PRÉDIO URBANO VS PRÉDIO RÚSTICO
DIREITO DE PREFERÊNCIA
EFETIVA EXPLORAÇÃO DE PRÉDIO RÚSTICO
Sumário

I - A distinção entre prédio rústico e urbano deve assentar numa avaliação casuística, tendo subjacente o critério base de destinação ou afetação económica.
II - Com o direito de preferência pretende-se propiciar o emparcelamento de terrenos com área inferior à unidade de cultura, com vista a alcançar-se uma exploração agrícola tecnicamente rentável. Assim, o exercício do direito de preferência deve estar vinculado à efetiva exploração dos terrenos rústicos para fins de cultura florestal e/ou agrícola.
(Sumário elaborado pelo Relator)

Texto Integral

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Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

AA e marido, BB, intentaram ação contra CC e mulher, DD, e EE e mulher, FF, pedindo que lhes seja reconhecido o direito de haver para si o prédio objeto do contrato de compra e venda celebrado por documento particular de 21/09/2018.

Alegam para tanto e em síntese:

São donos dos pinhais que identificam, confinantes entre si, sendo que o segundo confronta, do seu lado sul, com o eucaliptal inscrito na matriz rústica da respetiva freguesia sob o artigo ...47;

Por documento particular autenticado, datado de 21 de setembro de 2018, os 1ºs RR. declaram vender ao 2.º R. marido, pelo preço de € 1.600,00 (mil e seiscentos euros), o prédio descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...33/... e inscrito na matriz rústica da respetiva freguesia sob o artigo ...47;

Os 2.ºs RR não são proprietários de quaisquer rústicos confinantes;

Nem os 1.ºs RR., nem os 2.ºs RR. deram conhecimento aos AA. dos elementos essenciais da venda, tais como a pessoa do comprador, o preço e as condições de pagamento, mais descrevendo as circunstâncias em que tiveram conhecimento da venda do prédio aos 2ª RR.

Os Réus contestaram, pedindo que seja declarado que o preço efectivamente pago pela compra e venda em questão foi de 8.000,00 €; para o caso da procedência da ação, pedem 1.485,00 €, valor das benfeitorias referidas nos artigos 54 a 57 da reconvenção.

Alegam, em síntese:

No final do mês de junho de 2018, o 1.º R. disse ao A. que tencionava vender o terreno em causa pelo preço de 8.000,00€. O A. ofereceu ao 1.º Réu o valor de 5.000,00 €, ao que o 1.º Réu respondeu que o réu EE já lhe tinha oferecido 8.000,00€, tendo o A. dito que 1.º Réu que poderia vender o terreno porque por aquele preço não estava interessado.

De seguida, o 1.º disse ao 2.º Réu para marcar a escritura tendo sido dito por este que só faria a escritura depois do 1º Réu colocar 2 marcos na linha divisória do seu terreno com o do A. O 1.º Réu comunicou então ao A. a exigência do 2.º Réu e, alguns dias mais tarde, o A. e o 1.º Réu deslocaram-se ao terreno, num domingo de manhã, tendo então sido endireitada a linha divisória, a pedido do A. e colocado 2 marcos.

Após a venda, e durante quase 5 anos, os AA. tiveram conhecimento que os 1.ºs RR já não eram donos do imóvel em questão e que os 2.ºs RR estavam na posse do mesmo.

Os Autores instauraram a ação para se vingarem dos 2.ºs RR, por pensarem que foram eles a queixar-se à Proteção Civil. E como verificaram que os RR. haviam cometido o erro de declararem apenas 1.600,00€ como preço, viram nisso mais um pretexto para se vingarem dos 2.ºs RR.

Os 2.ºs RR são donos do prédio rústico sito em ..., que confronta do norte com GG com HH e poente com caminho, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...45 da união das freguesias ..., ..., ... e ..., que proveio do artigo ...30 da freguesia ..., com a área real de 5226.1 m2, terreno que se destina a agricultura.

Da própria confissão dos autores, consagrada nos artigos 24 e 25 da p.i. resulta evidente que os RR, no documento particular de compra e venda, simularam o preço, ou seja, declararam um preço inferior ao efetivamente acordado e pago.

Após a compra do terreno ao 1.º R., os 2.ºs RR efetuaram nele diversas benfeitorias e valorizaram-no, nomeadamente procederam ao arranque dos cepos dos eucaliptos e pinheiros, cerca de 40, em toda a propriedade, procederam à limpeza e regularização do terreno, no que despenderam 750,00 € e nele plantaram 11 oliveiras, 4 nespereiras, 1 figueira, 1 abacateiro, 1 zapote, 7 maracujeiros e 7 catos figos da índia, e aplicaram as respetivas estacas em madeira para suporte, no que despenderam 485,00 € e nele instalaram um sistema de rega gota a gota, no que despenderam 250,00 €.

Os AA vieram replicar, dizendo, em síntese:

Não houve simulação do preço; não existe nos autos qualquer prova escrita que possa levar a concluir o contrário: o preço efetivo da compra e venda foi no valor de € 1.600,00.

Nunca antes de fevereiro de 2023 os AA. tiveram conhecimento do negócio, nunca foram notificados para a preferência, sendo certo que a preferência deve ser feita a ambos os cônjuges quando o respetivo direito a ambos pertença em comum, como é o caso dos autos.

Realizado o julgamento, foi proferida a seguinte decisão:

1. Condena-se os Réus a reconhecerem à autora, AA, o direito de preferência na compra do prédio rústico efetuada no documento referido em II. 1 a) 8. e, consequentemente, a substituir os réus EE e FF, na titularidade do prédio inscrito na matriz rústica sob o artigo ...47 (anteriormente inscrito na matriz rústica da freguesia ... sob o artigo ...31), descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...33/..., adquirido por 1.600,00€ (mil e seiscentos euros), absolvendo-os do pedido do Autor.

2. Condenam-se os réus EE e FF a abrirem mão e a entregar à Autora o referido prédio, absolvendo-os do pedido do Autor.

3. Ordena-se o cancelamento da inscrição relativa à Ap. ...79 de 2018/10/02 do prédio descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...33/... e as que eventualmente lhes tenham sucedido.

4. Atribui-se aos réus EE e FF a quantia depositada nos autos pelo Autora de 1.600,00€ (mil e seiscentos euros).

5. Julgo parcialmente procedente a reconvenção, condenando a autora AA a pagar aos réus EE e FF a quantia de 312,80€ (trezentos e doze euros e oitenta cêntimos), absolvendo-a do mais peticionado na reconvenção.

6. Absolvo o autor, BB dos pedidos reconvencionais.


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Inconformados, os Réus recorreram e apresentam as seguintes conclusões:

1. Os 2.ºs RR são donos e legítimos proprietários do seguinte prédio rústico: Prédio rústico, sito em ..., a confrontar do norte com GG com HH e poente com caminho, com a área de 4.950 m2, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...45 da união das freguesias ..., ..., ... e ..., que proveio do artigo ...30 da extinta freguesia .... Facto provado II 1. a) 13 da d. sentença, e admitido por acordo das partes.

2. É também admitido por acordo das partes que aquele prédio rústico confina do

norte com o prédio rústico objecto da preferência.

3. Não lograram os RR provar que aquele imóvel constitua mero logradouro do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ...95.

4. No facto provado II 1. a) 14 consta que, a nascente da casa, têm zona de jardim

seguida de passagem de acesso à casa (de veículos), seguida de zona com árvores de fruta, que também existem para sul e poente da mesma casa, entre elas laranjeiras, oliveiras, figueiras, pereiras, macieiras, diospireiros, videiras, algumas com sistema de rega gota a gota, sendo que na zona mais poente do terreno não existem árvores, existindo apenas em parte do limite poente, junto da vedação aí existente, videiras. Ou seja, existem árvores de fruto no terreno dos 2.ºs RR a nascente, sul e poente da casa.

5. No facto provado II 1. a) 16 consta que na zona situada a nascente da casa, na referida vedação do lado norte existe abertura com portão, referido em II. 1. a) 15., em chapa, que permite a passagem para o prédio do art. ...47, referido em 6. Ou seja, não obstante a existência de uma vedação, a norte dos prédios dos 2.ºs RR, com placas de cimento amovíveis, existe uma abertura com portão que dá acesso ao terreno dos 2.ºs RR para o prédio objecto da preferência, onde os 2.ºs RR cultivam as 25 árvores de fruto e mais catos figos da índia referidos em II 1.a) 25.

6. Dos provados os factos II 1. a) 10, 13, 14, 15 e 16, das imagens obtidas via Google juntas aos autos, do doc. n.º 1, junto com a contestação, e dos depoimentos transcritos não podem restar dúvidas que: a) O prédio rústico existe, e que nele os 2.ºs RR cultivam essencialmente árvores de fruto. b) O artigo urbano casa e barracão tem a superfície coberta de 213 m2 e descoberta (jardim e acessos) de 776,10 m2. c) O terreno rústico, quer o cultivado com árvores de fruto, quer o restante que não constitui logradouro da casa, continua com o mesmo fim agrícola e florestal, e a sua área é de 5.226,10 m2. d) A vedação norte dos imóveis dos 2.ºs RR é efectuada por placas amovíveis, facilmente retiráveis, sendo essa vedação interrompida por um portão que dá

acesso do terreno dos 2.ºs RR para o terreno objecto de preferência. Assim, aqueles factos não provados 1 e 2 deverão declarar-se provados.

7. Os terrenos pertencentes aos AA têm, o artigo 651, a área de 1250 m2, e artigo

649 a área de 1260 m2 (factos II 1. a) 1 e 2) no total de 2.560 m2.

8. Os AA. não lograram provar o que alegaram provar nos artigos 18, 20 e 21 da d. petição, ou seja, que o terreno dos 2.ºs RR não tenha a natureza rústica, agrícola e florestal, e que este se encontra totalmente murado. Aliás, recai sobre os AA. o ónus de prova de que à data da compra, o R. adquirente não era dono de nenhum prédio rústico confinante com o vendido, sendo este pressuposto do direito de preferência.

9. Os AA. não detêm o direito de preferência que invocaram.

10. Face aos depoimentos das testemunhas II e EE, e aos depoimentos dos RR. EE e CC e restante prova, é forçoso concluir que o facto II 1 a) 23 ocorreu na sequência do facto 22, ou seja, o A. e o 1.º R deslocaram-se ao terreno tendo então sido endireitada a linha divisória e colocado os marcos, após o facto referido em II 1.a) 17, que o 1. R informou o A. que o interessado na venda era o 2.º R e que não estava interessado na compra por preço superior a 5.000,00 €.

11. O facto 4 não provado deverá provar-se como provado, ou seja, nas circunstâncias referidas em II. 1. a) 24. o A. encontrou-se no terreno com o filho do 2º Réu e com o maquinista, tendo-lhe sido dito que o dono da máquina havia sido chamado pelo 2º Réu, que havia comprado o terreno.

12. Consequentemente, também o facto II 1. a) 9 deve ser alterado, declarando-se

provado que 1º Réu (CC) comunicou aos AA. os elementos do negócio referido em 8., nomeadamente identificação do comprador, preço e condições de pagamento.

13. Aliás, aquele facto está em contradição com o facto II 1.a) 17 e com os depoimentos citados, para além de constituir um facto conclusivo.

14. Não obstante esteja demonstrado que o 1.º R informou o A. de que o interessado na compra era o 2.º R, essa indicação não é elemento essencial da comunicação prevista no artigo 1410 n.º 1 do Código Civil, face ao caso concreto da venda a proprietário confinante.

15. Os AA. renunciaram, pois, ao direito de preferência e, ainda que assim se não entenda, tomaram conhecimento dos elementos essenciais da venda há mais de 6 meses relativamente à data em que instauraram a presente acção.

16. “Se, depois de lhe ter sido comunicado o projeto de alienação e as cláusulas do respectivo contrato, o preferente declara que não quer preferir, deve entender-se que renunciou ao seu direito. A renúncia não depende de qualquer formalidade e pode ser expressa ou tácita.” (Código Civil Anotado – ao artigo 416)

17. Quer com fundamento na renúncia ao invocado direito de preferência, quer com fundamento na caducidade, devem os RR. ser absolvidos do pedido. (Artigo 576 n.º 3 do Código Civil)

18. Se os AA. tivessem realmente interessados na compra do terreno e não soubessem das condições essenciais do negócio, era seu dever também diligenciar para se informar das condições convencionadas no contrato de compra e venda, agindo segundo as regras da boa fé, tanto mais que eram amigos e falaram por duas vezes sobre a proposta de venda.

19. O que motivou os AA. a propor esta acção foi o facto de, como referem no artigo 32 da d. p.i., os AA. estarem convictos de que tenha sido o 2.º A. a apresentar queixa no Serviço Municipal de Protecção Civil para que os AA. procedessem à limpeza do seu terreno.

20. E como verificaram que os RR. haviam cometido o erro de declararem apenas

1.600,00 € como preço, viram nisso mais um pretexto para se vingarem dos 2.ºs RR.

21. Ao instaurarem a presente acção, os AA. excedem manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico do seu alegado direito. (Artigo 334 do Código Civil). Pelo que, se lhe assistisse o direito que invocam nesta acção, o mesmo deverá ser declarado ilegítimo.

22. Da própria confissão dos autores, consagrada nos artigos 24 e 25 da d. p.i. resulta evidente que os RR, no documento particular de compra e venda, simularam o preço, ou seja, declararam um preço inferior ao efectivamente acordado e pago: se os AA. lhe ofereceram 5.000,00 €, não faria sentido os 2.ºs RR. venderem por 1.600,00 €.

23. E fizeram-no com o objectivo de pagar um valor inferior de Imposto Municipal

de Transações e de Imposto de Selo e de mais valias por parte dos vendedores, assim enganado o estado.

24. E fizeram-no também na confiança de que os AA. haviam renunciado ao direito de preferência que eventualmente lhes assistisse.

25. O preço acordado entre os RR., compradores e vendedores, foi de 8.000,00 €, como resulta do depoimento dos RR CC, EE e da testemunha EE, não havendo outros depoimentos que o contradigam.

26. Tendo os AA. confessado que o 1.º R marido lhes tinha dito que já tinha uma

proposta de 8.000,00 € para a venda do terreno, que o A. ofereceu 5.000,00 € e que o 1.º R não aceitava, é evidente, claro e manifesto que o 1.º R não iria vender o terreno por 1.600,00 €, nem por menos de 5.000,00 €.

27. É um facto notório, que nem carece de prova (artigo 412 n.º 1 CPC) e que como tal deve ser considerado pelo Juiz. (Artigo 5 n.º 2 c) CPC)

28. Que o preço da venda não foi inferior a 5.000,00 €, constitui uma presunção judicial. (Artigo 349 Código Civil)

29. Aquela confissão dos AA permite só por si, deduzir a existência da simulação do preço.

30. Também os documentos juntos com a contestação sob os números 5, 6, 7 e 8

constituem um começo de prova escrita que permite o recurso à prova testemunhal.

31. No mesmo sentido, e entre outros, citam-se as conclusões do acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 25.02.2021, processo 706/19.0T8AMT.P1 in https://www.dgsi.pt/ “I - Se a análise das circunstâncias do caso concreto tornar verosímil a existência da convenção das partes, contrária ou adicional ao conteúdo de documento autêntico, quer as convenções sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores, poderá ser admissível a prova testemunhal acerca desta; II - Em tal hipótese, o recurso às testemunhas já não apresenta os perigos a

que os artigos 394.º e 395.º Código Civil visam obstar, porquanto o juízo do tribunal se apoiará, nestas circunstâncias, não apenas nos depoimentos testemunhais, mas também nas circunstâncias objetivas que tornem verosímil a convenção: estas circunstâncias servem de base inicial à formação da convicção do tribunal, e a prova testemunhal limita-se a completar essa convicção, ou antes, a esclarecer o significado dessas circunstâncias.

32. Face ao exposto o facto não provado II 1. a) 7 deve declarar-se provado nos seguintes termos: O preço acordado e pago pelos 2ºs RR ao 1º Réu não foi o indicado no

documento referido em II.1. a) 6., mas 8.000,00€, o que fizeram para pagar menos Imposto Municipal de Transações, Imposto de Selo e mais valias.

33. Nunca os AA manifestaram vontade em adquirir o imóvel, por outro preço, nem formularam na réplica pedido subsidiário de reconhecimento do direito de preferência pelo preço que viesse a ser considerado e efectivamente pago, como o permite o artigo 265 do CPC. Nem os AA procederam ao depósito, ainda que condicional, do preço invocado pelos RR.

34. Assim, a provar-se que o preço efectivamente pago foi de 8.000,00 €, (ou até

5.000,00 €), deverão V. Ex. julgar improcedente o pedido dos AA por não poder ser proferida decisão “ultra petitum”. (Artigo 609 CPC)

35. Face aos factos provados em II 1. a) 24, 25 e 26, parece-nos evidente que o arranque de cepos de pinheiros e eucaliptos que se encontravam no terreno, a limpeza e a regularização do terreno, e depois de ser lavrado nele terem plantado árvores de fruto com aplicação de estacas em madeira para suporte e nele terem instalado um sistema de rega gota a gota, todas essas intervenções valorizam o terreno.

36. Criar um pomar num terreno inculto, com cepos de pinheiros e eucaliptos, parece-nos manifesto que isso valoriza o terreno.

37. Face aos depoimentos das testemunhas II e EE, e não havendo outros em contrário, deve consequentemente, o facto não provado II 1. b) 9 deve declarar-se provado com a seguinte redacção: com a limpeza do terreno, as árvores, estacas e sistema de rega referidos em II. 1. a) 24. e 25. os 2.ºs RR despenderam 750,00 €, 485,00 € e 250,00 €, respectivamente.

38. Ainda que se entenda não existirem elementos para fixar os valores, deverá o Tribunal condenar no que vier a ser liquidado em execução de sentença. (Artigo 609 n.º 1 CPC)

39. Na d. sentença não se fez correta interpretação e aplicação do disposto nos artigos 216, 334, 342, 349, 351, 379, 393, 394, 416, 1380, 1381, 1410 n.º 1 do Código Civil, bem como o disposto nos artigos 576, 412 n.º 1, 5 n.º 2 c) todos do CPC.

Pelo exposto, e com o d. suprimento de V. Ex., deve o presente recurso ser julgado procedente e provado, revogar-se a d. sentença e proferir-se acórdão que, conhecendo da inexistência do direito de preferência por parte dos AA, da renuncia e caducidade do direito invocado pelos AA, e do abuso do direito, e da simulação do preço, declarar-se que o preço efectivamente acordado e pago foi de 8.000,00 €, absolva os RR dos pedidos formulados pelos AA. Na hipótese da procedência da acção, devem os AA. ser condenados a pagar aos RR, além da quantia de 312,80 €, a quantia de 1.485,00 €, ou, se ainda assim se não entender, na quantia que vier a ser liquidada em execução de sentença.


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           Contra-alegaram os Autores, defendendo a solução encontrada pelo tribunal recorrido.

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            As questões a decidir são as seguintes:

            A reapreciação da matéria de facto impugnada;

            A caraterização do prédio inscrito na matriz sob o art....45;

           O conhecimento dos termos do negócio pelos Autores; a caducidade do seu direito e a sua renúncia;

            O abuso do direito dos Autores;

            A simulação do preço; a confissão dos Autores;

            As benfeitorias e a valorização do terreno.


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A reapreciação da matéria de facto impugnada.

Os Recorrentes questionam os factos assentes em 9 e os não provados em 1, 2, 4, 7 e 9.

Os Recorrentes invocam os articulados, os documentos, uma pretensa confissão dos Autores, as imagens obtidas, o levantamento topográfico, os depoimentos de II, EE, EE e de CC.

Na reapreciação dos factos, o Tribunal da Relação altera a decisão proferida sobre a matéria de facto se a prova produzida, reapreciada a pedido dos interessados, impuser decisão diversa (art.662, nº1, do Código de Processo Civil).

Este tribunal forma a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos impugnados.

Reapreciada a prova indicada, não encontramos elementos para alterar o decidido, julgando assim improcedente a impugnação feita pelos Recorrentes.

Vejamos:

Está em causa um prédio rústico da Autora, composto de pinhal/ eucaliptal, com uma área inferior à unidade de cultura.

Está em causa a aquisição de um eucaliptal, artigo rústico ...47.

Discute-se se o prédio ...45 é rústico confinante deste ...47 (factos não provados em 1 e 2).

Como podemos caraterizar o art. ...45?

           Tendo em conta a jurisprudência do STJ, acórdão de 14.1.2021, proc. 892/18, em www.dgsi.pt., devemos atentar especialmente, conforme as imagens obtidas do local, as inscrições registais e as declarações do Réu EE:

           Naquele prédio, descrito como eucaliptal, foi implantado o urbano ...95.

            De eucaliptal já não tem nada.

            Não se vislumbra nele qualquer exploração agrícola ou silvícola. É certo que tem algumas árvores de fruto, diferenciadas, mas parecem servir o quintal/ jardim da habitação, um pomar doméstico, com um eventual simples consumo dos Réus.

            No urbano habitam os segundos Réus.

            O prédio foi murado.

           Na descrição predial do urbano ...95 consta que confronta a nascente com estrada e a poente com caminho e a norte com CC, elementos que indiciam que o urbano ocupa de nascente a poente toda a área representada no doc. 1, junto com a p.i, junto à extrema norte.

            O levantamento topográfico encaixa esta separação a norte, com o muro, de nascente a poente.

            O facto provado em 14, não impugnado, procura ser expressão da transformação operada no antigo eucaliptal: a habitação, o logradouro, as árvores de fruto diversas, os veículos acumulados, o barracão, o restante espaço vazio.

           A abertura, no muro, para o ...47 pode ser já resultado da aquisição deste.

            Neste contexto, não se pode afirmar que exista um eucaliptal, o art. rústico ...45, que confine com o ...47, parecendo existir antes a urbanização do ...45 e o seu muro a confinar com o ...47.

            Sobre a comunicação dos elementos do negócio:

           O facto provado em 9 não é conclusivo e não está em contradição com o provado em 17.

Desde logo e relativamente à Autora mulher, AA, está perfeitamente assente que nunca ninguém falou com ela, dando-lhe conhecimento do negócio ou falando deste.

            Quanto ao Autor, que não é proprietário do prédio que beneficiou da preferência, considerando o seu depoimento, o dos Réus e o do filho do segundo Réu, EE, conferimos a sua contradição, não permitindo esta assegurar qual a versão verdadeira, pois que ninguém presenciou as suas invocadas conversas.

Quanto ao facto não provado em 4, embora II e EE o suportem, a contradição referida antes e a consideração da imediação do Tribunal recorrido, da forma como depuseram, da falta de espontaneidade e a discordância respeitante ao veículo em que o Autor se deslocava na altura (não merecendo credibilidade para invalidar o que disse o Autor), mantém a dúvida já assinalada.

De qualquer maneira, esta discussão relativa ao Autor apresenta-se inútil porque, relativamente à Autora, a quem importa a preferência, nada se alegou ou provou, a não ser o que consta do facto 19.

Sobre a simulação do preço:

No documento particular autenticado, de compra e venda, consta que os contraentes declararam que o preço é 1.600,00€, já recebido pelo vendedor, do qual este dá quitação.

Os contraentes invocam nesta ação a simulação do preço, o que fizeram para pagarem menos impostos, pois segundo dizem, o preço real foi 8.000,00€.

O Tribunal recorrido é exaustivo e correto na explicação do afastamento da prova testemunhal. Conforme os arts.240, 241, 351 e 394 do Código Civil, interpretados conforme o acórdão desta Relação, de 6.2.2024, proc. 1519/21, em www.dgsi.pt, importa considerar que, no caso, nenhum documento junto constitui um princípio de prova da simulação, não tendo essa natureza os docs. 5 a 8 juntos com a contestação.

Os Recorrentes invocam uma confissão dos Autores, mas esta não existe. Conforme o art. 5 da réplica, os Autores até apresentam uma justificação para o preço ser o declarado (1.600 €).

Quanto ao facto não provado em 9 (valores dos trabalhos provados):

Considerando o que já se disse a respeito dos depoimentos do Réu EE, de II e de EE, não tendo sido junto qualquer outro apoio probatório, nomeadamente documental, a prova tem-se por insuficiente.

Pelo exposto, julgamos improcedente a impugnação feita pelos Recorrentes e mantemos a matéria de facto como fixada.


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Os factos provados são os seguintes:

1. Encontra-se inscrito na matriz rústica sob o artigo ...51 (anteriormente inscrito na matriz rústica da freguesia ... sob o artigo ...33) o prédio com descrição de “pinhal atravessado por estrada”, sito em ..., união das freguesias ..., ..., ... e ..., concelho ..., com a “área total (ha): 0,125000”, descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...25/..., com inscrição de aquisição, por compra, a favor dos Autores (no estado civil de casados, um com o outro) no regime de comunhão de adquiridos, pela Ap. ...4 de 2012/04/23.

2. Encontra-se inscrito na matriz rústica sob o artigo ...49 (anteriormente inscrito na matriz rústica da freguesia ... sob o art. ...32) o prédio com descrição de “pinhal”, sito em ..., união das freguesias ..., ..., ... e ..., concelho ..., com a “área total (ha): 0,126000” descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...09/..., com inscrição de aquisição, por partilha de herança, a favor da Autora (então no estado civil de solteira) pela Ap. ...0 de 1999/11/18.

3. O prédio indicado em 1. veio à posse dos Autores por escritura de compra e venda de 20/04/2012, lavrada a folhas 122, do livro ..., do Cartório Notarial ... a cargo da Notária JJ.

4. O prédio indicado em 2. veio à posse da Autora por Inventário Obrigatório, processo n.º ...7, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca ..., onde constituía a verba 34.

5. Os referidos prédios são compostos atualmente de eucaliptal.

6. Encontra-se inscrito na matriz rústica sob o artigo ...47 (anteriormente inscrito na matriz rústica da freguesia ... sob o artigo ...31), o prédio com descrição de “eucaliptal e pinhal”, sito em ..., união das freguesias ..., ..., ... e ..., concelho ..., com a “área total (ha): 0,270000”, descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...33/..., com inscrição de aquisição, por compra, a favor dos réus EE e FF, 2ºs RR (no estado civil de casados, um com o outro, no regime de comunhão de adquiridos), pela Ap. ...79 de 2018/10/02.

7. Os prédios identificados em 1. e 2., são confinantes entre si, sendo que o prédio identificado em 2. confronta, do seu lado sul, com o prédio identificado em 6.

8. Por documento particular, datado de 21/09/2018, autenticado pela Solicitadora KK, cfr. docs. 9 da p.i., cujo teor se dá aqui por reproduzidos, em que constam como primeiros contraentes CC e mulher DD, “casados sob o regime da comunhão de adquiridos” e como segundo contraente EE, “casado no regime da comunhão de adquiridos com FF” consta na cláusula 1ª que:

“O Primeiro Contraente é dono e legítimo possuidor do PRÉDIO RÚSTICO, composto por “Eucaliptal e Pinhal, sito em ..., (…) descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o número .../... (…) inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...47 (…)”;

Na 2ª que: “Pelo presente contrato o Primeiro Contraente vende ao Segundo Contraente, livre de quaisquer ónus ou encargos, o imóvel atrás identificado, pelo preço de €1.600,00 (mil e seiscentos euros), que recebeu e do qual dá a respetiva quitação.”;

Na cláusula 4ª que: “O Segundo Contraente declara que aceita a presente venda nos termos exarados”;

E na cláusula 5ª que: “A primeira contraente mulher declara dar o necessário consentimento à presente venda.”

9. O 1º Réu (CC) não comunicou aos AA. os elementos do negócio referido em 8., nomeadamente identificação do comprador, preço e condições de pagamento.

10. Encontra-se inscrito na matriz urbana o prédio de "r/chão destinado a habitação com 4 divisões, cozinha, 2 casas de banho, sótão amplo destinado a arrumos, cave destinada a arrumos, garagem e logradouro”, sito em ..., freguesia união das freguesias ..., ..., ... e ..., concelho ..., com a “área total do terreno/área de implantação do edifício”:152,0000 m2; “área bruta de construção: 288,0000m2”; “área bruta dependente:136,0000m2”; “área bruta privativa: 152,0000m2”, inscrito na matriz da respetiva freguesia sob o artigo ...95 (anteriormente inscrito na matriz urbana da freguesia ... sob o artigo ...73), descrito na ... Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...33/..., com as seguintes confrontações: “Norte, CC; Sul, LL; Nascente, Estrada; Poente, Caminho” tem inscrição de aquisição, por compra, a favor do réu “EE casado com FF, no regime de comunhão de adquiridos”, pela ap. ...2 de 1977/11/12.

11. É neste prédio, casa de habitação e logradouro, que os 2.ºs RR. residem, prédio que se situa na Rua ..., ..., Quinta ..., ....

12. Este prédio urbano confina a norte com o prédio rústico referido em 6.

13. Encontra-se inscrito na matriz rústica sob o artigo ...45 (anteriormente inscrito na matriz rústica da freguesia ... sob o artigo ...30), o prédio com a descrição de “eucaliptal” sito em ..., freguesia união das freguesias ..., ..., ... e ..., concelho ..., com a “área total (há): 0,495000” com titular (…): EE (…) Propriedade plena”, com as seguintes confrontações: “Norte: GG: HH: MM: caminho”, prédio dos 2ºs Réus.

14. A poente da casa referida em II.1.a) 14., os 2.ºs RR. tem barracões e outros objetos, havendo ainda uma zona para sul onde se encontram alguns veículos; para nascente, daquela casa têm zona de jardim seguida de passagem de acesso à casa (de veículos), seguida de zona com árvores de fruta, que também existem para sul e poente da mesma casa, entre elas laranjeiras, oliveiras, figueiras, pereiras, macieiras, diospireiros, videiras, algumas com sistema de rega gota a gota, sendo que na zona mais poente do terreno não existem árvores, existindo apenas em parte do limite poente, junto da vedação aí existente, videiras.

15. Os prédios referidos em II. 1. a) 10., 11., 13. e 14. encontram-se vedados por placas de cimento amovíveis no lado norte, onde também há um portão, lado sul e lado poente, onde também há um portão, e a nascente por muro de alvenaria e dois portões.

16. Na zona situada a nascente da casa, na referida vedação do lado norte existe abertura com portão, referido em II. 1. a) 15., em chapa, que permite a passagem para o prédio do art. ...47, referido em 6.

17. O 1.º R. marido há cerca de 6 anos atrás (com ref. à data da propositura da ação) contatou o A. dizendo-lhe que tinha o terreno referido em 6. à venda e que tinha proposta de 8.000,00€, tendo o A. oferecido àquele a quantia de 5.000,00€, quantia não aceite pelo 1º R.

18. No dia 14/02/2023 a Autora foi contactada pessoalmente, em sua casa, por uma Sra. Fiscal da Câmara Municipal ... (CM...), que lhe deu conhecimento de uma queixa apresentada pelo proprietário do terreno vizinho, residente no ...53, para que procedesse à limpeza de matos, silvas, vegetação e à desramação das árvores no terreno rústico referido em 2.

19. Após este contacto da Técnica da CM... a Autora. fez pesquisas no sentido de obter informação fidedigna e atualizada quanto à identificação do proprietário do terreno rústico confinante a sul com o descrito em II.1. a) 2.

20. Tendo obtido, a 16/02/2023, informação/documentos de que o prédio rústico em causa havia sido vendido em 21/09/2018, pelo preço de 1.600,00€, aos 2.ºs RR pelo 1.º R.

21. Por carta de 10/03/2023, a A. foi notificada pela CM... para proceder à gestão de combustíveis “… na sua propriedade, sito na Rua ..., ..., Quinta ... …”

22. Em data posterior aos factos descritos em II. 1. a) 17. o 1.º Réu disse ao 2.º Réu para marcar a escritura porque o A. não estava interessado, tendo este dito que primeiro tinha o 1º R. que colocar marcos na linha divisória do terreno com o sito a norte do mesmo.

23. Em data não concretamente apurada, o A. e o 1.º Réu deslocaram-se ao terreno, tendo então sido endireitada a linha divisória e colocados marcos.

24. Alguns meses mais tarde, após a outorga do documento da venda referido em II. 1.a) 8., em 2019, o 2.º Réu (por intermédio do filho) contratou uma máquina giratória para arrancar os cepos de pinheiros e eucaliptos que se encontravam no terreno referido em II. 1 a) 6. e para efetuar a limpeza e regularização do mesmo, no que despenderam valor não concretamente apurado.

25. Depois de lavrado e regularizado o terreno, os 2.ºs Réus (por intermédio do filho) plantou nele 11 oliveiras, 4 nespereiras, 1 figueira, 1 abacateiro, 1 zapote, várias 7 plantas de maracujá e vários catos figos da índia, e aplicou as respetivas estacas em madeira para suporte, no que despenderam valor não concretamente apurado e instalaram sistema de rega gota a gota, no que despenderam valor não concretamente apurado.

26. Desde 2019 até ao presente que os 2.ºs Réus (por intermédio do filho) vem cuidando daquelas árvores, podando-as, regando-as e limpando o terreno de ervas daninhas.

27. Os AA. passam nas estradas – Rua ... e Rua ... – que confinam com o terreno em causa e deslocam-se aos terrenos referidos em II. 1. a) 1. e 2.

28. Os 2.ºs RR pagaram, aquando da outorga do contrato de compra e venda as seguintes quantias: a) IMT-80,00 € b) I. Selo-12,80 € c) Depósito eletrónico-20,00 € d) Honorários da solicitadora referentes àqueles atos e organização do contrato de compra

e venda-200,00 €

29. Os 2.ºs RR procederam, após a citação, ao pagamento do IMT e do I.S referentes à diferença entre o preço declarado no documento referido em II.1 a) 8. e o valor de 8.000,00€, nos valores de 383,40€ (incluindo o 63,40€ de juros compensatórios) e 61,34€ (sendo 10,14€ de juros compensatórios), respetivamente.

            (Lembremos que ficou como não provado que o prédio referido em 13. (art. ...45, como rústico) confine a norte com o prédio rústico referido em 6 (art. rústico ...47).


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A caraterização do prédio inscrito na matriz sob o art....45.

Como analisado supra, tendo em conta a jurisprudência do STJ, acórdão de 14.1.2021, proc. 892/18, em www.dgsi.pt., o exercício do direito de preferência deve estar vinculado à efetiva exploração dos terrenos rústicos para fins de cultura florestal e/ou agrícola.

O art. ...45, de eucaliptal, já não tem nada e nele não se deteta qualquer efetiva exploração para fins de cultura florestal ou agrícola.

Assim, ele não serve de fundamento à preferência, que tem em vista o emparcelamento de terrenos com área inferior à unidade de cultura, com vista a alcançar-se uma exploração agrícola tecnicamente rentável.


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           O conhecimento dos termos do negócio pelos Autores; a caducidade do seu direito e a sua renúncia.

São elementos essenciais da projetada alienação, para efeitos do art. 1410, nº 1, do Código Civil, o preço, as condições de pagamento e, nos casos em que estejam em jogo outros interesses, mormente relações de vizinhança (como é o caso da preferência prevista no art. 1380), que também condicionam a predisposição dos preferentes a exercer ou não a preferência, a identificação do adquirente.

No que respeita especialmente à Autora (sem prejuízo do mesmo valer para o Autor), não se prova o seu conhecimento dos elementos essenciais do negócio, a não ser em fevereiro de 2023 (facto 19).

Assim, quando a ação foi proposta, em junho de 2023, ainda não tinha decorrido o prazo de 6 meses previsto no referido art. 1410, nº 1, aplicável por força do seu art. 1380, nº 4.

Por seu lado, a renúncia ao direito de preferir tem de ser clara e inequívoca, só sendo válida depois de ao preferente ter sido dado conhecimento dos elementos essenciais do negócio. Só na posse de tais elementos é que se poderia dizer estar ele em condições de, conscientemente, poder formar a sua vontade, quer no sentido de aceitar realizar o negócio, quer no sentido de não preferir no mesmo.

Em conclusão, não ocorre renúncia ao direito, que não caducou.


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            O abuso do direito dos Autores.

Conforme o artigo 334 do Código Civil, “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.”

O exercício do direito será feito em termos clamorosamente ofensivos da justiça.

Ora, no caso dos autos, considerando a factualidade, não vemos que esteja demonstrada uma situação de abuso, por parte da Autora, no exercício do seu direito de preferência.

É aos vendedores que cabe comunicar os elementos essenciais do negócio e não aos potencialmente preferentes um dever de diligenciar para se informarem das condições convencionadas no contrato.

Também não há qualquer facto que comprove uma atitude vingativa.


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            A simulação do preço; a confissão dos Autores.

Como vimos supra, no caso, nenhum documento junto constitui um princípio de prova da simulação, não tendo essa natureza os docs. 5 a 8 juntos com a contestação. Sem esse princípio de prova, a prova testemunhal é interdita.

Os Recorrentes invocam uma confissão dos Autores, mas esta não existe. Conforme o art. 5 da réplica, os Autores até apresentam uma justificação/ explicação para o preço ser o declarado (1.600 €).

É este o preço a considerar.


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            As benfeitorias e a valorização do terreno.

           O Tribunal recorrido, com o enquadramento jurídico devido, entendeu que, apesar da prova dos trabalhos realizados, não se mostra provado que o prédio se valorizou, nem em que medida, em consequência daquela intervenção.

            Além disso, importará ainda considerar:

           A medida do benefício do prédio não se confunde com o reembolso das despesas feitas.

            O prédio que entra na esfera jurídica da Autora é o do momento da venda, tratando-se de um eucaliptal e pinhal, que na altura teria sido já “cortado”.

            Parecendo haver um benefício com a limpeza feita, este trabalho visou a plantação referida no facto 25.

           Esta plantação apresenta-se como uma conversão do prédio anterior em algo de exploração duvidosa (será um pequeno olival/ um pomar doméstico).

            Se a Autora quis um eucaliptal/ pinhal, para juntar ao seu pinhal/ eucaliptal, ela ver-se-á forçada a retirar de lá as árvores colocadas, o que acarraterá novas despesas.

           Neste contexto, não se pode dizer que o prédio (original) beneficiou ou se valorizou.


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Decisão.

Julga-se o recurso improcedente e confirma-se a decisão recorrida.

Custas pelos Recorrentes, vencidos.

Notifique.

2025-05-27


(Fernando Monteiro)

(Carlos Moreira)

(Alberto Ruço)