INSTRUÇÃO
PROCESSO RESPEITANTE A MAGISTRADO
DESPACHO DE NÃO PRONÚNCIA
USURPAÇÃO DE FUNÇÕES
MAGISTRADOS JUDICIAIS
FUNÇÃO JURISDICIONAL
REQUERIMENTO DE ABERTURA DE INSTRUÇÃO
OBJETO DO PROCESSO
MEIOS DE PROVA
INDEFERIMENTO
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
RECLAMAÇÃO
FUNDAMENTAÇÃO
ISENÇÃO DE CUSTAS
Sumário


I. Nos termos do art. 287.º, n.º 2, do CPP o requerente da instrução pode indicar os actos de instrução que pretende sejam levados a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que através de uns e outros se espera provar.
II. Os actos de instrução, são apenas os que o juiz entenda levar a cabo (art. 289.º do CPP), o juiz indefere os actos requeridos que entenda não interessarem desde logo à instrução (art. 291.º do CPP), e os “actos e diligencias de prova praticados no inquérito só são repetidos no caso de não terem sido observadas as formalidades legais ou quando a repetição se revelar indispensável à realização das finalidades da instrução” – art. 291.º, n.º 3, do CPP.
III. Obrigatório é apenas a audição do arguido e da vítima a seu pedido (o que não ocorreu) e apenas esta gera a nulidade, dependente da arguição a fazer até ao encerramento do debate instrutório (art. 120.º, n.os 1, al. d) e 2 al. c), do CPP).
IV. Do despacho que indefere os meios de prova requeridos no RAI não cabe recurso (art. 291.º, n.º 2, do CPP), mas apenas reclamação.
V. Se no despacho são elencados os factos indiciados e a final se consigna que os restantes factos alegados no requerimento de abertura de instrução, não foram tidos em consideração, por se mostrarem irrelevantes para a boa decisão da causa, por serem conclusivos ou por se tratar de considerações pessoais e/ou matéria de direito, demonstrando que foram ponderados e analisados, não ocorre falta de fundamentação por ausência de indicação dos factos não indiciados.
VI. Se apenas foram investigados nem relação ao arguido determinados factos e só sobre eles se pronunciou no seu despacho de arquivamento o MP, apenas estes podem ser objecto de instrução, pois dela não podem fazer parte factos não investigados nem objecto de inquérito.
VII. É função do inquérito e razão da sua obrigatoriedade, assegurar que ninguém será pronunciado ou acusado sem que a sua responsabilidade penal (nos factos imputados) seja investigada, equacionada e decidida pelo titular da acção penal, e sem que nesse âmbito possa fazer valer os seus direitos de participação e de defesa assegurados pelo processo penal. É essa a função de garantia, do caracter obrigatório (art. 262.º, n.º 2, do CPP), do inquérito.
VIII. Se o juiz, despacha no processo de um colega requerimento que a si próprio é dirigido, declarando-se que não cabe nas suas funções apreciar o mesmo e desse modo não interfere na resolução do conflito de interesses entre as partes e que através do processo procuram solucionar, não há usurpação da função jurisdicional, pois não decidiu do mérito nem sequer tomou posição sobre qualquer questão meramente procedimental, e muito menos se arrogou expressa ou tacitamente, possuir condições para proferir decisão jurisdicional.
IX. Se o juiz litiga nessa qualidade e o processo nasceu por virtude do exercício dessas funções está isento de custas – art. 4.º, al. c), do RCP.

Texto Integral


Acordam em conferência os Juízes Conselheiros na 3ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça

Na instrução nº 48/23.7... que correu termos na 5ª Secção Criminal deste Supremo Tribunal de Justiça em que é arguido juiz desembargador AA,

E interveio como assistente BB, juíza de direito

Foi, por despacho o Mº Juiz de Instrução Juiz Conselheiro neste Supremo Tribunal, de 24.02.2025, proferido o despacho de não pronuncia e decidido:

“De harmonia com o artigo 308.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, não pronuncio o arguido AA, pela prática de um crime de Denúncia Caluniosa, previsto e punível pelo artigo 365.º, n.º 1, do Código Penal, nem por um crime de usurpação de funções, previsto e punível pelo artigo 358.º, do mesmo diploma legal.


Custas pela assistente, fixando-se a taxa de justiça pelo seu mínimo legal”

+

Desta decisão recorre a Mª assistente, a qual no final da sua motivação apresenta as seguintes conclusões:

“1. Da nulidade e irregularidade da decisão de não pronúncia pela ausência / insuficiência de instrução e pela falta de devida fundamentação legal do despacho de não pronúncia – cfr. conjugação do disposto nos artºs 97º, 123º, 307º, 308º, 309º, 379º todos do CPP e artº 205º da CRP;

2. O Despacho de não pronúncia, por se tratar de despacho final do processo tem de conter no mínimo a enumeração e narração autónoma e percetível, ainda que, sintética, de todos os factos participados e de cuja instrução se requereu, que tenham sido considerados não suficientemente indiciados – o que, a decisão que ora se impugna, datada de 24.02.2025 violou – irregularidade clarividente, que se invoca, ao abrigo da conjugação do disposto nos artºs 308º nº 2 in fine, 283º nº 3 e 123º todos do CPP.

3. Violação grosseira do Princípio do processo equitativo e desigualdade manifesta de tratamento entre os sujeitos processuais – a assistente e o arguido – cfr. conjugação dos artºs 13º da CRP e 6º da CEDH.

4. Do direito da assistente ao “duplo grau de jurisdição” e à plenitude da jurisdição efetiva de defesa – cfr. artºs 145º nº. 1 e 292º nº. 2 ambos do CPP e artºs 32º nºs 1 e 7 e 20º nºs 1 e 4 ambos da CRP.

5. Da total omissão de pronúncia sobre o crime de difamação agravada na decisão de “não pronúncia” – cfr. al.c) do nº. 1 do artº 379º do CPP

6. Quanto ao crime de usurpação de funções – considerando a prova documental inequivocamente, produzida, quanto à sua prática, e a conclusão alcançada pela decisão ora recorrida, constata-se a contradição do seu arrazoado e da conclusão atingida – cfr. conjugação do preceituado nos artºs 307º nº1, 308º nº. 2 ambos do CPP e al. c) do nº. 1 do artº 668º, 729º nºs 2 e 3 e 722º nº 2 todos do CPC.

7. De acordo com a conjugação do preceituado nos artºs 4º nº. 1 al. c) do RCP, cfr. Acórdão do TC 130/2019, e ainda, artºs 179º e 17º nº1 al. f) ambos do EMJ, a ora assistente, litiga na qualidade de juíza de direito e na sequência do exercício das suas funções, pelo que, beneficia de isenção objetiva de custas processuais, onde se inclui a taxa de justiça, e as custas que lhe foram agora nessa Instância aplicadas por esse Colendo Tribunal.

8. NESTA SEDE DE DEBATE INSTRUTÓRIO, CUMPRE SOMENTE APURAR INDÍCIOS E CONCLUIR SE OS MESMOS, SÃO OU NÃO, SUFICIENTES, PARA SUBMETER O ARGUIDO A JULGAMENTO. Não se carece de “indícios bastantes”, mas tão somente, suficientes.

9. NO QUE CONCERNE AO CRIME DE DIFAMAÇÃO AGRAVADO, O ARGUIDO, QUE É JUIZ E JUIZ PRESIDENTE DA COMARCA DE SETÚBAL, NÃO SE LIMITOU A UMA MERA PARTICIPAÇÃO DA ORA ASSISTENTE, PARA O CSM, POIS, NÃO DEIXOU DE ADJETIVAR E QUALIFICAR A CONDUTA DA SUA COLEGA, COM AS SEGUINTES EXPRESSÕES, QUANTO AO RELACIONAMENTO DESTA E DOS SEUS OFICIAIS DE JUSTIÇA:

- ESCREVEU NA PARTICIPAÇÃO ENVIADA AO CSM QUE O “CLIMA ERA DE CRISPAÇÃO” E DE “ROMPMENTO DA RELAÇÃO HARMONIOSA” (TERMOS SEUS) E QUE ESTE COMPORTAMENTO QUE OPINOU DA ASSISTENTE “TERÁ ESTADO NA ORIGEM DAS BAIXAS MÉDICAS DOS OFICIAIS DE JUSTIÇA” (CONCLUSÃO SUA), CONCLUINDO TAMBÉM JUNTO DA SUA PARTCIPAÇÃO PARA O CSM, SE TAL, NÃO SERIA DE CONSTITUIR INFRAÇÃO DISCIPLINAR (OUTRA INSINUAÇÃO SUA);

10. A REFERIDA ADJETIVAÇÃO É FALSA E DIFAMATÓRIA COMO O ARGUIDO NÃO PODIA DEIXAR DE IGNORAR, TANTO MAIS, QUE, NÃO ELENCOU QUAISQUER FACTOS QUE TIVESSE PRESENCIADO E OU TIVESSE TIDO CONHECIMENTO DIRETO, QUE SUSTENTASSE, TAIS JUÍZOS DE VALOR OPINATIVOS.

11. SE AS BAIXAS DOS OFICIAIS DE JUSTIÇA JÁ VINHAM DE 2020 E A ASSISTENTE SÓ TOMOU POSSE, NAQUELE TRIBUNAL DE SETÚBAL, EM SETEMBRO DE 2022, IMPOSSÍVEL SE REVELAVA SER A ASSISTENTE A CAUSA DAS DITAS BAIXAS MÉDICAS, DESDE LOGO, POR RAZÕES LÓGICAS E CRONOLÓGICAS.

12. FACTOS QUE O ARGUIDO NÃO PODIA IGNORAR PORQUE JÁ ANTES E À DATA DOS MESMOS, ERA O JUIZ PRESIDENTE DAQUELE TRIBUNAL E TINHA O DEVER FUNCIONAL DE O SABER.

13. SE POR OUTRO LADO, ATÉ ALI, EXISTIA UM CLIMA HARMONIOSO, COMO EXPLICA O ORA ARGUIDO, COMO ENTÃO JÁ NESSA ÉPOCA, EXISTIAM TANTAS BAIXAS MÉDICAS DE TODOS OS SRS. OFICIAIS DE JUSTIÇA, ANTES MESMOS DE CHEGAR AO TRIBUNAL A ORA ASSISTENTE, OU SEJA 2 ANOS ANTES.

14. A PARTICIPAÇÃO É TAMBÉM INEQUIVOCAMENTE DIFAMATÓRIA, PORQUE CONCLUSIVA, E AO ARGUIDO, SENDO JUIZ, TAL NÃO PODIA SER DESCONHECIDO, EM VIRTUDE DO SEU DEVER ACRESCIDO, DECORRENTE DO EXERCÍCIO DA JUDICATURA.

15. ALIÁS, SE DÚVIDAS AINDA PUDESSEM SUBSISTIR, QUANTO AO PROPÓSITO DO ARGUIDO, IMPÕE-SE SALIENTAR, QUE, NÃO CUMPRIU O DEVER DE DAR O DEVIDO CONHECIMENTO À SUA COLEGA ASSISTENTE, DAQUILO QUE PARTICIPOU AO CSM, E EM CONSEQUÊNCIA, NÃO A TER QUESTIONADO SOBRE O ASSUNTO, PREVIAMENTE, TENDO ESTA SABIDO DA PARTICIPÇÃO, SOMENTE A 16.12.2022, QUANDO FOI CONFRONTADA PELO SR. INSPETOR JUDICIAL DO CSM. TUDO COMO NÃO NEGOU JUNTO DO SR. INSPETOR JUDICIAL DO CSM.

16. LOGO, NÃO FEZ OPERAR NEM O CUMPRIMENTO DA URBANIDADE ENTRE JUÍZES QUE SE IMPUNHA, NEM DO CONTRADITÓRIO, NEM DO INQUISITÓRIO/INVESTIGAÇÃO, QUE AQUI SE IMPUNHA, PORQUE, NUMA DAS PARTES ESTAVA UMA SUA COLEGA E NA OUTRA OFICIAIS DE JUSTIÇA, O QUE DETERMINAVA QUE PELO SEU DEVER FUNCIONAL DE JUIZ PRESIDENTE E COM COMPETENCIAS DISCIPLINARES SOBRE OS OFICIAIS DE JUSTIÇA, SE IMPUNHA QUE SE APURASSE O QUE SE PASSAVA E SE NÃO ASSISTIA RAZÃO ÀQUELES, CABIA-LHE ATUAR DISCIPLINARMENTE.

17. AO INVÉS, CONCLUIU SEM MAIS, PELA PARTICIPAÇÃO DA COLEGA ORA ASSISTENTE, E QUANTO AOS FUNCIONÁRIOS NÃO FEZ SE QUER PARTICIPAÇÃO DESTES PARA O COJ, O QUE DENOTA SEM MARGEM PARA DÚVIDAS QUE NO IMEDIATO CONCLUIU SEM MAIS, PELA CULPA DA COLEGA;

18. O QUE, APÓS EXAUSTIVA AVERIGUAÇÃO DO CSM SE VEIO A CONFIRMAR SER FALSO, O QUE TORNA AQUELA PARTICIPAÇÃO DIFAMATÓRIA, PORQUE LOGO “AB INITIO” QUALIFICATIVA DA AÇÃO DA ASSISTENTE E CONCLUSIVA, NEGATIVAMENTE, QUANTO À SUA PESSOA E AO SEU PROFISSIONALISMO, POSTO QUE, A PARTICIPAÇÃO ENVIADA PARA SE APURAR, JÁ FOI ELA EM SI MESMA, CARREGADA DA VERSÃO PESSOAL DO ORA ARGUIDO;

19. NESTA SENDA NÃO ESTRANHOU O ARGUIDO QUE ESTANDO A SER INVESTIGADA A SITUAÇÃO SUPRA REFERIDA NA SEQUÊNCIA DA SUA PARTICIPAÇÃO AO CSM, ALEGADO PROBLEMA ENTRE A ASSISTENTE E OS SENHORES OFICIAIS DE JUSTIÇA, TENHA TAMBÉM FICADO NA POSSE DE UMA GRAVAÇÃO ÁUDIO (DESCONHECENDO COMO E EM QUE TERMOS), DE UMA CONVERSA ENTRE A ASSISTENTE E UM SENHOR ADVOGADO, NÃO CUIDANDO O ARGUIDO DE SABER PREVIAMENTE, COMO E EM QUE CONDIÇÕES TAL GRAVAÇÃO FOI RETIRADA DO VISADO PROCESSO, NÃO ESTRANHANDO IGUALMENTE, QUE TAL ÁUDIO, FOSSE ALHEIO AO OBJETO DA PARTICIPAÇÃO QUE FEZ, E POR ÚLTIMO, NÃO QUESTIONANDO PORQUE NA GRAVAÇÃO SÓ SE OUVIA PRATICAMENTE A VOZ DA ORA ASSISTENTE, NÃO CUIDANDO DE A QUESTIONAR, MAIS UMA VEZ, E NÃO SE PREOCUPANDO EM VERIFICAR QUE O DITO ÁUDIO ESTAVA TRUNCADO E FALSIFICADO, E, LOGO O ENVIANDO EM COMPLEMENTO/ADITAMENTO Á PARTICIPAÇÃO, QUE JÁ A 29.11.2022 TINHA REMETIDO AO CSM;

20. TAMBÉM ESTA FACTUALIDADE É INDICIADORA DA FALSIDADE DO QUE PARTICIPAVA. CUMPRINDO APENAS REFERIR QUE O SENHOR ADVOGADO NESTA MATÉRIA, VISADO, NUNCA AO CSM PARTICIPOU DA ORA ASSISTENTE E QUE ESTES FACTOS FORAM IGUALMENTE AVERIGUADOS, E POR FIM, TAMBÉM IGUALMENTE ARQUIVADOS PELO CSM;

21. AQUI CHEGADOS, CUMPRE CHAMAR À COLAÇÃO O CONHECIDO FILME “HÁ LODO NO CAIS”, PORQUANTO, EXISTÍA NAQUELE TRIBUNAL UM MOVIMENTO SINDICALISTA OU PARTIDÁRIO APOSTADO EM PARALISAR O TRIBUNAL, NA CONCRETIZAÇÃO DESTE PROPÓSITO, NO QUAL, OS SRS OFICIAIS DE JUSTIÇA APOIADOS NOS SEUS SINDICATOS NUM ENGENDRADO PLANO DE FAZER UMA GREVE À LA CARTE, SEM QUE VISSEM DESCONTADOS OS SEUS VENCIMENTOS E NA CONCRETIZAÇÃO DESTE PLANO, FAZIAM CONCRETAMENTE O SEGUINTE, NÃO TRABALHAVAM, NÃO FAZIAM QUAISQUER ESCALAS DE SERVIÇOS MÍNIMOS, FECHAVAM POR COMPLETO AS PORTAS DO TRIBUNAL, FAZIAM PLENÁRIOS E REUNIÕES NAS SALAS DE AUDIÊNCIAS, NÃO CUMPRIAM E NÃO EXECUTAVAM OS DESPACHOS, COMO TAMBÉM, CONCLUIAM POUCOS OU NENHUNS PROCESSOS AO JUIZ, DEIXAVAM A UNIDADE DE PROCESSOS SEM QUALQUER FUNCIONÁRIO, NÃO CUMPRIAM OS MANDADOS EMITIDOS PARA RETIRADA DAS CRIANÇAS COM A URGÊNCIA QUE A LEI DETERMINA, DESAPARECIAM DO TRIBUNAL SEM CONHECIMENTO E/OU JUSTIFICAÇÃO AO JUIZ, A RAZÃO DA SUA AUSÊNCIA, ADULTERAVA-SE E FALSIFICAVA-SE AS ESTATÍSTICAS DO TRIBUNAL, LOGO ERA IMPOSSÍVEL QUE O ARGUIDO QUE SE ENCONTRAVA A PARTICIPAR EM TAIS REUNIÕES E A COMANDAR TAIS HOSTES, E SENDO JUIZ PRESIDENTE DAQUELE TRIBUNAL, IGNORASSE TAL FACTUALIDADE, E NÃO ACTUASSE COMO A LEI O EXIJE;

22. E AQUI RESIDE A VERDADEIRA MOTIVAÇÃO DO ARGUIDO PARA O QUE FEZ À ASSISTENTE, É NESTA FATUALIDADE AGORA RELATADA, E TAMBÉM, NO FACTO DE CERCA DE 15 DIAS ANTES A12.11.2022, TER ÍDO DESPACHAR NO PROCESSO DE INVENTÁRIO DA ORA ASSISTENTE, COM O PROPÓSITO DE PROTEGER QUEM TINHA O ATRASO CONSIDERÁVEL NA ELABORAÇÃO DO MAPA DE PARTILHA, NÃO HAVENDO QUALQUER ATRASO, DA PARTE DA ORA ASSISTENTE, NEM ANTES NEM DEPOIS, COMO TAMBÉM FICOU PROVADO NAS AVERIGUAÇÕES DO CSM, MAS SIM, UM ELEVADO INTERESSE EM BLOQUEAR A TRAMITAÇÃO CÉLERE DAQUELE CONCRETO PROCESSO QUE À JUSTIÇA CABIA DESCORTINAR PORQUE MOTIVO, ASSIM SE PASSAVA.

23. MAIS UMA VEZ NA PRÁTICA DESTE SEU CRIME O ARGUIDO ESTRAVASOU OS PODERES QUE A LEI LHE CONFERIU E TOMOU PARTIDO NUMA SITUAÇÃO NA QUAL, NÃO PODIA IGNORAR QUE A CULPA DO INUSITADO ATRASO DAQUELE PROCESSO DE MUITOS ANOS ERA DA ESCRIVÃ E DA SEÇÃO E NUNCA DA ASSISTENTE QUE ALI ACABARA DE CHEGAR, SENDO MANIFESTO QUE ESTA SUA CONDUTA É DE ENORME GRAVIDADE, POIS, ALÉM DE NÃO LHE SER PERMITIDA POR LEI SE DESTINAVA A OCULTAR A REFERIDA INÉRCIA DOS OFICIAIS DE JUSTIÇA E EM PARTICULAR DA ESCRIVÃ DE DIREITO, DESAUTORIZANDO COM A SUA CONDUTA A ASSISTENTE Á DATA TITULAR DO PROCESSO E, EM ÚLTMA ANÁLISE NÃO SERVIU DE TODO A JUSTIÇA E CONTINUA A NÃO SERVIR;

24. SENDO QUE O ARGUIDO NÃO PODIA IGNORAR QUE TINHA OUTROS MEIOS PARA

RESPONDER AO ADVOGADO RECLAMANTE NO INVENTÁRIO, QUE NÃO IR DESPACHAR AO PROCESSO, DO QUAL, NÃO ERA SEU TITULAR. E SE FOI DESPACHAR O PROCESSO COMO DEFENDE A DECISÃO INSTRUTÓRIA ORA IMPUGNADA, SEM QUALQUER FINALIDADE DE SE “LIMITAR A ESCLARECER”, E, NADA MAIS, PORQUE NÃO DEIXOU A SUA JUÍZA TITULAR, FAZÊ-LO?

25.ESTA CONDUTA DIFAMATÓRIA E DE ABUSO DE PODER DO ARGUIDO NO CIRCUNSTANCIALISMO JÁ REFERIDO É DE ENORME GRAVIDADE E É UMA QUESTÃO DE JUSTIÇA, POIS SE A ASSISTENTE NÃO TIVESSE JÁ LARGOS MAIS DE 20 ANOS, À DATA, DE JUÍZA, E UM FUTURO, APÓS ESTES FACTOS, DE CERCA DE MAIS 2 ANOS, SEM QUAISQUER INCIDENTES, E SEM NADA NO SEU REGISTO DISCIPLINAR E COM NOTA DE MÉRITO, TINHA POR CERTO, SIDO “CILINDRADA” PELA CABALA CONJUNTA DO ORA ARGUIDO CONLUIADO COM OS SEUS OFICIAIS DE JUSTIÇA.

26. POIS SÓ ASSIM O SR INSPETOR JUDICIAL TEVE MATÉRIA PARA PODER TER UM TERMO DE COMPARAÇÃO COM TODOS OS OUTROS ANOS DE EXERCÍCIO DA JUDICATURA DA ASSISTENTE, COM TODAS AS OUTRAS DEMAIS SUAS EQUIPAS DE OFICIAIS DE JUSTIÇA E PROVAS DADAS POR OUTROS TRIBUNAIS POR ONDE PASSOU.

27.MAS MAIS, É A ASSISTENTE QUE NO CUMPRIMENTO DO SEU DEVER E AO DENUNCIAR TODAS ESTAS SITUAÇÕES DE ENORME GRAVIDADE, AINDA É VÍTIMA DA PARTICIPAÇÃO CALUNIOSA E DIFAMATÓRIA E DO ABUSO DE PODER DO ORA ARGUIDO, QUE AINDA TEM SOBRE ESTA UM DEVER AINDA MAIS ACRESCIDO EM VIRTUDE DAS SUAS FUNÇÕES DE JUIZ PRESIDENTE DA COMARCA DE SETÚBAL;

28. ORA OS FACTOS FORAM EXAUSTIVAMENTE INVESTIGADOS JUNTO DO CSM POR MAIS DE 9 MESES, CONCLUÍNDO-SE QUE TUDO O QUE VINHA PARTICIPADO E IMPUTADO QUANTO À PESSOA DA ASSISTENTE ERA FALSO, E AGORA, TARDAM EM CHEGAR AS NECESSÁRIAS CONSEQUÊNCIAS DE TAL. POIS SE A MATÉRIA DISCIPLINAR CABE AO CSM, A AÇÃO PENAL CUMPRE AO TRIBUNAL.

29. OS FACTOS PARTICIPADOS SÃO MUITO GRAVES PORQUE CHEGARAM A ESTAR CERCA DE 900 PROCESSOS DESPACHADOS POR CUMPRIR, AS FALSIFICAÇÕES DAS ESTATÍSTICAS TIVERAM INFLUÊNCIA NAS AVALIAÇÕES E NAS PROMOÇÕES DAQUELES MAGISTRADOS, DAQUELE TRIBUNAL, E PRIMEIRAMENTE, NA JUSTIÇA DAS FAMÍLIAS E DAS CRIANÇAS VISADAS NOS PROCESSOS DAQUELE TRIBUNAL, CHAMANDO AQUI A ATENÇÃO PARA QUE MORREM CRIANÇAS A SABER EM SETÚBAL, COMO JÁ SE SABE PUBLICAMENTE, E POR MAIS DE UMA VEZ, E QUE AS MESMAS MORTES PODERIAM SER EVITADAS, SE AS CRIANÇAS FOSSEM SINALIZADAS E RETIRADAS EM TEMPO, ASSIM SE FIZESSE O TRABALHO DEVIDO E ATEMPADAMENTE, PARA O EFEITO.

30.TODOS ESTES FACTOS PARTICIPADOS FORAM FALSOS, DOIS PROCESSOS VISANDO A ASSISTENTE DO CSM ASSIM O CONCLUÍRAM, O PROCESSO DE INSPEÇÃO AO TRABALHO DA ORA ASSISTENTE, APÓS OS FACTOS EM DISCUSSÃO, CONCLUIU PELA AUSÊNCIA DA EXISTÊNCIA DE ATRASOS NO EXERCÍCIO DAS SUAS FUNÇÕES E POR LHE DAR NOTA DE MÉRITO, UM PROCESSO DE AVERIGUAÇÕES DO CSM Á ESTATÍSTICA DA COMARCA DE SETÚBAL, CONCLUIU PELA RESPONSABILIZAÇÃO DO JUIZ PRESIDENTE AQUI ARGUIDO, PELO QUE, SE APUROU QUANTO À ADULTERAÇÃO DA ESTATÍSTICA E AOS PROBLEMAS INERENTES À MESMA E DECORRENTES DA MESMA, NA PESSOA DO ORA ARGUIDO. IMPORTA, POIS, REFLETIR SOBRE ESTES FACTOS!

31. PARA ALÉM DAS AVERIGUAÇÕES JÁ REFERIDAS E SE DÚVIDAS HOUVESSEM, A SEÇÃO EM CAUSA, FOI NA SEQUÊNCIA DESTES FACTOS, TOTALMENTE DESMANTELADA EM SETEMBRO DE 2023, DISTRIBUÍNDO-SE CADA UM DESTES OFICIAIS DE JUSTIÇA, POR TODASAS OUTRAS SEÇÕES DO TRIBUNAL, O QUE QUERERÁ DIZER ALGUMA COISA…E DENOTA A AFLIÇÃO DO ARGUIDO.

32. OS FACTOS DIFAMATÓRIOS SÃO DE UMA ENORME GRAVIDADE COMO NOVAMENTE SE FRISA E ERAM E SÃO DO CONHECIMENTO DE TODA A COMUNIDADE JUDICIÁRIA DE SETÚBAL E NÃO SÓ! É GRAVE DIZER-SE QUE A ASSISTENTE GRITAVA E FAZIA CHORAR OS OFICIAIS DE JUSTIÇA, QUANDO NEM UM ÚNICO EXEMPLO DE TAL SE APUROU E COMPROVOU, PELO CONTRÁRIO.

33. É IGUALMENTE GRAVE DIZER QUE A ASSISTENTE ERA A CAUSA DAS BAIXAS MÉDICAS DOS SEUS OFICIAIS DE JUSTIÇA, QUANDO TAL, NÃO CORRESPONDIA Á VERDADE E ERA ENFIM, ESTA, E A SENHORA PROCURADORA, AS ÚNICAS QUE ALI TRABALHAVAM.

34. É MUITO GRAVE DIZER QUE A CULPA NO ATRASO DO PROCESSO DE INVENTÁRIO NESTES AUTOS VISADO, ERA DA ASSISTENTE, QUANDO DE UMA BREVE CONSULTA RÁPIDA, INDUBITAVELMENTE SE VERIFICAVA QUE A QUEIXA DO ADVOGADO ERA PORQUE A SRA ESCRIVÃ TARDAVA EM FAZER O MAPA DE PARTILHA QUE LHE COMPETIA, E ALIÁS, JÁ TINHA ANTERIORMENTE SIDO ORDENADA A SUA ELABORAÇÃO PELA JUÍZA ANTECESSORA, DA ORA ASSISTENTE.

35. É GRAVE A ASSISTENTE TER A SUA ESTATÍSTICA FALSEADA, ADULTERADA E INVERÍDICA E SEREM-LHE IMPUTADAS SENTENÇAS EM ATRASO POR DEPOSITAR, QUANDO NUNCA TEVE UMA DECISÃO, POR DEPOSITAR, COM QUALQUER MÍNIMO ATRASO;

36. É GRAVE E MUITO NOTÓRIO DO COMPORTAMENTO E CONDUTA DO ARGUIDO VERIFICAR AS DECLARAÇÕES QUE APESAR DE TER PARTICIPADO DA ASSISTENTE, PRESTOU JUNTO DO INSPETOR JUDICIAL DO CSM E BEM ASSIM, O TEOR DO TRATO E DA CONSIDERAÇÃO QUE DAVA Á ASSISTENTE ATÉ POR MENSAGENS ESCRITAS, DE QUE HÁ EXEMPLO NESTES AUTOS, E, APÓS A QUEIXA CRIME DA ASSISTENTE, SE CONSTATAR O TEOR CONTRADITÓRIO DAS DECLARAÇÕES QUE PRESTOU SOBRE A PESSOA DA ASSISTENTE E A PRÁTICA REPETIDA E REITERADA QUE AS MESMAS TRADUZEM DE DIFAMAÇÃO, INSULTO E CALÚNIA Á SUA PESSOA, HONRA, DIGNIDADE, BOM NOME E IMAGEM PESSOAL E PROFISSIONAL;

37. O ARGUIDO TEM ESPECIAL CONHECIMENTO E DEVER ACRESCIDO DE SABER QUE OS FACTOS QUE PARTICIPAVA E NOS EXATOS TERMOS EM QUE O FEZ, ERAM FALSOS E DIFAMATÓRIOS, E ENXOVALHAVAM A PESSOA E A PROFISSIONAL, AQUI ASSISTENTE;

38. DE IGUAL MODO AO PROFERIR UM DESPACHO NUM PROCESSO CUJA TITULARIDADE ERA DA ASSITENTE, BEM SABIA, QUE ATENTAVA CONTRA AS MAIS ELEMENTARES REGRAS E PRINCÍPIOS DA JUDICATURA, E DESIGNADAMENTE, A INDEPENDÊNCIA E A PLENITUDE DO JUIZ, E NÃO SE COIBIU DE O FAZER, COMETENDO UM CRIME QUE NÃO DESCONHECIA E ATÉ TINHA CONHECIMENTO PRIVILEGIADO DO MESMO, EM RELAÇÃO AO COMUM DOS MORTAIS;

39. ASSIM TERMINAMOS, COMO COMEÇÁMOS, COMO NESTA SEDE, ESTAMOS APENAS EM FACE DA NECESSIDADEDEMATÉRIA INDICIÁRIA, A MESMA É SOBEJA, COMO AQUI JÁ SE DEIXOU DEMONSTRADO, PELO QUE, ESTANDO PREENCHIDOS TODOS OS ELEMENTOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS DOS TIPOS DE ILÍCITOS CRIME DENUNCIADOS E REITERANDO-SE TODOS OS ARGUMENTOS JÁ GIZADOS NO RAI, DEVE O ARGUIDO SEM QUALQUER HESITAÇÃO, SER PRONUNCIADO POR TODOS OS FACTOS QUE LHE VÊM IMPUTADOS, DESDE LOGO, E NÃO MENOS IMPORTANTE, PELA PROVA DOCUMENTAL COM FORÇA PROBATÓRIA PLENA, CARREADA PARA OS AUTOS E QUE DESDE O SEU INÍCIO, OS INTEGRA E SER SUJEITO A JULGAMENTO.

40. E PORQUE A QUESTÃO DISCIPLINAR ATINENTE A TODOS ESTES FACTOS É DA EXCLUSIVA ALÇADA DO CSM, MAS, CONTUDO, A VERTENTE CRIMINAL DOS MESMOS FACTOS, É POR SUA VEZ DA COMPETÊNCIA DESTE TRIBUNAL, E É UM DIREITO QUE ASSISTE Á AQUI ASSISTENTE, ASUA DENÚNCIA E VÊ-LOS JULGADOS, SENDO-LHE FEITA A JUSTIÇA DEVIDA! IMPÕE-SE A PRONÚNCIA DO ARGUIDO!

41. EM CONFORMIDADE SE REVOGANDO O DESPACHO ORA RECORRIDO, E SE REALIZANDO TUDO O MAIS JÁ ATEMPADAMENTE REQUERIDO NO REQUERIMENTO DE ABERTURA DE INSTRUÇÃO.

42. PARA OS TERMOS DO DISPOSTO NO ART. 412º Nº. 2 ALÍNEAS A), C) DO CPP, O TRIBUNAL A QUO VIOLOU, INTERPRETOU DE FORMA ERRADA OU NÃO APLICOU OS SEGUINTES NORMATIVOS, DA CRP, 13º, 20º, 32º, 205 DA CRP, DA CEDH O ARTº 6º, DO CPP, 97º, 123º, 145º, 283º, 286º, 292º, 307º, 308º, 379º, 410º, 428º, 432º, TODOS DO CPP, DO CP 180º, 184º, 365º Nº2, 382º, ETC E AINDA DO CPC, 157º, 668º, 722º, 729º, ETC.

Nestes termos e nos demais de Direito, Vossas Excelências deverão dar provimento ao presente recurso, e em conformidade, declararem verificadas as irregularidades/nulidades/anulabilidades aqui alegadas, com a consequente revogação do Despacho de não pronúncia do arguido datado de 24.02.2025 ora recorrido e a subsequente pronúncia do arguido para julgamento.”

Respondeu o Mº Pº pugnando pela improcedência do recurso salvo quanto à condenação em custas pela instrução.

Respondeu o arguido pugnando pela improcedência do recurso

O Ilustre PGA neste STJ apôs o seu visto.

Procedeu-se à conferencia com observância do formalismo legal

Cumpre apreciar.

Consta do despacho de não pronuncia:

3.2.- Factos suficientemente indiciados e com relevo para a boa decisão da causa

A) Com referência ao processo nº 6227/16.6... do J... de FM:

A Assistente proferiu despacho em 25 de outubro de 2022, no âmbito do qual determina a correção ao registo e autuação de determinada ação, de modo que fosse submetida à distribuição;

A Senhora Escrivã de Direito enviou o despacho suprarreferido para a gestão da comarca, com conhecimento à Senhora Administradora Judicial, por correio eletrónico de 26 de outubro de 2022, solicitando indicações sobre como proceder.

B) Com referência ao processo nº 7433/11.5... de J... (inventário/partilha de bens), titulado pela assistente, no qual deu entrada determinado requerimento e que foi subsequentemente concluso à Assistente (em 21 de setembro de 2022), registam-se, em síntese, os seguintes factos:

Atraso da Senhora Escrivã de Direito, CC, na sequência de período de doença, tendo a Assistente sugerido que esta o fizesse constar dos autos, proferindo despacho na data da conclusão;

Aquela Senhora Escrivã de Direito não terá cumprido o despacho referido e não prestou à denunciante os esclarecimentos solicitados;

Posteriormente, para o mesmo processo deram entrada outros dois requerimentos, a 24 de outubro de 2022 e a 08 de novembro de 2022;

A 09 de novembro de 2022 a Senhora Escrivã de Direito elaborou o mapa de partilha de forma que a Denunciante/Assistente entendeu ser incompleta e, a 11 de novembro de 2022, concluiu o processo ao Senhor Juiz Presidente da Comarca, com informação que fez constar da própria conclusão e nos termos da qual fez referência a não ter sido elaborado o mapa de partilha atempadamente devido a acumulação de serviço, por falta de funcionários, descrevendo a sua versão do que seria a situação concreta daqueles serviços e juntando ainda informação estatística;

A 12 de novembro de 2022 veio o Senhor Juiz Presidente a proferir despacho nos autos em reporte, com o seguinte teor: “nos termos das disposições conjugadas dos artigos 6.º, n.º 3 do estatuto dos Funcionários Judiciais e 157.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, dos atos dos funcionários da secretaria judicial é sempre admissível reclamação para o juiz de que aquele depende funcionalmente, a quem cabe a respetiva validação ou revogação, circunstância que não poderá deixar de incluir a eventual omissão ou atraso na prática de um ato. O Juízo de Família e menores de ... (J...) depende funcionalmente da magistrada judicial que se encontra agora em exercício de funções naquele juízo. Assim sendo, não cabe ao juiz presidente da comarca apreciar a reclamação apresentada pelo cabeça-de-casal DD na medida em que o âmbito das suas competências se encontra delimitado no que respeita aos atos de natureza jurisdicional (…) pelo que nada se impõe determinar em acréscimo ao que foi já referido.”

A Senhora Escrivã de Direito apresentou os autos para despacho ao Senhor Juiz Presidente da Comarca por sugestão da Senhora Administradora Judicial;

A 14 de novembro de 2022 foram aqueles autos conclusos à Denunciante/Assistente, com data de 15 de novembro, que os veio a despachar regularmente;

A Senhora Escrivã de Direito lavrou termo no processo, a 01 de março de 2023, no qual é feita referência à falta de meios humanos nos serviços, “pressão” e “stress em que se encontra e toda a coação e ameaças a que tem sido submetida”, após o que a Assistente proferiu despacho em que suscitava a identificação dos autores de tais condutas, obtendo a informação de não ser tal possível.

C) A Denunciante/Assistente veio a ser visada em Participação do Senhor Juiz Presidente da Comarca de Setúbal endereçada a 29 de novembro de 2022 ao Conselho Superior da Magistratura (doravante “CSM”), a qual veio a dar lugar a processo de averiguações (identificado por 2022/AV/...) e que foi arquivado em março de 2023;

A tal comunicação foi junto expediente a que se refere a factualidade descrita nos pontos antecedentes.

*

Consigna-se que os restantes factos alegados no requerimento de abertura de instrução, não foram tidos em consideração, por se mostrarem irrelevantes para a boa decisão da causa, por serem conclusivos ou por se tratar de considerações pessoais e/ou matéria de direito.”

+

O presente recurso, interposto do despacho de não pronúncia relativo a magistrado judicial (Juiz Desembargador) é por essa razão da competência deste Supremo Tribunal o seu conhecimento nos termos do artº 11º nº 4 do CPP que dispõe a esse nível “ Compete às secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça, em matéria penal:

a. Julgar processos por crimes cometidos por juízes do Supremo Tribunal de Justiça e das relações e magistrados do Ministério Público que exerçam funções junto destes tribunais, ou equiparados”

b. Julgar os recursos que não sejam da competência do pleno das secções” e

na sequência do que estabelece o seu nº 7 “ Compete a cada juiz das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça, em matéria penal, praticar os actos jurisdicionais relativos ao inquérito, dirigir a instrução, presidir ao debate instrutório e proferir despacho de pronúncia ou não pronúncia nos processos referidos na alínea a) do n.º 3 e na alínea a) do n.º 4.”

E nessa medida em face das conclusões expressas na motivação são as seguintes as questões suscitadas:

1-Nulidade e irregularidade da decisão de não pronúncia pela ausência/ insuficiência de instrução e pela falta de fundamentação legal do despacho de não pronúncia.

2- Violação do princípio do processo equitativo e desigualdade manifesta de tratamento entre os sujeitos processuais – a assistente e o arguido.

3- Do direito da assistente ao “duplo grau de jurisdição” e à plenitude da jurisdição efetiva de defesa.

4- O omissão de pronúncia sobre o crime de difamação agravada na decisão de “não pronúncia”.

5- Da contradição entre a fundamentação e a conclusão/ decisão quanto ao crime de usurpação de funções.

6- Isenção de taxa de justiça e de custas da assistente por litigar na qualidade de juíza de direito e na sequência do exercício das suas funções, pelo que, beneficia de isenção objetiva de custas processuais.

Conhecendo:

Invoca a ilustre assistente/ recorrente a nulidade e irregularidade da decisão sob recurso por ausência e insuficiência de instrução, por em seu entender tendo resultado “de uma fase instrutória, na qual, não se produziram quaisquer provas, … todas as provas requeridas pela assistente, e bem assim, a tomada de declarações requerida pela própria assistente, a seu prévio requerimento, não só, não foi cumprido, como ainda, ignorado e omitido do seu despacho de não pronúncia” e por outro lado “apesar de, a pedido de esclarecimento desse próprio Douto Tribunal, a assistente, quanto a comunicações/contatos telefónicos, ter nomeadamente, junto mensagem escrita do arguido, via Whatsapp dirigidaàsuapessoa, datadade 24.03.2023. A verdade, é que, sobre a referida mensagem, por sinal, remetida aos autos na sequência de pedido de esclarecimento desse STJ, a omissão de pronúncia e de fundamentação da decisão de não pronúncia, é manifesta”.

Daqui resulta que a nulidade / irregularidade que invoca, resulta de não haver sido ouvida na instrução e não haver sido feita referencia à mensagem que enviara a pedido do tribunal para o processo.

Tendo a assistente direito a ser ouvida no processo (inquérito e/ou instrução a seu pedido) nos termos das normas que invoca – artº145º e 292º CPP – ou outras provas no decurso da instrução, o certo é também que nos termos do artº 287º2 CPP o requerente da instrução pode indicar os actos de instrução que pretende sejam levados a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que através de uns e outros se espera provar. Acresce que em face da regulamentação dos actos de instrução, estes são apenas os que o juiz entenda levar a cabo (artº 289º CPP), o juiz indefere os actos requeridos que entenda não interessarem desde logo à instrução (artº 291º CPP), e os “actos e diligencias de prova praticados no inquérito só são repetidos no caso de não terem sido observadas as formalidades legais ou quando a repetição se revelar indispensável à realização das finalidades da instrução” - artº 291º 3 CPP. Tais actos de prova, foram objecto de apreciação, notificação da requerente para os reformular no sentido de “Indicar quais os factos que pretende provar com a prova documental elencada e, no caso dos processos judiciais que identifica, indicar as peças processuais que pretende; Esclarecer se as conversas telefónicas a que alude no ponto 6 e 7 de fls. da requerida prova documental foram objeto de interceção e gravação e, na afirmativa, que identifique o processo e Tribunal em que as mesmas foram realizadas.”, e a final pelo Mº JIC foram rejeitados por decisão fundamentada e não impugnada (por meio de reclamação – 291º2 CPP).

Em face de tudo isso, resulta que tais atos não são obrigatórios1 estando sujeita a sua admissibilidade ao prudente juízo do Mº JIC em face das finalidades da instrução e do objecto do processo, e sendo apenas obrigatória a audição do arguido e da vítima a seu pedido2 (o que não ocorreu) e apenas esta gera a nulidade, dependente da arguição a fazer até ao encerramento do debate instrutório (artº 120º1d) e 2 c) CPP)3 e após isso, apenas poderia constituir mera irregularidade a sanar / reparar se afetasse o valor do acto praticado, o que em lado algum se evidencia ou é alegado.

Por outro lado, apenas há que valorar e mencionar um determinado meio de prova, obviamente se se considerar que o mesmo interfere com a apreciação dos factos e se revelam essencial para apuramento da verdade processual que se busca e não se é inócuo.

Não vemos assim que exista e nulidade e ou irregularidade por ausência ou insuficiência de instrução a qual teve lugar, permitindo a lei o indeferimento de toda a prova requerida com excepção da obrigatória mencionada que não foi requerida.

No que respeita à falta de fundamentação legal do despacho de não pronúncia, alega a ilustre recorrente que “não foram afirmados, elencados e discriminados os factos participados, com reporte ao RAI, pela assistente, e que, não foram julgados indiciados; não se indicou que prova foi produzida (porque, não o foi) na fase instrutória; não se descreveu cabalmente quaisquer incidências processuais atinentes à fase instrutória” e como “despacho final do processo tem de conter no mínimo a enumeração e narração autónoma e percetível, ainda que, sintética, de todos os factos participados e de cuja instrução se requereu, que tenham sido considerados não suficientemente indiciados”

Esta questão mostra-se conexionada com a relativa à omissão de pronuncia, elencada sob o nº 4 e traduzida na “ omissão de pronúncia sobre o crime de difamação agravada na decisão de “não pronúncia” – cfr. al.c) do nº. 1 do artº 379º do CPP”, e por essa razão será tratada neste contexto.

Dispõe o artº 97º1 b) e 5 CPP que os actos dos juízes tomam a forma de despachos quanto, não sendo sentenças, puserem termo ao processo, devendo ser sempre fundamentados, “devendo ser especificados os motivos de facto e de direito” e, não sendo sentença não lhe é aplicável o disposto no artº 374º CPP exclusivo das sentenças, e como tal a inobservância de tal normativo, não gera a sua nulidade (imposta às sentenças) por não prevista nos artºs 118º, 119º e 120º CPP, mas apenas a sua irregularidade, que pode determinar a invalidade do acto (termos subsequentes do processo) se tiver sido arguida nos termos do artº 123º1 CPP, sem prejuízo de o juiz oficiosamente poder ordenar a reparação da irregularidade se ela puder afectar o valor do acro praticado.

O vício elencado pela recorrente resultaria do facto de não terem sido elencados/ discriminados, ainda que de forma sintética os factos participados que tenham sido considerados não indiciados.

Ora descreve-se no despacho de não pronuncia:

3.2.- Factos suficientemente indiciados e com relevo para a boa decisão da causa

A) Com referência ao processo nº 6227/16.6... do J... de FM:

A Assistente proferiu despacho em 25 de outubro de 2022, no âmbito do qual determina a correção ao registo e autuação de determinada ação, de modo que fosse submetida à distribuição;

A Senhora Escrivã de Direito enviou o despacho suprarreferido para a gestão da comarca, com conhecimento à Senhora Administradora Judicial, por correio eletrónico de 26 de outubro de 2022, solicitando indicações sobre como proceder.

B) Com referência ao processo nº 7433/11.5... de J... (inventário/partilha de bens), titulado pela assistente, no qual deu entrada determinado requerimento e que foi subsequentemente concluso à Assistente (em 21 de setembro de 2022), registam-se, em síntese, os seguintes factos:

Atraso da Senhora Escrivã de Direito, CC, na sequência de período de doença, tendo a Assistente sugerido que esta o fizesse constar dos autos, proferindo despacho na data da conclusão;

Aquela Senhora Escrivã de Direito não terá cumprido o despacho referido e não prestou à denunciante os esclarecimentos solicitados;

Posteriormente, para o mesmo processo deram entrada outros dois requerimentos, a 24 de outubro de 2022 e a 08 de novembro de 2022;

A 09 de novembro de 2022 a Senhora Escrivã de Direito elaborou o mapa de partilha de forma que a Denunciante/Assistente entendeu ser incompleta e, a 11 de novembro de 2022, concluiu o processo ao Senhor Juiz Presidente da Comarca, com informação que fez constar da própria conclusão e nos termos da qual fez referência a não ter sido elaborado o mapa de partilha atempadamente devido a acumulação de serviço, por falta de funcionários, descrevendo a sua versão do que seria a situação concreta daqueles serviços e juntando ainda informação estatística;

A 12 de novembro de 2022 veio o Senhor Juiz Presidente a proferir despacho nos autos em reporte, com o seguinte teor: “nos termos das disposições conjugadas dos artigos 6.º, n.º 3 do estatuto dos Funcionários Judiciais e 157.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, dos atos dos funcionários da secretaria judicial é sempre admissível reclamação para o juiz de que aquele depende funcionalmente, a quem cabe a respetiva validação ou revogação, circunstância que não poderá deixar de incluir a eventual omissão ou atraso na prática de um ato. O Juízo de Família e menores de ... (J...) depende funcionalmente da magistrada judicial que se encontra agora em exercício de funções naquele juízo. Assim sendo, não cabe ao juiz presidente da comarca apreciar a reclamação apresentada pelo cabeça-de-casal DD na medida em que o âmbito das suas competências se encontra delimitado no que respeita aos atos de natureza jurisdicional (…) pelo que nada se impõe determinar em acréscimo ao que foi já referido.”

A Senhora Escrivã de Direito apresentou os autos para despacho ao Senhor Juiz Presidente da Comarca por sugestão da Senhora Administradora Judicial;

A 14 de novembro de 2022 foram aqueles autos conclusos à Denunciante/Assistente, com data de 15 de novembro, que os veio a despachar regularmente;

A Senhora Escrivã de Direito lavrou termo no processo, a 01 de março de 2023, no qual é feita referência à falta de meios humanos nos serviços, “pressão” e “stress em que se encontra e toda a coação e ameaças a que tem sido submetida”, após o que a Assistente proferiu despacho em que suscitava a identificação dos autores de tais condutas, obtendo a informação de não ser tal possível.

C) A Denunciante/Assistente veio a ser visada em Participação do Senhor Juiz Presidente da Comarca de Setúbal endereçada a 29 de novembro de 2022 ao Conselho Superior da Magistratura (doravante “CSM”), a qual veio a dar lugar a processo de averiguações (identificado por 2022/AV/...) e que foi arquivado em março de 2023;

A tal comunicação foi junto expediente a que se refere a factualidade descrita nos pontos antecedentes.

*

Consigna-se que os restantes factos alegados no requerimento de abertura de instrução, não foram tidos em consideração, por se mostrarem irrelevantes para a boa decisão da causa, por serem conclusivos ou por se tratar de considerações pessoais e/ou matéria de direito.”

Visto o transcrito dele resulta que o Mº JIC analisou todos os factos do requerimento de instrução e se pronunciou sobre todos os factos que considerou relevantes e como tal indiciados, desconsiderando os demais nos termos que a final consignado deixou.

Nessa sequência e na da invocada nulidade de omissão de pronúncia, convirá salientar, que dos factos alegados no RAI apenas interessariam os factos que respeitem ao objecto da instrução, que como se salienta dirão respeito àqueles que poderão/ poderiam integrar os crimes investigados pelo Mº Pº na fase de inquérito e sobre os quais o mesmo se debruçou no despacho final, na ausência de qualquer alteração desse objecto posteriormente (por qualquer via nomeadamente reclamação hierárquica) e que foram o crime de usurpação de funções previsto e punível pelo artigo 358.º, do Código Penal e de um crime de denúncia caluniosa, previsto e punível pelo artigo 365.º, n.º 1, do Código Penal,

Como apenas sobre estes ilícitos quanto ao arguido se procedeu a inquérito, separado do inquérito aos demais arguidos4, e apenas estes foram investigados nem relação ao arguido e sobre eles se pronunciou no seu despacho de arquivamento o MºPº, apenas estes podem ser objecto de instrução. Na verdade o disposto no artº 287º1 b) CPP pressupõe que os factos pelos quais o Mº Pº não tiver deduzido acusação foram objecto de investigação em inquérito por si conduzido. Se não houve investigação sobre eles não podiam ser objeto de despacho de acusação ou de arquivamento. Foi o que sucedeu.

Deste modo delimitado ficou o objecto da instrução, pois dela não podem fazer parte factos não investigados, ou seja que não foram objecto de inquérito, pois ninguém pode ser acusado sobre factos não investigados. É que é função exactamente do inquérito e razão da sua obrigatoriedade, assegurar que ninguém será pronunciado ou acusado sem que a sua responsabilidade penal (nos factos imputados) seja investigada, equacionada e decidida pelo titular da acção penal, e sem que nesse âmbito possa fazer valer os seus direitos de participação e de defesa assegurados pelo processo penal. É essa a função de garantia, do caracter obrigatório (artº 262º2 CPP), do inquérito.

Assim e estando em causa apenas os crimes investigados e sobre os quis o MºPº proferiu despacho e desse modo se mostra delimitado o objecto da instrução, em face do supra transcrito e da posição que o Mº JIC tomou e expressa, no conhecimento de todos os factos alegados no RAI, não se mostra que o vicio que a recorrente lhe imputa se mostre verificado, nem que ocorra a nulidade por omissão de pronuncia

+

Questiona a assistente / recorrente a violação do princípio do processo equitativo e desigualdade manifesta de tratamento entre os sujeitos processuais – a assistente e o arguido.

Como pano de fundo de tal arguição insurge-se, a nosso ver, a ilustre recorrente contra a apreciação e valoração da prova indiciária no que ao crime de denuncia caluniosa diz respeito, por em seu entender dever o arguido saber que os factos de que deu conhecimento aos CSM eram falsos, falsidade que o CSM averiguou no inquérito a que procedeu. Ou seja, o arguido, do seu ponto de vista devia antes de ter dado a conhecer ao CSM os factos participados devia ter averiguado da verdade ou falsidade da informações que lhe eram dadas não o tendo feito.

Sendo assim, não vemos que no inquérito a que se procedeu, para averiguação do crime, tenha ocorrido um diverso tratamento entre arguido e assistente. Não vemos que tenha sido postergado qualquer direito a qualquer um dos sujeitos processuais que o Código de Processo lhes conceda, e só nessas circunstâncias se poderia falar de violação de um processo equitativo e de desigualdade de tratamento. Por outro lado, tanto quanto nos é dado conhecer no inquérito o arguido aconselhou-se sobre o que fazer com elementos do CSM para este averiguar o que se estaria a passar, sendo que é sobre este órgão que compete proceder com vista à averiguação dos factos, o que fez, sendo que apenas alguns factos deram lugar a inquérito que veio a ser arquivado por ausência de ilícito disciplinar.

Não vemos assim que ocorra violação dos princípios alegados, sendo elencados e analisados todos os meios de prova, com interesse para o apuramento dos factos relevantes em face dos ilicitos em causa incluindo os procedimentos junto do CSM.

Sob o direito da assistente ao “duplo grau de jurisdição” e à plenitude da jurisdição efetiva de defesa – cfr. artºs 145º nº1 e 292º nº 2 ambos do CPP e artºs 32º nºs 1 e 7 e 20º nºs 1 e 4 ambos da CRP, invoca a recorrente, se bem entendemos, o facto de não haver sido admitida em instrução a prova que arrolou, a qual foi objecto de despacho de indeferimento pelo Mº JIC sob diversas razões que individualmente elenca. Como já no inicio do conhecimento deste recurso se assinalou, de tal despacho não cabe recurso (artº 291º2 CPP), mas apenas reclamação, que não ocorreu, donde tal decisão não pode ora ser questionada, sendo certo que tal não invalida a apreciação da matéria de facto no despacho de pronuncia como se mostra ter sido realizada no despacho sob recurso.

Se porventura outro for o alcance visado pela recorrente, no que à investigação da natureza dos crimes respeita, não existirá, nos termos já assinalados, dúvida que a realização do inquérito e do despacho final condicionará o objecto da instrução, pois esta não pode ter como objecto factos que não foram investigados em inquérito5, e por essa via limitando os poderes do Mº JIC, sendo que sobre aqueles que pode conhecer não ocorrem limitações no seu conhecimento.

Por outro lado especificamente no que respeita ao duplo grau de jurisdição ele mostra-se assegurado através da possibilidade conferida aos sujeitos processuais de fazerem reapreciar por uma instância superior, a decisão proferida sobre uma matéria do processo por uma outra instância de grau inferior, o que ocorre.

Improcede assim esta questão.

Suscita a ilustre recorrente o vicio da contradição entre a fundamentação e a conclusão/ decisão quanto ao crime de usurpação de funções - cfr. conjugação do preceituado nos artºs 307º nº1, 308º nº. 2 ambos do CPP e al. c) do nº. 1 do artº 668º, 729º nºs 2 e 3 e 722º nº 2 todos do CPC.

Temos alguma dificuldade em compreender o vicio alegado pela recorrente de cuja motivação recursiva são os seguintes trechos:

“Vejam-se as duas versões contidas no próprio despacho de não pronúncia ora recorrido, evidentemente, contraditórias, quanto ao Despacho proferido a 12.11.2022 pelo arguido na qualidade de Juiz Presidente da Comarca de Setúbal, no processo judicial 7433/11.5... de J... da FM de ..., à data, da titularidade da assistente, e que, pasmem-se, não foram tidas por estranhas e avessas à Lei, sendo que, tudo e todos falavam de um Processo de Inventário, onde cada um dava “ordens e orientações” à sua maneira, e à revelia do disposto no artº 157º do CPC e também do conhecimento da sua juíza titular, aqui assistente. E o MMº. JIC desse STJ, não se arrepiou com tal episódio, tendo-o tomado, por perfeitamente normal e legal.

Escreve o MMº Juiz Conselheiro que prolatou a decisão de 24.02.2025 ora em crise que: A seriedade de que se deve revestir a decisão de submeter qualquer pessoa a julgamento não se compatibiliza com a existência de imputações pouco seguras como sucede in casu.”. Pois, escrevemos nós, que, a evidência de que o ora arguido, então Juiz Presidente de um Tribunal, nada ía acrescentar, mudar ou alterar, com a sua intervenção no processo, ao despachá-lo, e que, não se “apoderou de quaisquer funções jurisdicionais da ora assistente”, demanda então, que perguntemos, para que propósito e que fim visava o arguido ao despachar o processo da sua Colega assistente.”

Não descortinamos onde se encontra a contradição entre a fundamentação e a decisão invocada, sendo que ocorre contradição entre a fundamentação e a decisão (…) quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto ou, pelo menos, de sentido diferente6.

Diz-se na decisão recorrida (despacho de não pronuncia):

“ Relata a assistente que o ora arguido, na qualidade de Juiz Presidente da Comarca de Setúbal, proferiu despacho em processo de inventário, na sequência de um requerimento de um Advogado, por entender que, sendo a denunciante titular daquele processo, ao arguido não competia a prática daquele ato, que qualifica como sendo jurisdicional e abusivo relativamente às suas competências. (…)

Ora, atento o despacho proferido pelo ora arguido nos autos de inventário em que se limitou a esclarecer, face a requerimento que lhe era dirigido, que “não cabe ao juiz presidente da comarca apreciar a reclamação apresentada pelo cabeça-de-casal DD na medida em o âmbito das suas competências se encontra delimitado no que respeita aos atos de natureza jurisdicional”, poder-se-á afirmar, com segurança, que o ora arguido, na qualidade de Juiz Presidente, não se apoderou de quaisquer funções jurisdicionais da ora assistente, enquanto titular do referido processo de inventário.”

Conforme resulta dos autos, estaríamos perante um dilema absurdo e intransponível:

Um sr. advogado faz um requerimento a um processo dirigido, não ao Mº juiz titular do processo, mas a um terceiro juiz. Que fazer. O juiz do processo pode despachar um requerimento que não lhe é dirigido? Não, porque não lhe é dirigido. E o Juiz terceiro pode despachar um requerimento que lhe é dirigido num processo que não é seu? Não, porque está inserido num processo de que não é titular. Seguindo este raciocínio ninguém poderia despachar tal requerimento. Mas se algum dos dois despachar no sentido de que não é competente para apreciar o requerimento, e o remeter se for o caso, para apreciação de quem o deve fazer, estará a interferir na função jurisdicional ou seja a interferir no andamento processual? E com isso a cometer um crime de usurpação de funções?

Cremos que a resposta será negativa. Na perspectiva absurda tanto usurparia funções o Sr Juiz que despachando no processo se pronunciasse sobre o requerimento que não lhe dizia respeito, como o juiz que pronunciando-se sobre o requerimento que lhe era dirigido declarou a sua incompetência para interferir no processo. Claro que não sendo despachado se poderia incorrer noutro ilícito.

Apesar de nos parecer que o correcto numa situação destas seria o de juiz do processo despachar no sentido de desentranhar e remeter o documento a quem era dirigido para este o apreciar, o certo é que a apreciação feita pela pessoa a quem era dirigido nas folhas do processo (no local errado) nos termos em que foi feito - declarando-se exactamente sem competência para interferir no processo -, desse modo não interferindo na resolução do conflito de interesses entre as partes e que através do processo procuram solucionar, não há usurpação da função jurisdicional, pois não decidiu do mérito nem sequer tomou posição sobre qualquer questão meramente procedimental, e muito menos se arrogou expressa ou tacitamente, possuir condições para proferir decisão jurisdicional.

Assim a fundamentação do despacho de não pronuncia está de acordo com a decisão. Não houve qualquer ingerência na função jurisdicional de dizer o direito.

Reclama a assistente a isenção de taxa de justiça e de custas da assistente por litigar na qualidade de juíza de direito e na sequência do exercício das suas funções, pelo que, beneficia de isenção objetiva de custas processuais. De acordo com a conjugação do preceituado nos artºs 4º nº. 1 al. c) do RCP, cfr. Acórdão do TC 130/2019, e ainda, artºs 179º e 17º nº1 al. f) ambos do EMJ,

Atenta a qualidade que alega e demonstrada está, tem razão.

Na verdade, assume a profissão/ função de juiz de direito, e os autos nasceram em virtude do exercício dessas suas funções, donde atento o disposto no artº 4º c) RCP que dispõe: “ 1 - Estão isentos de custas: (…)

c) Os magistrados … em quaisquer acções em que sejam parte por via do exercício das suas funções;”7 não há lugar à condenação em custas dada a isenção de que goza, tanto no que respeita ao despacho de não pronuncia quer relativamente a este recurso (artº 515º 1 a) e b) CPP). Tal isenção constitui direito especial dos juízes estabelecido no artº 17º1 al. f) do EMJ8.

Procede assim parcialmente o recurso

+

Pelo exposto o Supremo Tribunal de Justiça, decide

Julgar parcialmente procedente o presente recurso interposto pela assistente e em consequência revoga a condenação em custas constante do despacho de não pronuncia, mantendo o demais decidido.

Sem Custas

Notifique

+

Lisboa e Supremo Tribunal de Justiça 28/5/2025

José A. Vaz Carreto (relator)

Maria Margarida Almeida

António Augusto Manso

_____________________________________________

1. Sendo apenas obrigatório o debate instrutório oral e contraditório ( artº 289º1 CPP), que teve lugar

2. Artº 292º2 CPP “2 - O juiz de instrução interroga o arguido e ouve a vítima, mesmo que não se tenha constituído assistente, quando o julgar necessário e sempre que estes o solicitarem

3. Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português – Do Procedimento (Marcha do Processo), p. 153.

4. Expressamente se referindo no despacho de arquivamento “quanto ao arguido AA, antes mesmo de fazer qualquer avaliação do material probatório, tomando por referência anteriores delimitações jurídicas resultantes de integrações jurídico-penais de outros despachos do Ministério Público no decurso deste inquérito, estão, aprioristicamente, em causa os crimes de usurpação de funções e denúncia caluniosa, ps. e ps. respetivamente pelos artigos 358.º e 365.º, do CP. Na verdade, o longo elenco dos ilícitos que a denunciante invoca na formalização da sua denúncia, de forma, aliás, genérica, imprecisa e indeterminada, refere-se aos demais denunciados que ali indica, que não o denunciado aqui arguido.”

5. Não sendo objecto de inquérito nada obsta a que sejam objecto de “novo” inquérito pois sobre eles não ocorreu nem investigação nem decisão.

6. Por todos ac STJ 14/4/2021 proc. 3167/17.5T8LSB.L1.S1 www.dgsi.pt

7. Aplicável ex vi artº 179º 2 EMJ. Com ressalva do nº 7 do artº 4 no que respeita ao reembolso à parte vencedora. Cfr ac. TC Nº 130/2019 de 21/2/2019.

8. Artigo 17.º - Direitos especiais

1 - São direitos especiais dos juízes: (…)

f) A isenção de custas em qualquer ação em que o juiz seja parte principal ou acessória, por via do exercício das suas funções (…)