SUSTAÇÃO DA EXECUÇÃO
EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
Sumário

1 – A sustação integral determina a extinção da execução.
2 – Se não houver outros bens além daquele que foi duplamente penhorado, a sustação da execução desembocará na sua extinção, sem prejuízo da sua posterior renovação se porventura vierem a ser identificados outros bens.
3 – O exequente vê-se forçado a reclamar o seu crédito na execução onde o bem foi previamente penhorado, sob pena de os efeitos da penhora se virem a extinguir com a venda executiva que nela se realize.
4 – A oposição à execução mediante embargos de executado processa-se num regime de autonomia relativamente à execução, mas são estrita dependência desta.
5 – Extinta a execução, findam também, por inutilidade superveniente da lide, os apensos declarativos pendentes, como a oposição à execução, os embargos de terceiro e as reclamações de créditos.
6 – Não existe qualquer limite ou obstáculo relevante ao princípio do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva traduzida na diminuição das garantias e na possibilidade real de exercício da defesa, as quais podem ser concretizadas por impugnação dos créditos reclamados na execução que prossegue ou em caso de renovação da instância executiva, aproveitando-se então tudo o que tiver sido processado relativamente aos bens em que prossegue a execução, com eventual repristinação da matéria da oposição, mediante o reconhecimento da actual inexistência do direito exequendo ou da falta de um pressuposto, específico ou geral, da acção executiva, se for o caso.
7 – As custas da execução que por aquele motivo venha a ser declarada extinta são a cargo do exequente.
(Sumário do Relator)

Texto Integral

Processo n.º 1648/24.3T8SLV-A.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo de Execução de Silves – J1
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
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I – Relatório:
Na presente execução para pagamento de quantia certa proposta por “Banco (…), SA” contra (…), após dedução de oposição mediante embargos, o executado interpôs do recurso do despacho que julgou extinta a instância, por impossibilidade superveniente da lide.
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A execução em causa foi proposta para pagamento da quantia global de € 196.452,41 (€ 188.071,33 de capital, acrescida de juros de mora entretanto vencidos no valor de € 8.058,73 (6,200% + 3%) e de imposto de selo no montante de € 322,35, acrescida de juros de mora, cláusula penal e respectivo imposto de selo até efectivo e integral pagamento.
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A instituição bancária alicerçou a sua pretensão na seguinte causa de pedir: «no exercício da sua atividade creditícia, no dia 20/09/2022, o Exequente celebrou com o ora executado (…), na qualidade de Mutuário, um Contrato de Mútuo com Hipoteca no valor de € 198.075,00 (cento e noventa e oito mil e setenta e cinco euros)», não tendo procedido ao pagamento das prestações acordadas.
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A fracção autónoma do prédio urbano que deu origem ao empréstimo foi onerada com uma hipoteca constituída a favor da instituição bancária.
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Em 04/09/2024 foi efectuada a penhora da fracção autónoma designada pela Letra "F", correspondente ao rés-do-chão – apartamento E, na Urbanização (…), freguesia e concelho de Portimão, Distrito de Faro, inscrita na matriz predial urbana sob o artigo (…), da freguesia de Portimão, e descrita na Conservatória de Registo Predial de Portimão sob o número (…), da freguesia de Portimão.
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Em 24/09/2024, o agente de execução remeteu carta de citação, nos termos do disposto nos artigos 856.º do Código Processo Civil, comunicando ao executado que tinha o prazo de 20 (vinte dias) para:
«a. Pagar a quantia em dívida, juros e custas; ou querendo,
b. Deduzir oposição à execução através de embargos de executado; e/ou
c. Deduzir oposição à penhora.
Sem prejuízo do atrás referido e nos termos do n.º 3 do artigo 753.º do CPC, fica também notificado que, no prazo da oposição e sob pena de ser condenado como litigante de má-fé, deve indicar os direitos, ónus e encargos não registáveis que recaiam sobre os bens penhorados, bem como os respetivos titulares ou beneficiários; e que pode requerer a substituição dos bens penhorados ou a substituição da penhora por caução, nas condições e nos termos do disposto na alínea a) do n.º 4 e no n.º 5 do art.º 751.º do CPC».
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A documentação em causa estava redigida em Português e o destinatário diz não dominar a língua.
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Em 08/10/2024, o executado remeteu mail à agente de execução, redigido em inglês, a pedir explicações sobre o conteúdo do documento, informando que não compreendia português.
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A 09/10/2024, também em inglês, a agente de execução informou o executado que se tratava de um processo judicial instaurado pelo Banco (…) relacionado com um empréstimo, fornecendo o contacto telefónico do advogado do banco, caso desejasse proceder ao pagamento da dívida.
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Em 28/11/2024, a mandatária do arguido enviou mail à agente de execução, sublinhando que «dito imóvel não é dele e não mora lá» e solicitou outras informações sobre a penhora e a nomeação do cliente como fiel depositário, por não ter acesso ao processo.
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Na mesma data, recebeu a seguinte resposta:
«Em esclarecimento ao solicitado por V. Exa., cumpre-me informar que a execução tem por base de título um Contrato de Mútuo com Hipoteca no valor de € 198.075,00, assim a tramitação inicia-se pela penhora junto da Conservatória do Registo Predial.
Nesta fase não há nem tem de haver uma deslocação prévia ao local, após a referida penhora é enviada citação ao executado acompanhada do respetivo auto de penhora, neste caso, foi enviada para a mesma morada que consta na procuração assinada pelo seu constituinte.
Recebemos um email do mesmo a 08.10.2024, o qual anexo para conhecimento de V. Exa., com a nossa resposta.
Informo que tal email já foi junto aos presentes autos,
Até deslocação ao local para afixação de edital e verificação do estado do bem, entende-se que é o executado considerado fiel depositário pois é o proprietário do imóvel».
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Em 02/12/2024, via email, a mandatária do executado estabeleceu comunicação com a agente de execução que, na sua parte pertinente, tinha o seguinte conteúdo: «juntei agora procuração aos autos de execução, na expectativa de os poder consultar. Acontece que a secretaria do Tribunal informou que ainda não se encontrava junto aos autos o comprovativo da citação do executado, razão pela qual eu, como advogada do mesmo, ainda não posso consultar o processo».
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Na mesma data, a agente de execução respondeu, comunicando o seguinte: «É um ato que a A.E. pratica telematicamente, no entanto conforme email infra, a comunicação de dados entre o sistema informático dos Agentes de Execução e Tribunais demora cerca de 24H a 48H a ser comunicado, após esse prazo já conseguirá consultar o processo via citius».
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Em 04/12/2024 foi apresentado o requerimento de oposição à execução, onde o executado, para além do mais, pediu que fosse reconhecida a nulidade da citação e fosse determinada a suspensão de execução, sem prestação de caução.
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Em 06/12/2024, a Meritíssima Juíza de Direito ordenou uma pesquisa base de dados «a fim de apurar a data de entrega ao Executado do expediente de citação».
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Foi junta cópia de expediente dos CTT.
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Em 10/12/2024, por não ser perceptível a data da entrega da citação, foi proferido despacho nos seguintes termos: «Diligencie-se pela obtenção dessa informação, seja através de base de dados, seja através de notificação para o efeito».
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Em 13/12/2024, a agente de execução deu conhecimento que «não rececionou o AR até à presente data, tendo sido contactada pelo executado via email após ter rececionado a citação via postal».
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Os CTT informaram que a data de aceitação da carta de citação ocorreu em 25/09/2024.
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Em 16/12/2024 foi proferida decisão nos seguintes termos:
«Transfira-se o expediente que antecede – 13 de Dezembro – para o apenso.
Após, notifique-se o mesmo ao Embargante.
Decorrido o prazo de contraditório, conclua-se».
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Por requerimento de 03/01/2025 a mandatária do executado remeteu para a defesa da Oposição à Execução sobre a nulidade de tal citação.
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Existia penhora prévia registada em 29/05/2023 no processo de execução fiscal n.º 3085202181176058 e Apensos, a correr termos no Serviço de Finanças de Lisboa 3.
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Em 10/01/2025, a agente de execução lavrou a seguinte decisão:
«Atendendo ao preceituado no n.º 1 do artigo 752.º, no que respeita ao bem supra mencionado, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 794.º, a sustação integral determina a extinção da presente execução, sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 850.º, todos do Código de Processo Civil, pelo que por ora, não se procede ao cancelamento da penhora registada por ordem dos presentes autos».
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Em 10/01/2025 os mandatários das partes foram notificados da referida decisão de sustação.
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Por decisão datada de 29/01/2025 o Tribunal a quo proferiu a decisão que se transcreve:
«A acção executiva de que este apenso é dependência já se encontra declarada extinta.
Assim sendo, verifica-se uma impossibilidade superveniente da lide – artigo 277.º, alínea e), do Código de Processo Civil – que determina a extinção desta instância incidental (sem prejuízo da sua eventual renovação, por via da renovação do processo principal).
Pelo que se declara extinta esta instância por impossibilidade superveniente da lide.
Custas, por ora, pelo Embargante – artigo 536.º, n.º 3, do Código de Processo Civil».
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Inconformado com tal decisão, o recorrente apresentou recurso de apelação e formulou as seguintes conclusões:
«I. O presente recurso vem interposto da decisão/sentença da Mm.ª Juiz a quo que sem mais determinou a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, avalizando de forma acrítica a Decisão da sra. Agente de Execução de 10-01-2025;
II. É por demais evidente que a Mm.ª Juiz demitiu-se das suas funções de controlo da legalidade ao reproduzir sem mais a decisão da sra. agente de Execução;
Vejamos,
III. Em 24-09-2024 o Executado é citado na Alemanha, em língua portuguesa, da presente execução e da penhora de um imóvel, que sabe não lhe pertencer, porque não o quis comprar, a quem não sabia que tinha vendido e não o queria vender, por conta de uma divida que não contraiu, factos que estão a ser investigados no âmbito de um processo crime, a correr termos no DIAP de Évora, sob o n.º 26/24.9JAPTM;
IV. Com esta decisão de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, mantendo a penhora do imóvel fica o ora Recorrente prejudicado e impedido de se defender por um erro de procedimento da sra. Agente de Execução que decidiu lavrar um Auto de Penhora do bem indicado pelo Exequente, quando sabia – ou não poderia desconhecer – que sobre esse mesmo bem já existia uma anterior penhora da Fazenda Pública – bastava para o efeito a mera consulta da certidão do registo predial.
V. Não pode o Recorrente aceitar que, tendo sido citado para deduzir Oposição por Embargos pela Agente de Execução, venha agora esta arguir um vício procedimental que lhe é exclusivamente imputável, levando o Tribunal a reconhecer a extinção da ação executiva e consequente impossibilidade superveniente da lide em que se traduzem os Embargos de Executado.
VI. Decorre do n.º 4 do artigo 794.º do CPC, segundo a qual a sustação integral determina a extinção da execução, incluindo a extinção dos Embargos de Executado e de Terceiro a ela apensos, é inconstitucional por se traduzir na violação de um direito fundamental, qual seja o do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva, que implica o direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo, como previsto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
VII. A Decisão/Sentença proferida pela Mm.ª Juiz, subscrevendo sem qualquer análise do processo executivo e respetivos Apensos, a decisão da Agente de Execução está ferida de nulidade, por força do disposto no artigo 615.º, nº 1, alíneas b) e d), do CPC, porquanto não especifica os fundamentos de facto e de direito que a justificam, não se pronunciando ainda sobre questões que deveria apreciar e que determinariam necessariamente o prosseguimento da tramitação processual dos Embargos, como ação incidental.
VIII. Por último e no que se refere a custas, não pode o Executado / Embargante / Recorrente, perante esta situação de impossibilidade superveniente da lide, decorrente da existência de uma penhora da Fazenda Pública anterior, à qual, nem o Exequente, nem a Agente de Execução, deram qualquer relevância.
IX. Sendo que o Executado, ao deduzir os Embargos se limitou a tentar defender os seus direitos e não pode ser penalizado em sede de custas por um erro que não lhe é imputável.
Nestes termos e nos demais de Direito, deve o presente Recurso ser julgado procedente e determinada a revogação da sentença proferida pelo tribunal a quo que deve ser substituída por outra que determine o prosseguimento dos presentes embargos».
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Não houve lugar a resposta.
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II – Do objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
Da interpretação e da análise das transcritas alegações de recurso apresentadas resulta que a matéria a decidir se resume à apreciação:
a) da sustação e das suas consequências, designadamente ao nível do prosseguimento da apreciação da oposição à execução e do pagamento de custas.
b) E, se for caso disso, da existência de nulidade da citação e respectivas consequências e da apreciação das nulidades a esta associadas.
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III – Da factualidade com interesse para a justa decisão da causa:
A factualidade com interesse para a justa decisão da causa consta do relatório inicial.
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IV – Fundamentação:
A questão central e decisiva do presente recurso está relacionada com a sustação integral da execução e implica uma análise integrada da disciplina contida nos artigos 794.º[1], 849.º[2] e 850.º[3] do Código de Processo Civil.
Com o preceito acima transcrito pretende-se não permitir a adjudicação ou a venda dos mesmos bens em processos diferentes, uma vez que a liquidação deve ser única e deve operar-se no processo em que os bens foram penhorados em primeiro lugar[4].
Se não houver outros bens além daquele que foi duplamente penhorado, a sustação da execução desembocará na sua extinção, sem prejuízo da sua posterior renovação se porventura vierem a ser identificados outros bens (artigos 794.º, n.º 4 e 850.º, n.º 5)[5] [6] [7].
É inegável que a sustação integral determina a extinção da execução, pois, na presente situação, até momento, não existem outros bens penhorados, para além do imóvel supra identificado.
Efectivamente, sustada a execução, o exequente vê-se forçado a reclamar o seu crédito na outra, sob pena de os efeitos da penhora se virem a extinguir com a venda executiva que nela se realize (artigo 824.º-2, CC). É estabelecido, para tanto, o prazo de 15 dias, contado da notificação da sustação, se o exequente não tiver sido citado nos termos do art. 788-2, refazendo-se a graduação que já tenha tido lugar[8].
No fundo esta posição é tributária da jurisprudência do Tribunal Constitucional que, continua actual quando interpretada dinamicamente, com a necessária renumeração dos artigos implicados, validou o entendimento que «o artigo 871.º do CPC impõe a sustação da execução nos casos em que, efetuada a penhora ordenada nessa execução, se verificar a existência de penhoras anteriores à ordenada / efetuada nessa execução, abrindo-se prazo para o credor reclamar o crédito na execução onde a penhora foi registada com anterioridade. Mas refira-se que a natureza do crédito, ou melhor, a garantia do crédito decorrente da penhora mantém-se, em nada a afetando o regime previsto no artigo 871.º do CPC. Aliás essa garantia da penhora é determinante quer no novo prazo para reclamação de créditos que é facultado ao credor, quer na preferência a efetuar em sede de graduação de créditos. Não pode dizer-se que, por força do mecanismo legal previsto no normativo em apreço, a posição do credor saia prejudicada ou seja para ele mais difícil a cobrança do seu crédito, tanto mais que a dívida não é estática, procedendo-se à contagem dos respetivos juros, que obviamente revertem a favor do credor. Por outro lado, o credor pode sempre impulsionar a execução sustada ao abrigo do artigo 871.º do CPC, nomeando à penhora outros bens do devedor, se os houver. Podendo, igualmente, acordar com o devedor o pagamento da dívida exequenda em prestações, nos termos do artigo 882.º do Código de Processo Civil […]. Essencialmente preservada a garantia do crédito, não pode dizer-se que as vicissitudes da execução fiscal – a que o exequente comum se sujeita – seja, de tal forma gravosas que, num quadro de necessária ponderação do interesse público em jogo naquela execução, afetem de forma desproporcionada tal garantia»[9].
Ainda assim, poder-se-ia colocar a hipótese, tal como pretende o executado, do prosseguimento do apenso declarativo. No entanto, como sustenta Rui Pinto, extinta a execução, findam também, por inutilidade superveniente da lide, os apensos declarativos pendentes, como a oposição à execução, os embargos de terceiro e as reclamações de créditos[10]. E, no caso que nos ocupa, esta posição está acolitada em jurisprudência dos Tribunais Superiores[11] [12]. Num caso com contornos semelhantes, na jurisprudência deste Tribunal da Relação de Évora já foi decidido que o princípio da adequação não permite evitar a sustação da execução[13].
Na verdade, a oposição à execução mediante embargos de executado processa-se num regime de autonomia relativamente à execução, mas está na estrita dependência desta. Assim sendo, a extinção da execução determina, como consequência directa e necessária, o termo do processo de embargos.
O Recorrente entende que ficou prejudicado e impedido de se defender por um erro de procedimento da sra. Agente de Execução, o qual deveria ter sido censurado e corrigido pela Mm.ª Juíza de Direito.
Porém, não está aqui em causa qualquer limite ou obstáculo relevante ao princípio do acesso ao direito, a uma tutela jurisdicional efectiva e a um processo equitativo. Na verdade, não existe qualquer diminuição das garantias e da possibilidade de exercício da defesa, as quais podem ser concretizadas por outras vias:
i) a instituição bancária reclama o seu crédito na execução fiscal e, nesse caso, o executado poderá impugnar o crédito nos mesmos termos (ou noutros) junto da jurisdição administrativa e fiscal.
ii) Em caso de renovação da instância executiva, os autos prosseguem «e aproveita-se tudo o que tiver sido processado relativamente aos bens em que prossegue a execução»[14], caso em que, por paridade lógica, deverá então ser conhecida, em sede de Tribunal comum, a matéria em que suscitou a questão da extinção da execução, mediante o reconhecimento da actual inexistência do direito exequendo ou da falta de um pressuposto, específico ou geral, da acção executiva[15], caso esta matéria não tenha sido conhecida na execução fiscal.
iii) Subsidiariamente, caso haja decisão no procedimento criminal num sentido conforme com a pretensão do executado e se a instância for renovada, quando essa factualidade assim o permitir, poderá ser deduzida oposição superveniente, nos termos do n.º 2 do artigo 728.º do Código de Processo Civil.
Nestes termos, não se pode afirmar que houve um cenário de omissão de pronúncia ou de falta de fundamentação, tanto nos aspectos relacionados com a celebração (ou não) do negócio entre banco e executado, como na questão da matéria da nulidade da citação – ainda que esse ponto fosse agora conhecido nenhum efeito prático teria no prosseguimento da lide –, por estar extinta a execução, que acarreta necessariamente o fim dos embargos.
Não existe assim qualquer argumento com a idoneidade para determinar o prosseguimento da acção executiva e o subsequente conhecimento imediato da matéria da oposição.
Dito isto, a única modificação a introduzir na decisão recorrida reporta-se à condenação na taxa de justiça e nos demais encargos do processo, dado que as custas da execução que por aquele motivo venha a ser declarada extinta são a cargo do exequente[16], ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 536.º[17] do Código de Processo Civil.
Julga-se assim parcialmente procedente o recurso apresentado quanto à matéria da condenação em custas relacionada com a extinção da instância executiva.
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V – Sumário: (…)

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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar parcialmente procedente o recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida, na parte em que condenou o executado no pagamento das custas, as quais correm por conta do exequente, mantendo-se no mais o previamente decidido.
Custas a cargo do recurso a cargo do apelante nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil, na proporção de 9/10 – fica dispensado do pagamento de 1/10 face ao vencimento na matéria das custas.
Notifique.
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Processei e revi.
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Évora, 22/05/2025
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
Mário João Canelas Brás

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[1] Artigo 794.º (Pluralidade de execuções sobre os mesmos bens):
1 - Pendendo mais de uma execução sobre os mesmos bens, o agente de execução susta quanto a estes a execução em que a penhora tiver sido posterior, podendo o exequente reclamar o respetivo crédito no processo em que a penhora seja mais antiga.
2 - Se o exequente ainda não tiver sido citado no processo em que a penhora seja mais antiga, pode reclamar o seu crédito no prazo de 15 dias a contar da notificação de sustação; a reclamação suspende os efeitos da graduação de créditos já fixada e, se for atendida, provoca nova sentença de graduação, na qual se inclui o crédito do reclamante.
3 - Na execução sustada, pode o exequente desistir da penhora relativa aos bens apreendidos no outro processo e indicar outros em sua substituição.
4 - A sustação integral determina a extinção da execução, sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 850.º.
[2] Artigo 849.º (Extinção da execução):
1 - A execução extingue-se nas seguintes situações:
a) Logo que se efetue o depósito da quantia liquidada, nos termos do artigo 847.º;
b) Depois de efetuada a liquidação e os pagamentos, pelo agente de execução, nos termos do Regulamento das Custas Processuais, tanto no caso do artigo anterior como quando se mostre satisfeita pelo pagamento coercivo a obrigação exequenda;
c) Nos casos referidos no n.º 3 do artigo 748.º, no n.º 2 do artigo 750.º, no n.º 6 do artigo 799.º e no n.º 4 do artigo 855.º, por inutilidade superveniente da lide;
d) No caso referido na alínea b) do n.º 4 do artigo 779.º;
e) No caso referido no n.º 4 do artigo 794.º;
f) Quando ocorra outra causa de extinção da execução.
2 - A extinção é notificada ao exequente, ao executado, apenas nos casos em que este já tenha sido pessoalmente citado, e aos credores reclamantes.
3 - A extinção da execução é comunicada, por via eletrónica, ao tribunal, sendo assegurado pelo sistema informático o arquivo automático e eletrónico do processo, sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria.
[3] Artigo 850.º (Renovação da execução extinta):
1 - A extinção da execução, quando o título tenha trato sucessivo, não obsta a que a ação executiva se renove no mesmo processo para pagamento de prestações que se vençam posteriormente.
2 - Também o credor reclamante, cujo crédito esteja vencido e haja reclamado para ser pago pelo produto de bens penhorados que não chegaram entretanto a ser vendidos nem adjudicados, pode requerer, no prazo de 10 dias contados da notificação da extinção da execução, a renovação desta para efetiva verificação, graduação e pagamento do seu crédito.
3 - O requerimento faz prosseguir a execução, mas somente quanto aos bens sobre que incida a garantia real invocada pelo requerente, que assume a posição de exequente.
4 - Não se repetem as citações e aproveita-se tudo o que tiver sido processado relativamente aos bens em que prossegue a execução, mas os outros credores e o executado são notificados do requerimento.
5 - O exequente pode ainda requerer a renovação da execução extinta nos termos das alíneas c), d) e e) do n.º 1 do artigo anterior, quando indique os concretos bens a penhorar, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no número anterior.
[4] Alberto dos Reis, Processo de Execução, volume 2.º, reimpressão, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 287.
[5] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, vol. II – Processo de execução, processos especiais e processo de inventário judicial, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 211.
[6] No mesmo sentido, Marco Carvalho Gonçalves, Lições de Processo Executivo, Almedina, Coimbra, 2016, págs. 399-400.
[7] José Lebre de Freitas, a Ação Executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 7.ª edição, Gestlegal, Coimbra, 2017, pág. 415, que, em nota de rodapé, adianta que «com a reforma da reforma, casos que davam lugar apenas à suspensão da execução passaram a constituir causa da sua extinção».
[8] José Lebre de Freitas, Armando Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 3.º, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 718.
[9] Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 51/99, cuja leitura pode ser feita em www.tribunalconstitucional.pt.
[10] Rui Pinto, A ação executiva, AAFDL Editora, Lisboa, 2018, pág. 962.
[11] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/12/1987, cujo sumário está publicado em www.dgsi.pt: Requerido pela embargante o pagamento da execução e, consequente extinção desta, nos termos do artigo 916.º do Código de Processo Civil, devem os embargos – dependência dessa execução – ter igual sorte, por inutilidade superveniente da lide – artigo 287.º, alínea e), do citado Código.
[12] No mesmo sentido, podem ser consultados os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 04/07/1996 (rel. Loureiro da Fonseca), 25/01/2000 (rel. Soares Curado) e 23/05/2002 (rel. Maria Manuela Gomes), disponibilizados em www.dgsi.pt.
[13] Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 04/06/2020, publicitado em www.dgsi.pt, que decidiu que «o princípio de adequação formal previsto no artigo 547.º do CPC não permite ao juiz deixar de ordenar a sustação da execução prevista no artigo 794.º do CPC, dispensando o exequente de reclamar o seu crédito na instância executiva fiscal onde se verificou a primeira penhora e de ordenar a notificação do primeiro exequente para reclamar o seu crédito na execução judicial sob o pretexto de adequação da tramitação processual às especificidades do caso».
[14] Rui Pinto, A ação executiva, AAFDL Editora, Lisboa, 2018, pág. 967.
[15] Lebre de Freitas, A Acção Executiva, Coimbra Editora, Coimbra, 1993, pág. 143.
[16] Salvador da Costa, o Concurso de Credores, 5ª edição, pág. 269.
[17] Artigo 536.º (Repartição das custas):
1 - Quando a demanda do autor ou requerente ou a oposição do réu ou requerido eram fundadas no momento em que foram intentadas ou deduzidas e deixaram de o ser por circunstâncias supervenientes a estes não imputáveis, as custas são repartidas entre aqueles em partes iguais.
2 - Considera-se que ocorreu uma alteração das circunstâncias não imputável às partes quando:
a) A pretensão do autor ou requerido ou oposição do réu ou requerente se houverem fundado em disposição legal entretanto alterada ou revogada;
b) Quando ocorra uma reversão de jurisprudência constante em que se haja fundado a pretensão do autor ou requerente ou oposição do réu ou requerido;
c) Quando ocorra, no decurso do processo, prescrição ou amnistia;
d) Quando, em processo de execução, o património que serviria de garantia aos credores se tiver dissipado por facto não imputável ao executado;
e) Quando se trate de ação tendente à satisfação de obrigações pecuniárias e venha a ocorrer a declaração de insolvência do réu ou executado, desde que, à data da propositura da ação, não fosse previsível para o autor a referida insolvência.
3 - Nos restantes casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, caso em que é este o responsável pela totalidade das custas.
4 - Considera-se, designadamente, que é imputável ao réu ou requerido a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou requerente, fora dos casos previstos no n.º 2 do artigo anterior e salvo se, em caso de acordo, as partes acordem a repartição das custas.