CONTRATO DE ADESÃO
DEVERES DE COMUNICAÇÃO E DE INFORMAÇÃO
COMUNICAÇÃO DA RESOLUÇÃO DO CONTRATO
CLÁUSULA PENAL
DESPROPORCIONALIDADE DA CLÁUSULA PENAL
Sumário

I - No âmbito de um contrato de adesão, o ónus da prova do cumprimento dos deveres de comunicação e informação impende sobre o contratante que adopta o uso do modelo contratual pré formatado. Mas os termos da satisfação de tais deveres devem ser adaptados às circunstâncias de cada caso, onde cumpre levar em conta, por exemplo, se o destinatário é um consumidor ou um operador económico que discute e negoceia outros elementos cruciais do contrato, subscrevendo-o depois com a declaração de ter conhecimento e estar esclarecido sobre todo o seu conteúdo.
II - Estabelecido no contrato o domicílio dos seus subscritores, não deixa de ser eficaz a comunicação da resolução do contrato remetida por correio registado e com aviso de recepção para esse domicílio, ainda que o expediente seja devolvido com a menção de “não reclamado”.
III - É válida e eficaz a declaração de resolução de um contrato subscrita e enviada, em representação de uma das partes, por advogado que expressamente anuncia essa representação.
IV - Não é condição de eficácia da declaração a concomitante demonstração dos correspondentes poderes de representação, inerentes a um mandato forense, cabendo aos destinatários, caso o pretendam, exigir essa demonstração.
V - O estabelecimento de uma cláusula penal para a hipótese de incumprimento de um contrato prejudica, na generalidade dos casos, a necessidade de qualquer identificação entre o correspondente valor e o valor dos prejuízos efectivamente sofridos pelo contraente não faltoso, em resultado do incumprimento.
VI - Num contrato de adesão, o regime é mais restritivo, sendo proibida uma cláusula penal que se revele desproporcionada em relação aos danos a ressarcir.
VII - A conclusão pela desproporcionalidade de uma cláusula penal fixada num contrato de adesão, justificativa da sua proibição, ou pela sua manifesta desproporcionalidade, em ordem a habilitar uma intervenção judicial correctiva ao abrigo do art. 812º do C. Civil, não se basta com uma análise perfunctória em face da qual, perante a pura economia do contrato, se indicie uma desproporção entre a sanção prevista para o incumprimento e os danos que se admita poderem a resultar desse mesmo incumprimento. A identificação de uma tal desproporção deve ser operada dentro do contexto e em atenção às circunstâncias em que o concreto o contrato se celebrou e com apelo ao paradigma de um “quadro negocial padronizado”, tudo a ser alegado e demonstrado em juízo.

Texto Integral

PROC. Nº 6367/24.8T8PRT-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Execução do Porto - ...




REL. N.º 957
Juiz Desembargador Relator: Rui Moreira
1º Adjunto: Juiz Desembargador: Alberto Eduardo Monteiro de Paiva Taveira
2º Adjunto: Juiz Desembargador: Anabela Andrade Miranda

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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO


1 – RELATÓRIO

Por apenso à execução para pagamento de quantia certa que A..., Ldª moveu a AA, veio o executado opor-se à execução por meio de embargos de executado, pugnando pela extinção da execução.
Alegou carecer a execução de título, por aquele dado à execução ser inexequível; alegou que, apesar de ser avalista, a execução se encontra no domínio das relações imediatas por ter intervindo no pacto de preenchimento, podendo opor ao exequente as excepções pessoais do avalizado. Ora o contrato subjacente é um contrato de adesão, sujeito à disciplina do D.L. nº 446/85, de 31 de Agosto, e as respectivas cláusulas não lhe foram lidas, nem explicadas, sendo, em consequência, nulas. Alegou ainda ser ineficaz a declaração resolutiva, e ter ocorrido o preenchimento abusivo da livrança exequenda.
Regularmente notificada, a embargada contestou, pugnando pela improcedência dos embargos.
Alegou que a declaração de resolução, embora assinada por advogado, é eficaz; que o contrato subjacente à emissão da livrança não é um contrato de adesão, não lhe sendo aplicável o regime das cláusulas contratuais gerais, considerando que foi negociado o preço do café, as quantidades a fornecer, o prazo de duração do contrato, o valor do desconto antecipado; e que as cartas de resolução forma enviadas para o domicilio convencionado.
Foi realizada audiência prévia, tendo o processo sido saneado, fixado o objecto do litígio e apontados os temas de prova.
Sucessivamente, foi realizada audiência de julgamento, no termo da qual foi proferida sentença que julgou os embargos improcedentes e determinou o prosseguimento da execução.
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É desta decisão que vem interposto o presente recurso, pelo embargante, que o termina alinhando as seguintes conclusões:
“1. Recorre-se da douta sentença com a referência 465259174, proferida neste apenso de embargos de executado que julgou os mesmos improcedentes.
2. Sendo objecto do presente ver revogada a douta decisão colocada em crise, pela divergente solução de direito preconizada para as questões da (1) nulidade da obrigação subjacente por omissão do dever de comunicação do teor das cláusulas contratuais gerais, (2) da ineficácia da declaração resolutiva, com o decorrente preenchimento \abusivo da letra dada à execução e da suas consequências e (3) da nulidade e/ ou natureza abusiva da penalidade contratual estipulada e sua redução.
3. No que tange à primeira questão conclui-se que foi dada à execução uma letra de câmbio que havia sido emitida em branco, como garantia do cumprimento do contrato escrito intitulado de “Parceria Comercial” junto aos autos como documento 3 com o Requerimento Executivo (Contrato) e complementar autorização de preenchimento (Autorização) que constitui o documento nº 2, igualmente junto, ambos datados de 30.03.2023, onde a Recorrida figura como sacadora e Primeira Outorgante, o Recorrente e BB, como avalistas e Terceiros Outorgantes e a sociedade “B..., - Unipessoal, Lda”, como aceitante e Segunda Outorgante
4. O preenchimento da letra pela exequente, ora recorrida, teve subjacente o regime consagrado no Contrato e na Autorização, sendo inequívoco que esta enquanto sacadora e portadora da letra e o Recorrente, enquanto avalista se encontrarem entre si no domínio das relações imediatas
5. Pelo que, pode o Embargante, ora Recorrente, opor à Exequente, aqui Recorrida, todas as exceções fundadas no contrato que justificou a emissão dessa letra, bem como as fundadas no complementar pacto de preenchimento e respetiva violação, com base no qual esta preencheu essa letra emitida em branco.
6. Sendo inequívoco, como se consagra na sentença recorrida que estamos em face de um contrato de adesão, posto que as respectivas cláusulas se mostravam previamente redigidas e elaboradas, sem prévia negociação individual, em bloco, em modelo já existente, o que decorre da singela análise de tal documento e anexa autorização.
7. Pelo que o respetivo clausulado, como ali igualmente se consagra, está sujeito à disciplina do D.L. nº 446/85, de 31 de Agosto, com a redacção introduzida pelo D.L. nº 323/2001, de 17 de Dezembro (RJCCG). – ut. artigo 1º do referido diploma, competido o ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes à Recorrida que pretenda prevalecer-se do seu conteúdo, como emerge do nº 3 do preceito em apreço.
8. Diverge-se do julgado quando, após ter concluído nos termos estigmatizados nas antecedentes, contraditoriamente e sem qualquer justificação plausível, faz decorrer do singelo facto de no final do Contrato, antes das assinaturas nele apostas, constar que “ A presente pareceria, após análise prévia da minuta e negociações, constituída por 3 páginas, depois de lido, explicado, analisado e entendido, vai ser assinada por todos os Outorgantes que a acham conforme a sua vontade, livre e esclarecida, sendo entregue uma via da presente parceria ao cliente, a 30 de março de 2023”, ali se considerando que tal declaração pré-elaborada e disponibilizada aos aderentes cumpre e satisfaz o dever de comunicação previsto no artigo 5º do sobredito diploma
9. Desde logo, porque a mesma declaração se encontra integrada no Contrato em análise e evidencia, de forma ostensiva, a mesma pré elaboração, não sujeita a negociação, não sendo de molde suprir a prova e dar corpo ao real e efectivo cumprimento do legal dever de informação e comunicação, cujo ónus competia à disponente, ora Recorrida, que, assim, não cumpre.
10. Posto que, o contratante que recorra a cláusulas contratuais gerais, tem o dever de efectiva e adequada informação e comunicação do teor das mesmas que só podem ser corretamente aceites pela outra parte (aderente) se desta forem conhecidas, sob pena de ocorrerem vícios na formação da vontade, nomeadamente os aludidos nos artigos 246.º, 247.º e 251.º do Código Civil.
11. Sendo mister concluir que não basta a simples disposição, por parte do aderente do conteúdo das cláusulas contratuais gerais, para que tal dever se considere contrato, mesmo que o mesmo o assine.
12. Impondo-se que além da comunicação do respetivo conteúdo, o aderente seja informado pelo disponente do significado e implicações das cláusulas, com a devida antecedência, tendo em conta as especificidades de cada caso em concreto, sob pena de não se poder ter por cumprido tal dever, cabendo o ónus da prova de que assim aconteceu ao proponente.
13. A lei comina e sanciona tal ilegalidade e incumprimento do evidenciado dever com a exclusão de tais cláusulas dos contratos singulares celebrados, como ocorre no caso vertente, por força do disposto no artigo 8.º, al. a), do RJCCG, donde emerge uma indeterminação insuprível dos termos essenciais do Contrato e um vazio de conteúdo não passível de integração. – ut. artigo 9, º nº 2 do mesmo diploma.
14. O que tudo afecta o preenchimento da letra dada à execução que se deve ter por abusivo, com todas as legais consequências, com evidência para a invalidade e inexequibilidade do título, a impor a revogação da decisão em crise, por erro de interpretação e aplicação dos supra referidos preceitos, com a procedência dos embargos e a extinção da execução, por força do disposto na alínea a), do artigo 729º, “ ex vi” do artigo 731º do CPC.
15. Passando a concluir sobre a segunda questão enunciada na sentença em crise e nestas, de que se diverge, sem prescindir de quanto se alegou e concluiu, mostra-se assente e documentado que a Recorrida dirigiu aos executados alegadas declarações resolutivas, através de cartas registadas com aviso de recepção como consta do elenco dos factos provados na sentença, o que é pressuposto do preenchimento da letra e sua exequibilidade.
16. Ora, analisadas as invocadas declarações resolutivas que a Exequente reputa de válidas e eficazes, nos termos do disposto no artigo 436º do Código Civil e mereceu acolhimento pelo tribunal a quo constata-se que as mesmas não foram recebidas pela 1ª e 2º Executados.
17. Por outro lado, sendo a exequente e Recorrida, sacadora da letra e parte no contrato, uma sociedade comercial por quotas, constata-se que nas pretensas s declarações resolutivas esta não se mostra representada pela sua gerência, antes alegadamente pelo Ilustre Advogado subscritor do Requerimento Executivo, Sr. Dr. CC, que subscreveu as missivas juntas aos autos e que não exibiu poderes de representação da Recorrida, que não se presumem, antes veio a exibir meros poderes forenses gerais que constam da procuração, datada de 22.02..024, junta com o Requerimento Executivo, como tal posterior a 18.01.2024, data que ostentam as missivas endereçadas aos executados .
18. O que viola o disposto no artigo 163.º do Código Civil que, sob a epígrafe “Representação”, no seu nº 1 estipula que a representação da pessoa colectiva, em juízo e fora dele cabe a quem os estatutos determinarem ou, na falta de disposição estatutária, à administração, ou a quem por ela for designado e no seu nº 2 que a designação de representantes por parte da administração só é oponível a terceiros quando se prove que estes a conheciam.
19. E bem assim, o disposto nos artigos 252º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais que estipula que as mesmas são representadas pelos gerentes, ou por mandatários ou procuradores da sociedade para a prática de determinados actos ou categorias de actos, cumpridos os legais requisitos de forma, sendo que a aludida e posterior procuração forense junta aos autos indica que a sociedade recorrida é representada pelo seu gerente Dr. DD.
20. Donde se conclui que tais declarações / comunicações em apreço constituem actos ineficazes, o que se traduz na não produção dos seus pretendidos efeitos, com prejuízo para o preenchimento da letra de que é pressuposto prévio válida
21. Ora, na douta sentença em crise, a propósito da subscrição das missivas pelo Ilustre Advogado da Recorrida sem dispor de ou exibir procuração para o efeito, invoca-se o disposto no artigo 258º do CC., os artigos 1157º e seguintes do C.C., que regula o mandato e o artigo 67º do Estatuto da Orem dos Advogado (EOA) que estatui sobre o mandato forense, classificado como um subtipo de mandato com representação, máxime a sua alínea b), onde se consigna que este tipo de mandato pode ter por objecto o exercício do mandato com representação, com poderes para negociar a constituição, alteração ou extinção de relações jurídicas.
22. Como se sufraga na sentença em crise, é a procuração que constitui o negócio jurídico unilateral que corporiza e formaliza o mandato, pelo que os poderes de representação terão que constar expressamente daquela, que assim define e concretiza os poderes representativos por ela conferidos
23. Ora, na divergência do julgado, conclui-se que o Ilustre Advogado da Recorrida não dispunha de válidos poderes para a pretendida resolução, no transe da assinatura e expedição das comunicações, nem posteriormente, com tal objectivo, como os poderes previstos na alínea b), do nº 1, do artigo 67º do EOA, são meramente negociais e não de disposição, como da própria letra da lei decorre.
24. E não é o facto de os destinatários, que sequer receberam as missivas, não terem exigido do alegado representante a comprovação dos poderes, que é passível de se poder equiparar à aceitação da prática do acto que só após a recepção das cartas e análise do instrumento de representação se poderiam ter por cognoscíveis.
25. Donde emerge a insofismável conclusão de que não tendo ocorrido válida e eficaz resolução do contrato, pressuposto do preenchimento da letra dada à execução, ocorre o preenchimento abusivo da mesma, com todas as legais consequências, com evidência para a invalidade e inexequibilidade do título
26. Igualmente a impor a revogação da decisão recorrida, por erro de interpretação e aplicação dos preceitos nela invocados e nas antecedentes conclusões, com a decorrente procedência dos embargos e extinção da execução, por força do disposto na alínea a), do artigo 729º, “ ex vi” do artigo 731º do CPC.
27. Por fim, no que tange à questão da nulidade da clausula penal ou da sua redução por excessiva, que a douta sentença recorrida entendeu não verificada, por quanto se alegou e concluiu e aqui se dá por reproduzido, atenta a violação do dever de comunicação ter-se-á de considerar excluída do contrato singular em apreço a cláusula 6ª que estatui sobre a penalidade, com prejuízo para o preenchimento da letra e valor dado à execução.
28. Sem embargo, impõe-se ainda manifestar divergência do decidido nesta parte, a impor revogação, quando ali se enjeita o uso da faculdade de redução da dita cláusula penal, por não a considerar manifestamente excessiva.
29. Ao invés, é ostensivo e assim se pretende ver declarado, que logo à data da celebração do contrato (em que as partes não partiram do pressuposto que aquele iria ser incumprido, mas antes do pressuposto contrário) que a mesma se revela manifestamente excessiva, dado que, em caso de incumprimento, permitia à Recorrida cobrar a totalidade do preço do café que não lhe tivesse sido adquirido pela executada, ao preço pelo qual lho teria vendido, sem descontar o preço do café pelo qual a própria o teria adquirido e os custos associados ao fornecimento.
30. Também que ao tempo do incumprimento e alegada resolução a mesma não pode deixar de se considerar manter essa natureza manifestamente excessiva atenta a dimensão do prejuízo efetivamente sofrido pela recorrida em consequência daquele incumprimento, seja em que circunstâncias for.
31. Na verdade, a referida cláusula a prevalecer válida como na sentença se sufraga, permitirá à recorrida obter o pagamento do preço do café não adquirido como se a executada sociedade lhe tivesse efetivamente comprado esse café, sem que tivesse ou tenha de despender o custo pelo qual ela própria teria para adquirir esse café e dos custos associados ao fornecimento, quando estão em causa 1766 Kgs. de café não adquirido (que é a maior parte dos 1800 kgs de quantidade mínima estipulada).
32. Donde dever tal clausula ser considerada manifestamente excessiva, a impor redução, à luz do disposto no artigo 812º do CC, o que importa a revogação da douta decisão em crise, por erro de interpretação e aplicação deste preceito.
33. Neste sentido, por paradigmático, remete-se para o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 10.07.2019, disponível em www.dgsi.pt, que ostenta o seguinte sumário: (não se transcreve, por ser impertinente a citação em sede de conclusões).
34. Nestes termos, e nos demais que V.Exas. doutamente suprirão e reputarem convenientes, impetra-se a revogação da douta sentença recorrida, com o que se fará, a costumada JUSTIÇA.”
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A embargada apresentou resposta ao recurso, concluindo pelo seu não provimento e pela confirmação da decisão recorrida.
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O recurso foi admitido, com subida nos próprios autos e sob efeito devolutivo, como devido.

Cumpre decidir.

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2- FUNDAMENTAÇÃO

Não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas nas conclusões, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 3 do CPC, é nelas que deve identificar-se o objecto do recurso.
No caso, as questões colocadas pelo embargante, ora apelante, referem-se:
1. à nulidade da obrigação subjacente à emissão da letra dada à execução, por emanar de um contrato de adesão cujas cláusulas não foram devidamente comunicadas ao executado;
2. à não comunicação da resolução do contrato a que sucedeu o preenchimento da letra dada à execução aos 1º e 2º executados
3. à falta de poderes do advogado autor da comunicação da resolução do contrato para representar a exequente, prejudicando a respectiva eficácia e tornando abusivo o preenchimento da letra;
4. à nulidade da cláusula penal ou à conclusão pelo sua excessividade, redundando no preenchimento abusivo da letra exequenda.
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O tribunal deu por provada e não provada a seguinte matéria:

Factos Provados:
3.1.1. A exequente deu à execução como título executivo o seguinte documento




3.1.2. Entre a exequente, B..., Unipessoal, Ldª, AA e BB, no dia 30.03.2023, foi celebrado um contrato de fornecimento de café e sucedâneos, denominado "PARCERIA COMERCIAL".
3.1.3. Neste contrato, o Embargante e os restantes constantes no contrato, denominados segundo e terceiros outorgantes, obrigaram-se a adquirir 1800 kg de café, Marca…, lote "Massimo/Biológico", por um período de 72 meses, resultando numa quantia mínima mensal de 25 kg, conforme a cláusula primeira do contrato.
3.1.4. Em contrapartida do cumprimento pontual do contrato, a exequente obrigou-se a:





3.1.5. Os executados apenas adquiriram 34 Kg de café.
3.1.6. Por carta registada, com aviso de receção, datada de 18.01.2024, subscrita pelo Il. Mandatário da exequente nestes autos, remetida para a B..., Ldª, para a morada Rua ..., ..., Porto, o Il subscritor da execução, arrogando-se mandatário da exequente, declarou considerar resolvido o contrato, mais declarando os valores que entendia serem devidos à exequente, e que concedia o prazo de dez dias para proceder ao seu pagamento, sob pena de proceder ao preenchimento da livrança por esse valor (o que consta do titulo executivo).
3.1.7. A carta foi devolvida com a menção “objecto não reclamado”
3.1.8. Por carta registada, com aviso de receção, datada de 18.01.2024, subscrita pelo Il. Mandatário da exequente nestes autos, remetida para BB, para a morada Rua ..., ..., Porto, o Il subscritor da execução, arrogando-se mandatário da exequente, declarou considerar resolvido o contrato, mais declarando os valores que entendia serem devidos à exequente, e que concedia o prazo de dez dias para proceder ao seu pagamento, sob pena de proceder ao preenchimento da livrança por esse valor (o que consta do titulo executivo).
3.1.9. A carta foi devolvida com a menção “objecto não reclamado”
3.1.10. Por carta registada, com aviso de receção, datada de 18.01.2024, subscrita pelo Il. Mandatário da exequente nestes autos, remetida para a B..., Ldª, para a morada Rua ..., ..., Porto, o Il subscritor da execução, arrogando-se mandatário da exequente, declarou considerar resolvido o contrato, mais declarando os valores que entendia serem devidos à exequente, e que concedia o prazo de dez dias para proceder ao seu pagamento, sob pena de proceder ao preenchimento da livrança por esse valor (o que consta do titulo executivo).
3.1.11. A carta foi devolvida com a menção “objecto não reclamado”
3.1.13. Nos termos da clausula Nona do Contrato as partes fixaram o domicílio convencionado os por elas indicados no contrato, sendo a dos executados a Rua ..., ..., Porto
3.1.14. Nos termos da cláusula sexta do contrato



3.1.15. O 3º outorgante, o aqui embargante, declarou “constituir-se fiador e principal pagador, com expressa renuncia ao benefício da excussão prévia, do cumprimento de todas as obrigações que resultem do presente contrato para a segunda outorgante, incluindo facturas, bem como qualquer indemnização ou pagamento devido à primeira outorgante”.
3.1.16. Antes da aposição das assinaturas dos contraentes no contrato id. em 2, os mesmos declararam:



3.1.17. A livrança foi entregue à primeira outorgante, apenas assinada no local destinado à assinatura do subscritor e no verso da letra pelos terceiro e quarto outorgantes, como garantia do pagamento de qualquer quantia devida pela segunda à primeira outorgante, no âmbito do referido contrato.
3.1.18. Os 3ª e 4ª Outorgantes remeteram à exequente autorização para preenchimento da livrança nos seguintes termos:



3.1.19. À data do cumprimento do contrato o valor por Kg de café mostrava-se fixado em €33,94 (Euro Kg do contrato – 19,47; euros kg Financeiro 13,89; Euro/kg não financeiro 0,58.
3.1.20. Tendo a livrança sido preenchida pelo valor apurado em 3.1.19 e o referente ao do equipamento fornecido e desconto antecipado que entregou à executada
3.2. Não Provados
Com relevância para a decisão da causa não se provou que:
3.2.1. O embargante não exercia a gerência da sociedade executada.
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Começa o apelante por justificar o seu direito a opor à exequente as excepções fundadas aa relação subjacente à emissão da letra exequenda, apesar de estar a ser demandado como avalista. Invoca, para esse efeito, ter tido intervenção nessa relação e no pacto de preenchimento que a integrou e motivou o preenchimento da letra, que havia sido subscrita em branco.
Acontece, porém, que a sentença lhe reconheceu tal direito, pelo que nenhuma questão se suscita a esse propósito.
Sucessivamente, invoca o apelante que tal relação contratual subjacente deve ser qualificada como um contrato de adesão, pretendendo a sua sujeição ao regime do D.L. nº 446/85, de 31 de Agosto, com a redacção introduzida pelo D.L. nº 323/2001, de 17 de Dezembro (RJCCG).
A este propósito, a sentença em crise afirma categoricamente (depois de o justificar) que “… é aplicável ao contrato em apreço o regime legal das CCG [cláusulas contratuais gerais]”.
Inexiste, pois, também a este propósito qualquer controvérsia que deva ser decidida, tanto mais que a apelada nem sequer impugnou, designadamente por via subsidiária, tal decisão.
Na sequência de tal classificação do contrato subjacente à emissão da letra, o tribunal concluiu dever ter-se por demonstrado o especial dever de comunicação e informação que impende sobre a parte que pretende fazer valer-se do contrato, relativamente ao teor do clausulado e quanto ao outro contraente.
É esta a primeira questão que cabe decidir.
O tribunal a quo concluiu pelo cumprimento dos deveres de comunicação e informação da embargada, inerentes à utilização de um tal modelo contratual, por constar do próprio contrato que o mesmo foi assinado “após análise prévia da minuta e negociações, constituído por 3 páginas, depois de lido, explicado, analisado e entendido (…) por todos os outorgantes que o acham conforme a sua vontade livre e esclarecida, sendo entregue uma via da presente parceria ao cliente (…)”.
É certo que, nos termos do nº 3 do art. 5º do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais. E que, segundo o nº 1 do art. 6º, também lhe cabe o dever de informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique.
Deste regime resulta assim que, por um lado, o ónus da prova do cumprimento dos deveres de comunicação e informação impende inequivocamente sobre o contratante que adopta o uso do modelo contratual pré formatado. Mas, por outro lado, também resulta que os termos da satisfação de tais deveres devem ser adaptados às circunstâncias de cada caso.
Ora, no caso em apreço, o contrato em causa, que continha cláusulas contratuais gerais, entre as quais aquelas respeitantes às consequências do seu incumprimento e ao preenchimento da letra exequenda, não foi celebrado com um consumidor final, mas antes com verdadeiros operadores económicos, tal como resulta do seu objecto e das obrigações ali previstas para as partes. Aliás, para sustentar o seu direito a discutir a sua responsabilidade no âmbito desta execução, o ora apelante afirmou que participou na negociação do próprio contrato e do conexo pacto de preenchimento da letra subscrita em branco. Por isso, em relação aos subscritores do contrato, designadamente em relação ao aqui embargante, só pode presumir-se que, ao subscreverem um contrato onde consta expressamente a declaração que antes se transcreveu, o fizeram no domínio de todas as informações necessárias, conhecendo o seu teor integral, designadamente as obrigações dele resultantes. Com efeito, admitir o contrário seria fazer tábua rasa da existência de uma tal cláusula no contrato.
Acresce que, apesar de pôr em causa a satisfação do ónus de prova da exequente quanto ao cumprimento das referidas obrigações de comunicação e informação, o embargante, ora apelante, não chega a alegar qualquer razão para infirmar que tenha tido conhecimento dos termos do contrato e das consequências nele previstas para o respectivo incumprimento. Não alega o desconhecimento do teor do contrato, a falta de compreensão de qualquer das cláusulas, a inadequação da redacção do clausulado para a inteligibilidade dos seus efeitos, enfim, não alega nada. Limita-se a concluir que a exequente não satisfez o dever legal de comunicação e informação e que, por isso, as cláusulas devem ter-se por excluídas do contrato, ficando sem fundamento o preenchimento da letra exequenda.
Nestas circunstâncias, repete-se, perante o teor do próprio contrato que o apelante subscreveu, onde consta o seu reconhecimento de ter sido informado e estar esclarecido sobre o conteúdo do contrato, não existe qualquer fundamento para concluir pelo incumprimento dos deveres de comunicação e informação, em ordem à exclusão de qualquer cláusula deste contrato.
Improcede, pois, a apelação no respeitante a este fundamento.
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Sucessivamente, apesar de não extrair disso, expressamente, qualquer conclusão o apelante volta a invocar que a resolução do contrato não chegou ao conhecimento dos 1º e 2º executados, B..., Unipessoal, Ldª, e AA.
Sobre esta matéria, e porquanto – repete-se – o apelante não chega a alegar que a resolução não é operante por tal motivo, tanto mais que, no seu próprio caso, a comunicação em causa foi por si recebida, referir-se-á simplesmente que aqueles outorgantes haviam fixado domicílio na morada para onde foram expedidas as cartas (ponto 13 dos factos provados). As cartas, com aviso de recepção, foram para ali dirigidas e, avisados os destinatários, não as reclamaram junto dos CTT. Ora, sendo inequívoco que as declaração em causa é uma declaração receptícia, não deixou ela de ser eficaz, atento o disposto no nº 2 do art. 224º do C. Civil.
Nada mais cumpre, pois, referir a este propósito.
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Mais alega o apelante que a o autor da comunicação da resolução do contrato foi um advogado, que não podia substituir-se à exequente, o que impede a eficácia da resolução e torna abusivo o preenchimento da letra. Afirma que, sendo a exequente uma sociedade, apenas poderia ser representada pela respectiva gerência, tanto mais que o referido advogado só demonstrou ter poderes para representar a exequente com a procuração de 22/2/2024, que é ulterior àquela comunicação, de 18/1/2024.
Nas cartas destinadas a comunicar a resolução do contrato, o subscritor, que é o advogado que patrocina a exequente nestes autos, arrogou-se “…mandatário da exequente, declarou considerar resolvido o contrato, mais declarando os valores que entendia serem devidos à exequente, e que concedia o prazo de dez dias para proceder ao seu pagamento, sob pena de proceder ao preenchimento da livrança por esse valor.” (pontos 6, 8 e 10 dos factos provados).
Foi expressamente invocada a representação da exequente, pelo subscritor. O acto em causa não é um acto pessoal e pode ser praticado por outrem, com poderes de representação. O acto produz efeitos na esfera jurídica do representado, como dispõe o art. 258º do C. Civil. É próprio da actividade do advogado a representação dos seus clientes para a prática de actos jurídicos, no desenvolvimento de uma típica relação de mandato, como dispõem o art. 1157º do C. Civil e 67º do E.O.A. Prevê a al. b) desta regra que o mandato forense pode consistir, precisamente, em acções tendentes à constituição, alteração ou extinção de relações jurídicas, do representado, como aconteceu no caso em apreço.
Para além disso, a demonstração prévia ou concomitante dos poderes de representação, v.g. por via da apresentação de uma procuração atributiva dos mesmos, não é condição de validade ou eficácia do acto praticado, contrariamente ao defendido pelo apelante. Suficiente é o anúncio de tais poderes. É ao destinatário do acto que cabe exigir a respectiva prova, se tiver dúvidas quanto à representação anunciada, tal como dispõem os nºs 1 e 2 do art. 260º do C. Civil.
Por outro lado, o facto de, para introduzir a execução em juízo, tenha sido apresentada uma procuração datada de 22/2/2024, não permite inferir a inexistência do mandato forense em momento anterior. A junção dessa procuração dá cumprimento ao disposto no art. 43º, al. a) do CPC, ou seja, pretende dar resposta a uma exigência processual absolutamente distinta de um outro acto de representação extra-judicial. Como se assinala no ac. do STJ de 13/5/2021 (proc. nº 1021/16.7T8CSC.L2.S1, em dgsi.pt), “…o mandato e a procuração podem coexistir ou andar dissociados: aquele sem esta, esta sem aquele. O que, efectivamente, origina os poderes existentes no mandatário não é a procuração; a procuração, no sistema do CC actual, mais não é que o meio adequado para exercer o mandato; representa apenas a exteriorização do poder negocial que é conferido ao mandatário pelo mandante através do mandato.”
Pelo exposto, em total concordância com a solução constante da decisão recorrida, cumpre afirmar que a subscrição das declarações de resolução mencionadas nos pontos 6, 8 e 10 por advogado, anunciando expressamente a sua actuação em representação da exequente, em nada prejudicou a respectiva validade e eficácia.
Consequentemente, com tal fundamento, nenhum vício adveio à letra dada à execução, preenchida na sequência da referida resolução contratual.
Improcede, pois, a apelação também quanto a esta questão.
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Por fim, vem o apelante arguir a nulidade ou a necessidade de redução da cláusula penal fixada no contrato subjacente à subscrição da letra exequenda, por ser manifestamente excessiva.
No que se refere à nulidade da cláusula, por estar incluída num contrato de adesão e não ser ter sido devidamente comunicada e explicada, já acima se decidiu pelo não provimento das razões do apelante.
Sem prejuízo, alega ele, também, que tal cláusula penal se tem de ter como manifestamente excessiva, por facultar à exequente, fornecedora do café que era objecto do contrato, “…cobrar a totalidade do preço do café que não lhe tivesse sido adquirido pela executada, ao preço pelo qual lho teria vendido, sem descontar o preço do café pelo qual a própria o teria adquirido e os custos associados ao fornecimento.” e também em atenção à “… dimensão do prejuízo efetivamente sofrido pela recorrida em consequência daquele incumprimento, seja em que circunstâncias for.”
A letra em causa foi preenchida com o valor do preço dos 1.766 kg. de café que não chegaram a ser encomendados e entregues (só o foram 34kg.), com o valor do desconto antecipadamente conferido e entregue à executada e com o valor do equipamento que lhe havia entregue. Tais valores foram calculados em 61.142,35€ + IVA, no montante de 75.548,42€ e de 35.041,08€+ IVA, no montante de 43.100,52€, tudo num total de 118.648,94€.
Nestas circunstâncias, contrariamente ao que o apelante chegou a afirmar nos embargos, a actuação desta cláusula penal não permite à exequente obter simultaneamente o que alcançaria com o cumprimento do contrato e qualquer indemnização complementar. Não se verifica, por isso, qualquer infracção ao disposto no art. 811º do C. Civil.
Por outro lado, o estabelecimento de uma cláusula penal para a hipótese de incumprimento de um contrato prejudica, na generalidade dos casos, a necessidade de qualquer identificação entre o valor indemnizatório daí resultante e o valor dos prejuízos efectivamente sofridos pelo contraente não faltoso, em resultado do incumprimento.
Porém, tendo já sido decidida a subsunção do contrato subjacente ao saque da letra exequenda ao regime das cláusulas contratuais gerais, importa ter presente o disposto no respectivo art. 19.º, al. c). Ali se dispõe: “São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que: c) Consagrem cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir.”
Este regime é, pois, claramente mais restritivo do que a solução genérica consagrada no art. 812º do C. Civil, que exige uma excessividade qualificada, um resultado “manifestamente excessivo”, para facultar uma intervenção judicial correctiva.
Assim, se por um lado não pode deixar de se ter presente o sentido do regime geral do Código Civil a este propósito, tão bem exposto no Ac. do STJ de 19/06/2018 (proc. nº 2042/13.7TVLSB.L1.S2, em dgsi.pt), aliás citado pelo apelado (“I. A recorrente pretende que a cláusula penal, malgrado o seu carácter sancionatório, se situe nos parâmetros do dano efectivo, esquecendo que o fim da cláusula é não só a indemnização pelo incumprimento, fixada a forfait, mas também compelir o devedor a cumprir, não sendo, por isso, aferida pelo valor matemático do incumprimento, desde logo por ser fixada ex ante. II. A cláusula penal, tendo um fim punitivo só será ilegítima se houver uma chocante desproporção, entre os danos que previsivelmente o devedor causar com a sua conduta, e a indemnização prevista na cláusula para os ressarcir.”), por outro lado não pode ignorar-se a disciplina especial constante do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro (Cláusulas Contratuais Gerais), imposta pela citada al. c) do respectivo art. 19º.
Em qualquer caso, mesmo em face deste regime e da proibição constante dessa norma, de modo nenhum se impõe uma coincidência entre os danos sofridos pelo contraente não faltoso e a cláusula penal. Como refere a decisão recorrida, citando Pinto Monteiro, “Duplo controlo de penas manifestamente excessivas em contratos de adesão. Diálogos com a jurisprudência”, RLJ, Ano 146.°, n° 4004, Maio-Junho de 2017, págs. 312 e segs., isso excluiria a função coercitiva ou compulsória da cláusula penal. A defender-se uma tal identificação entre o teor da cláusula penal e os danos resultantes do incumprimento, o faltoso jamais incorreria numa consequência mais gravosa do que a da indemnização desses danos, tornando inútil a cláusula penal, que nenhum complemento tendente ao cumprimento acrescentaria.
Para além disso, a identificação de uma cláusula penal que justifique um juízo de proibição não se basta com uma análise perfunctória em face do qual, perante a pura economia do contrato, se indicie uma desproporção entre a sanção prevista para o incumprimento e os danos que se possam especular como serem aqueles que poderão resultar desse mesmo incumprimento.
Com efeito, a identificação de uma tal desproporção deve ser operada dentro do contexto e em atenção às circunstâncias em que o concreto o contrato se celebrou e com apelo ao paradigma de um “quadro negocial padronizado”.
Isso mesmo se refere no Ac. STJ de 16.03.2017, (proc. nº 2042/13.7TVLSB.L1.S1, em dgsi.pt): “ I - Na avaliação do carácter abusivo das cláusulas “relativamente proibidas” ao abrigo do art. 19.º da LCCG, deverá ter-se em atenção não só o “quadro negocial padronizado” -segundo o tipo ou modelo geral do contrato em que aquela se insere tendo em conta a actividade do utilizador- mas também todas as demais circunstâncias que acompanharam e condicionaram a feitura do contrato, nomeadamente, as especialmente atinentes ao destinatário das cláusulas. II - Num contrato individualizado de fornecimento de bebidas para revenda ao público, do qual consta que o fornecedor/fabricante pode exigir, a título de indemnização, do comerciante/comprador seu cliente, que incumpra definitivamente o negócio, o pagamento de quantia nunca inferior ao valor total que arrecadaria com o negócio, caso o contrato tivesse sido honrado pelo comprador, vista isoladamente tal cláusula poderia, a priori, apresentar uma certa desproporcionalidade relativamente ao eventual prejuízo a ressarcir. III - Contudo, encontrando-se essa cláusula intimamente relacionada com outras livremente negociadas pelas partes contraentes (v.g. cláusulas que prevêem contrapartidas monetárias e descontos em favor do comprador), com as quais se interligam na economia do contrato e que, de certo modo, funcionam como contrapeso daquela, inexistindo elementos suficientes que permitam afirmar a desproporcionalidade da dita cláusula penal em face dos previsíveis danos a ressarcir, não se pode afirmar a sua inadequação ao tipo de actividade negocial da autora e, consequentemente, concluir pela sua nulidade nos termos do art. 19.º, al. c), da LCCG.IV - O juízo de valor sobre a desproporção deve ser reportado ao momento em que a cláusula é concebida (aos danos típica e previsivelmente a ressarcir, dentro do quadro negocial padronizado) sendo inexacto relacioná-lo com as vicissitudes que o contrato em que se integra sofreu. V - Tal não significa que a aludida cláusula não possa ou não deva ser considerada manifestamente excessiva, nos termos do n.º 1 do art. 812.º do CC, e passível de redução equitativa, como no caso da mesma proporcionar ao fornecedor/fabricante um proveito francamente superior ao cumprimento do contrato, porquanto lhe permite receber o correspondente ao preço total dos produtos objecto do contrato, sem incorrer nos correspondentes custos, designadamente, de produção e de transporte, para além de ficar com a possibilidade de vender a terceiros a totalidade dos litros das bebidas negociados e não adquiridos.”
Entendeu o tribunal a quo que, segundo o disposto no art. 342º, nº 1 do C. Civil, competia ao embargante a alegação e prova das circunstâncias que permitiriam concluir por tais caracteres susceptíveis de afastar a validade da cláusula penal efectivamente contratada entre a exequente a sua cliente, ora executada e garantida pelo apelante.
É insusceptível de crítica tal conclusão.
Com efeito, nada se mostra provado, nem sequer fora alegado, que permita fundar um tal juízo de censura sobre a cláusula penal fixada, por ser de concluir pela sua desproporção em relação aos danos resultantes do incumprimento, para a exequente, bem como pela sua desadequação perante um quadro negocial padronizado. Com efeito, desconhecemos, por exemplo, se a cláusula em questão é idêntica ou compreende algum desvio em relação aos contratos celebrados em situações congéneres; desconhecemos se as contrapartidas adiantadas pela exequente foram semelhantes ou superiores às conferidas a outros clientes; desconhecemos se a análise de risco do negócio, para a exequente, justificava uma tal cláusula penal, no caso de esta ser divergente perante outras situações; desconhecemos se existiu e qual o esforço económico feito pela exequente para garantir a satisfação das suas obrigações; desconhecemos quais os custos eventualmente prevenidos pela exequente, por não ter que entregar os 1.766kg. de café que não foram gastos pela cliente; desconhecemos se a exequente suportou quaisquer custos, como por exemplo os do valor do produto, mas conseguiu colocá-lo noutros clientes, ou se o mesmo acabou a perecer.
Como se referiu no acórdão do STJ citado, num tal quadro de desconhecimento sobre as concretas circunstâncias do negócio e sobre o quadro padronizado em que o mesmo tenha sido inserido (o que é indiciado pelo recurso a cláusulas contratuais gerais) é impossível concluir que a cláusula penal que as partes, no exercício da sua liberdade contratual, convencionaram, é efectivamente desproporcionada em relação aos danos suportados pela exequente, por efeito da frustração do contrato.
Mas a isso acresce que a ausência de tal factualidade inibe, complementarmente, qualquer conclusão pela justeza de uma intervenção judicial correctiva quanto ao teor da cláusula penal convencionada, à luz do art. 812º do C. Civil, com fundamento numa conclusão sobre a sua manifesta desproporcionalidade.
Uma tal conclusão não se infere necessariamente da circunstância de a actuação da cláusula penal em causa redundar no recebimento do preço acordado para a venda da totalidade do café, pois desconhecemos o significado económico, para a exequente, desse resultado. E isso porquanto, como acima se referiu, nada foi alegado e demonstrado sobre os elementos do negócio e do seu incumprimento, sobre o seu contexto e os seus efeitos, e mesmo sobre os danos sofridos ou não pela vendedora, ora exequente. Perante tal desconhecimento, como justificar uma eventual afirmação de que a cláusula penal redundou num benefício manifestamente desproporcionado para esta?
Foi com este fundamento que o tribunal recorrido concluiu pela falta de fundamento para se afirmar que a cláusula penal estabelecida no contrato subjacente à letra exequenda havia de ter-se por proibida ou, pelo menos, justificar-se a sua correcção ao abrigo do disposto no art. 812º, nº 1, do C. Civil, prejudicando a regularidade do preenchimento da letra entretanto dada à execução.
Ora, como resulta do anteriormente exposto, é insusceptível de crítica tal juízo do tribunal a quo.
Por consequência, rejeita-se a ocorrência de qualquer nulidade, vício ou anomalia na relação contratual subjacente à emissão da letra dada à execução, bem como na respectiva resolução, precedente do respectivo preenchimento.
Carecem, em suma, de fundamento os embargos opostos à execução, cabendo confirmar a respectiva sentença, na conclusão pela falta de provimento da presente apelação.

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Sumariando:
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3 - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal em recusar provimento ao presente recurso de apelação, confirmando na íntegra a decisão recorrida.

Custas pelo apelante .

Reg. e not.


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Porto, 27 de Maio de 2025

Rui Moreira
Alberto Taveira
Anabela Miranda