propriedade intelectual, concorrência, regulação e supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa

I - RELATÓRIO:
Mediante sentença proferida no dia 20-11-2024 pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão – Juiz 1, foram julgados parcialmente procedentes os recursos interpostos da decisão condenatória do Banco de Portugal de 03-10-2023, proferida nos presentes autos de contra-ordenação, e, em consequência:
a)  A recorrente “Parcela Já, Lda.” foi condenada:
--pela prática de uma contraordenação dolosa, consubstanciada no exercício da operação de factoring, entre 28-09-2017 e 23-10-2020, sem habilitação para o efeito, em violação do princípio da exclusividade constante do art.º 4.º do DL n.º 171/95 e do art.º 8.º do RGICSF, punida pela al. a) do n.º 1 do art.º 211.º do RGICSF, na coima de € 30 000 (trinta mil euros);
--pela prática de uma contraordenação dolosa, consubstanciada na contribuição causal ao exercício da operação de factoring pela “Parcela Já SP Z.O.O.” entre 03-07-2020 e 31-12-2021, em violação do princípio da exclusividade do constante do art.º 4.º do DL n.º 171/95 e do art.º 8.º do RGICSF, punida pela al. a) do n.º 1 do art.º 211.º do RGICSF, na coima de € 35 000 (trinta e cinco mil euros);
--pela prática de uma contraordenação dolosa, consubstanciada na divulgação de publicidade a um produto de crédito pela “Parcela Já SP Z.O.O.”, entre 11-02-2022 e 15-07-2022, em violação do art.º 11.º do RGICSF, punida pela al. c) do art.º 210.º do RGICSF, na coima de € 10 000 (dez mil euros);
--na coima única de € 48 000 (quarenta e oito mil euros), uma vez efectuado o cúmulo jurídico das coimas parcelares.
b) A recorrente “Parcela Já, SP Z.O.O.” foi condenada:
--pela prática de uma contraordenação dolosa, consubstanciada no exercício da operação de factoring, entre 03-07-2020 e 31-12-2021, sem habilitação para o efeito, em violação do princípio da exclusividade constante do art.º 8.º do RGICSF, punida pela al. a) do n.º 1 do art.º 211.º do RGICSF, na coima de € 35 000 (trinta e cinco mil euros);
--pela prática de uma contraordenação dolosa, consubstanciada na divulgação de publicidade a um produto de crédito, entre 11-02-2022 e 15-07-2022 em violação do art.º 11.º do RGICSF, punida pela al. c) do art.º 210.º do RGICSF, na coima de € 15.000 (quinze mil euros);
--na coima única de € 42.000 (quarenta e dois mil euros), uma vez efectuado o cúmulo jurídico das coimas parcelares.
c) O recorrente AA…:
--pela prática de uma contraordenação dolosa, consubstanciada na contribuição causal, enquanto sócio-gerente da “Parcela Já, Lda.”, no exercício da operação de factoring levado a cabo pela “Parcela Já, Lda.”,  sem habilitação para o efeito, entre 28-09-2017 e 23-10-2020, em violação do princípio da exclusividade constante do art.º 4.º do DL n.º 171/95 e do art.º 8.º do RGICSF, punida pela al. a) do n.º 1 do art.º 211.º do RGICSF, na coima de € 15.000 (quinze mil euros);
--pela prática de uma contraordenação dolosa, consubstanciada na contribuição causal, enquanto sócio-gerente da “Parcela Já, Lda.”, no exercício da operação de factoring levada a cabo pela “Parcela Já SP Z.O.O.” sem habilitação para o efeito, entre 03-07-2020 e 31-12-2021, em violação do princípio da exclusividade do art.º 4.º do DL n.º 171/95 e do art.º 8.º do RGICSF, punida pela al. a) do n.º 1 do art.º 211.º do RGICSF, na coima de € 20.000 (vinte mil euros);
--pela prática de uma contraordenação dolosa, consubstanciada na contribuição causal, enquanto sócio-gerente da  “Parcela Já SP Z.O.O.”, no exercício da operação de factoring levado a cabo pela “Parcela Já SP Z.O.O.” sem habilitação para o efeito, entre 03-07-2020 e 31-12-2021, em violação do princípio da exclusividade do art.º 4.º do DL n.º 171/95 e do art.º 8.º do RGICSF, punida pela al. a) do n.º 1 do art.º 211.º do RGICSF, na coima de € 20.000 (vinte mil euros);
--pela prática de uma contraordenação dolosa, consubstanciada na contribuição causal, enquanto sócio-gerente da “Parcela Já, Lda.”, na divulgação de publicidade a um produto de crédito levada a cabo pela “Parcela Já SP Z.O.O.”, entre 11-02-2022 e 15-07-2022, em violação do art.º 11.º do RGICSF, punida pela al. c) do art.º 210.º do RGICSF, na coima de € 5.000 (cinco mil euros);
--pela prática de uma contraordenação dolosa, consubstanciada na contribuição causal, enquanto sócio-gerente da “Parcela Já SP Z.O.O.”, na divulgação de publicidade a um produto de crédito levada a cabo pela “Parcela Já SP Z.O.O.”, entre 11-02-2022 e 15-07-2022, em violação do art.º 11.º do RGICSF, punida pela al. c) do art.º 210.º do RGICSF, na coima de € 8.000 (oito mil euros);
--na coima única de € 30.000 (trinta mil euros), uma vez efectuado o cúmulo jurídico das coimas parcelares.
                                                           *
A sentença proferida pelo tribunal de primeira instância decidiu manter que as condenações dos recorrentes sejam divulgadas no site do Banco de Portugal sem recurso ao regime de anonimato.
                                                                       *
“Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA…, vieram interpor recurso da sentença proferida, que terminaram com a apresentação das seguintes conclusões:
“A. O presente recurso está limitado à matéria relativa à suspensão da execução da sanção e à aplicação da sanção acessória, por se considerar que a mesma está em contradição com a factualidade dada como provada pelo tribunal a quo.
B. Deu o tribunal como provado que i) os recorrentes não têm registo de condenações contraordenacionais junto do BP; ii) actuaram impulsionados pela demora na implementação prática da parceria que foi assinada, por parte do BNI Europa, que estudava aviabilidade financeira dos parceiros apresentados pelos recorrentes, mas não tomava uma posição de avançar ou então terminar com a parceria (…) iii) inexistência de danos apurados que tenham sido causados no sistema bancário ou financeiro pela conduta dos recorrentes. Também não resulta que a factualidade apurada tenha gerado qualquer alarme social em concreto, que tenham ocorrido actos de ocultação por parte das recorrentes, sendo antes de considerar que colaboraram com o BP.
C. Para depois considerar que não existiam razões suficientes para uma suspensão da execução da sanção e ainda condenar os Recorrentes na sanção acessória de publicação da decisão definitiva ou transitada em julgado, com divulgação no site do Banco de Portugal sem recurso ao regime de anonimato, nos termos do previsto no art.º 212º do RGICSF;
D. Contrariando o art.º 206º do RGICSF, a determinação da medida da coima e das sanções acessórias, faz-se na sequência de uma ponderação entre a ilicitude concreta do facto, a culpa do agente e as exigências de prevenção.
E. Pelo que se impõe a correcção da sentença quanto à não condenação na sanção acessória, por a mesa se revelar excessiva e desproporcional face às exigência de prevenção geral e à gravidade da infracção que já se mostram asseguradas pela condenação em si.”
                                                           *
O “Banco de Portugal” respondeu ao recurso interposto, que terminou com as seguintes conclusões:

“Da suspensão da execução da sanção

A. Nos termos do n.º 1 do art.º 223.º do RGICSF, a suspensão da execução da sanção apenas pode ser determinada pelo Conselho de Administração do Banco de Portugal quando se conclua «que dessa forma ainda são realizadas de modo adequado e suficiente as finalidades de prevenção».
B. A valoração conjunta de todos os elementos carreados para o processo impedem a conclusão dos Recorrentes de que se encontrariam verificados os pressupostos de que depende a possibilidade de suspensão da execução da sanção, tanto mais que a PARCELA JÁ SP Z.O.O., e respetivo sócio gerente AA…, também gerente da PARCELA JÁ, LDA., desenvolveram a sua atividade, já após saber que tais serviços financeiros lhes estavam vedados.
C. No caso, as acentuadas necessidades de prevenção geral associadas às infrações em questão, impedem a suspensão da execução da sanção.
D. É imperativo que o público percecione como absolutamente intolerável o exercício por entidades não habilitadas para o efeito da atividade de factoring e operações de crédito suscetíveis de criar no público a convicção (errada) de que está perante uma entidade autorizada a desenvolver atividade no sector financeiro, com o inerente e acentuado risco de avultadas perdas e da criação de desconfiança no público em geral sobre o sector financeiro como um todo.
E. Sem prejuízo do exposto, sempre importa referir que os Recorrentes não só beneficiaram do efeito suspensivo do recurso, sem a prestação de caução ou a prova de insuficiência de meios para o efeito, como ainda pretendem interpor recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa com efeito suspensivo e lograr obter a suspensão da execução da sanção, sem que se verifiquem os pressupostos para tal, e sem procederem ao pagamento de qualquer quantia em que foram condenados.

Da decisão de divulgação da decisão sem anonimato

F. As razões que determinaram a divulgação da decisão sem recurso ao regime do anonimato são justificadas e proporcionais ao caso concreto, uma vez que resultam de informação que deve ser prestada aos consumidores no que respeita ao exercício da atividade financeira não autorizada, nos termos da Lei n.º 78/2021, de 24-11.
G. Segundo os n.ºs 1 e 2 do art.º 10.º de tal diploma legal, que consagra o Regime de Prevenção e Combate à Atividade Financeira Não Autorizada e Proteção dos Consumidores, deve a decisão condenatória transitada em julgado ser alvo de publicitação, com a identificação da pessoa ou entidade objeto de processo penal ou contraordenacional pela tentativa ou prática de atividade financeira não autorizada, a tipologia da infração e a sanção aplicada.
H. Tal divulgação, entre outros elementos, esclarece qual a data dos factos ocorridos, pelo que o perigo de confusão no mercado não se verifica.
I. Mesmo que assim não se considere, o que apenas por mera cautela de patrocínio se concebe, é de notar que apenas a Recorrente PARCELA JÁ, LDA. se encontra, na atualidade, a exercer a sua atividade no mercado, pelo que a divulgação em regime de anonimato apenas se poderá aplicar à Recorrente PARCELA JÁ, LDA., mas já não quanto aos restantes Recorrentes.”
                                                           *
O MINISTÉRIO PÚBLICO, junto do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, respondeu ao recurso interposto, sustentando que:
a) O recurso que por ora se responde apresenta conclusões que, por si só, delimitam de forma insuficiente o objecto do mesmo – uma vez que as concretas razões de discordância apenas dali se retiram de forma indirecta – e cuja apreciação se requer a este Tribunal da Relação;
b) Sem prejuízo, sempre se dirá que a pretendida suspensão da execução das coimas únicas aplicadas aos visados não satisfaz as necessidades de prevenção geral que devem ser acauteladas, pelo que bem andou a douta sentença recorrida ao condenar os visados em sanções efectivas;
c) O comportamento reiterado dos visados, nomeadamente do gerente de ambas as sociedades recorrentes, AA…, durou por mais de 6 meses e traduziu-se na assunção de um risco não permitido pelo RGICSF, dada a ausência de um parceiro financeiro, sempre exigível nos contratos de factoring;
d) Permitir-se a aplicação, de forma quase automática, do art.º 223.º nº 1 do RGICSF – e sempre que seja alegado um ulterior comportamento já conforme à normatividade jurídica vigente – colocará sempre em risco as normas legais que visam proteger a integridade e a sustentabilidade do sistema financeiro, bem como o surgimento de riscos sistémicos que, atenta a história recente, conduzem sempre a perdas de credibilidade e desconfiança no mercado de concessão de crédito;
e) Inexiste qualquer contradição na douta sentença recorrida quando, perante o que deu como provado e distendeu na sua fundamentação de facto e de direito, nem sequer ponderou a possibilidade de aplicação do instituto da suspensão da execução das coimas aplicadas;
f) No mais, não foi invocado qualquer vício previsto no art.º 410.º n.º 2 do CPP, consubstanciando a argumentação das recorrentes apenas uma preferência subjectiva relativamente a um resultado punitivo que permitisse melhor acomodar as suas expectativas de não suportar qualquer sacrifício, em virtude da prática de um comportamento infraccional, merecedor de uma clara censura social, tanto mais que subsistiu sempre a consciência de que as operações de factoring realizadas pelas sociedades visadas ocorriam a descoberto de qualquer licença ou autorização legalmente exigível;
g) De qualquer forma, e do mesmo modo que o que se deve sempre acautelar será a segurança e a estabilidade do mercado financeiro e de capitais, mesmo no tocante ao sector do factoring – e tendo presente que os visados operam, presentemente, no mercado de forma legalmente habilitada –, o MP declara para os devidos efeitos nada ter a opor – sem prejuízo da douta ponderação que este Tribunal vier a fazer – à publicação da decisão condenatória com recurso ao regime do anonimato, nos termos previstos no art.º 227º-B nº 3 al. b), primeira parte, do RGICSF.”
                                                           *
A Senhora Procuradora-Geral Adjunta, junto deste Tribunal da Relação, apôs “visto” nos presentes autos.
                                                           *
Admitido o recurso e colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO:
a) Factos provados:
A primeira instância considerou como provados os seguintes factos:

“1) A PARCELA JÁ, LDA. é uma sociedade por quotas, constituída em 21-07-2014, e tem por objecto social "Prestação de serviços de investigação e desenvolvimento de produtos e equipamentos informáticos, e a gestão e controlo das transações de dados entre equipamentos físicos e sistemas computacionais. Atividade de agência ligada às vendas de viagens, de percursos turísticos e de alojamento, compreendendo vendas por grosso ou a retalho, a particulares e a empresas".
2) Em 28-09-2017, foi assinado um contrato denominado de "Protocolo de Parceria" entre a Parcela Já, Lda. e o BNI – Banco de Negócios Internacional (Europa), S.A. para a implementação e exploração conjunta de um produto denominado "Solução Parcela Já", que consistia num projeto de diferimento de pagamentos de compras.
3) Na cláusula 2.ª do contrato referido em 2), epigrafada "Vigência", ficou definido que o acordo se iniciaria na respetiva data de assinatura (a saber, em 28-09-2017) e vigoraria por um período inicial de 3 (três) anos.
4) De acordo com a cláusula 6ª, ponto 2, do contrato referido em 2), o BNI detinha as seguintes atribuições:
"a) Assegurar a componente financeira das operações inerentes à solução "PARCELA JÁ", através da aquisição dos créditos dos aderentes sobre os clientes finais, na sequência das transações autorizadas por contrato de adesão à solução "PARCELA JÁ" (…), com parcelamento do preço e cobrança via cartão de crédito autorizado, assumindo o correspetivo risco de crédito da operação;
b) Gestão dos pagamentos parcelados e interação junto dos devedores, sendo este serviço prestado em primeira linha pela PARCELA JÁ em nome do Banco BNI EUROPA (…);
c) Assegurar a integração dos seus sistemas com a informação disponibilizada pela PARCELA JÁ"
5) Por sua vez, de acordo com a cláusula 6ª, ponto 1., do contrato referido em 2), à Parcela Já, Lda. competia:
"a) Criar os instrumentos e materiais de comunicação offline e online necessários à comercialização do Projeto, assegurando os necessários canais de comunicação;
b) Criar condições para que as empresas interessadas [pudessem] aderir, desenvolvendo uma rede comercial e assegurando a gestão operacional da solução "PARCELA JÁ", através de: Promoção e angariação de aderentes em feiras, eventos, via centrais de compras ou de forma individualizada; Avaliação do potencial do aderente, recolha dos elementos e formalização dos contratos necessários para a sua adesão; Instalação e configuração dos terminais de pagamento; Gestão corrente dos contratos e apoio ao aderente através do seu backoffice; (…)".
6) De acordo com o Anexo I do Protocolo denominado de “Apresentação Técnica PARCELA JÁ Software e Hardware", para o funcionamento da "Solução Parcela Já", a Parcela Já, Lda. adquiriu terminais de pagamento (hardware) que, sendo carregados com o software por si desenvolvido, permitiriam ao cliente final o parcelamento do pagamento de uma compra.
7) De acordo com o Anexo I do Acordo de Parceria denominado de “Apresentação Solução PARCELA JÁ Software e Hardware", através da utilização do terminal de pagamento desenvolvido pela Parcela Já, Lda., instalado junto do ponto de venda do Aderente, após a introdução do valor da compra e do número de prestações, ao cliente final caberia introduzir, no terminal da PARCELA JÁ, o seu cartão de cidadão e, seguidamente, o seu cartão de crédito, com o respetivo código. Caso: o cartão de cidadão correspondesse ao titular do cartão de crédito, o código fosse corretamente inserido e o cliente tivesse o plafond da compra disponível no seu cartão de crédito, a transação seria validada.
8) O modelo de negócio da Parcela Já, Lda. foi, em 30-10-2017, publicitado no jornal online ECO, com o título "Fazer compras em prestações sem juros? Agora é possível com a PARCELA JÁ", tendo sido aí divulgado o desenvolvimento, pela PARCELA JÁ, dos terminais de pagamento que permitiriam aos consumidores fracionar o pagamento das suas compras, até um máximo de 12 (doze) prestações, sem pagamento de juros.
9) Em 31-10-2017, cerca de um mês após a assinatura do mencionado "Protocolo de Parceria", o Presidente do Executivo do BNI EUROPA, BB…, anunciou, em entrevista ao Jornal Económico, a parceria entre a PARCELA JÁ e o BNI EUROPA.
10) E, na mesma data, o BNI EUROPA lançou um press release sobre a parceria celebrada com a PARCELA JÁ.

Da Conduta da Parcela Já, Lda.

11) A PARCELA JÁ detinha um sítio na internet, disponível no endereço https://www.parcelaja.pt/ e, pelo menos em 14-05-2019, anunciava nesse endereço a atividade de parcelamento do pagamento de compras e fazia referência ao BNI EUROPA enquanto seu parceiro.
12) No separador "Como funciona" do seu sítio na internet, a PARCELA JÁ disponibilizava um vídeo sobre a sua atividade, junto da expressão "PAGUE AS SUAS COMPRAS DE UMA FORMA PARCELADA SEM CUSTOS E ENCARGOS".
13) Na secção intitulada de "Sem registos, sem burocracias e sem demora na aprovação de crédito" era disponibilizado um texto informativo sobre a atividade da PARCELA JÁ, com o seguinte teor: "Utilizando a solução Parcela Já, as lojas podem agora oferecer aos seus clientes um plano de pagamento em parcelas, sem qualquer custo ou juros associados. A solução oferecida requer o uso do cartão de crédito dos clientes e proporciona uma excelente oportunidade para gerar novas compras, agendando os pagamentos dos clientes numa base mensal. O cliente pode decidir pagar até 12 parcelas sem juros, e não necessita de apresentar qualquer documentação, passar por burocracias ou tempos de espera de aprovação de crédito. Para aderir à solução Parcela Já, as lojas têm de ter um terminal POS da Parcela Já ou a aplicação web no seu website. O cliente, ao utilizar o seu cartão de crédito Visa ou Mastercard, pode então decidir em quantas parcelas vai querer pagar a sua compra."
14) Nesse mesmo separador era demonstrada a forma como os clientes finais poderiam pagar as suas compras de forma fracionada, e, na secção identificada "Toda a gestão das compras sem letras pequenas", era explicado o modelo de negócio da PARCELA JÁ do ponto de vista do cliente final, que se iniciaria com a criação de um plano pessoal de pagamentos parcelados, seguida da cobrança da primeira parcela imediatamente após a compra e a criação de uma autorização que bloqueava o valor até um máximo de 12 (doze) parcelas no cartão de crédito do cliente. Depois, a PARCELA JÁ cobraria, mensalmente, as parcelas no cartão de crédito do cliente, até ao final do plano de pagamentos estipulado.
15) No separador "Para clientes", na secção intitulada "Conheça aqui as nossas lojas aderentes", eram indicados os logótipos de 42 (quarenta e dois)
Aderentes e os respetivos setores ("Agências de Viagens", "Perfumarias", "Ópticas", "Lojas de Informática", "Oficinas de Automóveis", "Saúde", "Vestuário", "Móveis" e "Relojoaria e Joalharia").
16) A PARCELA JÁ, à data de 05-07-2019, dispunha de 155 Aderentes, os quais já ofereciam aos seus clientes finais a possibilidade de parcelarem o pagamento do preço dos produtos e serviços que adquiriam.
17) Uma vez que o "Protocolo de Parceria" celebrado entre a PARCELA JÁ e o BNI EUROPA ainda não se encontrava a ser cumprido na plenitude (já que, conforme se referirá adiante, o BNI EUROPA fazia apenas a avaliação de risco e emitia, de seguida, pareceres sobre os candidatos a Aderentes, mas não atuava na componente financeira das operações), entre 28-09-2017 e 23-10-2020, a PARCELA JÁ, para além dos aspetos tecnológicos e comerciais, também se ocupava dos fluxos financeiros da sua atividade, adquirindo os créditos dos Aderentes sobre os clientes finais, com parcelamento do preço e cobrança via cartão de crédito autorizado, assumindo o risco de crédito das operações.
18) Entre 28-09-2017 e 23-10-2020, sempre que um cliente final pretendia fracionar o pagamento de um produto ou serviço, numa das lojas de um Aderente, introduzia o seu cartão de crédito e o cartão de cidadão no terminal de pagamento da PARCELA JÁ e realizava-se a transação nos termos acordados.
19) Aquando da realização da transação comercial, o terminal de pagamento da PARCELA JÁ emitia um talão para assinatura do cliente, que continha os dados do cliente, da operação e do plano de parcelamento de pagamentos.
20) O cliente assinava, ainda, uma declaração de autorização de débito direto à PARCELA JÁ.
21) Os Aderentes recebiam o valor da venda no prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas úteis.
22) A PARCELA JÁ cativava as 2 (duas) primeiras prestações e comprometia-se a retirar mensalmente o valor das prestações acordadas.
23) A PARCELA JÁ utilizava a Evo Payments International GMBH (doravante, "Evo Payments"), instituição de pagamento com sede na União Europeia, para proceder à cobrança dos pagamentos dos Aderentes, os quais, posteriormente, eram depositados, em bloco, na conta da PARCELA JÁ junto do Novo Banco, S.A. (doravante, "Novo Banco").
24) Com efeito, da análise à conta com o IBAN n.º PT5000…., detida pela PARCELA JÁ junto do Novo Banco, verificaram-se, no período compreendido entre 28-09-2017 e 23-10-2020, os seguintes movimentos:
a) 2 160 (dois mil, cento e sessenta) movimentos relevantes a crédito, no valor global de € 6.571.519,54 (seis milhões, quinhentos e setenta e um mil, quinhentos e dezanove euros e cinquenta e quatro cêntimos), dos quais se destacam:
i) 752 (setecentos e cinquenta e dois) movimentos, no valor global de € 3.095.265,25 (três milhões, noventa e cinco mil, duzentos e sessenta e cinco euros e vinte e cinco cêntimos), provenientes da instituição de pagamento Evo Payments;
ii) 138 (cento e trinta e oito) movimentos, no valor global de € 1.281.001,91 (um milhão, duzentos e oitenta e um mil, e um euros e noventa e um cêntimos), provenientes de Aderentes, sobretudo de Agências de Viagens - no valor global de, aproximadamente, € 1.200.000 (um milhão e duzentos mil euros) - e de Lojas de Ótica - no valor global de, aproximadamente, € 13.000 (treze mil euros);
iii) 603 (seiscentos e três) movimentos, no valor global de € 78.921,19 (setenta e oito mil, novecentos e vinte e um euros e dezanove cêntimos), provenientes de particulares.
b) 5.462 (cinco mil, quatrocentos e sessenta e dois) movimentos relevantes a débito, no valor global de € 6.416.507,04 (seis milhões, quatrocentos e dezasseis mil, quinhentos e sete euros e quatro cêntimos), dos quais se destacam:
4.412 movimentos, no valor global de € 3.295.149,50 (três milhões, duzentos e noventa e cinco mil, cento e quarenta e nove euros e cinquenta cêntimos), destinados a Aderentes, sobretudo Lojas de Ótica, no valor global de, aproximadamente, € 2.300.000 (dois milhões e trezentos mil euros); Agências de Viagens, no valor global de, aproximadamente, € 300.000 (trezentos mil euros); e Lojas de Material Informático, no valor global de, aproximadamente, € 300.000 (trezentos mil euros);
25) Assim, a PARCELA JÁ, face à parceria protocolada com o BNI EUROPA, sem que este tivesse concedido qualquer crédito aos Aderentes, substituiu-se, entre 28-09-2017 e 23-10-2020, àquela instituição na qualidade de mutuante, assumindo, deste modo, o risco de crédito das operações efetuadas.
26) A PARCELA JÁ não se encontra, nem nunca se encontrou, registada junto do Banco de Portugal e, por conseguinte, habilitada para desenvolver atividades sujeitas à sua supervisão, nomeadamente operações de crédito, incluindo factoring.
27) Ao agir da forma descrita, adquirindo créditos a curto prazo, derivados da venda de produtos, sem se encontrar habilitada para o efeito, entre 28-09-2017 e 23-10-2020, a PARCELA JÁ agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que desenvolvia uma atividade para a qual não se encontrava autorizada, conduta que sabia ser proibida e punida por lei.

Da conduta do BNI

28) Em 05-07-2019, no âmbito de ação inspetiva efetuada às instalações da PARCELA JÁ, foi o Banco de Portugal informado de que, apesar de ser a PARCELA JÁ que, para além dos aspetos tecnológicos e comerciais, se ocupava dos fluxos financeiros da "Solução Parcela Já", o processo de aceitação de novos clientes era feito pelo BNI EUROPA, através da avaliação de adequabilidade do Aderente em sede de know Your Customer.
29) No processo de validação de novos Aderentes levado a cabo pelo BNI EUROPA, era-lhe remetido, pela PARCELA JÁ:
i) um template intitulado de "Adesão de Comerciante PARCELA JÁ", onde eram preenchidos os dados do candidato a Aderente,
ii) a Certidão do Registo Comercial da empresa ou o seu código de acesso,
iii) cópias dos documentos de identificação e comprovativo de morada dos sócios e/ou beneficiários efetivos,
iv) no caso de empresa que, ou fosse detida por pessoas coletivas, ou fosse sociedade anónima, uma declaração da empresa onde estivesse expressa a informação sobre a sua composição societária, com informação que identificasse os particulares que detinham o capital social da mesma e
v) a autorização - assinada pelos representantes da empresa e dos sócios -para consultar a Central de Responsabilidades de Crédito do candidato a Aderente e dos seus sócios.
30) Com efeito, o BNI EUROPA consultava a Central de Responsabilidades de Crédito dos candidatos a Aderentes e utilizava a informação assim obtida para emitir o seu parecer à PARCELA JÁ.
31) Foi apurado, em 01-08-2019, pelo Banco de Portugal, que o BNI EUROPA tinha acedido, entre 21-12-2017 e 24-01-2018, à Central de Responsabilidades de Crédito para verificar o mapa de responsabilidades das seguintes 20 (vinte) entidades:
a) Iberopticas, Lda., em 21-12-2017;
b) Centro Óptico Ibérico, Lda., em 21-12-2017;
c) Dimbird Optical House, Unipessoal Lda., em 21-12-2017 e 24-01-2018;
d) Cardoso da Cruz & Cruz, Lda., em 21-12-2017, 12-03-2018 e 08-08-2018;
e) Vision For You, Lda., em 21-12-2017;
f) Fun Display, Lda., em 21-12-2017;
g) I Flor C Unipessoal, Lda., em 21-12-2017 e 22-12-2017;
h) Meia Viagem, Lda., em 21-12-2017;
i) Esonor - Empresa de Serviços e Ópticas do Norte, Lda., em 21-12-2017;
j) Olharlongo, Lda., em 22-12-2017 e 24-01-2018;
k) Superhubby Investimentos Comerciais, Lda., em 07-02-2018;
l) Rêgo & Palhinhas, Lda., em 02-03-2018;
m) Veja Pelo Oculo Lda., em 02-03-2018;
n) Osuya Asset Portugal Lda., em 08-03-2018;
o) Puzzle - Comércio De Mobiliário, Lda., em 12-03-2018;
p) Beontime - Comércio de Relógios e Acessórios, Lda., em 20-03-2018;
q) Multiflaviae Optica, Lda. (Opticalia Chaves), em 20-03-2018;
r) Lebróptica, Artigos de Óptica, Lda., em 04-04-2018;
s) Yonos, Lda., em 08-08-2018;
t) Sociedade Ótica DB, Unipessoal, Lda., em 08-08-2018.
32) Em 05-07-2019, o Banco de Portugal dirigiu ao BNI EUROPA um e-mail com o seguinte teor: “No exercício das funções de supervisão que lhe estão legalmente cometidas, vem o Banco de Portugal solicitar, ao abrigo do disposto no nº 3 do art.º 120º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 292/98, de 31-12 a V. Exas. que lhe sejam disponibilizadas, no prazo de 2 dias úteis, cópias dos contratos assinados, no âmbito da parceria com a Parcela Já, Lda., com as seguintes entidades:
a) Visinvest Company, Lda. (…)
b) Posperargold, Lda. (…)
c) Esonor - Empresa de Serviços e Ópticas do Norte, Lda. (…)
d) N A S, Unipessoal, Lda. (…)
e) Velozláxia, Lda. (…)
f) Olharlongo, Lda. (…)”
33) Em resposta ao e-mail referido em 32), o BNI EUROPA, em 08-07-2019, informou o Banco de Portugal, do seguinte: “No âmbito do V/pedido sobre o processo infra indicado, somos a informar que não dispomos de cópias de contratos nem qualquer relação com nenhuma das entidades referidas. (…)”.
34) Tendo sido igualmente solicitado à PARCELA JÁ pelo Banco de Portugal, em 08-07-2019, a disponibilização de cópia dos contratos assinados no âmbito da parceria com o BNI EUROPA com os Aderentes mencionados nas alíneas a) a d) do ponto 32) supra, a PARCELA JÁ informou o Banco de Portugal, em 10-07-2019, de que “A Parcela Já não tem ainda à sua disposição as cópias dos contratos tripartidos com as entidades abaixo mencionadas, uma vez que o Banco BNI Europa até ao momento não nos fez chegar cópia dos mesmos. Em face do nosso pedido ao Banco BNI Europa para o envio dos mesmos, foi-nos comunicado “que estaria por dias” (…)”.
35) No âmbito da ação inspetiva realizada pelo BP às instalações do BNI EUROPA sitas na Av. Eng. Duarte Pacheco, Lisboa, em 08-10-2019, verificou-se que os contratos tripartidos celebrados entre o BNI EUROPA, a PARCELA JÁ e os Aderentes não se encontravam junto da PARCELA JÁ, mas sim junto do BNI EUROPA, para assinatura deste.
36) Em 08-10-2019 encontravam-se junto do BNI EUROPA os contratos tripartidos respeitantes aos seguintes Aderentes:
a) Visão Viva - Óptica e Saúde, Lda.
b) Vision For You, Lda.
c) R B M Unipessoal, Lda.
d) Roytur - Viagens e Turismo, Lda.
e) Rigor Cristalino, Unipessoal, Lda.
f) Puzzle Comércio de Mobiliário, Lda.
g) Prognóstico Rigoroso - Unipessoal Lda.
h) Optivisão - Óptica, Serviços e Investimento, S.A.
i) Olharlongo, Lda.
j) N A S, Unipessoal, Lda.
k) Lebróptica, Artigos de Óptica, Lda.
l) Fun Display, Lda.
m) Flying Scorpion, Lda.
n) Esonor - Empresa de Serviços e Ópticas do Norte, Lda.
o) Eleganteolhar, Unipessoal Lda.
p) D Rei - Comércio de Vestuário, Unipessoal Lda.
q) Dimbird Optical House, Unipessoal Lda.
r) Clínica Oftalmológica do Minho, Lda.
s) Centro Óptico Ibérico, Lda.
t) Cardoso da Cruz & Cruz, Lda.
u) Agência de Viagens Arco Íris, Lda.

Da Conduta da Parcela Já SP Z.O.O.

37) Pelo menos a partir de 22-11-2021, o sítio na internet www.parcelaja.pt, registado em nome da PARCELA JÁ, era utilizado pela sociedade polaca PARCELA JÁ, SP Z.O.O., sendo referido no separador "Informação Legal" que seria esta a sociedade "detentora" daquele sítio na internet.
38) De acordo com o registo comercial polaco, a sociedade denominada PARCELA JÁ SPÓLKA OGRANICZONA ODPOWIEDZIALNOSCIA (PARCELA JÁ, SP Z.O.O.) encontra-se devidamente registada no registo comercial desde 16-11-2019, não dispondo, contudo, de natureza financeira, e tem como responsável único AA….
39) A PARCELA JÁ, SP Z O. O. não se encontra, nem nunca se encontrou, registada junto do Banco de Portugal e, por conseguinte, habilitada para desenvolver atividades sujeitas à sua supervisão.

I. Publicidade a produtos de crédito

40) Em 11-02-2022, a PARCELA JÁ e a PARCELA JÁ, SP Z.O.O. apresentavam no referido sítio na internet, o slogan "Pague as suas compras com o seu cartão de crédito e sem juros", dando a conhecer o serviço que permitia aos clientes, através da utilização de um cartão de crédito, pagar bens ou serviços num conjunto de Aderentes e fracionar o pagamento dessa compra entre duas a seis prestações "sem juros ou outros custos associados".
41) A publicidade ao produto de crédito em causa - de parcelamento do pagamento de compras realizadas com cartão de crédito - era suscetível de gerar a convicção no público de que a PARCELA JÁ, SP Z.O.O. era um mutuante autorizado a conceder crédito.
42) Pelo menos até 15-07-2022, a língua principal da página continuava a ser o português (ao que acresciam as opções de língua inglesa e polaca), todos os Aderentes anunciados encontravam-se sedeados em Portugal e, nos contactos, continuava a ser fornecido um número português (+35121…).
43) Ao agirem da forma descrita, publicitando produtos de crédito, entre 11-02-2022 e 15-07-2022, a PARCELA JÁ e a PARCELA JÁ, SP Z.O.O. agiram livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que desenvolviam uma atividade para a qual não se encontravam autorizadas, conduta que sabiam ser proibida e punida por lei.

II. Exercício da actividade de factoring

44) Os contratos realizados, entre 03-07-2020 e 31-12-2021, entre os Aderentes e a PARCELA JÁ, SP Z O. O. eram bipartidos, tendo deixado de existir qualquer referência ao BNI EUROPA.
45) Era a PARCELA JÁ, SP Z.O.O. que fazia a avaliação do cliente em sede de know your customer e era também quem adquiria os valores a receber pelos comerciantes diretamente aos mesmos, atuando como cessionário.
46) A conta com o IBAN n.º PT5000…, detida pela PARCELA JÁ, SP Z O. O. junto do Banco Comercial Português, S.A., entre 03-07-2020 e 31-12-2021, registou os seguintes movimentos:
a) 357 (trezentos e cinquenta e sete) movimentos a crédito, no valor total de € 1.206.455,97 (um milhão, duzentos e seis mil, quatrocentos e cinquenta e cinco euros e noventa e sete cêntimos), dos quais se destacam:
i. 324 (trezentos e vinte e quatro) movimentos, no valor global de € 895.652,46 (oitocentos e noventa e cinco mil, seiscentos e cinquenta e dois euros e quarenta e seis cêntimos), provenientes da instituição de pagamentos sueca Bambora AB (que, à data, não se encontrava autorizada em Portugal) relativa à cobrança em bloco dos pagamentos dos clientes, com uma regularidade quase diária (com início em fevereiro de 2021);
ii. 7 (sete) movimentos, no valor global de € 932,85 (novecentos e trinta e dois euros e oitenta e cinco cêntimos) provenientes da instituição de pagamento portuguesa Ifthenpay, Lda (doravante, "Ifthenpay"); 15 (quinze) movimentos, no valor global de € 306.049,15 (trezentos e seis mil quarenta e nove euros e quinze cêntimos) provenientes da PARCELA JÁ;
iii. 9 (nove) movimentos, no valor global de € 3.819,51 (três mil, oitocentos e dezanove euros e cinquenta e um cêntimo), provenientes 8 (oito) Aderentes distintos.
b) 707 movimentos relevantes a débito, no valor total de € 1.179.894,20 (um milhão, cento e setenta e nove mil, oitocentos e noventa e quatro euros e vinte cêntimos), dos quais se destacam:
i. 474 (quatrocentos e setenta e quatro) movimentos, no valor global de € 226.944,19 (duzentos e vinte e seis mil, novecentos e quarenta e quatro euros e dezanove cêntimos), destinados a diversos Aderentes (a primeira em 04-11-2020 e a última em 10-02-2021);
ii. 231 (duzentas e trinta e um) movimentos, no valor global de € 952.454,41 (novecentos e cinquenta e dois mil, quatrocentos e cinquenta e quatro euros e quarenta e um cêntimo), destinados a Aderentes, com os descritivos "PAGAMENTO TRANSFERENCIAS - AAAAMMDD-XXXXXX" (a primeira em 26-01-2021 e a última em 30-12-2021);
iii. 1 (um) movimento no valor de € 348 (trezentos e quarenta e oito euros) para a PARCELA JÁ.
47) Os movimentos a débito, tendo como beneficiários os Aderentes - para pagamento das compras parceladas pelos clientes finais - passaram a ser efetuados a partir da conta da sociedade PARCELA JÁ, SP Z O. O.
48) No que respeita aos recebimentos das parcelas pagas pelos clientes finais, verificou-se que foram operacionalizados com recurso à Evo Payments, que, até Fevereiro de 2021, creditou os mesmos na conta da PARCELA JÁ.
49) E, a partir de Fevereiro de 2021, começaram a ser recebidos idênticos pagamentos na conta da PARCELA JÁ, SP Z.O.O. junto do Millennium BCP, através da instituição de pagamentos Bambora AB.
50) Da análise aos movimentos financeiros, conclui-se que a atividade de concessão de crédito, sob a designação "PARCELA JÁ", passou a ser desenvolvida mediante a atuação da PARCELA JÁ, SP Z.O.O.
51) Ao agir da forma descrita, concedendo crédito sem se encontrar habilitada para o efeito, entre 03-07-2020 e 31-12-2021, a PARCELA JÁ, SP Z O.O. agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que desenvolvia uma atividade para a qual não se encontrava autorizada, conduta que sabia ser proibida e punida por lei.

III. Contribuição da Parcela Já para o exercício da actividade da Parcela Já SP Z.O.O.

52) Da análise à conta com o IBAN n.º PT50000…, detida pela PARCELA JÁ junto do Novo Banco, verificaram-se, no período compreendido entre 02-11-2020 e 10-01-2022, os seguintes movimentos:
469 (quatrocentos e sessenta e nove) movimentos a crédito, no valor total de € 717.985,09 (setecentos e dezassete mil, novecentos e oitenta e cinco euros e nove cêntimos), dos quais se destacam:
a) 75 (setenta e cinco) movimentos, no valor global de € 327.431,03 (trezentos e vinte e sete mil, quatrocentos e trinta e um euros e três cêntimos), provenientes da instituição de pagamento Evo Payments;
b) 183 (cento e oitenta e três) movimentos, no valor global de € 36.593,11 (trinta e seis mil, quinhentos e noventa e três euros e onze cêntimos), provenientes da instituição de pagamento Ifthenpay;
c) 38 (trinta e oito) movimentos, no valor global de 55.694,40 (cinquenta e cinco mil, seiscentos e noventa e quatro euros e quarenta cêntimos) com o descritivo "PROCESSAMENTO SDD PARCELA JÁ - NIS AAAAMMDD00000XXX";
d) 89 (oitenta e nove) movimentos no valor global de € 9 117,63 (nove mil, cento e dezassete euros e sessenta e três cêntimos) provenientes de particulares e Aderentes.
53) Na sequência das transações realizadas através do terminal de pagamento da PARCELA JÁ, era enviada, para o responsável do Aderente, uma mensagem de correio eletrónico com a confirmação da transação e com a indicação das comissões a descontar no valor de cessão (taxa de desconto e comissão de processamento).
54) A morada constante na assinatura da mensagem de correio eletrónico de confirmação da transação era a da PARCELA JÁ (Av. da República, n.º 48-B, 6º, 1050-195 Lisboa), e não a morada da PARCELA JÁ, SP Z.O.O.
55) Era a PARCELA JÁ que faturava mensalmente aos Aderentes o valor relativo à disponibilização dos terminais utilizados para realizar as transações, pelo que aqueles equipamentos eram sua propriedade.
56) Ao agir da forma descrita, facultando os meios tecnológicos indispensáveis à prossecução da atividade financeira ilícita da PARCELA JÁ, SP Z.O.O., entre 03-07-2020 e 31-12-2021, a PARCELA JÁ agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

Da Conduta de AA…
I. Enquanto titular do órgão de administração da Parcela Já

57) AA… é sócio e o único gerente da PARCELA JÁ.
58) AA…, enquanto titular do órgão de administração da PARCELA JÁ, sabia das operações de cessão de crédito levadas a cabo pela PARCELA JÁ, entre 28-09-2017 e 23-10-2020, sem para tal estar devidamente autorizada pelo BP, e não diligenciou pela cessação de tal comportamento.
59) Ao agir da forma descrita, AA…, enquanto titular do órgão de administração da PARCELA JÁ, entre 28-09-2017 e 23-10-2020, agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que contribuía causalmente para o desenvolvimento de uma atividade para a qual a PARCELA JÁ não se encontrava autorizada, conduta que sabia ser proibida e punida por lei.
60) AA…, enquanto titular do órgão de administração da PARCELA JÁ, sabia ainda do contributo da PARCELA JÁ nas operações de cessão de crédito levadas a cabo pela PARCELA JÁ, SP Z O. O., entre 03-07-2020 e 31-12-2021, sem para tal estar devidamente autorizada pelo do Banco de Portugal, e não diligenciou pela cessação de tal comportamento.
61) Ao agir da forma descrita, AA…, enquanto titular do órgão de administração da PARCELA JÁ, entre 03-07-2020 e 31-12-2021, agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a PARCELA JÁ contribuía causalmente para o desenvolvimento de uma atividade para a qual a PARCELA JÁ, SP Z.O.O. não se encontrava autorizada, conduta que sabia ser proibida e punida por lei.
62) AA…, enquanto titular do órgão de administração da PARCELA JÁ, sabia igualmente que a PARCELA JÁ, SP Z.O.O., entre 11-02-2022 e 15-07-2022, publicitava indevidamente um produto de crédito no sítio na internet da PARCELA JÁ, sem que para essa atividade estivesse esta devidamente autorizada pelo Banco de Portugal, e não diligenciou pela cessação de tal comportamento.
63) Ao agir da forma descrita, AA…, enquanto titular do órgão de administração da PARCELA JÁ, entre 11-02-2022 e 15-07-2022, agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que contribuía causalmente para a publicidade indevida de produtos de crédito por entidades que não estavam autorizadas pelo BP, conduta que sabia ser proibida e punida por lei.
         
II. Enquanto titular do órgão de administração da Parcela Já SP ZOO

64) AA… é igualmente único responsável da PARCELA JÁ, SP Z.O.O.
65) AA…, enquanto titular do órgão de administração da PARCELA JÁ, SP Z O. O., sabia das operações de cessão de crédito levadas a cabo pela PARCELA JÁ, SP Z O. O., entre 03-07-2020 e 31-12-2021, sem para tal estar devidamente autorizada pelo Banco de Portugal, e não diligenciou pela cessação de tal comportamento.
66) Ao agir da forma descrita, AA…, enquanto titular do órgão de administração da PARCELA JÁ, SP Z.O.O., entre 03-07-2020 e 31-12-2021, agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que contribuía causalmente para o desenvolvimento de uma atividade para a qual a PARCELA JÁ, SP Z.O.O. não se encontrava autorizada, conduta que sabia ser proibida e punida por lei.
67) AA…, enquanto titular do órgão de administração da PARCELA JÁ, SP Z.O.O., sabia igualmente que a PARCELA JÁ, SP Z.O.O. publicitava indevidamente um produto de crédito no sítio na internet da PARCELA JÁ, entre 11-02-2022 e 15-07-2022, sem para essa atividade estivesse esta devidamente autorizada pelo BP, e não diligenciou pela cessação de tal comportamento.
68) Ao agir da forma descrita, AA…, enquanto titular do órgão de administração da PARCELA JÁ, SPZ.O.O., entre 11-02-2022 e 15-07-2022, agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que contribuía causalmente para a publicidade indevida de produtos de crédito por entidades que não estavam autorizadas pelo BP, conduta que sabia ser proibida e punida por lei.
69) A Parcela Já, Lda. apresentou um resultado líquido no ano de 2022 no valor de € 85 634,23.
70) AA… apresentou um rendimento colectável no ano de 2022 no valor de € 26 827,86.
71) Não há registo de antecedentes contra-ordenacionais por parte dos recorrentes.”

Para além dos que ficaram descritos, o tribunal de primeira instância não considerou provados quaisquer outros factos.

b) Objecto do recurso:
Como decorre do disposto nos arts. 402.º, 403.º e 412.º, todos do CPP, as conclusões do recorrente delimitam o recurso apresentado, estando vedado ao tribunal hierarquicamente superior àquele que proferiu a decisão recorrida conhecer de questões ou de matérias que não tenham sido suscitadas, com excepção daquelas que sejam de conhecimento oficioso.
Isto significa compete ao sujeito processual, que se mostra inconformado com a decisão judicial, indicar, nas conclusões do recurso, que segmento ou que segmentos decisórios pretende ver reapreciado(s), delimitando o recurso quanto aos seus sujeitos e/ou quanto ao seu objecto. 
A delimitação (objectiva e/ou subjectiva) do recurso condiciona a intervenção do tribunal hierarquicamente superior, que se deve cingir à apreciação e à decisão das matérias indicadas pela parte recorrente, com excepção de eventuais questões que se revelem de conhecimento oficioso.
 Está vedado ao tribunal de recurso proceder a uma reapreciação de questões que não tenham sido suscitadas e, por consequência, os seus poderes de cognição encontram-se delimitados pelo recurso interposto pelo sujeito processual, sem prejuízo daquelas que se revelem de conhecimento oficioso.
Os recursos não se destinam a proceder a um novo julgamento de todo o objecto da causa, antes visam a reapreciação de questões anteriormente decididas, mediante o impulso processual do sujeito que se mostre afectado pela decisão.  
In casu, os recorrentes “Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA… vieram requerer que seja determinada a suspensão da execução das sanções aplicadas, para tanto alegando, em suma, que não têm antecedentes em matéria contraordenacional, que actuaram impulsionados pela demora na implantação prática da parceira com a sociedade “BNI Europa” e que não foram causados danos ao sistema bancário ou financeiro.
O recorrido “Banco de Portugal” veio defender, muito em suma, que as acentuadas necessidades de prevenção geral, associadas às infracções em causa, impedem a suspensão da execução das sanções aplicadas.
Por seu turno, o Ministério Público, junto do tribunal da primeira instância, defendeu, a este propósito, que a pretendida suspensão da execução das coimas únicas aplicadas não satisfaz as necessidades de prevenção geral, que o recurso deverá ser julgado improcedente e que deverá ser mantida a sentença recorrida.
Apreciando e decidindo:
Estabelece o art.º 223.º, n.º 1, DL n.º 298/92, de 31-12 (“Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras”), que “o conselho de administração do Banco de Portugal pode suspender, total ou parcialmente, a execução da sanção, sempre que conclua que dessa forma são ainda realizadas de modo adequado e suficiente as finalidades de prevenção”.
Deste dispositivo resulta que o legislador admitiu, de modo expresso, a suspensão da execução das sanções aplicadas decorrentes do cometimento de ilícitos de mera ordenação social previstos pelo DL n.º 298/92, de 31-12.
Reconheceu essa competência ao conselho de administração do Banco de Portugal durante a fase administrativa do processo de contra-ordenação, o que não obsta à sua reapreciação por parte do tribunal, caso a decisão condenatória venha a ser objecto de impugnação judicial.
Essa suspensão não se encontra dependente do preenchimento de pressupostos de ordem formal relativos à gravidade da contra-ordenação, à coima aplicável ou ao montante da coima imposta ao agente.  
Deste modo, admite-se que a sanção possa vir a ser suspensa na sua execução, independentemente de quaisquer limites mínimo ou máximo da coima previstos na lei, do montante da coima aplicada ao agente e mesmo em casos de infracções especialmente graves (vide art.º 211.º do DL n.º 298/92).
Todavia, encontra-se dependente do preenchimento de um pressuposto de ordem material, impondo-se que a suspensão da execução salvaguarde, de modo adequado e suficiente, as “finalidades de prevenção”.
Em termos gerais, distingue-se a prevenção geral (que visa reforçar a confiança da comunidade na validade das normas jurídicas e evitar o cometimento de novas infracções por parte das pessoas em geral) da prevenção especial (que visa impulsionar o agente para o cumprimento das normas jurídicas e dissuadi-lo do cometimento de novos delitos).  
Ou seja, a suspensão encontra-se dependente de se conseguir formular um juízo de prognose relativamente ao cumprimento futuro das normas jurídicas, quer por parte do agente, quer por parte da sociedade em geral.
Muito embora o art.º 223.º, n.º 1, DL n.º 298/92 não indique quaisquer factores de ponderação, para esse juízo de prognose deve levar-se em conta a globalidade dos factos apurados, muito em particular a personalidade do agente, o grau de culpa e todas as circunstâncias relativas à infracção.   
No caso vertente, adiantando-se, desde já, que se concorda com o prognóstico realizado pela sentença recorrida, afigura-se que a suspensão da execução das coimas (assim como da sanção acessória) não acautela, de modo suficiente e adequado, as finalidades preventivas da condenação.
Como a própria decisão recorrida deixou assinalado, os factos imputados aos recorrentes “Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA… não consubstanciam um acontecimento esporádico, pontual ou meramente ocasional, que levaria a desvalorizar a gravidade dos ilícitos cometidos.
Ao invés, resulta dos factos provados um comportamento delituoso que persistiu ao longo do tempo, que se prolongou desde o dia 28-09-2017 até ao dia 15-07-2022, ou seja, durante aproximadamente 5 anos, vindo muitos deles a ser praticados quando já se encontra em curso a investigação levada a cabo pelo “Banco de Portugal”. 
Deste modo, afigura-se que os recorrentes “Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA… denotaram uma postura arredia ou contrária ao direito, muito em particular violadora do princípio da exclusividade, na medida em que desenvolveram uma actividade financeira, sem se encontrarem habilitados para o efeito, durante o longo período temporal acima delimitado.
Essa circunstância demonstrativa de uma elevada ilicitude e culpa, também denota que os recorrentes “Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA… têm propensão para a prática de comportamentos antijurídicos, que persistiram ao longo do tempo e que inclusive não cessaram com a investigação desencadeada pelo “Banco de Portugal”, como, aliás, anota a sentença recorrida.
Ainda que não possuam antecedentes contra-ordenacionais, essa (persistente) energia delituosa leva este tribunal a recear que, de futuro, possam vir a assumir comportamentos semelhantes, incorrendo na prática de novos ilícitos de mera ordenação social, caso venham a ser confrontados com outras exigências legais, que, nesse momento, não consigam cumprir.
Os factos provados são demonstrativos de indiferença perante as normas jurídicas ordenadoras das matérias em causa, o que leva a concluir que não ficariam devidamente salvaguardadas as exigências de prevenção especial, caso este tribunal de recurso viesse a optar pela suspensão da execução das coimas (e/ou das sanções acessórias) que foram aplicadas.  
Por outro lado, ao nível da prevenção geral, a tutela das normas jurídicas violadas e a necessidade de reforço da sua validade não se compadece com a suspensão da execução das sanções aplicadas, de modo a se transmitir a todos os operadores que a actividade financeira se encontra sujeita a regras e que, a sua inobservância, determina a aplicação de sanções.
Nesta perspectiva, impõe-se reforçar junto da comunidade em geral o princípio de que o empreendimento de comportamentos contra-ordenacionais, durante diversos anos, desencadeia o cumprimento (efectivo) das coimas e/ou das sanções acessórias previstas na lei, com o intuito de assegurar a confiança e a credibilidade devidas ao sistema financeiro.
Isto significa que a longa duração das infracções cometidas, a sua gravidade intrínseca, a persistência delituosa, a intensidade do dolo (dolo directo) e o prejuízo causado à confiança e à credibilidade do sistema financeiro, levam a que não se consiga formular um juízo de prognose favorável à salvaguarda das finalidades preventivas da condenação, mediante a simples ameaça de cumprimento efectivo das sanções aplicadas.
Deste modo, subscreve-se a sentença proferida pelo tribunal a quo quando se afirma que “(…) a suspensão das coimas aplicadas não irá assegurar de forma adequada e suficiente as finalidades de prevenção, razão pela qual se conclui que não estão reunidas as condições para a sua aplicação (…)”.
Ou, conforme sublinhou o Banco de Portugal, “(…) é imperativo que o público percecione como absolutamente intolerável o exercício por entidades não habilitadas para o efeito da atividade de factoring e operações de crédito suscetíveis de criar no público a convicção (errada) de que está perante uma entidade autorizada a desenvolver atividade no sector financeiro, com o inerente e acentuado risco de avultadas perdas e da criação de desconfiança no público em geral sobre o sector financeiro como um todo.”
Em face do exposto, o recurso apresentado pelos recorrentes “Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA… deverá ser julgado improcedente e, em consequência, deverá ser confirmada a sentença recorrida, por se entender que, a simples censura do facto e ameaça da sanção, não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades (preventivas) subjacentes à condenação.
Improcede, pois, nesta parte, o recurso interposto.
O mesmo se diga, mutatis mutandis, relativamente ao pedido formulado para a não aplicação da sanção acessória de divulgação da condenação.

Recorde-se que a sentença proferida pelo tribunal a quo manteve a imposição ditada pelo Banco de Portugal para que as condenações fossem publicitadas no seu site, sem recurso ao regime do anonimato.
De acordo com o disposto no art.º 227.º-A, n.º 3, do DL n.º 298/92 (na redacção introduzida pela Lei n.º 23-A/2015, de 26-03), que o Banco de Portugal pode não divulgar a decisão condenatória caso se demonstre que “(…) a divulgação da identidade da pessoa singular ou colectiva condenada é desproporcional face à gravidade da infracção em causa”.
Os recorrentes “Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA… alegaram, em abono desta pretensão, em termos muito genéricos, que a sanção acessória aplicada poderia provocar “confusão no mercado” e o tribunal de primeira instância não avaliou, convenientemente, a ilicitude concreta dos factos praticados, a culpa dos agentes e as exigências de prevenção.
 Os motivos invocados, em termos muito genéricos, afiguram-se insuficientes para se demonstrar o requisito da desproporcionalidade previsto pelo n.º 3 do art.º 227.º-A do DL n.º 298/92, ou seja, para o Banco de Portugal não divulgar ou para divulgar em regime de anonimato a condenação em causa. 
Em concreto, nada é alegado que convença este tribunal de recurso que a aplicação desta sanção acessória se revela desproporcional perante uma reduzida ou mitigada gravidade dos ilícitos de mera ordenação social em referência nestes autos.
A este propósito, importa assinalar que os recorrentes “Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA… foram condenados, para além do mais, pela prática de contra-ordenações p. e p. pelo art.º 211.º, n.º 1, al. a), do DL n.º 298/92, de 31-12, ilícitos de mera ordenação social que são considerados, pelo próprio legislador, como sendo “especialmente graves”.
Foram ainda condenados pela prática de outras contra-ordenações dolosas, desta feita, p. e p. pelo art.º 210.º, al. c), do DL n.º 298/92, de 31-12, que são qualificadas como “infracções graves” pelo próprio legislador.
Deste modo, atendendo à gravidade das infracções, atribuída pelo próprio legislador, associada às demais circunstâncias acima enunciadas (v.g. longo período de duração das infracções, persistência delituosa, intensidade do dolo, prejuízo causado à confiança e à credibilidade do sistema financeiro) nenhuma censura merece a sentença recorrida quando manteve a divulgação da condenação ditada pelo Banco de Portugal, sem recurso a anonimato.
Isto significa que os recorrentes “Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA… não lograram demonstrar, como se impunha, existir uma desproporcionalidade decorrente da divulgação da sua identidade, sem anonimato, que viesse a desaconselhar a aplicação desta sanção acessória.
Em face do exposto, improcede também, nesta parte, o recurso apresentado pelos recorrentes “Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA…, pelo que deverá se confirmada, integralmente, a sentença recorrida.

III – DECISÃO:
Em face do exposto, acordam os juízes que integram a secção da propriedade intelectual, concorrência, regulação e supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso interposto pelos recorrentes “Parcela Já, Lda.”, “Parcela Já SP Z.O.O.” e AA… e, em consequência, decide-se confirmar integralmente a sentença proferida pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão – Juiz 1.
Custas a cargo dos recorrentes, fixando-se em 3 UCs. a taxa de justiça devida (art.º 513.º, n.ºs 1 e 3, do CPP, em conjugação com o art.º 8.º, n.º 9, do RCP e com a Tabela III anexa a este diploma legal).

Lisboa, 28 de Maio de 2025
Paulo Registo
Alexandre Au-Yong Oliveira
Bernardino Tavares