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PLANO DE REVITALIZAÇÃO
CRÉDITOS DA SEGURANÇA SOCIAL
INEFICÁCIA
Sumário
É ineficaz perante o Estado – quanto a ele não produzindo efeitos – a homologação de Plano de Revitalização aprovado pelos credores, mas com o voto contra daquele – por não respeitar o regime previsto na lei relativamente a créditos tributários (impostos e da segurança social). (Sumário do Relator)
Texto Integral
RECURSO N.º 2660/24.8T8STR.E1 – APELAÇÃO (JUÍZO DE COMÉRCIO DE SANTARÉM)
O credor reclamante, ora Apelante, “Instituto da Segurança Social, I.P. – Centro Distrital de Santarém”, aí com sede no n.º 51 do Largo do Milagre, vem interpor recurso da douta sentença que foi proferida a 04 de Abril de 2025 (ora no citius) e que homologou o Plano Especial de Recuperação (PER) que fora apresentado pela devedora, ora Apelada, “(…) – Engenharia e Construção, Lda.”, com sede no Largo (…), n.º 53-A, (…), nestes autos de procedimento especial de revitalização, que esta havia instaurado no Juízo de Comércio de Santarém-Juiz 2 – sendo no valor de € 179.996,67 (cento e setenta e nove mil, novecentos e noventa e seis euros e sessenta e sete cêntimos) e juros o crédito reclamado e reconhecido ao Apelante [com o fundamento aduzido em tal douta sentença ora recorrida de que «Não se mostra violada qualquer regra procedimental ou relativa ao conteúdo do plano e não se vislumbra qualquer situação de prejuízo ou desigualdade injustificada para os credores advinda do mesmo (artigos 215.º e 216.º, ex vi do artigo 17.º-F, n.º 7, do CIRE)» –, ora intentando a revogação do que assim vem decidido e apresentando alegações que remata com a formulação das seguintes Conclusões:
1.º O devedor apresentou um PER. 2.º O CDS votou contra este Plano. 3.º O Meritíssimo Juiz homologou o PER. 4.º A indisponibilidade dos créditos tributários exige a declaração expressa da ineficácia do PER aos créditos reclamados pela Segurança Social. 5.º Nas situações excecionais para a regularização da dívida previstas no artigo 190.º do Código Contributivo, nunca é permitida a redução da dívida de contribuições, mas apenas o diferimento do seu pagamento, para além de considerar como indício da inviabilidade económica do contribuinte o incumprimento do pagamento das contribuições mensais desde a data da entrada do requerimento. 6.º No caso do PER não ficou demonstrada a viabilidade económica do devedor, identificando-se vários indícios que apontam em sentido contrário, como o facto de não ter retomado o pagamento integral das contribuições mensais devidas. 7.º Por outro lado, a Segurança Social encontra-se numa posição mais desfavorável do que outros credores, considerando que os prazos de pagamento são mais penalizadores. 8.º A homologação de um PER que inclua o pagamento em prestações de créditos sem o acordo da Segurança Social constitui uma violação não negligenciável das normas legais aplicáveis, nos termos do artigo 215.º do CIRE e, por tal motivo, o mesmo deve ser considerado ineficaz expressamente, para com a Segurança Social. 9.º Assim, o Meritíssimo Juiz devia ter considerado expressamente o Plano ineficaz em relação à Segurança Social, uma vez que este credor não deu o seu consentimento expresso à modificação dos seus créditos, verificando-se violação da legislação específica da Segurança Social, bem como da legislação tributária, designadamente, o artigo 30.º da Lei Geral Tributária, que refere que os créditos da Segurança Social são indisponíveis. 10.º A douta decisão violou, além do mais, o disposto nos artigos 190.º e 191.º do Código Contributivo, 17.º-F, 194.º e 215.º do CIRE e artigo 30.º da LGT.
Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve a decisão da 1.ª instância ser revogada e substituída por outra que consigne o voto desfavorável do CDS quanto ao PER e declare expressamente que este é ineficaz em relação à Segurança Social, considerando, assim, procedente o pedido do ora recorrente, com o que se fará JUSTIÇA.
Não foram apresentadas quaisquer contra-alegações.
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A matéria de facto necessária e suficiente para apreciação do recurso é a que consta do relatório supra, para que se remete, constituída basicamente pelas vicissitudes processuais que, até ao momento, ocorreram na acção.
E o douto despacho recorrido é do seguinte teor, na sua parte impugnada:
«Nos presentes autos de processo especial de revitalização em que é devedora “(…) – Engenharia e Construção, Lda.”, foi apresentada a versão final do plano de recuperação em 14-02-2025, bem como o resultado da votação de tal plano em 05-03-2025.
Apreciando.
O plano de recuperação teve um quorum deliberativo de 94,24% dos créditos relacionados com direitos de voto. Recolheu votos favoráveis de 56,79% dos credores no enquadramento do artigo 17.º-F, n.º 5, alínea c), do CIRE, e votos desfavoráveis de 43,21%.
Por conseguinte, o plano foi aprovado, conforme consta da respetiva ata junta em 05-03-2025, que não mereceu qualquer oposição.
AT e ISS, IP juntaram pedido de não homologação por terem créditos indisponíveis.
Nos termos do artigo 17.º-F, n.º 7, do CIRE, “7 - Nos 10 dias seguintes à receção da documentação mencionada nos números anteriores, o juiz decide se deve homologar o plano de recuperação ou recusar a sua homologação, aplicando, com as necessárias adaptações, as regras previstas no título IX, em especial o disposto nos artigos 194.º a 197.º, no n.º 1 do artigo 198.º e nos artigos 200.º a 202.º, 215.º e 216.º, e aferindo: a) Se o plano foi aprovado nos termos do n.º 5; b) Se, no caso de classificação dos credores em categorias distintas, nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 17.º-C, os credores inseridos na mesma categoria são tratados de forma igual e proporcional aos seus créditos; c) Se, no caso de classificação dos credores em categorias distintas, nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 17.º-C, as categorias votantes discordantes de credores afetados recebem um tratamento pelo menos tão favorável como o de qualquer outra categoria do mesmo grau, e mais favorável do que o de qualquer categoria de grau inferior; d) Que nenhuma categoria de credores, a que alude a alínea d) do n.º 3 do artigo 17.º-C, pode, no âmbito do plano de recuperação, receber nem conservar mais do que o montante correspondente à totalidade dos seus créditos; e) Se a situação dos credores ao abrigo do plano é mais favorável do que seria num cenário de liquidação da empresa, caso existam pedidos de não homologação de credores com este fundamento; f) Se aplicável, que qualquer novo financiamento necessário para executar o plano de reestruturação não prejudica injustamente os interesses dos credores; g) Se o plano de recuperação apresenta perspetivas razoáveis de evitar a insolvência da empresa ou de garantir a viabilidade da mesma”.
Não resulta dos autos, mais concretamente da tramitação dos mesmos posterior à junção da versão definitiva do plano de recuperação (destacando-se a este propósito quer o próprio plano, quer o parecer do sr. Administrador Judicial Provisório), que não esteja verificado nenhum dos requisitos do inciso legal transcrito.
Para o efeito, remete-se para o requerimento do sr. Administrador Judicial Provisório de 01-04-2025, onde é feita uma síntese dos termos em que o plano satisfaz todos os requisitos para a sua homologação que é elucidativa da sua verificação nos autos concretos, abstendo-se o Tribunal de estar aqui a reproduzir os termos do mesmo, e que se dá por integralmente reproduzido por questões de economia processual.
No mesmo sentido advoga pela irrelevância dos pedidos de não homologação, uma vez que as alterações dos créditos da ATA e ISS, IP constantes do plano são ineficazes relativamente a esses credores.
Importa ainda atentar no facto de não ter sido apresentado qualquer pedido de não homologação do plano fundamentado na violação dos requisitos constantes do artigo 17.º-F/7 do CIRE, não podendo o Tribunal diminuir o facto de também ser aqui aplicável o princípio do dispositivo, uma vez que estão em causa direitos disponíveis.
Não se mostra violada qualquer regra procedimental ou relativa ao conteúdo do plano e não se vislumbra qualquer situação de prejuízo ou desigualdade injustificada para os credores advinda do mesmo (artigos 215.º e 216.º, ex vi do artigo 17.º-F, n.º 7, do CIRE).
Consigna-se que, não obstante, caso do plano resulte a violação d’alguma norma legal imperativa referente aos créditos da ATA e do ISS, IP, deverá tal previsão ser considerada como ineficaz (Ac. do STJ de 01-04-2014, proc. n.º 185/13.6TBCHV-A.P1.S1) relativamente a estes credores.
Assim, nos termos do artigo 17.º-F, n.º 7, do CIRE, deve homologar-se por sentença o plano de recuperação apresentado, o qual vincula os credores, mesmo os que não hajam participado nas negociações.
Pelo exposto, o tribunal homologa por sentença o plano de recuperação apresentado, que vincula os credores, mesmo os que não hajam participado nas negociações, com salvaguarda da ineficácia do mesmo em relação aos credores ATA e do ISS, IP no caso de violação de alguma norma legal imperativa referente aos seus créditos.
Valor tributário: € 30.000,00 – artigo 301.º do CIRE.
Custas a suportar pelo devedor.
Registe, notifique e publicite.
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Com a vertente decisão, cessam as funções do sr. Administrador Judicial Provisório.
Notifique o mesmo para indicar os fatores que entende por relevantes para a fixação da sua remuneração, e o valor que entende justo pelo trabalho desenvolvido nos autos.»
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Vejamos, pois, as questões que vêm suscitadas no recurso interposto da douta sentença homologatória do Plano de Revitalização e que demandam ainda a apreciação e decisão do Tribunal ad quem – basicamente, relativas à avaliação encetada pelo Tribunal a quo no sentido de nada ter vislumbrado que impedisse a homologação de tal Plano, que o credor, ora Apelante, “Instituto da Segurança Social, IP – Centro Distrital de Santarém” veementemente contesta (e contestou ao longo do processo) e, então, se a decisão do Tribunal a quo que assim o veio a considerar foi bem ou mal feita, de acordo ou ao arrepio dos factos e normas legais que a deveriam ter informado. É isso que hic et nunc está em causa, como se extrai das conclusões alinhadas no recurso apresentado e que supra já se deixaram transcritas para facilidade de percepção da própria questão solvenda.
[O que o Apelante não deixa de resumir nas duas seguintes conclusões do seu recurso: «4.º A indisponibilidade dos créditos tributários exige a declaração expressa da ineficácia do PER aos créditos reclamados pela Segurança Social; 9.º Assim, o Mm.º Juiz devia ter considerado expressamente o Plano ineficaz em relação à Segurança Social, uma vez que este credor não deu o seu consentimento expresso à modificação dos seus créditos, verificando-se violação da legislação específica da Segurança Social, bem como da legislação tributária, designadamente, o artigo 30.º da Lei Geral Tributária, que refere que os créditos da Segurança Social são indisponíveis».]
Pois, como é sobejamente conhecido, é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do CPC), naturalmente sem prejuízo das questões cujo conhecimento ex officio se imponha (vide artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, desse Código).
A douta sentença recorrida homologou tout court o plano de revitalização que foi aprovado pela maioria dos credores e lhe foi apresentado, mas sem dele excluir expressamente os créditos relativos à Segurança Social – embora nele tenha consignado que “não obstante, caso do plano resulte a violação d’alguma norma legal imperativa referente aos créditos da ATA e do ISS, IP, deverá tal previsão ser considerada como ineficaz (Acórdão do STJ de 01-04-2014, proc. n.º 185/13.6TBCHV-A.P1.S1) relativamente a estes credores”, assim deixando no ar tal possibilidade, o que constitui sempre uma técnica algo duvidosa pelas incertezas que isso poderá acarretar no futuro da sua respectiva aplicação.
Mas cremos bem, salva outra e melhor opinião, que o Apelante terá agora razão nas objecções que suscita ao trabalho da Mm.ª Juíza a quo, pelo que será ainda a douta sentença, nessa parte, objecto de censura através da sua respectiva revogação.
E assim, nos termos previstos no artigo 194.º, n.º 1, aplicável ao Plano de Recuperação ex vi do artigo 17.º-F, n.º 7, in fine, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante C.I.R.E.), aprovado pelo Decreto-lei n.º 53/2004, de 18 de Março – alterado e republicado no Decreto-lei n.º 200/2004, de 18 de Agosto e, ultimamente, também pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, diploma que lhe introduziu precisamente esse processo especial de revitalização e pelo Decreto-lei n.º 26/2015, de 06 de Fevereiro –, “O plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas” (para efeito do processo especial de revitalização, onde se refere Plano de Insolvência deve entender-se por reportado ao Plano de Recuperação ou de Revitalização).
E, segundo o seu n.º 2, “O tratamento mais desfavorável relativamente a outros credores em idêntica situação depende do consentimento do credor afectado, o qual se considera tacitamente prestado em caso de voto favorável” (o n.º 2 do seu artigo 192.º estabelecia que “O plano só pode afectar por forma diversa a esfera jurídica dos interessados, ou interferir com direitos de terceiros, na medida em que tal seja expressamente autorizado neste título ou consentido pelos visados”).
[A este propósito, vide, paradigmaticamente, Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, no seu “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado”, Reimpressão, 2009, da ‘Quid Juris’, na anotação 7ª ao artigo 192.º, a páginas 636, onde dizem: “Cremos, todavia, ser de admitir a não homologação, seja oficiosamente, com base no artigo 215.º, ou a requerimento do lesado, fundada no artigo 216.º, quando, não estando demonstrado o consentimento, tenha havido indevida afectação da posição jurídica dos interessados ou de terceiros”; e na anotação 1ª ao seu artigo 215.º, a páginas 712: “… este preceito continua a orientação do Direito anterior no sentido de conferir ao tribunal o papel de guardião da legalidade, cabendo-lhe, em consequência, sindicar o cumprimento das normas aplicáveis como requisito da homologação do plano” – transmitindo, assim, a ideia do papel interventor e conformador do Tribunal.]
Esta é, pois, a matriz e o ponto de partida da discussão.
[Recorde-se que é esse o regime estabelecido no artigo 17.º-F do C.I.R.E. donde não resulta que o juiz tenha que fazer aprofundada análise da situação económica ou financeira da visada, apenas, dos requisitos de natureza formal que ali constam, deixando, nesse papel conformador do juiz, nas mãos dos credores as demais questões que se liguem à própria recuperação. Pois que não podem perder-se de vista as finalidades de recuperação desses Planos e um tal papel regulador e guardião do juiz na defesa da legalidade (e existindo o necessário controlo e garantia jurisdicionais, com os limites fixados pelo CIRE, nos seus artigos 215.º e 216.º, aqui aplicáveis ex vi do citado artigo 17.º-F, n.º 7, que manda aplicar nesta sede de revitalização, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos artigos 215.º e 216.º – nosso sublinhado.]
Ora, pelo seu artigo 215º se estabelece que “o juiz recusa oficiosamente a homologação do plano de insolvência aprovado em assembleia de credores no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza e ainda quando, no prazo razoável que estabeleça, não se verifiquem as condições suspensivas do plano ou não sejam praticados os actos ou executadas as medidas que devam preceder a homologação”.
E segundo o seu artigo 216.º, n.º 1, “o juiz recusa ainda a homologação se tal lhe for solicitado pelo devedor, caso este não seja o proponente e tiver manifestado nos autos a sua oposição, anteriormente à aprovação do plano de insolvência, ou por algum credor ou sócio, associado ou membro do devedor cuja oposição haja sido comunicada nos mesmos termos, contanto o requerente demonstre em termos plausíveis, em alternativa, que – a) a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano, designadamente face à situação resultante do acordo já celebrado em procedimento extrajudicial de regularização de dívidas – b) o plano proporciona a algum credor um valor económico superior ao montante nominal dos seus créditos sobre a insolvência, acrescido do valor das eventuais contribuições que ele deva prestar”.
O Apelante opôs-se à homologação, pese embora seja do conhecimento oficioso do tribunal a apreciação “de violação das normas aplicáveis ao seu conteúdo”, nos termos do referido artigo 215.º, aqui remetendo para o artigo 194.º, ambos do CIRE. Entende a doutrina (vide Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, na obra citada, anotação 5ª, artigo 215.º, a págs. 713) que “são não negligenciáveis, todas as violações de normas imperativas que acarretem a produção de um resultado que a lei não autoriza”. E ao juiz compete aquilatar, oficiosamente, da violação de quaisquer normas imperativas.]
No caso sub judicio, tudo aponta para que se tenham utilizado critérios de duvidosa conformação com as leis aplicáveis ao caso dos créditos da Segurança Social (e por impostos, embora, quanto a esses, não se tenha deduzido recurso).
Com efeito, preceitua o artigo 30.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária, que “o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária”. E decorre do seu artigo 36.º, n.º 3, que “a Administração Tributária não pode conceder moratórias”.
Ademais, com a entrada em vigor da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12 (Lei do Orçamento de Estado para 2011), os créditos tributários deixaram de poder ser afectados pelo plano de insolvência, pois foi acrescentado um n.º 3 a esse citado artigo 30.º, cujo regime passou a prevalecer sobre qualquer legislação especial – artigo 30.º, n.º 3, da LGT, na redacção do artigo 123.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12 – e decorre do artigo 125.º da referida Lei do Orçamento do Estado, sob a epígrafe “Disposições transitórias no âmbito da LGT”, que o disposto no n.º 3 do artigo 30.º da LGT é aplicável designadamente aos processos de insolvência que se encontrem pendentes e ainda não tenham sido objecto de homologação.
Daí concluir-se que após tais alterações, em face das normas imperativas vigentes, deixou de ser legalmente possível homologar um plano de insolvência ou revitalização que contemple a redução, extinção ou moratória de créditos de natureza tributária, sem que o Estado (a Fazenda Pública ou a Segurança Social) tenha votado favoravelmente tal opção.
Pois que, nos termos previstos no artigo 190.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (CRCSPSS: Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro), tais regimes carecem de aprovação [vide o seu n.º 6: “Sem prejuízo das competências próprias das instituições de segurança social nas Regiões Autónomas, a autorização a que se refere o n.º 1 do presente artigo é concedida por deliberação do conselho diretivo do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP (IGFSS, IP)”]. E o nº 1 diz: “A autorização do pagamento prestacional de dívida à Segurança Social, a isenção ou redução dos respetivos juros vencidos e vincendos, só é permitida nos termos do presente artigo, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte e das regras aplicáveis ao processo de execução fiscal”. E, segundo o n.º 2, “As condições excecionais previstas no número anterior só podem ser autorizadas quando, cumulativamente, sejam requeridas pelo contribuinte, sejam indispensáveis para a viabilidade económica deste e desde que o contribuinte se encontre numa das seguintes situações: a) Processo de insolvência, de recuperação ou de revitalização” (logo, na revitalização é necessária essa aprovação da tutela).
E tem sido entendido pela jurisprudência que a homologação de plano de revitalização aprovado pelos credores, com o voto contra do Estado – por não respeitar o regime previsto na lei relativamente a créditos tributários (impostos e da Segurança Social) – é ineficaz em relação ao próprio Estado, quanto a ele não produzindo quaisquer efeitos.
Temos, assim, que entender que a homologação que foi feita não é legal, pelo que, nesse enquadramento, não cremos que a mesma – que consta da douta sentença impugnada – possa manter-se na ordem jurídica, por padecer de vícios que a conduzem a uma solução não permitida por lei, e assim vindo a proceder o presente recurso de Apelação.
E, em conclusão, dir-se-á: (…)
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Decidindo.
Assim, face ao que se deixa exposto, decide-se conceder provimento ao recurso e revogar parcialmente a douta sentença que homologou o Plano de Revitalização, sendo este ineficaz em relação aos créditos da Segurança Social.
Custas pelo devedor.
Registe e notifique.
Évora, 29 de Maio de 2025
Mário João Canelas Brás