PLATAFORMA DIGITAL
PRESUNÇÃO DE LABORALIDADE
ILISÃO DA PRESUNÇÃO
Sumário

I - Em presença de uma prestação de atividade de estafeta através de plataforma digital, visando-se o reconhecimento da existência de contrato de trabalho, deve verificar-se o preenchimento do disposto no art.º 12ºA, do Código de Trabalho.
II – Não se verificando os factos índice aí previstos deve verificar-se se há subordinação jurídica.
III – Ainda que se verifique presunção de laboralidade esta é ilidível.

Texto Integral

Acordam os Juízes da 4.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I- Relatório
1. O Ministério Público propôs ação especial de reconhecimento de existência de contrato de trabalho contra a GLOVOAPP Portugal, Unipessoal, Lda. pedindo que seja declarada a existência de um contrato de trabalho, entre a Ré e AA, com início em 28.06.2023.
A este processo foram apensadas quatro ações especiais de reconhecimento da existência de contrato trabalho, sendo aí peticionado:
a) no apenso A) que seja declarada a existência de um contrato de trabalho entre a ré GLOVOAPP Portugal, Unipessoal, Lda e BB, com início em 29.06.2023;
b) no apenso B) que seja declarada a existência de um contrato de trabalho entre a ré GLOVOAPP Portugal, Unipessoal, Lda e CC, com início em 19.06.2023;
c) no apenso C) seja declarada a existência de um contrato de trabalho entre a ré GLOVOAPP Portugal, Unipessoal, Lda e DD, com início em 11.04.2023;
d) no apenso D) declarada a existência de um contrato de trabalho entre a ré GLOVOAPP Portugal, Unipessoal, Lda e EE, com início em Janeiro de 2021 (ou pelo menos em 01.05.2023).
A ré GLOVOAPP Portugal, Unipessoal, Lda contestou todas as ações defendendo-se por exceção e impugnação tendo o Ministério Público respondido à matéria de exceção.
2. Realizado julgamento foi proferida sentença julgando procedentes as ações, declarou:
a existência de um contrato de trabalho por termo indeterminado entre a Ré, GLOVOAPP Portugal, Unipessoal, Lda., e os:
– senhor AA, em 28.06.2023;
– senhor BB, em 29.06.2023;
– senhor CC, em 19.06.2023;
– senhora DD, em 11.04.2023;
– senhor EE, em Dezembro de 2021.”
3. Inconformada, a ré recorreu da sentença proferida apresentando as seguintes conclusões:
“A. Na sentença não se decidiu corretamente quanto aos pontos 24, 25, 26, 29, 30, 34, 35 e 41 a 46, porquanto considerou:
a. Factos provados que deverão ser considerados como não escritos e/ou como não provados e/ou passar a ter outra redação:
i. Por consubstanciarem matéria conclusiva e/ou matéria de direito que está diretamente relacionada com o thema decidendum;
ii. Em face da prova produzida e/ou por estarem em contradição com outros factos provados;
b. Factos não provados que deverão ser considerados provados, em face da prova produzida;
B. Não procedeu à correta interpretação da matéria de direito:
a. Dos artigos 11.º, 12.º e 12.º-A do Código do Trabalho, não apenas porque não se podem considerar preenchidas características que pudessem presumir a existência de contrato de trabalho, como, sobretudo, da matéria de facto provada e não provada, resultam factos suficientes que permitem concluir pela ilisão de uma eventual presunção de existência de contrato de trabalho, e, portanto, que determinavam uma decisão de direito diferente.
Do recurso da matéria de facto
C. O Ponto 24 dos Factos Provados deve ser considerado não provado, devendo ver a sua redação alterada.
D. O ponto 24 é, em si próprio, contraditório. Não se coaduna a alegada obrigatoriedade de “manter a permissão de acesso à sua geolocalização pela plataforma” com a possibilidade de “concluir o transporte com o próprio telemóvel desligado”, na medida em que estando o próprio telemóvel desligado, o GPS deixa de funcionar/estar ativo.
E. Conforme se verifica pelo disposto no facto 19, o GPS apenas necessita de estar ligado para que seja proposto um serviço ao estafeta podendo, a partir desse momento, o GPS ser desligado.
F. A necessidade de ter o GPS ligado apenas no momento da proposta do serviço e a possibilidade de desligar o mesmo em seguida, foi ainda confirmado pela prova testemunhal, cfr. depoimento da estafeta DD, entre 21:50 e 21:59; estafeta EE, entre 16:08 e 16:22; Testemunha da Recorrente - FF, entre 07:14 e 08:20; Testemunha da Recorrente - GG entre 35:15 e 37:47; 01:10:56 e 01:11:35, conforme depoimentos gravados disponíveis no Citius.
G. Assim, deve o Ponto 24 dos Factos Provados ser considerado não provado, devendo a sua redação alterada com o seguinte sentido:
“24 – O sistema de geolocalização permite ainda ao «cliente» acompanhar a sua encomenda, caso o estafeta decida permanecer com o GPS ligado, embora possa concluir o transporte com o próprio telemóvel desligado.”
H. O Ponto 25 dos Factos Provados deve ser considerado não provado, na medida em que nenhum dos estafetas, ou Inspetores da Autoridade para as Condições no Trabalho, fez qualquer referência a uma obrigatoriedade dos estafetas de terem de aguardar “10 minutos pelo «cliente»” ou uma obrigatoriedade de os estafetas terem de comunicar “ao Suporte da Ré para que esta contacte o «cliente»”, nem tal resulta dos referidos Termos e Condições.
I. Quando o estafeta recolhe o produto para proceder a uma entrega, o estafeta passa a ser o responsável pelo bem transportado, conforme previsto na cláusula 5.1.7 dos T&C da utilização da plataforma para estafetas, transmitindo essa responsabilidade para o cliente utilizador aquando da entrega do bem ao mesmo, além de que o estafeta pode falar diretamente com os clientes e vise versa (conforme depoimento gravado, disponível no Citius, da testemunha GG, entre 39:27 e 40:05).
J. Os estafetas podem, se assim desejarem,
- acionar o “botão dos 10 minutos”, ou
- contactar o cliente (telefonicamente ou por mensagem) referindo que já se encontram no locar de entrega, ou
- simplesmente tocar à campainha quando chegam, etc.
K. O Ponto 26 dos Factos Provados deve ser considerado não provado.
L. Os Estafetas, bem como os estabelecimentos comerciais e os clientes utilizadores, podem assinalar, na Plataforma gerida pela Recorrente, as fases que compõem o serviço, desde a recolha até à entrega, todavia, tal não significa que seja obrigatório assinalar os mesmos, (conforme depoimento gravado, disponível no Citius, da testemunha FF entre 08:26 e 08:47; e conforme depoimento gravado, disponível no Citius, da testemunha GG entre 37:43 e 38:57; e 01:10:56 e 01:12:33).
M. Os Pontos 29 e 30 dos Factos Provados devem ser considerados não provados, devendo a redação do facto 30 ser alterada.
N. A Recorrente não fixa ao cliente “a quantia a pagar pelo serviço de transporte prestado pelo «estafeta».”
O. Conforme referido no facto 30 o Estafeta tem a possibilidade de alterar o multiplicador (que incide sobre as taxas de entrega) o que, dependo da escolha que o estafeta faça, poderá fazer com que o mesmo receba um valor mais elevado por serviço o que, por sua vez, poderá fazer com que o cliente possa ter de pagar um valor mais elevado.
P. Além de que, conforme referido ao abrigo da análise à alínea a), no ponto 1.3.4. infra para o qual se remete, os valores propostos para os serviços dependem de vários fatores que não são controlados pela Ré Recorrente, não havendo um valor fixo, nem um máximo ou um mínimo:
- a distância do pedido;
- o tempo de espera;
- condições meteorológicas;
- horas de procura mais elevada (conforme facto provado 30, na parte não impugnada);
- multiplicador;
- gorjetas;
- horas e local onde o estafeta decide aguardar pelos pedidos e quantos pedidos decide aceitar;
realizar e de que valor (conforme depoimento gravado, disponível no Citius, da testemunha GG entre 46:47 e 55:06).
Q. Assim, deve o Ponto 29 dos Factos Provados ser considerado não provado e o ponto 30 deve ver a sua redação alterada no seguinte sentido:
“30 – O preço do serviço varia em função de vários critérios, designadamente a taxa base de entrega, a distância percorrida (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega), o tempo de espera (tempo de espera do «estafeta» pela entrega do pedido), o horário (sendo que o valor é mais elevado nas horas em que o afluxo de pedidos é maior), condições meteorológicas adversas, e o multiplicador (que incide sobre as taxas de entrega e que só pode ser alterado pelo estafeta uma vez por dia, mas no intervalo pré-fixado pela Ré).”
R. O Ponto 34 dos Factos Provados deve ser considerado não provado, devendo ver a sua redação alterada.
S. Essa possibilidade de dar feedback que os utilizadores clientes tinham possibilidade de dar aos Prestadores de Atividade já não se encontra disponível na aplicação gerida pela Recorrente, conforme referido pelas várias testemunhas cfr. depoimentos das testemunhas Estafeta - DD entre 14:20 e 16:36; Estafeta - EE entre 25:39 e 25:54; Testemunha da Recorrente - GG entre 40:37 e 40:56, todos disponíveis no Citius.
T. Deve o Ponto 34 dos Factos Provados ser considerado não provado devendo ver a sua redação alterada com o seguinte sentido:
“34 – O denominado «sistema de estrelas» (reputação), no qual os «utilizadores» são convidados a avaliar as entregas, através de meios electrónicos inseridos na aplicação deixou de existir na aplicação gerida pela Ré, em data não concretamente apurada, mas há mais de 1 ano.”
U. O Ponto 35 dos Factos Provados deve ser considerado não provado devendo ver a sua a redação alterada.
V. Da palavra “comunicar” não se pode inferir a necessidade de uma autorização prévia, conforme pretende fazer crer o Digníssimo Tribunal a quo.
W. A Ré não restringe qualquer decisão do Estafeta relativamente à sua substituição, como nem nisso teria interesse na medida em que, conforme previsto nos já referidos Termos e Condições, o Estafeta que subcontrata é que será responsável pelas obrigações dos subcontratados.
X. Além de tal ser o que resulta dos Termos e Condições, também é o que resulta dos depoimentos das testemunhas cfr. depoimento da testemunha da Recorrente - GG entre 28:42 e 31:59; 01:23:40 e 01:23:48 disponível no Citius.
Y. Deve haver uma mera comunicação à Recorrente, para efeitos de cumprimento das obrigações legais a que a Recorrente está obrigada por operar em Portugal.
Z. Desta forma, deve o Ponto 35 dos Factos Provados ser considerado não provado devendo ver a sua redação alterada com o seguinte sentido:
“35 – O «estafeta» é livre de, por si, decidir sobre a sua substituição por terceira pessoa, bastando para tal que informe a Ré, nos termos previstos nos Termos e Condições.”
AA. Os Pontos 41, 42, 43, 44, 45 e 46 dos Factos Provados devem ser considerados não provados.
BB. O estafeta AA não prestou declarações, e o Senhor Inspetor declarou não ter confirmado as informações que o estafeta lhe terá transmitido, nem tão pouco ter confirmado que o referido estafeta estaria, à data, a usar a sua conta e a prestar um serviço através da plataforma da Recorrente, conforme declarações do Senhor Inspetor HH, entre 2:00 e 2:05; 13:15 e 14:03, disponíveis no citius.
Do recurso da matéria de Direito
CC. Mesmo que não procedesse o recurso da matéria de facto, do elenco da matéria de facto provada pelo douto Tribunal a quo, consta já matéria suficiente para ilidir toda e qualquer eventual presunção de existência de contrato de trabalho, resultando evidente a inexistência de subordinação jurídica e de prestação de atividade no âmbito da organização da Recorrente. É patente a autonomia e independência do prestador de atividade face à Recorrente.
DD. Tanto assim é que a Sentença proferida pelo Tribunal a quo está em franca contradição com o recente Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 12.09.2024, que confirmou a sentença da primeira instância que absolveu a aqui Recorrente relativamente a 27 ações de reconhecimento de existência de contrato de trabalho, cujos factos são semelhantes.
EE. De igual forma, a sentença proferida pelo Tribunal a quo está em contradição com a grande maioria de outros Juízos do Trabalho que já julgaram ARECTs em que é Ré a aqui Recorrente e Autor o Ministério Público, relativamente à relação de estafetas/prestadores de atividade e a plataforma.
FF. Invoca ainda jurisprudência estrangeira, em particular, o Acórdão do Tribunal Supremo Espanhol de 25.09.2020, que considerou existir um contrato de trabalho entre um estafeta e uma empresa de plataforma do grupo Glovo, ainda que omitindo o contexto e outros aspetos relevantes que levaram à referida decisão, como: (i) a forma de retribuição, (ii) fluxo financeiro, (iii) suporte contratual e funcionamento da aplicação utilizada pelo utilizador estafeta, e (iv) o facto de o estafeta e aquela empresa terem celebrado entre si um “contrato para a realização de atividade profissional de trabalhador economicamente dependente”, todas condições específicas que não existiam na relação de prestação de serviços entre o Prestador de Atividade nestes autos e a Recorrente22.
GG. Ao contrário do sentido constante da decisão referida no ponto anterior atente-se no acórdão do Juzgado de lo Social nº 34 de Barcelona de 23/12/202223 onde o Tribunal considerou que a relação estabelecida entre os estafetas e uma empresa do grupo Glovo não é uma relação laboral e que os estafetas não são trabalhadores subordinados, precisamente porque “a prestação de serviços não reunia os elementos básicos de uma relação de trabalho, como a dependência e retribuição” (realce nosso).
HH. Ou, ainda, o acórdão da Cour d’appel de Paris de 07/04/202124 que considerou que os estafetas da DELIVEROO – outra plataforma no setor de serviços de entregas – não são trabalhadores subordinados e que “o objetivo da geolocalização dos estafetas é determinar em que zonas se encontram e onde trabalham, e assegurar a ligação com o proprietário do restaurante e o cliente final. Trata-se de um elemento inerente ao serviço solicitado, não podendo, por conseguinte, ser assimilado a um sistema de controlo hierárquico”.
II. Ou o entendimento do acórdão do Tribunale di Milano de 10/09/201825 que considerou que a relação estabelecida entre os estafetas e a FOODINHO -sociedade que explora a plataforma Glovo em Itália26 - não é uma relação de trabalho, dado que o estafeta “era livre de decidir se e quando trabalhar: ao reservar as faixas horárias, de facto, não tinha qualquer constrangimento em determinar a forma o quando e o quantum do serviço. Este é um elemento essencial da autonomia organizacional, que se traduz na liberdade de determinar a quantidade e o horário de trabalho, os dias de trabalhado e de descanso e o seu número. Este é, na opinião deste tribunal, um elemento incompatível com a subordinação”.
JJ. No mesmo sentido o acórdão do Tribunal de l’Entreprise francophone de Bruxelles de 19/01/2019, que confirmou o entendimento que a relação estabelecida entre os condutores e a Uber não é uma relação laboral e que os condutores não são trabalhadores subordinados (…) e as decisões do Central Arbitration Committee de 14/11/201728 e do UK Court of Appeal em 24/06/202129 que consideraram que a relação estabelecida entre os estafetas e a DELIVEROO não é uma relação laboral e que aqueles são trabalhadores independentes, não estando abrangidos pela definição de relação laboral definida pela Recomendação da OIT n.º 198.
KK. Também o Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”), conhecido como Yodel Delivery Network, Lda, que se pronunciou sobre a aplicação da diretiva 2003/88/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 4 de novembro de 2003 relativa a determinados aspetos da organização do tempo de trabalho, ao conceito de “worker”, tal como é definido na jurisdição britânica, o qual inclui não apenas uma pessoa que celebrou um contrato de trabalho, mas também, “qualquer outro contrato, expresso ou tácito e (no caso de ser expresso) oral ou escrito, pelo qual a pessoa singular se compromete a efetuar ou a executar pessoalmente um trabalho ou uma prestação de serviços a favor de uma outra parte no contrato, cuja qualidade não seja, por força do contrato, a de cliente ou freguês de uma profissão ou de uma empresa comercial exercida pela pessoa singular”.
LL. E o referido Tribunal decidiu que um prestador de serviços independente não deve ser qualificado como “worker” se estiverem verificados uma série de indicadores, designadamente: (i) quando o profissional tem liberdade de organização do seu tempo de trabalho, (ii) quando o profissional tem liberdade de a aceitação ou não de tarefas, ou (iii) quando o profissional tem possibilidade de prestação de serviços através de terceiros ou subcontratados.
MM. Por fim, o United States District Court for the Eastern District of Pennsylvania, num acórdão de 11/04/2018 (…) considerou que a relação estabelecida entre os condutores e a UBERBLACK não é uma relação de trabalho e que aqueles são verdadeiros trabalhadores independentes, dado que estes “estão autorizados a trabalhar tanto ou tão pouco quanto desejarem”, “a trabalhar durante as horas que escolherem e a conduzir onde quiserem”, podendo “concentrar os seus esforços em determinadas “alturas altas” do dia, da semana, do mês, ou do ano, de modo a capitalizarem os preços de “pico” e, ainda, referindo-se à falta de subordinação jurídica destes profissionais que “podem trabalhar para concorrentes quando acreditam que a oportunidade de lucro é maior ao fazê-lo (...) quando a oportunidade de lucro era maior ao escolher não aceitar pedidos de viagem, os requerentes eram livres de ganhar dinheiro noutro lado. Estes factos indicam fortemente que os Requerentes são trabalhadores independentes que procuram as suas próprias oportunidades empresariais em busca de lucro”.
NN. Ainda no âmbito da alegada “uberização”, a questão dos prestadores de serviço plataforma de transportes – e não de entregas – já foi de igual modo alvo de apreciação por parte dos tribunais da Austrália (…) e da Nova Zelândia (…) e de igual modo aos tribunais brasileiros, onde também foi considerado que os condutores da UBER não eram trabalhadores subordinados.
Da suficiência da matéria de facto considerada na Sentença que determina uma decisão de direito e a consequente absolvição da Recorrente
OO. Ainda que o recurso da matéria de facto não procedesse, o que não se concede e apenas por dever de patrocínio se teoriza, da matéria de facto provada na sentença resultam desde logo factos provados (todos os que não foram impugnados e na medida da impugnação supra) que demonstram a ausência de subordinação jurídica.
PP. Aliás recorde-se que os mesmo factos levaram ao não reconhecimento da existência de contrato de trabalho pelo mesmo Digníssimo Tribunal a quo.
QQ. Deveria ser suficiente para se concluir que a prestação da atividade do interveniente acidental e a respetiva relação com a Recorrente, nunca poderia consubstanciar um contrato de trabalho, desde logo porque:
- O estafeta é que decide se e quando presta atividade, não tendo qualquer obrigação de regularidade, assiduidade e disponibilidade e o modo como presta atividade (factos provados 15, 16, 21);
- Sempre dependeu exclusivamente do estafeta ligar-se à aplicação para receber propostas de serviços ou desligar-se da mesma (factos provados 15, 16, 21);
- O estafeta ligar-se à plataforma gerida pela Recorrente possibilita-lhe oferecer os seus serviços de estafeta a um universo de pessoas maior, em particular aos outros utilizadores da plataforma (factos provados 4);
- O estafeta pode escolher os pedidos que pretende ou não realizar e mesmo tendo, inicialmente aceite prestar um serviço, enquanto não tiver a encomenda recolhida, pode desistir de efetuar esse serviço livremente e sem qualquer penalização (factos provados 21,23);
- O estafeta pode prestar serviços de estafeta utilizando outras plataformas, nomeadamente plataformas concorrentes da Recorrente (facto provado 36);
- A grande maioria dos estafetas exerce outras atividades, nomeadamente por conta de outrem, prestando serviços de estafeta em complemento à atividade profissional, mediante as suas disponibilidades pessoais;
- O estafeta pode subcontratar a prestação da sua atividade (factos provados 35).
- O estafeta pode escolher os pedidos que pretende ou não realizar e mesmo tendo, inicialmente aceite prestar um serviço, enquanto não tiver a encomenda recolhida, pode desistir de efetuar esse serviço livremente e sem qualquer penalização (factos provados 21, 23);
- O estafeta pode prestar serviços de estafeta utilizando outras plataformas, nomeadamente plataformas concorrentes da Recorrente (facto provado 36);
- A grande maioria dos estafetas exerce outras atividades, nomeadamente por conta de outrem, prestando serviços de estafeta em complemento à atividade profissional, mediante as suas disponibilidades pessoais;
- O estafeta pode subcontratar a prestação da sua atividade (factos provados 35).
RR. O Venerando Tribunal ad quem não conhecerá uma pessoa singular que, no âmbito de um contrato de trabalho, possa, ao contrário do que sucede com o prestador de atividade nos autos, em suma:
- Decidir quando é que presta atividade sem ter que dar qualquer justificação se não exercer, inexistindo períodos mínimos de regularidade ou de prestação de atividade;
- Decidir quais os serviços que vai ou não prestar;
- Possa exercer atividade concorrente;
- Possa subcontratar a sua atividade a um terceiro.
SS. Para concluir, resulta do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 12.09.2024, com total aplicação ao caso dos autos, junto como documento n.º 1 que:
“III – Mostra-se ilidida a presunção, não sendo de considerar a existência de um contrato de trabalho entre cada um dos prestadores da atividade/estafeta e a plataforma digital, no circunstancialismo fáctico em que se apura, no essencial, que:
(i) o estafeta pode aceitar, não responder, ou rejeitar o serviço proposto;
(ii) essa rejeição pode verificar-se mesmo após o estafeta já ter aceitado o serviço proposto, sem que tal afete o estatuto da sua conta na aplicação, a apresentação de futuros serviços e o preço de tais futuros serviços;
(iii) após a aceitação do serviço, os estafetas podem permitir ou não que a plataforma tenha acesso à sua localização, sem que isso tenha impacto na realização do serviço ou leve a alguma penalização;
(iv) são eles que, após a aceitação do serviço, escolhem o meio de transporte utlizado, definem o percurso a seguir, podendo desligar a geolocalização do telemóvel;
(v) os estafetas, uma vez por dia, podem alterar um multiplicar que permite aumentar o valor total recebido por cada serviço;
(vi) os estafetas escolhem os dias e horas que pretendem ligar-se à aplicação da ré;
(vii) os estafetas podem subcontratar outro prestador de serviços de entrega.
TT. Verifica-se que de acordo com a matéria de facto provada e não provada nos presentes autos, a conclusão deverá ser igual à proferida pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, sendo a factualidade a mesma.
Da distinção entre contrato de trabalho e contrato de prestação de serviços
UU. Em suma, “A diferenciação entre contrato de trabalho e contrato de prestação de serviço centra-se, essencialmente, em dois elementos distintivos: no objecto do contrato (no contrato de trabalho existe uma obrigação de meios, de prestação de uma actividade intelectual ou manual, e no contrato de prestação de serviço uma obrigação de apresentar um resultado) e no relacionamento entre as partes: com a subordinação jurídica a caracterizar o contrato de trabalho e a autonomia do trabalho a imperar no contrato de prestação de serviço.
[…] Provando-se que: os instrumentos utilizados pelo Autor eram propriedade deste e não do empregador; o Autor utilizava a sua própria viatura nas deslocações de serviço, suportando as respectivas despesas; não estava sujeito a qualquer horário de trabalho; a remuneração auferida era variável e à percentagem, e não fixa em função do tempo despendido na realização da sua actividade ou número de locais visitados, e à qual o Autor dava quitação através da emissão dos respectivos ”recibos verdes”, nunca tendo auferido, durante a execução do contrato, retribuição nas férias, subsídios de férias e de Natal, afastada está a referida presunção, pelo que, não se pode considerar como provado o contrato de trabalho.
[…]
“Não obstante o que antecede, que não se pense que, por tal facto, o prestador de serviço(s) está completamente à margem e liberto da recepção e seguimento de instruções dadas por aquele que lhe solicita e encomenda o trabalho a efectuar.
[…] E naturalmente que quem encomenda o serviço, quem contrata, não pode ficar desonerado ou impedido de dar instruções ao prestador de serviços sobre o que quer e de que modo pretende ver realizado esse trabalho”, conforme Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, n.º 292/13.5TTCLD.C1.S1, de 08.10.2015.
VV. O contrato de trabalho tem como objeto a prestação de uma atividade e, como elemento típico e distintivo, a subordinação jurídica do trabalhador, consubstanciada no poder do empregador conformar, através de ordens, diretivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou. desonerado ou impedido de dar instruções ao prestador de serviços sobre o que quer e de que modo pretende ver realizado esse trabalho”, conforme Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, n.º 292/13.5TTCLD.C1.S1, de 08.10.2015.
VV. O contrato de trabalho tem como objeto a prestação de uma atividade e, como elemento típico e distintivo, a subordinação jurídica do trabalhador, consubstanciada no poder do empregador conformar, através de ordens, diretivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou.
WW. Concluir que um Estafeta é subordinado da Ré Recorrente e que executa a atividade no âmbito da organização é uma conclusão impossível, pois se os Estafetas podem não prestar atividade quando querem, sem necessidade de pré-aviso e sem sofrer qualquer sanção, nunca poderia a Ré organizar nem determinar o exercício de atividade pelo estafeta. Em suma, os estafetas não devem qualquer obediência à Ré!
Natureza intuitu personae
XX. O facto de não ser feita qualquer triagem ou seleção prévia do utilizador estafeta, põe a descoberto uma inexistência da natureza intuitu personae, reconhecidamente característica do contrato de trabalho.
YY. Não há escrutínio académico, curricular ou sequer de empatia ou personalidade e atitude/apresentação.
ZZ.1 Pelo que, também por este motivo, se deverá confirmar o teor da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, cuja decisão final não merece reparo, devendo o recurso intentado pelo Autor Recorrente, improceder, sem mais.
Alínea a): “A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela”
AAA. A Ré Recorrente desempenha um papel de mera intermediadora, cobrando taxas aos 3 intervenientes, sendo que a taxa cobrada ao estafeta incluí o pagamento do processamento, nomeadamente a emissão de faturas em nome dos estafetas.
BBB. Pelo excerto transcrito e pelos factos dados como provados, transcritos supra, é possível aferir que os valores propostos para os serviços dependem de vários fatores que não são controlados pela Ré Recorrente, não havendo um valor fixo, nem um máximo ou um mínimo:
- a distância do pedido;
- o tempo de espera;
- condições meteorológicas;
- horas de procura mais elevada;
- da escolha do multiplicador;
- da gorjeta;
do número e tipo de serviços que o estafeta decide aceitar e onde se coloca a aguardar a proposta de serviços.
CCC. Além de que refere ainda o Digníssimo Tribunal a quo que o pagamento da taxa de acesso à plataforma, no montante de 1,85€, por parte dos estafetas, “serve de estímulo à assiduidade do «estafeta», em nada interferindo com as conclusões já alcançadas nos parágrafos que antecedem”.
DDD. O Estafeta paga o mesmo montante de 1,85€, quinzenalmente, que aceite uma proposta de serviço, quer aceite 100, etc.
EEE. Assim, a Ré não fixa quaisquer retribuições pelos serviços prestados pelos Estafetas, ou quaisquer limites, dependendo o valor recebido pelos Estafetas das características dos pedidos que decidam aceitar realizar, sendo as características dos mesmos definidas pelos próprios estafetas e pelos demais utilizadores da plataforma.
FFF. Pelo exposto, não se pode considerar preenchida a característica prevista no artigo 12.º-A, n.º 1, alínea a) do Código do Trabalho, resultando provado que a aplicação gerida pela Ré não fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela.
Alínea b): A plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade
GGG. São os estafetas que, voluntariamente, se inscrevem na plataforma da Recorrente com o intuito de auferir dos serviços prestados pela Recorrente, pagando a respetiva taxa para este efeito.
HHH. Além de que os requisitos de inscrição e utilização da plataforma não podem ser confundidos com regras quanto à prestação da atividade de estafeta.
III. Os documentos que os Estafetas remetem à Ré Recorrente, os mesmos também não correspondem a uma determinação da Ré Recorrente, mas com o cumprimento de obrigações legais, nomeadamente para aferir se o Estafeta está autorizado legalmente a exercer atividade profissional em Portugal.
JJJ. Quanto ao GPS, conforme facto provado 19 o GPS é do próprio telemóvel.
KKK. A Recorrente apenas propõem os serviços, não tendo a Recorrente qualquer informação sobre nada mais relativamente à prestação do serviço, nem qual o trajeto que o estafeta seguiu, se já fez a entrega, quando tempo demorou, etc. até porque nesse momento inicial o estafeta limita-se a aceitar o pedido (ou não) não efetuando qualquer deslocação, e podendo desligar de imediato o GPS.
LLL. Quanto à verificação periódica de identidade, o Digníssimo Tribunal, o mecanismo de verificação de identidade, como seja o reconhecimento facial, visa apenas garantir que a pessoa que está a utilizar a conta está autorizado legalmente a exercer atividade profissional em Portugal.
MMM. Fica assim claro que os estafetas são livres e autónomos na execução dos serviços que entendam prestar, não se verificando preenchida a característica prevista no artigo 12.º-A, n.º 1 al. b) do Código do Trabalho.
Alínea d): A plataforma digital restringe a autonomia do prestador de atividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos, através da aplicação de sanções, à escolha dos clientes ou de prestar atividade a terceiros via plataforma
NNN. A propósito da relação de emprego dever ser intuitu personae, conclui o tribunal, conforme já se referiu supra ao abrigo da impugnação do facto provado 35, (no ponto 1.2.2, para o qual se remete para evitar repetição de argumentação), que a Recorrente restringe a utilização da subcontratação sendo, alegadamente necessária prévia autorização, além de quanto já se referiu supra, mais importa ainda referir que deve ser efetuada uma distinção.
OOO. Primeiro, se um estafeta receber e aceitar uma proposta de serviço através da aplicação gerida pela Recorrente, em seguida, pode incumbir quem o próprio prestador quiser de efetuar esse serviço, comunicando-lhe essas informações pelos meios que entender, nomeadamente verbalmente, por telefone, sms, email, etc.. A Recorrente não sabe, nem tem forma de impedir ou controlar que isso suceda.
PPP. Coisa diferente é a subcontratação da conta que o prestador de atividade tem na plataforma, pois se o prestador de atividade que tiver uma conta registada na aplicação gerida pela Recorrente pretender cedê-la a um terceiro para este efetuar serviços em seu nome, é totalmente livre de o fazer, bastando para o efeito enviar o documento de identificação e uma fotografia do subcontratado, para que também o subcontratado possa estar coberto pelo seguro que o titular da conta (prestador de atividade) paga à Recorrente.
QQQ. Além de que quanto à alegada característica da permanência conforme trabalho intermitente, não tem tal qualquer semelhança com a situação dos autos, nem foi alegado, ou dado como provado que a Recorrente exerça atividade com descontinuidade ou intensidade variável, não podendo tal ser assim concluído, sem mais.
RRR. Pelo exposto, não se pode considerar preenchida a característica prevista no artigo 12.º-A, n.º 1, alínea d) do Código do Trabalho, resultando provado que a aplicação gerida pela Ré não restringe a autonomia do prestador de atividade em nenhum aspeto.
Alínea e): A plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta
SSS. Os termos e condições da Ré Recorrente mais não visam que os poderes de uma plataforma digital. Os mesmo não podem confundir-se com os de um empregador.
TTT. Além de que não se provou que a Ré Recorrente retirasse daí qualquer consequência ou aplicasse qualquer penalização aos estafetas.
UUU. Não se provando que a Ré exercesse as sanções que o estafeta mencionou, nem se provando outras, não se pode concluir que a plataforma digital exerça poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta, devendo concluir-se pela não verificação da alínea e) do artigo 12.º-A do Código do Trabalho.
VVV. No que à possibilidade de a Ré desativar uma conta concerne – de qualquer utilizador, seja ele cliente ou profissional - trata-se de uma prorrogativa dos serviços de intermediação em linha, como o da Ré, que se encontra prevista no artigo 4.º do Regulamento (UE) 2019/1150 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, relativo à promoção da equidade e da transparência para os utilizadores profissionais de serviços de intermediação em linha (Regulamento P2B).
WWW. Um “homem médio” concebe que uma aplicação tenha o direito de desativar a respetiva conta se os termos e condições forem violados, por exemplo, na utilização de uma aplicação de um banco, de uma rede social, de um site de vendas em segunda mão, etc., e ninguém se lembraria de dizer que um utilizador é trabalhador dessas aplicações pelo facto de poder ver a sua conta suspensa ou bloqueada.
XXX. Conclui-se, assim, que também este critério (artigo 12.º-A n.º 1 al. e) do Código do Trabalho) não se verifica, sendo que todos os factos dados como provados apenas permitem concluir em sentido oposto ao previsto nesta alínea.
Alínea f): Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação
YYY. O Tribunal a quo alega o preenchimento desta alínea f) na medida em que a plataforma digital é um instrumento de trabalho.
ZZZ. A referida aplicação não é um instrumento, mas antes código informático que é utilizado pelo telemóvel.
AAAA. Ou seja, o telemóvel é que é apto a constituir um instrumento de trabalho.
BBBB. Seguindo a linha de raciocínio do Autor, os softwares de GPS poderiam ser instrumentos de trabalho e, portanto, os Prestadores da Atividade poderiam reclamar ser trabalhadores da Google, Waze ou da Apple, o que, naturalmente, não se concede.
CCCC. Os principais e essenciais equipamentos nesta atividade são o veículo e o telemóvel, ambos propriedade do prestador da atividade.
DDDD. Os utilizadores estafetas pagam uma taxa de acesso e utilização da plataforma à Ré. Assim, é forçoso concluir que não está verificado este critério (artigo 12.º-A n.º 1 al. f) do Código do Trabalho).
Dos factos que demonstram a ausência de verificação de indícios internos e externos de laboralidade
– Da ilisão da presunção
EEEE. É ainda relevante, e em complemento de quanto já se referiu supra, assinalar que, não tendo o estafeta AA prestado declarações, nem tendo o Inspetor da ACT que efetuou a respetiva Participação confirmado as declarações do estafeta, tendo-se limitado a ver o ecrã do telemóvel, onde viu o símbolo da Glovo, sem verificar ou comprovar, pessoal e diretamente, não é possível, sem mais, e conforme efetuado pelo Digníssimo Tribunal a quo, concluir pela existência de um qualquer contrato de trabalho.
FFFF. Sem conceder, e ao contrário do que refere o Digníssimo Tribunal a quo a propósito da ausência do dever de não concorrência, o dever de não concorrência visa que um trabalhador não preste atividade concorrencial à da sua antiga entidade patronal, sendo que tal pode ser de forma direta ou passando a prestar atividade concorrencial para uma outra empresa que presta atividade concorrente à da anterior entidade patronal.
GGGG. Os estafetas podem até prestar outras atividades (inclusive concorrenciais com a da Recorrente), ao mesmo tempo em que presta atividade através da plataforma da Recorrente, conforme facto provado 36.
HHHH. É relevante assinalar que a generalidade das decisões nas várias ações de reconhecimento da existência de contrato de trabalho em que é Ré a aqui Ré Recorrente, são no sentido de que a Ré ilidiu a existência de qualquer presunção de existência de contrato de trabalho que porventura pudesse verificar-se, o que não se concede.
Em específico, nomeadamente, quanto à Subcontratação
IIII. Na plataforma gerida pela Recorrente não existe qualquer limitação relativamente a quem pode substituir o prestador de serviços.
JJJJ. O substituto não tem de dispor de conta na plataforma da Ré Recorrente (nem a mesma tem de estar ativa, naturalmente).
KKKK. Nomeadamente, o Acórdão STJ - processo n.º 2609/19.0T8OAZ.P1.S1, de 11-11-2020, que obteve, inclusive, voto de conformidade dos Exmos. Juízes Conselheiros Adjuntos, António Leones Dantas e Júlio Manuel Vieira Gomes, a propósito da ilisão de presunção do disposto no artigo 12.º do Código do Trabalho, considerou como provados os seguintes factos:
“4. A enfermeira chefe elaborava o horário de prestação da atividade, respeitando uma carga horária de cerca de 20 horas/semanais, sendo os registos do tempo de prestação da atividade feitos manualmente e através de registo digital de ponto […]
5. Cumpria um horário em sistema de turnos rotativos, com horas de início e termo da prestação determinados pela ré, […]
6. Recebia, como contrapartida da sua prestação de atividade, com periodicidade mensal, a quantia de € 6,70 por hora diurna e € 8,40 por hora noturna, contrapartida essa que, era paga pela ré por transferência bancária com a identificação da ré, recebendo em média cerca de €300/400 mensais.
7. Antes de iniciar a colaboração com a Ré, a colaboradora compareceu a uma entrevista com vista à sua contratação, na qual foi informada de que prestaria atividade de enfermagem em regime de prestação de serviços, sendo remunerada à hora, mediante a emissão de correspondente recibo.
8. A colaboradora foi igualmente informada de que a prestação de serviços seria realizada na Unidade de Cuidados Continuados …, a qual, por imperativo da sua especificidade e natureza intrínseca, exige que se mantenha uma atividade contínua durante sete dias na semana, e por isso tem essa atividade organizada em regime de turnos.
9. A colaboradora aceitou as referidas condições. […]
17. O uso de dístico identificativo do nome do colaborador com o brasão da Misericórdia, é prática que se insere na humanização e responsabilização de cuidados, para que a pessoa cuidada possa identificar o cuidador pelo nome, facilitando o tratamento individualizado. […]
19. Quando a colaboradora não comparece ao serviço não recebe a contrapartida. […]
22. A Ré não inscreveu a colaboradora na Segurança Social, estando esta inscrita na Autoridade Tributária e Aduaneira como trabalhadora independente.
23. A colaboradora nunca reclamou, junto da Ré, a sua falta de inscrição na Segurança Social como trabalhadora dependente. […]
25. A Ré não pediu à colaboradora que prestasse atividade em regime de exclusividade, nem a impede de prestar serviços noutras entidades.
26. A colaboradora durante o período de férias não recebe a contrapartida […]
27. A colaboradora não aufere quaisquer quantias a título de férias, subsídio de férias e de Natal, nem nunca lhe foi proporcionada formação pela Ré, circunstâncias que já conhecia e que aceitou antes de iniciar a sua colaboração com a Ré, nunca tendo reclamado o seu pagamento.
28. Antes do preenchimento dos turnos e, consequentemente, da publicação dos horários, esta colaboradora expressa, e antes do início de cada mês, a sua disponibilidade para o mês seguinte, sendo os turnos preenchidos tendo em conta as disponibilidades informadas, e só depois é publicado o horário.
29. Devendo comunicar previamente essa intenção, a enfermeira AA podia ajustar trocas de turno com outras enfermeiras que já prestassem funções na Ré, salvo nos casos, por nesses ser recusada a troca pela enfermeira chefe, em que daí resultasse a realização de turnos seguidos (tarde/noite) pela mesma enfermeira, ou que ficassem duas enfermeiras novas na instituição, ou ainda que uma enfermeira ficasse muito tempo sem folgas. […]
30. Se faltar ao serviço, AA não tem de justificar essa falta. […]”
LLLL. Como base nestes factos, o STJ entendeu, por unanimidade, que a Ré havia ilidido a presunção de existência de contrato de trabalho.
MMMM. Ora, os estafetas que prestam serviços através da plataforma da Recorrente têm consideravelmente mais liberdade, não estando sujeitos a nenhuma regra que sequer se assemelhe às obrigações que aquela enfermeira, cujo contrato de trabalho não se reconheceu, tinha que observar.
NNNN. Muito pelo contrário, conforme já vimos, são os próprios estafetas que:
a. determinam as horas de início e termo da prestação do serviço;
b. não existe uma remuneração horária fixa;
c. não têm obrigações mínimas de regularidade / assiduidade;
d. não foi efetuada nenhuma entrevista para aferir das capacidades e qualidades para a prestação do serviço;
e. o local da prestação da atividade é definido pelos próprios que o podem alterar sempre que pretendam e para onde desejarem;
f. não existem quaisquer regras de apresentação ou outras semelhantes;
g. não existe obrigatoriedade de aceitação de prestação de serviços quando decidem prestar atividade.
OOOO. À semelhança do caso em análise pelo STJ, os estafetas se não prestarem atividade também não recebem qualquer montante; não estão inscritos na Segurança Social, nem nunca reclamaram tal inscrição.
PPPP. A aqui Ré Recorrente também nunca pediu aos estafetas que prestassem atividade em regime de exclusividade, muito pelo contrário.
QQQQ. Durante quaisquer períodos que os mesmos decidam não prestar atividade, independentemente da razão, também não recebem nenhuma contrapartida a título de férias, nem subsídio de férias ou de Natal e também nunca lhes foi proporcionada formação pela aqui Ré Recorrente.
RRRR. Os estafetas não têm sequer de informar a Ré da disponibilidade dos mesmos conectando-se e desconectando com total liberdade, pelo que também não têm sequer de informar (quanto mais justificar) uma “falta” ao serviço.
SSSS. Assim, conclui o referido Acórdão da seguinte forma: “de acordo com a generalidade da doutrina e da jurisprudência, o que realmente se mostra decisivo para a qualificação de um contrato como contrato de trabalho é a existência de uma subordinação jurídica do trabalhador em relação ao empregador, subordinação que se traduz no facto daquele, por força do contrato ter de prestar a sua atividade (intelectual ou manual) sob a autoridade e no âmbito da organização deste.[…] a subordinação jurídica comporta graus. Ao lado dos casos em que, diariamente, a entidade patronal manifesta a sua posição de supremacia, programando, dirigindo, controlando e fiscalizando a actividade do trabalhador, existem outros em que devido às condições de realização da prestação, o trabalhador goza de uma certa autonomia na execução da sua actividade laborativa, sem que deixe de ocorrer a subordinação jurídica».
Seguramente, por não desconhecer as dificuldades que, não raro, existem quanto à alegação e demonstração de indícios reveladores da existência de contrato de trabalho, o legislador, ao introduzir no nosso ordenamento jurídico o Código do Trabalho, quer o que foi aprovado pela Lei n.º 99/2003 de 27 de agosto, quer na versão atual aprovada pela Lei n.º 7/2009 de 12 de fevereiro, estabeleceu uma presunção de existência de contrato de trabalho, estipulando-se no art.º 12º do atual Código do Trabalho (aqui aplicável) […]
Não há dúvida que, perante esta matéria de facto provada, se pode concluir pela verificação de diversas das características das previstas no mencionado art.º 12º n.º 1 do Código do Trabalho, diremos que de forma mais clara as que se enunciam nas suas alíneas a), b) e d).
Mas será que a Recorrente logrou ilidir a presunção de laboralidade decorrente da verificação dessas características? Demonstrou-se que antes de iniciar a colaboração com a Ré, o que sucedeu em março de 2019, a AA compareceu a uma entrevista com vista à sua contratação, na qual foi informada de que prestaria atividade de enfermagem em regime de prestação de serviços, sendo remunerada à hora, mediante a emissão de correspondente recibo, tendo sido igualmente informada de que a prestação de serviços seria realizada na Unidade de Cuidados Continuados Sidónio de Pinho Álvares Pardal, a qual, por imperativo da sua especificidade e natureza intrínseca, exige que se mantenha uma atividade contínua durante sete dias na semana, e por isso tem essa atividade organizada em regime de turnos, provando-se também que AA aceitou as referidas condições. (v. matéria que consta dos pontos 7 a 9 dos factos provados).
Demonstrou-se, por outro lado, que antes do preenchimento dos turnos e, consequentemente, da publicação dos horários e antes do início de cada mês, a AA expressa, a sua disponibilidade para o mês seguinte, sendo os turnos preenchidos tendo em conta as disponibilidades informadas, e só depois é publicado o horário (matéria que consta do ponto 28 dos factos provados), assim como se provou que a enfermeira AA podia ajustar trocas de turno com outras enfermeiras que já prestassem funções na Ré, devendo comunicar previamente essa intenção, salvo nos casos em que daí resultasse a realização de turnos seguidos (tarde/noite) pela mesma enfermeira, ou que ficassem duas enfermeiras novas na instituição, ou ainda, que uma enfermeira ficasse muito tempo sem folgas, por nesses (casos) ser recusada a troca pela enfermeira chefe, provando-se também que se faltar ao serviço a AA não tem de justificar essa falta (v. matéria que consta dos pontos 28 a 30 dos factos provados).
Para além disso, demonstrou-se que quando a colaboradora AA não comparece ao serviço, bem como durante o período de férias não recebe a contrapartida anteriormente mencionada (v. matéria dos pontos 19 e 26 dos factos provados), assim como não aufere quaisquer quantias a título de férias, subsídio de férias e de Natal, nem nunca lhe foi proporcionada formação pela Ré, circunstâncias que AA já conhecia e que aceitou antes de iniciar a sua colaboração com a Ré, nunca tendo reclamado o seu pagamento (matéria do ponto 27 dos factos provados), sendo que, por outro lado, a Ré não a inscreveu na Segurança Social, estando a mesma inscrita na Autoridade Tributária e Aduaneira como trabalhadora independente (matéria do ponto 22 dos factos provados).
Ora, sopesando toda esta matéria de facto demonstrada, verifica-se que, não obstante dos primeiros factos a que fizemos referência se poder inferir pela verificação da presunção de laboralidade prevista no art.º 12º do CT, a verdade que estes outros que acabámos de enunciar, nos levam a concluir haver a Ré logrado ilidir uma tal presunção.
Na verdade, pese embora dos primeiros factos enunciados se possa concluir que a enfermeira AA desempenha, desde março de 2019, a sua atividade no âmbito de uma organização – Unidade de Cuidados Continuados e Lar de … – pertencente à Ré, com meios que aí lhe são disponibilizados por esta, o certo é que, face a estes outros factos descritos, não se poderá concluir que o desempenho da atividade de enfermagem por parte de AA no âmbito dessa organização, seja feita sob a autoridade da Ré Santa Casa da Misericórdia de …. Com efeito, basta atentar que, emergindo da autoridade do empregador a possibilidade que lhe assiste de exercício do poder disciplinar sobre qualquer dos trabalhadores a ele vinculados mediante contrato de trabalho, designadamente quando qualquer deles falte injustificadamente, em violação do dever de prestação de trabalho decorrente do contrato, no caso em apreço demonstrou-se que se a enfermeira AA faltar ao serviço não tem de justificar essa falta perante a Ré Santa Casa da Misericórdia de … o que, em si, se não coaduna com a autoridade e consequente poder disciplinar que esta possa exercer no seio da referida organização em relação aos trabalhadores a ela vinculados mediante contrato de trabalho.
A isto acresce a circunstância de, no caso em apreço, se haver demonstrado que a enfermeira AA expressa à Ré qual a sua disponibilidade – em termos de desempenho da atividade de enfermagem – para o mês seguinte, sendo que os turnos em que a mesma possa ser integrada no âmbito da organização da Ré, são preenchidos tendo em conta as disponibilidades por ela informadas, circunstância que também põe em causa o poder de direção na conformação do trabalho que o empregador caracteristicamente exerce na empresa em relação aos trabalhadores ao seu serviço, no cumprimento de contrato de trabalho.
Por outro lado, também resulta da matéria de facto provada a que fizemos referência que, em determinadas circunstâncias, a enfermeira AA pode ajustar trocas de turno com outras enfermeiras a prestarem funções ao serviço da Ré e que se não comparecer ao serviço, bem como durante o período de férias, não recebe a contrapartida justada com esta, aspetos que também se não compaginam com a existência de um contrato de trabalho.
Finalmente também assume relevo na apreciação do caso, a circunstância de se haver demonstrado que a enfermeira AA não aufere quaisquer quantias a título de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, circunstância que conhecia e que aceitou antes de iniciar a sua colaboração com a Ré, sendo que também nunca reclamou junto desta pelo seu pagamento, para além de se haver demonstrado que aquela está inscrita na Autoridade Tributária como trabalhadora independente e nunca reclamou junto da Ré a falta de inscrição na Segurança Social como trabalhadora dependente.
Perante tais factos e como anteriormente referimos, somos levados a concluir haver a Ré logrado ilidir a presunção de laboralidade que decorre do disposto no art.º 12º do CT […]” [negritos e sublinhados nossos].
TTTT. Em suma, a tese defendida pelo Tribunal da Relação de Guimarães no caso das plataformas digitais falece por completo e contraria o disposto no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, pois é inegável que aquela enfermeira prestadora de serviços, quando presta serviços de enfermagem aos utentes da Unidade de Cuidados Continuados do Lar, encontra-se inserida no âmbito da atividade da mesma, utilizando, inclusive, as infraestruturas e utensílios aí existentes, e não foi por essas circunstâncias que não se logrou ilidir a presunção, em face da autonomia, liberdade e ausência de subordinação jurídica da enfermeira em relação àquele Lar.
UUUU. Tudo ponderado, a Ré Recorrente ilidiu qualquer presunção de laboralidade.
VVVV. Caso se venha a considerar verificada a presunção constante do artigo 12.º-A do Código do Trabalho, o que não se aceita e teoriza para efeitos de patrocínio, a aplicação do disposto no artigo 12.º-A do Código do Trabalho à situação nos presentes autos seria ilegal, porquanto o teor daquele artigo é manifestamente inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 13.º, 18.º n.º 2 e 3 e 61.º da Constituição da República Portuguesa.”
4. O Ministério Público junto do Tribunal a quo apresentou contra-alegações e das quais constam as seguintes conclusões:
“4.1. O ponto 24 dos factos provados foi corretamente dado como provado, na medida em que resultou da prova produzida que o sistema de geolocalização também tem como virtualidade de permitir ao cliente acompanhar a encomenda, daí que o estafeta deva permitir o acesso à sua geolocalização.
4.2. O ponto 25 dos factos provados foi corretamente dado como provado, na medida em que resultou do documento Termos e Condições, em particular do ponto 5.1.5.
4.3. O ponto 26 dos factos provados foi corretamente dado como provado, na medida em que resultou da prova produzida, em particular do depoimento da testemunha GG, que o pagamento da entrega só será efetuado se a Glovo tiver conhecimento da entrega, sendo que o cliente não tem obrigação de comunicar essa entrega, devendo, portanto, o estafeta fazê-lo.
4.4. Os pontos 29 e 30 dos factos provados foram corretamente dados como provados, na medida em que resultou da prova produzida que todos os parâmetros do preço a cobrar ao cliente estão pré-determinados pela plataforma, inclusive o «multiplicador» e a sua margem de alteração do preço está pré-determinada pela plataforma. Pelo que a margem de influência do estafeta no preço é mínima e insignificante.
4.5. O Ministério Público nada tem a opor a que se altere o ponto 34 dos factos provados como proposto pela Recorrente.
4.6. O ponto 35 dos factos provados foi corretamente dado como provado, na medida em que resultou do documento Termos e Condições.
4.7. Os pontos 41 a 46 dos factos provados foram corretamente dados como provados, na medida em que resultou da prova produzida.
4.8. O contrato de trabalho tem como característica distintiva a existência de subordinação jurídica do trabalhador, geralmente acompanhada da subordinação económica.
4.9. Em consequência, enquanto no contrato de trabalho o trabalhador se obriga a prestar ao outro o seu trabalho, no contrato de prestação de serviços o objeto é o resultado do trabalho e não o trabalho em si, pelo que o prestador não fica sujeito à autoridade e direção do outro contraente.
4.10. É evidente que a subordinação jurídica está sujeita a diversos graus, pois se há situações em que a entidade patronal expressa a sua posição de supremacia, programando, dirigindo, controlando e fiscalizando a atividade do trabalhador, outros há que, devido às condições de realização da prestação, o trabalhador goza de uma certa autonomia.
4.11. Por consequência, a subordinação jurídica é muitas vezes de difícil perceção.
4.12. Atendendo à dificuldade existente na sua perceção, têm a doutrina e a jurisprudência vindo a classificar diversos elementos ou indícios reveladores da ocorrência de uma subordinação jurídica.
4.13. Mais ainda no que a estas novas formas de prestação de trabalho respeita.
4.14. Pelo que bem andou o Tribunal a quo ao decidir que “Impõe-se, por isso, em nosso entendimento, actualizar a forma como aferimos a subordinação, procedendo a uma leitura actualista do artigo 12.º, sob pena de se ter dificuldade em identificar trabalhadores no século XXI”.
4.15.2
4.16. Retribuição: é a Recorrente que fixa o valor da retribuição e fixa quais os componentes que influenciam na fixação desse valor, e ao estafeta cabe apenas a possibilidade de [ …] fazer aplicar o “multiplicador”, cujos parâmetros também são definidos pela Recorrente, pelo que a margem de negociação e de influência que o estafeta tem no preço da é absolutamente insignificante.
4.17. Poder de direção: é indubitável que é a Recorrente que controla toda a atividade (o negócio é da Ré, os clientes sãos seus, a principal estrutura operativa é sua, é a Ré que fixa o valor do transporte e que indica o local de recolha e o local de entrega), tendo por isso o poder de direção.
4.18. Natureza intuitu personae: a Recorrente exige que lhe seja comunicada a substituição de estafeta porque a Recorrente pretende que quem exerça a atividade seja alguém vinculado a si, que faça parte da sua organização e de quem a Recorrente tenha o registo e fotografia, precisamente porque lhe importa quem efetua a atividade.
4.19. Poder disciplinar: as cláusulas de obrigações do estafeta e as cláusulas de restrição e exclusão do acesso do estafeta à plataforma são cláusulas em branco, permitindo um enorme poder sancionatório à Recorrente.
4.20. Equipamentos e instrumentos de trabalho: a aplicação informática da Glovo é um instrumento de trabalho essencial ao negócio da Ré e é utilizado pelos diferentes utilizadores da plataforma. A aplicação é a principal ferramenta e instrumento de trabalho dos prestadores da atividade sem a qual, os estafetas não podem aceitar a atribuição/distribuição dos pedidos e com a qual é permitido à Ré o acompanhamento da forma como o serviço é prestado, supervisionando-o.
4.21. O art.º 12.º A do Código do Trabalho não viola o princípio da igualdade, pois visa regular uma nova realidade (plataformas digitais) cuja forma de trabalho, por ser tão diferente das realidades laborais até então existentes, exigiu uma resposta do direito do trabalho e a consequente necessidade de criação de um regime próprio, não configurando o mesmo qualquer discriminação das plataformas digitais.
4.22. Face ao exposto, deve o recurso ser julgado improcedente, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida, por o Mmo. Juiz de Direito ter feito uma correta valoração dos factos e uma correta análise crítica e conjugada da prova, bem como uma correta interpretação da lei, ao ter declarado a existência de um contrato de trabalho por termo indeterminado entre a Ré e os estafetas AA, desde 28.06.2023, BB, desde 29.06.2023, CC, desde 19.06.2023, DD, desde 11.04.2023, e EE, desde dezembro de 2021.
5. Cumprida a o disposto na primeira parte do n.º 2 do art.º 657º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art.º 87º, n.º 1 do Código de Processo de Trabalho e realizada a Conferência cumpre decidir.
II - Objeto do recurso.
Resulta das disposições conjugadas dos arts. 639.º, n.º 1, 635.º e 608.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis por força do disposto pelo art.º 1.º, n.ºs 1 e 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho (CPT), que as conclusões delimitam objetivamente o âmbito do recurso, no sentido de que o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas pelas partes (delimitação positiva) e, com exceção das questões do conhecimento oficioso, apenas sobre essas questões (delimitação negativa).
Assim sendo fixam-se as seguintes questões a resolver:
(i) impugnação da matéria de facto;
(ii) da existência, ou não, de uma relação jurídica de natureza laboral entre a recorrente e AA, cujo reconhecimento se reportará a 28 de junho de 2023; entre a recorrente e BB, cujo reconhecimento que se reportará a 29 de junho de 2023; entre a recorrente e CC, cujo reconhecimento que se reportará a 19 de junho de 2023; entre a recorrente e DD, cujo reconhecimento que se reportará a 11 de abril de 2023 e entre a recorrente e EE, cujo reconhecimento que se reportará a dezembro de 2021.
IV- Fundamentação de facto.
4.1. O art.º 640 do CPC sob a epigrafe “[ó]nus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto” dispõe que:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
(…)”
Cumprirá, assim, aferir se a recorrente que veio impugnar a decisão da matéria de facto, quanto a determinados pontos da matéria de facto provada e não provada, cumpriu os requisitos de ordem formal que permitem a este Tribunal apreciar aquela impugnação, a saber, se especifica, como a lei impõe, os concretos pontos da matéria de facto que pretende ver apreciada e os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa para cada um dos pontos da matéria de facto impugnada, indicando com exatidão as concretas passagens da gravação dos depoimentos em que se funda o recurso e a decisão que deve ser proferida.
4.2. Apreciemos, então, se deve ser alterada a decisão que recaiu sobre a matéria de facto, sendo que o incumprimento dos ónus acima enunciados será assinalado sempre que tal se verifique.
4.3. A recorrente discorda do ponto 24 dos factos provados que deve ser considerado não provado devendo ver a sua redação alterada.
O ponto 24 dos factos provados tem a seguinte redação:
“O sistema de geolocalização permite ainda ao «cliente» acompanhar a sua encomenda a partir do momento em que o «estafeta» a recolhe, pelo que o «estafeta» deve manter a permissão de acesso à sua geolocalização pela plataforma, embora possa concluir o transporte com o próprio telemóvel desligado. “
A recorrente propõe que o ponto 24 passe a ter o seguinte teor:
“24 – O sistema de geolocalização permite ainda ao «cliente» acompanhar a sua encomenda, caso o estafeta decida permanecer com o GPS ligado, embora possa concluir o transporte com o próprio telemóvel desligado.”
Fundamenta a sua pretensão nos depoimentos de DD, EE, FF e GG e refere, ainda, ser o ponto 24 é, em si, contraditório, por não se coadunar a alegada obrigatoriedade de ”manter a permissão de acesso à sua geolocalização pela plataforma”, com a possibilidade de “concluir o transporte com o próprio telemóvel desligado” e que do ponto 19 dado como provado, resulta apenas que o GPS necessita de estar ativo para receber o pedido, podendo a partir desse momento ser desligado.
O Tribunal a quo motivou o ponto 24 dos factos provados, em conjunto com outros factos, afirmando-se na sentença recorrida que:
“Os factos provados de 19 a 28 carecem de maior desenvolvimento. A Ré assumiu no seu articulado que a «geolocalização deve estar activa...quando o pedido é efectuado e sugerido ao prestador, uma vez que esta informação é necessária para providenciar os serviços». E, de facto, não podia ser de outra maneira, a bem da eficiência do sistema: a Ré carece de saber a efectiva localização de cada um dos «estafetas» online para distribuir entre estes as ordens de encomenda. Para tanto, o «estafeta» tem necessariamente de ter o sistema de geolocalização do seu telemóvel activo e de permitir o seu acesso pela plataforma. A questão é saber se, depois da aceitação da realização do transporte, a Ré exige ao «estafeta» que mantenha o sistema de geolocalização activo. Importa também dizer que a questão não se confunde com a possibilidade de o «estafeta» seguir pelo caminho que mais lhe agrade. Conforme fluiu dos depoimentos destes, o «estafeta» pode seguir pelo caminho que entenda mais conveniente, que será sempre certamente o mais rápido (pelo que essa não será a preocupação da Ré). Conforme também ressumou daqueles depoimentos, o «estafeta» recebe antes da aceitação uma estimativa (que depois poderá ser concretizada em montante superior, mas já lá vamos) de quanto irá receber pelo transporte. Isto sucede porque a plataforma assume por si a distância entre os pontos de recolha e entrega independentemente desse percurso ideal ser ou não concretizado pelo «estafeta». Também não se questionou que o transporte possa ser efectuado, após a recepção da mercadoria, na hipótese extrema, com o telemóvel desligado (por exemplo, por falta de bateria). Para tanto, basta que conheça o percurso, pelo que também não é por aí. A questão é outra: a Ré quer saber onde anda o «estafeta» e o que faz após a recepção do bem? A resposta foi afirmativa. Da leitura dos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas» resultou a conclusão pela imposição ao «estafeta» que aguarde 10 minutos pelo cliente ou que o ponto de recolha e/ou de entrega possa variar em até 200 metros por comparação ao indicado pela plataforma. Especificamente quanto à geolocalização, resultou dali que os dados de geolocalização são partilhados com o «cliente» e o «estabelecimento comercial». Por isso se diz ali que «os dados relacionados com a geolocalização do estafeta são necessários para a execução dos Termos e Condições, bem como para a utilização da plataforma, a fim de permitir aos consumidores e estabelecimentos comerciais saber o estado e localização do estafeta durante a recolha». Mais à frente é dito que «a geolocalização é uma informação importante e básica para a prestação do serviço» e que «o estafeta pode desactivar a geolocalização quando não está a usar a plataforma», relacionando essa ferramenta com a necessidade de «informar o estabelecimento comercial ou o utilizador cliente da localização do estafeta», com «a oferta de pedidos», a «facturação» em com questões relacionadas com a «segurança rodoviária...polícia)». Por isso, não surpreendeu que um dos «estafetas» inquiridos, o senhor CC, recordasse a recepção de notificações da Ré para que activasse novamente o GPS. Naturalmente, não estando online, nada obriga a que mantenham a geolocalização activada. Resultou, ainda, dos depoimentos dos inquiridos «estafetas», conjugados com as regras de experiência comum, que têm de dar parte à Ré da conclusão da tarefa, pois de outro modo não serão elegíveis para novo transporte nem recebem o seu valor. Por último, pelo depoimento dos «estafetas», designadamente dos senhores BB e CC, conjugados com a leitura dos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas», concluiu-se que podem recusar a proposta de transporte até à recepção do bem a entregar, continuando elegíveis para novas encomendas. É, aliás, uma forma de promover a eficiência do sistema, protegendo-o de atrasos intoleráveis na entrega da encomenda pelo «comerciante».
Relativamente a este ponto 24 verificamos que se pretende que se dê como não provado o segmento referente à obrigatoriedade de o estafeta manter a permissão de acesso à sua geolocalização, já que as partes aceitam que o sistema tem de estar ligado pelo estafeta para ser proposta a prestação de serviço por parte da ré (cfr. ponto 19 dos factos provados) e que não é necessário para concluir o serviço(cfr. ponto 24 dos factos provados, in fine).
Ouvidos os depoimentos das testemunhas, a testemunha DD explicou que nada a impedia de desligar o GPS. Este depoimento foi, ainda, corroborado pelo depoimento das testemunhas FF e GG. A testemunha EE afirma que a Glovo nem sabe que tem a localização desligada ainda que depois se contradiga ao referir que não tem autorização para a desligar.
Não foram apresentadas provas em sentido contrário.
Considerando a prova em referência e, não obstante o errático depoimento da testemunha EE, concordamos que o segmento em questão não tem como subsistir. Acrescentando-se, ainda, que da importância que é reconhecida à geolozalização afirmada na motivação do recurso não se retira a obrigatoriedade de manter o serviço de geolocalização durante o percurso que se afirma no segmento impugnado.
Assim, decide-se modificar o ponto 24, nos seguintes termos:
- dando-se como provado que: “o sistema de geolocalização permite ainda ao «cliente» acompanhar a sua encomenda, caso o estafeta decida permanecer com o GPS ligado, embora possa concluir o transporte com o próprio telemóvel desligado.”
- e não provado que: “o «estafeta» deva manter a permissão de acesso à sua geolocalização pela plataforma”
4.4. A recorrente discorda do ponto 25 dos factos provados que deve ser considerado não provado
O ponto 25 dos factos provados tem a seguinte redação:
“25 – A Ré exige ao estafeta que aguarde 10 minutos pelo «cliente», caso este não se encontre na morada de entrega, e que comunique ao Suporte da Ré para que esta contacte o «cliente».”
Refere que nenhum dos inspetores da ACT fez qualquer referência a uma obrigatoriedade dos estafetas de terem de aguardar “10 minutos pelo «cliente»” ou uma obrigatoriedade de os estafetas terem de comunicar “ao Suporte da Ré para que esta contacte o «cliente»” nem tal resulta dos Termos e Condições referindo-se, ainda, a importância da cláusula 5.1.7
Invoca, ainda, o depoimento da testemunha GG.
A motivação do Tribunal a quo, quanto a este facto, consta do extrato da sentença que já se reproduziu no ponto 4.3..
Da mesma resulta que a convicção do Tribunal resulta apenas do teor do documento “Termos e Condições de Utilização da plataforma Glovo para Estafetas”, designadamente do número 5.1.5 e 5.1.8.
Ora, a regra dos 10 minutos, estabelecida no número 5.1.5 dos “Termos e Condições de Utilização da plataforma Glovo para Estafetas”, não se dirige apenas ao estafeta mas também aos utilizadores clientes, e tem como pressuposto o evitar fraudes. E, a aceitação pelo estafeta da variação de uma distância dos pontos de recolha e entrega de 200 metros, regra estabelecida no número 5.1.8, não fundamenta a obrigatoriedade, para aquele, de aguardar 10 minutos.
Terá, assim, de proceder a pretensão da recorrente procedendo-se à eliminação do ponto 25 dos factos dos factos provados.
4.5. A recorrente discorda do ponto 26 dos factos provados que deve ser considerado não provado
O ponto 26 dos factos provados tem a seguinte redação:
“26 – Quando conclui a entrega, o «estafeta» deve registar na plataforma que a completou, para receber pelo transporte e tornar-se elegível para receber um novo pedido. “
Invoca o depoimento das testemunhas FF e GG.
A motivação do Tribunal a quo, quanto a este facto, consta do extrato da sentença que já se reproduziu no ponto 4.3..
Relativamente a esta questão, não se verifica que dos depoimentos se possa impor a modificação propugnada – basta atentar nas transcrições efetuadas pela recorrente -, ao invés, os estafetas têm de comunicar à recorrente a conclusão da tarefa, pois de outro modo não serão elegíveis para novo transporte nem recebem o seu valor.
Nada se impondo alterar terá de improceder a pretensão da recorrente, nesta parte.
4.6. A recorrente discorda dos pontos 29 e 30 dos factos provados que devem ser considerados não provados devendo a alteração do facto 30 ser alterada.
Os pontos 29 e 30 dos factos provados têm a seguinte redação:
“29 – É a Ré quem fixa ao «cliente» a quantia a pagar pelo serviço de transporte prestado pelo «estafeta».
30 – Para tanto, a Ré estabelece os limites mínimo e máximo para o efeito, acrescido das variáveis por si unilateralmente fixadas, não existindo qualquer negociação [prévia] entre si e o «estafeta» quanto aos critérios subjacentes à fixação dos respectivos valores, designadamente quanto à taxa base de entrega, à distância percorrida (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega), o tempo de espera (tempo de espera do «estafeta» na entrega do pedido), o horário (sendo que a remuneração é mais elevada nas horas em que o afluxo de pedidos é maior), condições meteorológicas adversas, e o multiplicador (que incide sobre as taxas de entrega e que só pode ser alterado pelo estafeta uma vez por dia, mas no intervalo pré-fixado pela Ré).”
Propõe a seguinte redação para o ponto 30 dos factos provados:
30 – O preço do serviço varia em função de vários critérios, designadamente a taxa base de entrega, a distância percorrida (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega), o tempo de espera (tempo de espera do «estafeta» pela entrega do pedido), o horário (sendo que o valor é mais elevado nas horas em que o afluxo de pedidos é maior), condições meteorológicas adversas, e o multiplicador (que incide sobre as taxas de entrega e que só pode ser alterado pelo estafeta uma vez por dia, mas no intervalo pré-fixado pela Ré).”
Invoca o depoimento da testemunha GG
O Tribunal a quo motivou os pontos 29 e 30 dos factos provados, em conjunto com outros factos, afirmando-se na sentença recorrida que:
Os factos provados em 29 a 31 (e a alegação não provada em i) resultaram, desde logo, da conclusão anterior quanto à natureza da plataforma. Está já assente que o «cliente» apenas interage, por recurso à plataforma, com a Ré, limitando-se a receber do «estafeta» a encomenda (e a quem pode, por simpatia, gratificar com a entrega de algum dinheiro, mas à margem da plataforma). Logo, é a plataforma que propõe ao «cliente» o preço a pagar pelo transporte. Está também já assente que o «estafeta» recebe a proposta de transporte com a indicação inicial do valor que poderá receber pelo serviço. Este pode resultar a final superior (por exemplo, pelo tempo de espera da encomenda). Em qualquer caso, de acordo com os depoimentos dos senhores FF, GG e dos «estafetas», concluiu-se sem dúvida que todos os parâmetros do preço a cobrar ao «cliente» estão pré-determinados pela plataforma. Todos fizeram, ainda, referência ao «multiplicador». Ainda em 14.02.2024, conforme «auditoria», o «estafeta» apenas podia lançar mão dele uma vez por dia. E, conforme fluiu daqueles depoimentos é a Ré que pré-determina a amplitude dessa possibilidade: o «estafeta» age sempre de acordo com as regras estabelecidas na plataforma. As variáveis alegadas, mas não provadas, resultaram da ausência de prova que as corroborasse.
Do depoimento da testemunha GG resulta que existe um valor mínimo do pedido que depois é alterado em função de vários fatores, como a distância do pedido, tempo de espera, condições meteorológicas, horas de maior procura – cujo pagamento é imputado ao cliente, com exceção do tempo de espera que é imputado ao estabelecimento comercial - e, ainda, pelo multiplicador, sendo este acionado exclusivamente pelo estafeta. Esclareceu a testemunha que não há um valor máximo, mas um valor mínimo que o pedido pode ter.
Não se mostram contrapostas outras provas.
Visto este depoimento afigura-se-nos que assiste parcialmente razão à recorrente não se podendo afirmar que seja a ré a estabelecer um valor máximo desde logo por o estafeta ser livre de acionar (ou não) o multiplicador. E, a ser assim afigura-se-nos que não se poderá manter o ponto 29 dos factos provados, considerando a intervenção que se verifica por parte do estafeta no preço final que é apresentado pela ré ao cliente.
Em face do exposto o ponto 29 dos factos provados será eliminado e modifica-se o ponto 30, nos seguintes termos:
- dando-se como provado que “ a ré estabelece limites mínimos para o preço a pagar pelo serviço de transporte, acrescido das variáveis por si unilateralmente fixadas, não existindo qualquer negociação [prévia] entre si e o «estafeta» quanto aos critérios subjacentes à fixação dos respetivos valores, designadamente quanto à taxa base de entrega, à distância percorrida (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega), o tempo de espera (tempo de espera do «estafeta» na entrega do pedido), o horário (sendo que a remuneração é mais elevada nas horas em que o afluxo de pedidos é maior), condições meteorológicas adversas e do multiplicador. que pode ser alterado pelo estafeta uma vez por dia, no intervalo pré-fixado pela ré.
- e não provado que: a ré estabeleça limites máximos na fixação do preço do serviço.
4.7. A recorrente discorda do ponto 34 dos factos provados que deve ser considerado não provado devendo a sua redação ser alterada.
O ponto 34 dos factos provados tem a seguinte redação:
“34 – A Ré pratica um sistema denominado «sistema de estrelas» (reputação), no qual os «utilizadores» são convidados a avaliar as entregas, através de meios electrónicos inseridos na aplicação.”
A recorrente propõe a seguinte alteração:
“34 – O denominado «sistema de estrelas» (reputação), no qual os «utilizadores» são convidados a avaliar as entregas, através de meios electrónicos inseridos na aplicação deixou de existir na aplicação da Ré, em data não concretamente apurada, mas há mais de 1 ano.”
O recorrido nada tem a opor a que se altere o facto provado, nos termos propostos pela recorrente.
Em face da posição assumida pelas partes procede-se à alteração da redação conforme o requerido.
4.8. A recorrente discorda do ponto 35 dos factos provados que deve ser considerado não provado devendo a sua redação ser alterada.
O ponto 35 dos factos provados tem a seguinte redação:
“35 – O «estafeta» encontra-se impedido pela Ré de, por si, decidir sobre a sua substituição por terceira pessoa, sem que previamente a informe dessa sua intenção «para fins organizacionais».
A recorrente propõe a seguinte redação:
“35 – O «estafeta» é livre de, por si, decidir sobre a sua substituição por terceira pessoa, bastando para tal que informe a Ré, nos termos previstos nos Termos e Condições.”
Fundamenta a sua pretensão no que resulta dos Termos e Condições e, ainda, no depoimento da testemunha GG
O Tribunal a quo motivou o ponto 35 dos factos provados, afirmando na sentença recorrida que:
O facto provado em 35 exige algum desenvolvimento. Foi sabido o texto consolidado dos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas», com data de Maio de 2023, pelo que a regulação posterior do tema foi por aí conhecida. Não se olvidou o que disse a este respeito o senhor GG, designadamente na parte final do seu depoimento. Porém, também por aí se desconfiou que a possibilidade de subcontratação sempre esteve sujeita ao controlo apertado da Ré. Aliás, lidos os «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas» de Maio, verificou-se que ainda ali constam frases como «a conta é intransmissível» (2.2) que pareceram ser resquícios de um anterior estado de coisas. De outra maneira, não faz sentido que também ali se fale em «subcontratar a sua conta de utilizador estafeta» (5.3.1) ou «intenção de subcontratar a sua conta». Por isso, atendeu-se ao depoimento dos «estafetas», designadamente da senhora DD e do senhor EE, e à leitura do seu «contrato para a realização de actividade profissional como profissional liberal» (de 2021, que refere expressamente «nem irá subcontratar parte ou a totalidade da actividade contratada pela Glovo, nem as actividades que poderiam ser contratadas por outros clientes, mas que, nessa eventualidade, informaria a Glovo com antecedência»), concluindo-se como provado.
Ouvido o depoimento da testemunha resulta que a mesma esclareceu a forma como o estafeta pode subcontratar a sua conta comunicando essa intenção à plataforma, bem como os documentos são exigidos que diferem dos solicitados ao estafeta e a razão pela qual os solicitam e, ainda, que o pagamento dos serviços será efetuado para estafeta. Confirmou, ainda, a instâncias do juiz a quo que sempre houve a possibilidade de subcontratar.
Este depoimento confirma o que consta dos Termos e condições de utilização da plataforma para Glovo, concretamente quanto ao Anexo II referente a Termos e Condições de Subcontratação. Neste Anexo II e que se mostra transcrito no ponto 40 dos factos provados (parte final) resulta que a subcontratação está dependente da comunicação prévia por escrito à recorrente.
Em face da prova em referência, concluiu-se que, embora para efetuar a subcontratação o estafeta tenha de efetuar prévia comunicação, mas não resulta que esteja está impedido de o fazer.
Assim, decide-se modificar o ponto 35, nos seguintes termos:
- dando-se como provado que “o «estafeta» pode decidir sobre a sua substituição por terceira pessoa, comunicando-o previamente por escrito à Glovo, nos termos previstos nos Termos e Condições”
- e não provado que: “o «estafeta» se encontre impedido pela Ré de, por si, decidir sobre a sua substituição por terceira pessoa, sem que previamente a informe dessa sua intenção «para fins organizacionais».
4.9. Por fim a recorrente discorda dos pontos 41 a 46 dos factos provados que devem ser considerados não provados.
Os pontos 41 a 46 dos factos provados têm o seguinte teor:
“41 – No dia 11.08.2023, pelas 11h45, o senhor AA encontrava-se, no exercício da descrita actividade de «estafeta», no Parque de Estacionamento do Centro Comercial Continente da Amadora (zona exterior) sito na EN 249 Amadora, a aguardar a preparação pelo restaurante do pedido efectuado pelo «cliente», para proceder à recolha desse pedido e posterior entrega na morada indicada por aquele, quando foi identificado por inspectores da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT).
42 – No momento da abordagem pelos elementos da ACT, o senhor AA encontrava-se equipado com a mochila necessária para o transporte de refeições, tinha veículo próprio para transportar as encomendas e tinha a aplicação (App) da plataforma Glovo instalada e activa no seu smartphone.
43 – Para o efeito, o senhor AA registou-se naquela plataforma, aderindo aos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas», no dia 28.06.2023, procedendo à criação de conta própria na plataforma, mediante o respectivo registo na modalidade de «utilizador estafeta».
44 – Nesse dia, o senhor AA iniciou a actividade de «estafeta» através da plataforma.
45 – A área geográfica preferencial que indicou na plataforma para prestação da sua actividade foi a cidade de Lisboa e arredores.
46 – Como contrapartida dos fretes que realiza, a Ré paga-lhe quinzenalmente, mediante transferência bancária para conta bancária por titulada por aquele senhor e indicada por si à Ré para esse efeito.
Invoca o depoimento da testemunha HH.
Os factos impugnados não respeitam à mesma realidade embora tenham como sujeito AA e a recorrente não indicou do depoimento da testemunha a parte que se reportava a cada um dos factos, não cabendo a este Tribunal escolher de, entre o depoimento indicado pelo recorrente, a parte que se adequa a cada um dos factos impugnados
.
Assim, é de concluir que a recorrente não cumpriu o ónus da prova a que alude o art.º 640º, n.º 1 al b), o que nos termos do n.º 1 determina a rejeição da impugnação da matéria de facto nesta parte.
*
Os pontos de facto que sofreram modificação serão introduzidos no local próprio do acervo fáctico.
*
5. São, pois, os seguintes factos provados e não provados a considerar:
(gerais)
1 – A Ré tem por objecto social o «desenvolvimento exploração de uma plataforma tecnológica, comércio a retalho por via electrónica, comércio não especializado de produtos alimentares e não alimentares, bebidas e tabaco e, de um modo geral, de todos os produtos de grande consumo, comercialização de medicamentos não sujeitos a receita médica, produtos de dermocosmética e de alimentos para animais, a importação de quaisquer produtos, o comércio de refeições prontas a levar para casa e a distribuição ao domicílio de produtos alimentares e não alimentares. Exploração, comercialização, prestação e desenvolvimento de todos os tipos de serviços complementares das actividades constantes do seu objecto social. Realização de actividades de formação, consultoria, assistência técnica, especialização e de pesquisa de mercado relacionadas com o objecto social. Qualquer outra actividade que esteja directa ou indirectamente relacionada com as actividades acima identificadas».
2 – No desenvolvimento da sua actividade, a Ré serve-se de uma plataforma ou aplicação informática em Portugal, mediante a utilização da Internet, designada «Glovo».
3 – A plataforma foi criada e é desenvolvida e administrada pela sócia única da Ré, a sociedade Glovoapp23, S.L., com sede em C/ Pujades, Barcelona, Espanha.
4 – A plataforma faz a ligação entre «comerciantes», que desejam vender os seus produtos, «clientes», que desejam adquirir bens e que os mesmos lhes sejam entregues ou optem por eles próprios fazer a sua recolha, e «estafetas» que desejam fazer entregas aos «clientes», fazendo a cobrança do valor do serviço ao «cliente».
5 – O serviço feito pelo «estafeta» consiste em, após aceitar pedidos de clientes na referida plataforma, ir ao estabelecimento de restauração ou outro, aguardar a preparação do pedido, recolhê-lo e posteriormente deslocar-se ao local de entrega indicado para proceder à efectiva entrega do pedido ao «cliente» que o solicitou.
6 – Quem deseje inscrever-se como «estafeta» na plataforma deve-se submeter ao procedimento de registo ali previsto, criando a sua conta como «utilizador estafeta», demonstrando cumprir os seguintes requisitos: (i) ser maior de idade; (ii) ter veículo próprio (bicicleta, ciclomotor, motociclo, trotinete ou veículo automóvel); (iii) ter documento de identificação (cartão de cidadão, título de residência ou passaporte), (iv) carta de condução, comprovativo de actividade aberta na Autoridade Tributária, (v) comprovativo de ATCUD (código único de documento), e (vi) ser titular de um método de pagamento (por exemplo, conta aberta em instituição bancária);
7 – O seu «perfil de conta» deve estar actualizado com a sua foto de perfil, podendo a Ré pedir a apresentação de prova da sua identidade mediante reconhecimento facial efectuado através do telemóvel (smartphone) e sempre que entenda;
8 – Deve indicar a área geográfica do país onde pretende prestar a sua actividade.
9 – Caso mais tarde pretenda alterar essa indicação geográfica, deverá solicitá-lo à Ré mediante formulário por esta disponibilizado para o efeito.
10 – Tem de aceitar os «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas».
11 – Tem, ainda, de aceitar: a) política de privacidade de protecção de dados; b) política de cookies; c) normas de Ética e Conduta empresarial para terceiros da Glovo, bem como todas as políticas aplicáveis à Comunidade Glovo; d) realização da actividade, contratando a plataforma directamente, por um preço que é facturado quinzenalmente.
12 – Para poder realizar a entrega, o «estafeta» tem de utilizar uma mochila térmica (se para transporte alimentar), possuir um telemóvel (smartphone) com ligação à Internet, tendo ainda transferido e aprendido a usar a aplicação, e servir-se de veículo de transporte individual.
13 – Estes equipamentos não pertencem à Ré.
14 – Estes equipamentos não têm de ostentar a marca da Ré.
15 – Uma vez registado, quando pretende iniciar a sua actividade o «estafeta» acede à sua conta na plataforma colocando-se online (ou seja, «disponível»).
16 – O «estafeta» é quem decide se trabalha num dia concreto e desenvolve a sua actividade em horário que o próprio define, bastando para o efeito ligar o referido botão na plataforma nos períodos respectivos.
17 – Dentro da área geográfica que indicou, o «estafeta» decide o concreto local onde presta a sua actividade.
18 – Por isso, a plataforma não dá qualquer tipo de indicação ao «estafeta» sobre o local onde deve estar para receber propostas de entrega.
19 – Porém, o «estafeta» tem de ter o sistema de geolocalizaçao por GPS do seu telemóvel ligado para que lhe seja proposta a prestação de serviço por parte da Ré.
20 – A plataforma apresenta a oferta de entrega ao «estafeta» melhor posicionado, e com a indicação do valor mínimo que propõe para o transporte.
21 – O «estafeta» que recebe a oferta de entrega pode aceitá-la, ignorá-la ou recusá-la (sem necessidade de justificar a causa), sem que deixe de continuar a receber novas propostas enquanto se mantiver ligado à aplicação.
22 – Aceitando-a, o «estafeta» dirige-se ao estabelecimento comercial de restauração ou outro, aguarda a preparação do pedido, recolhe-o e transporta-o até ao «cliente».
23 – Depois da aceitação e até à recolha do pedido, o «estafeta» pode desistir de efectuar o transporte.
24- O sistema de geolocalização permite ainda ao «cliente» acompanhar a sua encomenda, caso o estafeta decida permanecer com o GPS ligado, embora possa concluir o transporte com o próprio telemóvel desligado.”
25 - Eliminado.
26 – Quando conclui a entrega, o «estafeta» deve registar na plataforma que a completou, para receber pelo transporte e tornar-se elegível para receber um novo pedido.
27 – Porém, o «estafeta» é livre de seguir a concreta rota que desejar, bem como de se servir do sistema de navegação que deseje.
28 – O «estafeta» pode desactivar a geolocalização quando não estiver a usar a plataforma.
29 - Eliminado.
30 – A ré estabelece limite mínimos para o preço a pagar pelo serviço de transporte, acrescido das variáveis por si unilateralmente fixadas, não existindo qualquer negociação [prévia] entre si e o «estafeta» quanto aos critérios subjacentes à fixação dos respetivos valores, designadamente quanto à taxa base de entrega, à distância percorrida (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega), o tempo de espera (tempo de espera do «estafeta» na entrega do pedido), o horário (sendo que a remuneração é mais elevada nas horas em que o afluxo de pedidos é maior), condições meteorológicas adversas e do multiplicador. que pode ser alterado pelo estafeta uma vez por dia, no intervalo pré-fixado pela ré.
31 – O «cliente» pode, se assim o entender, dar uma gorjeta ao «estafeta», sem que a Ré tenha de o saber.
32 – O «estafeta» associado à plataforma deve pagar à Ré a denominada «Taxa de Plataforma» de modo a manter a possibilidade de lhe aceder (quinzenalmente, 1,85 €).
33 – Pela prestação da actividade do «estafeta», a Ré emite recibos de pagamento em documento com a sua denominação e logotipo, através de programa de emissão de facturas certificadas e acessíveis àquele.
34 – O denominado «sistema de estrelas» (reputação), no qual os «utilizadores» são convidados a avaliar as entregas, através de meios electrónicos inseridos na aplicação deixou de existir na aplicação da Ré, em data não concretamente apurada, mas há mais de 1 ano.
35 – O «estafeta» pode decidir sobre a sua substituição por terceira pessoa, comunicando-o previamente por escrito à Glovo, nos termos previstos nos Termos e Condições.
36 – O «estafeta» pode estar simultaneamente ligado a outra plataforma concorrente.
37 – A Ré pode desactivar temporária ou permanentemente a conta do «estafeta» na plataforma, nomeadamente em casos de (i) utilização da plataforma para insultar, ofender, ameaçar e/ou agredir «clientes», funcionários dos estabelecimentos comerciais ou outros «estafetas», (ii) violar quaisquer disposições dos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas» ou outras políticas da Glovo, ou (iii) na prevenção de acções fraudulentas.
38 – A Ré celebrou com a Companhia de Seguros «Chubb European Group SE, sucursal», um contrato de seguro sob a apólice n.º ESBMN232412, cujos termos se dão por reproduzidos, para cobertura de «acidentes sofridos pelo segurado [profissional de entregas] ao realizar um serviço e estando conectado à plataforma».
39 – Em 04.05.2023, o texto dos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas» foi alterado pela Ré, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu texto consolidado e que constam dos autos.
40 – Dele avulta com interesse:
«Os presentes Termos e Condições de Utilização da Plataforma GLOVO aplicam-se à prestação de todos os serviços tecnológicos oferecidos pela Glovoapp Portugal Unipessoal Lda. (…) a “Plataforma GLOVO”, ou “Nós” consoante o contexto), ao país no qual o Prestador de Serviços (o «Estafeta», o «Utilizador» ou «Você», consoante o contexto) tem de se registar na nossa Plataforma. A principal actividade da GLOVO é o desenvolvimento e a gestão de uma plataforma tecnológica através da qual certos estabelecimentos comerciais locais (adiante designados por «Estabelecimentos Comerciais») de algumas cidades oferecem os seus produtos através de uma aplicação móvel ou da Web (adiante designados por «serviços GLOVO», «Serviços» ou «App»); e, acessoriamente, quando apropriado e se solicitado pelo utilizador cliente final (adiante designado por «Utilizador Cliente») dos referidos estabelecimentos comerciais através da aplicação, podem actuar como intermediários na entrega imediata dos produtos. Os seus objectivos incluem a intermediação nos processos de recolha e/ou pagamento e a aceitação e execução de pedidos para fazer recolhas e receber entregas em nome do cliente Utilizador e dos Estabelecimentos Comerciais. (...).
2.2. A sua aceitação:
Para utilizar os serviços Glovo, é indispensável cumprir os seguintes requisitos:
i) tem de aceitar electronicamente os termos e condições específicos com base no país onde utilizará a Plataforma, através do canal descrito que a Glovo pode facultar oportunamente;
ii) tem de aceitar os presentes termos e condições de utilização;
iii) tem de aceitar a política de privacidade e de protecção de dados fornecidas abaixo;
iv) tem de aceitar a política de cookies;
v) tem de aceitar as Norma de Ética e Conduta Empresarial para terceiros da Glovo, bem como todas as políticas aplicáveis à Comunidade Glovo;
vi) realizará a sua actividade, contratando a Plataforma directamente ou através de uma empresa especializada em serviços de logística (3PL), consoante aplicável no seu país, por um preço que é facturado quinzenalmente, semanalmente ou conforme apropriado;
vii) a aceitação dos presentes termos e condições e respectivos anexos significa a alteração de quaisquer termos e condições de utilização da Plataforma que aceitou anteriormente, indicando que, a partir da aceitação e entrada em vigor dos actuais, anulam qualquer versão anterior e são substituídos pelos presentes termos e condições (...).
Ao aceder aos Serviços Glovo e registar-se pela primeira vez na Plataforma, inserindo os seus dados de identificação de conta (adiante designado por «Dados de Identificação de Conta»), está a aceitar os presentes Termos e Condições, bem como todos os anexos que incluem.
Tem de aceder à sua conta pessoa (a «Conta») iniciando sessão com o nome de utilizador que escolheu e o código de segurança pessoal (o «Código de Segurança»). Aceita manter a confidencialidade do seu Código de Segurança e alterá-lo frequentemente. Cada Conta é pessoal e única, pelo que está proibido de registar ou ter mais do que uma Conta. Além disso, a Conta é intransmissível, salvo nos países em que legislação local o permita (...).
Em caso de utilização ilegítima ou fraude, a Glovo pode cancelar, suspender ou desactivar duas ou mais Contas com os mesmos dados ou dados relacionados que possa detectar, mediante intervenção humana sempre por parte de um agente da Glovo e permitindo, em todo o caso, que o Estafeta apresente uma queixa e/ou reclame contra essa decisão em caso de discrepância. Será responsável por todas as transacções realizadas na sua Conta (por Si ou por eventuais substitutos), uma vez que só é possível aceder à mesma com o Código de Segurança e estão sujeitas à aceitação dos nossos Termos e Condições, incluindo, nomeadamente, responsabilidade penal. Aceita notificar imediatamente, através de meios apropriados e seguros, qualquer utilização fraudulenta ou ilegítima da sua Conta, bem como qualquer acesso à mesma por terceiros não autorizados. Para evitar dúvidas, qualquer venda, cessão e transferência da Conta sempre que possa ser considerada ilegal é proibida em quaisquer circunstâncias, salvo nos casos de sublocação/subcontratação da sua conta em conformidade com a regulamentação local aplicável (...).
2.3 Alterações:
A Glovo pode alterar unilateralmente os termos e condições e os respectivos anexos sem aviso prévio (...).
3.1 Opções de Serviço:
(...) No nosso sítio Web encontrará uma descrição das nossas opções de Serviço de Tecnologia e explicaremos que opções de Serviço tem à sua disposição quando cria uma Conta Glovo. Os presentes Termos e Condições serão aplicáveis a todos os nossos Serviços Tecnológicos se se registar na Plataforma como Utilizador Estafeta.
Serviços incluídos na Taxa de Utilização da Plataforma:
- Acesso à plataforma que lhe permitirá oferecer voluntária e livremente os seus serviços de entrega, podendo conectar-se em qualquer altura de acordo com a possibilidade de escolher livremente os pedidos que pretende realizar. Esse acesso inclui a possibilidade de prestar os seus serviços a qualquer um dos Utilizadores da Plataforma (Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, etc.), independentemente da empresa do Grupo Glovo (Glovo e/ou as suas filiais e/ou empresas coligadas) que gere a Plataforma à qual se conectou e sempre de acordo com a disponibilidade do país no qual se conecta.
- Acesso a cobertura de seguro durante o período de conexão à Plataforma.
- Acesso a apoio e serviço de assistência para qualquer inconveniente técnico que possa ocorrer.
- Gestão e intermediação no serviço de recolha e pagamentos.
- Aquisição e / ou uso de materiais que podem ser solicitados por você.
Serviços incluídos dentro da taxa de activação (se aplicável ao país em que você se conecta):
- Criação de perfil do courier para usar a plataforma Glovo.
- Aquisição e/ou uso de materiais que podem ser solicitados por você (...).
4.1. Quem é o Estafeta?
Ao aceitar os presentes Termos e Condições, também se torna um utilizador da aplicação Glovo. Deste modo, pode usar e conectar-se à Plataforma Glovo de forma flexível e a seu critério. Acede à Plataforma para usar uma tecnologia da Plataforma que lhe permite conectar-se a outros Utilizadores da Plataforma. Os mesmos poderão ser: Estabelecimentos Comerciais, Utilizadores, outros Estafetas ou outros Utilizadores.
Se estiver no seu país, usa a Glovo como:
● Utilizador Estafeta Independente: pode definir os seus próprios horários para se conec-tar à Plataforma e manter o seu perfil registado. Actuará em seu próprio nome e interesse, também usando os seus próprios equipamentos para exercer a actividade.
● Utilizador Estafeta numa empresa de serviços de logística: enquanto profissional de uma empresa de serviços de logística que usa os Serviços da Plataforma, estará dependente das instruções da sua empresa.
A Glovo não dirigirá, controlará ou será considerada dirigir ou controlar as acções ou conduta da empresa no âmbito dos presentes Termos e Condições, nomeadamente no que diz respeito à prestação dos seus serviços a outros Utilizadores da Plataforma.
Reconhece que não existe nenhuma obrigação ou relação de exclusividade entre Si e a Glovo, de tal modo que pode, a seu exclusivo critério, oferecer serviços ou exercer qualquer outra actividade comercial ou profissional relacionada ou não com o sector de actividades da Glovo (...).
4.2. Cessação de Serviços
Antes da cessão dos Serviços, as Partes aceitam liquidar qualquer dívida, obrigações pendentes ou quaisquer compromissos previamente acordados.
As Partes podem cessar os Serviços pelas seguintes razões:
a. Por vontade própria, em qualquer altura sem aviso prévio, salvo se acordado de outro modo por escrito.
b. Por violação de qualquer uma das obrigações previstas nos presentes Termos e Condições.
c. Em caso de impossibilidade de cumprir qualquer disposição dos presentes Termos e Condições.
d. O não cumprimento das Normas de Ética e Conduta Empresarial para Terceiros da Glovo e/ou de qualquer outra Política da Glovo aplicável a todos os Utilizadores da Plataforma.
e. Por violação da legislação local por parte do Estafeta que possa constituir uma violação do princípio de boa-fé entre as Partes.
f. Quaisquer outras circunstâncias resultantes em danos fiscais, de segurança social, financeiros, comerciais, organizacionais ou de reputação para a outra Parte ou um Terceiro, independentemente do montante ou dimensão do dano causado.
g. A utilização da Plataforma Glovo para fins abusivos ou fraudulentos susceptíveis de causar danos materiais e/ou imateriais a qualquer um dos Utilizadores da plataforma. h. Em situações de força maior, de acordo com a cláusula 8.5 destes Termos e Condições (...).
5.1.1. A sua Utilização dos Serviços de Tecnologia da Glovo:
Para utilizar os Serviços de Tecnologia da Glovo é necessário registar e criar uma Conta completa, actualizada e activa. Tal inclui, consoante apropriado, mas sem carácter exaustivo, as seguintes obrigações:
a. Estar registado correctamente para poder exercer a actividade de entrega para todos os fins legais, de segurança social e fiscais e em conformidade com a regulamentação local em vigor na altura.
b. Pagar pontualmente os Serviços acordados com a Plataforma.
c. Tem de enviar à Glovo certas informações, pessoais ou enquanto empresa prestadora de serviços, tais como o seu nome, endereço, número de telemóvel e idade (aplicar-se-á a idade legal da sua jurisdição), bem como, pelo menos, um método de pagamento válido.
d. Tem de manter informações exactas, completas e actualizadas na sua Conta. Será responsável por quaisquer inexactidões nas informações fornecidas.
e. Será responsável por todas as actividades realizadas na sua Conta, incluindo as que terceiros realizam em seu nome, bem como por manter sempre a segurança e o sigilo do nome de utilizador e da palavra-passe (Código de Segurança) da sua conta.
f. Aceita cumprir toda a legislação aplicável, incluindo regulamentação local, nacional e supranacional ao utilizar os Serviços de Tecnologia Glovo e apenas pode utilizar os Serviços para fins legítimos.
g. Aceita não utilizar a Plataforma de Tecnologia Glovo para causar inconvenientes, fraude ou danos materiais a terceiros.
h. Caso decida subcontratar a sua Conta de Utilizador Estafeta, tem de fazê-lo em conformidade com a regulamentação local, sempre que a mesma o permita, e serão aplicados processos internos para adaptar a operação. A Glovo não será responsável por quaisquer danos ou infracção que você e/ou as suas subcontratações possam cometer. Neste sentido, a Glovo, a fim de evitar comportamento abusivo e/ou fraudulento, pode pedir documentação relativa à conformidade do Estafeta titular da Conta Glovo e dos seus subcontratantes.
i. Declara que dispõe da capacidade jurídica para celebrar contratos e ser de maioridade no país correspondente.
j. Apenas os produtos e serviços que não sejam tácita ou expressamente proibidos nos Termos e Condições e outras políticas da Glovo ou pela legislação em vigor podem ser incluídos no âmbito dos presentes Termos e Condições. Para mais informações sobre os produtos ou serviços proibidos, consulte as nossas Políticas de Artigos Proibidos nos presentes Termos e Condições ou nos Termos e Condições Gerais de Utilização aplicáveis aos Utilizadores Cliente.
k. A Glovo irá sempre dar prioridade à sua experiência de Utilizador enquanto parte dos seus serviços. A Glovo pode criar painéis de informação para incluir as suas preferências enquanto Utilizador da Plataforma Digital da Glovo e melhorar a sua experiência na mesma.
l. Você, enquanto profissional e Estafeta, é responsável pela prestação dos seus serviços e pelas vicissitudes da sua actividade. Bem como, se for caso disso, pelos estafetas por si subcontratados.
m. O Estafeta compromete-se a verificar e cumprir os requisitos legais pertinentes, em termos de saúde e segurança apropriados para diferentes tipos de produtos (a título de exemplo, mas sem carácter exaustivo: os relacionados com farmácia, álcool e tabaco) e isenta a Glovo de qualquer responsabilidade caso a regulamentação supracitada não seja respeitada.
n. No caso de transporte de alimentos, em conformidade com a regulamentação aplicável a este respeito, o Estafeta compromete-se a transportá-los em meios de transporte e recipientes adequados para os mesmos.
o. Declara cumprir a legislação aplicável na prestação dos seus serviços de entrega, tais como legislação fiscal, laboral, civil, penal, de transporte de mercadorias, de saúde, segurança e higiene e a legislação inerente à actividade, nomeadamente apólices de seguro aplicáveis à sua região (como o seguro obrigatório de veículos) (...).
5.1.4. Ao aceitar um pedido, o Estafeta reconhece que esse pedido pode incluir a entrega/devolução/serviço de devolução ou conforme a morada/localização/descrição indicado pelo Utilizador Cliente ou o Estabelecimento Comercial com o qual celebrou um contrato.
5.1.5. Por força dos acordos alcançados com os Utilizadores Cliente, e para efeitos de evitar fraude, no momento da entrega, os Estafetas e Utilizadores Clientes aguardarão dez minutos antes de cancelar um pedido.
5.1.6. O Estafeta aceita que os Estabelecimentos Comerciais e o Utilizador Cliente peça um serviço de entrega de acordo com o preço e a qualidade em conformidade com as orientações de mercado. (...).
5.1.8 O Estafeta aceita que o ponto de recolha e/ou de entrega indicado na Plataforma pode variar em até 200 metros devido a inconvenientes e/ou erros do sistema ou relacionados com as informações prestadas por outros Utilizadores (...).
5.2 Restrições:
Sem prejuízo de quaisquer medidas adicionais que possam ser adoptadas, uma Conta Estafeta pode ser temporária ou permanentemente desactivada se:
a. Em conformidade com o Código de Ética que rege todos os Utilizadores da Plataforma, utilizar a Plataforma para insultar, ofender, ameaçar e/ou agredir Terceiros, nomeadamente, Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, outros Estafetas e pessoal da Glovo.
b. Violar a lei ou quaisquer outras disposições dos Termos e Condições Gerais ou outras políticas da Glovo.
c. Participar em actos ou conduta violentos.
d. Violar os seus direitos na aplicação da Glovo, causando danos materiais e/ou imateriais a outro Utilizador da plataforma (Estafetas, Utilizadores Cliente e/ou Estabelecimentos Comerciais).
e. Na prevenção de acções fraudulentas, se a identidade do Utilizador da Plataforma e/ou dos seus substitutos ou subcontratantes não puder ser verificada e/ou qualquer informação prestada por si e/ou os seus substitutos ou subcontratantes estiver incorrecta.
f. A fim de prevenir a segurança de todos os Utilizadores da Plataforma em caso de violação da Política de Mercadorias (...).
5.3.1 Facturação e pagamentos:
O processamento dos pagamentos estará sujeito a todas as condições do Processador de Pagamento, às condições e políticas de privacidade e deverá ter sua própria conta individual ou comercial, dependendo do país em questão, junto do Processador de Pagamento. A Glovo, através de um processador de pagamento, conectar-se-á e actuará como um intermediário nos pagamentos entre Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais e Estafetas (ou empresa de serviços de logística conexa). Aceita e concorda que, dependendo da regulamentação local aplicável, bem como da forma na qual se conecta à Plataforma (directamente ou através de uma empresa de serviços de logística), os serviços que oferece podem e terão de ser facturados ou refacturados ao Cliente Utilizador e/ou ao Estabelecimento Comercial, que em última instância paga o preço dos serviços por si oferecidos. Aceita que a taxa pelos serviços que pagará à Glovo inclui, se autorizado por si e conforme apropriado de acordo com a legislação local do seu país, bem como da forma como se conecta à Plataforma (directamente ou através de uma empresa de serviços de logística), a gestão e intermediação da facturação correspondente aos seus serviços. Neste caso, estas facturas serão consideradas aceites caso a Glovo não receba qualquer comunicação da sua parte no prazo de 5 dias a contar da emissão das facturas. O Estafeta reconhece e concorda que a Glovo, em conformidade com o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), pode proceder a uma revisão periódica dos pagamentos que lhe são efectuados. Tal revisão pode resultar na retenção do imposto sobre o rendimento caso o limite, em conformidade com o disposto no Artigo 53 do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e no Artigo 101 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), seja ultrapassado. O Estafeta reconhece e aceita a sua responsabilidade pelo dinheiro que lhe foi entregue pelos Utilizadores Cliente e que é propriedade dos Estabelecimentos Comerciais. Neste sentido, aceita que, consoante apropriado à forma como se conecta à Plataforma, o preço que lhe foi pago pelo serviço pelo Estabelecimento Comercial inclui o serviço de recolha do dinheiro que tem de ser entregue ao referido Estabelecimento Comercial. (...).
5.3.2 Pagamento e Taxas da Glovo
Aceita que a sua utilização dos Serviços Glovo tem um custo associado para os serviços ou produtos que recebe («Encargos»). A Glovo pode cobrar a seu exclusivo critério uma taxa padrão, uma taxa adicional ou um ajustamento aplicável pela utilização da Plataforma e os custos de activar o Perfil da sua Conta. A taxa que tem de pagar corresponderá à utilização dos serviços contratados por si através da Plataforma, ou aos eventuais produtos/bens que pode adquirir através da mesma. Para que conste, a utilização dos serviços e os produtos podem ser momentânea ou definitivamente suspensos ou desactivados na Plataforma, dependendo do país a partir do qual se conecta. A Glovo reserva-se o direito de adoptar as medidas judiciais e extrajudiciais que considere apropriadas para obter o pagamento dos montantes em dívida. A Glovo reserva-se o direito de modificar, alterar, aumentar ou cancelar as taxas actuais em qualquer altura notificando os Utilizadores da sua Plataforma. Além disso, a Glovo pode temporariamente modificar a Taxa e a Política e as taxas dos seus Serviços em resultado de promoções ou descontos. Estas modificações produzem efeitos quando a promoção é tornada pública ou o Utilizador beneficiário é notificado. Todas as Taxas para Produtos e/ou Serviços contratados à Glovo serão cobradas imediatamente em conformidade com o método de pagamento permitido no seu país e o método preferencial indicado na sua Conta e disponibilizado aos Serviços Glovo. Quando carregado, a Glovo enviar-lhe-á um recibo por e-mail. O pagamento também pode ser efectuado mediante a compensação de facturas pendentes entre as partes. Se o método de pagamento da sua conta principal for considerado expirado, inválido ou indisponível para a cobrança, a Glovo irá contactá-lo e/ou providenciar outros métodos de pagamento aplicáveis à sua Conta. A Glovo envidará esforços razoáveis para o informar sobre quaisquer encargos aplicáveis. A Glovo pode ocasionalmente eliminar e/ou rever quaisquer taxas, ofertas e/ou descontos aplicáveis a todos os Utilizadores da Plataforma, você incluído. A Glovo pode aplicar taxas de Serviço ou outras taxas previamente anunciadas nas redes sociais aplicáveis, salvo se a Glovo não a aplicar na sua região, caso no qual não lhe serão cobradas. A forma de cobrança dos Encargos irá sempre depender da forma na qual se conecta à Plataforma, directamente ou através de uma empresa de serviços de logística.
5.4 Segurança dos serviços e da Plataforma da Glovo
5.4.1 Em certos casos, por uma questão de prevenção de fraudes, poderá ter de apresentar prova da sua identidade e/ou, se aplicável nos termos da legislação local, dos seus substitutos ou subcontratantes para aceder ou utilizar os Serviços e aceita que lhe pode ser negado acesso aos Serviços e à utilização dos mesmos se você ou os seus substitutos ou subcontratantes recusarem fornecer essa prova de identidade. A Glovo pode também recorrer a terceiros fornecedores de serviços para efeitos de verificar a sua identidade ou a dos seus substitutos ou subcontratantes.
5.4.2 A Glovo pode, mas não é obrigada, monitorizar, rever e/ou editar a sua Conta. A Glovo reserva-se o direito de, em qualquer caso, eliminar ou desactivar o acesso a qualquer Conta por qualquer motivo ou sem motivo, até mesmo se considerar, a seu critério exclusivo, que a sua Conta viola os direitos de terceiros ou direitos protegidos pelos Termos e Condições.
5.4.3 A Glovo pode adoptar essa acção sem aviso prévio feito a si ou a um terceiro. A eliminação ou desactivação do acesso à sua Conta de Utilizador será a critério exclusivo da Glovo e não há qualquer obrigação de eliminar ou desactivar o acesso em relação a Estafetas específicos.
5.5 Definição do preço
5.5.1 Você pode determinar e escolher o preço dos seus serviços através da Plataforma Glovo. A Glovo, para fins informativos, com base em informações de mercado, irá sugerir um preço de mercado que poderá ser alterado diariamente pelo Estafeta através do seu Perfil de Utilizador, sem que isso implique garantias de adjudicação do serviço.
5.5.2 Caso seja identificado que o preço por serviço tenha sido alterado de maneira fraudulenta ou através do uso de erros e bugs do sistema, a Glovo reserva-se o direito de tomar as medidas necessárias.
5.6 Limitações e exoneração da responsabilidade da Glovo
(...) Aceita como reparação única e exclusiva da sua parte de quaisquer problemas ou insatisfação com o serviço Glovo desinstalar qualquer software Glovo e deixar de usar os serviços Glovo (...).
5.7 Sistema de reputação.
O Estafeta terá uma Reputação associada ao seu perfil fácil de usar e consultar. Este sistema é automático e é actualizado periodicamente à medida que os diferentes Utilizadores realizam transacções na Plataforma Glovo e está sujeito às regras aí contidas e sobre as quais os Utilizadores são informados no presente documento e/ou na APP e/ou através dos canais de comunicação apropriados, para que o conheçam exaustivamente e o considerem útil. O sistema baseia-se em dados objectivos, informação numérica e métricas fornecidas pelos Utilizadores da Plataforma e os clientes do Estafeta: Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais. A Glovo não manipula ou intervém no processo de formação da Reputação, mas apenas consolida informação objectiva obtida dos Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais, beneficiários dos serviços do Estafeta. A Glovo não verifica a veracidade ou precisão dos comentários feitos por outros Utilizadores e não é responsável pelo que é expresso no sítio Web ou por outros meios, nomeadamente e-mail. Todas as informações fornecidas pelos Utilizadores serão incluídas no sítio Web sob a exclusiva responsabilidade do seu autor. (...).
7. Propriedade Intelectual
(...) O que se segue não é permitido em nenhuma circunstância (...): fornecer a sua palavra-passe (código de segurança) a qualquer outra pessoa ou usar o nome de utilizador e palavra-passe (código de segurança) de outra pessoa (...).
8. Disposições diversas
(...) Em caso se subcontratação ou substituição da sua conta, na forma da legislação em vigor aplicável, não é permitido atribuir ou transferir estes Termos e Condições a terceiro, no todo ou em parte, sem aviso prévio por escrito à Glovo (...).
9.2 Dados tratados
Os dados do Estafeta recolhidos através da Plataforma e das ferramentas tecnológicas que a Glovo fornece ao Estafeta estarão, regra geral, limitados aos dados necessários para executar a relação entre as Partes e são necessários para a poder desenvolver correctamente (adiante designados por os «Dados»). Não obstante o que precede, é possível que no momento do registo ou da criação da Conta pelo Estafeta ou durante a relação, sejam pedidos dados adicionais, através de campos opcionais na Conta do Estafeta, ou através de campanhas promocionais ou outras acções que a Glovo possa realizar. Em consonância com o que precede, a Glovo pode tratar as seguintes categorias de dados, sem prejuízo de outras que possam ser pedidas durante a relação: (...) Os dados relacionados com a geolocalização do Estafeta são necessários para a execução dos Termos e Condições, bem como para utilizar a Plataforma, a fim de permitir aos Consumidores e Estabelecimentos Comerciais saber o estado e localização do Estafeta durante a recolha ou entrega.
9.3. Geolocalização
Ao utilizar a aplicação fornecida pela Glovo para a execução da relação e, portanto, para exercer a actividade, a Glovo pode receber os dados de geolocalização do Estafeta caso o mesmo tenha activado esta função directamente no seu telemóvel. A Glovo usará os Dados obtidos para prestar os Serviços ao Estafeta e partilhá-los com o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial cujo pedido o Estafeta aceitou executar, para que o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial possam contactar o Estafeta no caso de algum incidente. É expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e especificação dos seus serviços e em nenhum caso a Glovo utilizará esses
dados para fins de controlo. (...).
9.4. Finalidade e base jurídica do tratamento
(...) Os Dados serão tratados exclusivamente para cumprir a relação estabelecida e, nomeadamente: (...) De igual modo, podem ser tratados para cumprir os serviços prestados através da Plataforma tecnológica da Glovo e manter as obrigações entre as Partes. Este tratamento pode incluir sistemas de reputação dos Estafetas com base no feedback dos Utilizadores Clientes e Estabelecimentos Comerciais, o estabelecimento de faixas de serviços escolhidas pelo Estafeta, a oferta de pedidos com base em critérios e capacidades objectivos ou equipamento do Estafeta (por exemplo, proximidade do ponto de recolha e entrega, veículo utilizado, capacidade de carga, etc.). (...) A geolocalização é uma informação importante e básica para a prestação do Serviço, porquanto serve apenas para informar o Estabelecimento Comercial ou o Utilizador Cliente da localização do Estafeta e, portanto, calcular o tempo de recolha ou entrega, mas que é também usada pela Glovo para a oferta de pedidos. A proximidade do ponto de recolha é um dos critérios utilizados no momento da oferta do pedido, pelo que, se não estiver activada, a Glovo não poderá garantir que são oferecidos pedidos, ou que são razoáveis em termos do tempo previsto de recolha ou entrega. Neste sentido, e sem prejuízo do sistema operativo do dispositivo do Estafeta que pede consentimento para o uso da geolocalização, a utilização desta informação é necessária para correcta execução dos Termos e Condições. Em todo o caso, o Estafeta pode desactivar a geolocalização quando não está a usar a Plataforma, embora a Glovo não use esta informação fora do âmbito da oferta de pedidos ou fora das horas em que o Estafeta está a usar a Plataforma. De igual modo, é expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e concretização dos seus serviços e em nenhum caso a Glovo utilizará esses dados para fins de controlo do Estafeta. Neste sentido, a geolocalização é meramente temporária e não de modo algum exaustiva. A informação de geolocalização pode também ser usado para efeitos de facturação (a fim de obter informações relativas à quilometragem e despesas atribuíveis), bem como segurança (...). Em qualquer caso, uma vez que a Glovo apenas trata esta informação durante o tempo em que o estafeta está a prestar serviços... e em conformidade com as faixas horárias que escolheu, a informação não terá impacto na esfera privada do Estafeta (...).
9.5 Métricas e outras informações relacionadas com a execução do serviço:
Em relação ao sistema de Reputação e às avaliações dos Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais sobre o serviço oferecido pelo Estafeta, o mesmo deverá ter em conta que:
- Não são estabelecidos perfis ou realizadas avaliações de pessoas, mas sim sobre a execução do serviço.
O Consumidor e o Estabelecimento Comercial podem avaliar a qualidade do serviço prestado.
- Todas as métricas obtidas pela Glovo referem-se sempre, em qualquer caso e exclusivamente, ao serviço prestado.
- Não são recolhidos dados relacionados com a vida privada, a personalidade ou os hábitos do Estafeta.
De igual modo, no tocante à existência de decisões automatizadas com efeitos legais para o Estafeta, deve ter-se em conta que:
- As decisões não são tomadas baseadas exclusivamente no tratamento automatizado dos dados pessoais do Estafeta, mas quando apropriado baseadas numa avaliação da execução do serviço.
- Todos os parâmetros a ter em conta foram gerados manualmente pelos Clientes e Estabelecimentos Comerciais.
- Todos os parâmetros e métricas usadas para tomar essas decisões referem-se sempre e exclusivamente ao serviço e à execução dos Termos e Condições, independentemente do Estafeta que os executa.
- Não são estabelecidos perfis, conforme indicado no ponto anterior.
- Em caso algum são tidos em conta características da personalidade ou a esfera não profissional da Parte.
- Os resultados dependem de acções anteriores e voluntárias do Estafeta.
- Os resultados podem ser corrigidos caso tenha havido um erro e/ou discrepância entre o Estafeta e a Glovo.
- O Estafeta não é impedido de exercer um direito.
- O Estafeta não é impedido de aceder a um bem ou serviço.
- O Estafeta não é impedido de ser parte num contrato.
Com base no que precede, e em conformidade com as disposições do RGPD, não são estabelecidos perfis sobre os Estafetas ou tomadas decisões automatizadas com efeitos legais para o Estafeta com base nos seus dados ou características pessoais, mas apenas são tidas em conta uma avaliação do serviço e características objectivas sobre a capacidade de prestar o serviço pelo Estafeta (...).
Anexo II
Termos e Condições de Subcontratação
O Utilizador da conta (...) não pode ceder ou subcontratar, total ou parcialmente, os direitos e obrigações decorrentes do uso da Plataforma sem comunicação prévia por escrito à Glovo. Para o efeito, o Utilizador informará a Glovo por escrito, e antes da celebração de qualquer acordo de subcontratação, da sua intenção de subcontratar a sua conta, a identidade da pessoa com que irá subcontratar, juntamente com a sua autorização de prestação de serviços e fotografia, para que a Glovo tenha prova do subcontrato sem que tal notificação signifique qualquer assunção de responsabilidade por parte da Glovo. O Utilizador assegura a idoneidade do subcontratado e a garantia do resultado dos serviços por ele prestados a terceiros. A fim de proteger a integridade do uso da plataforma, a Globo reserva o direito de rejeitar a possível subcontratação de utilizadores que tenham sido previamente desactivados na plataforma por motivos técnicos ou relacionados a fraudes (...)».
(específicos do senhor AA – processo principal)
41 – No dia 11.08.2023, pelas 11h45, o senhor AA encontrava-se, no exercício da descrita actividade de «estafeta», no Parque de Estacionamento do Centro Comercial Continente da Amadora (zona exterior) sito na EN 249 Amadora, a aguardar a preparação pelo restaurante do pedido efectuado pelo «cliente», para proceder à recolha desse pedido e posterior entrega na morada indicada por aquele, quando foi identificado por inspectores da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT).
42 – No momento da abordagem pelos elementos da ACT, o senhor AA encontrava-se equipado com a mochila necessária para o transporte de refeições, tinha veículo próprio para transportar as encomendas e tinha a aplicação (App) da plataforma Glovo instalada e activa no seu smartphone.
43 – Para o efeito, o senhor AA registou-se naquela plataforma, aderindo aos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas», no dia 28.06.2023, procedendo à criação de conta própria na plataforma, mediante o respectivo registo na modalidade de «utilizador estafeta».
44 – Nesse dia, o senhor AA iniciou a actividade de «estafeta» através da plataforma.
45 – A área geográfica preferencial que indicou na plataforma para prestação da sua actividade foi a cidade de Lisboa e arredores.
46 – Como contrapartida dos fretes que realiza, a Ré paga-lhe quinzenalmente, mediante transferência bancária para conta bancária por titulada por aquele senhor e indicada por si à Ré para esse efeito.
47 – Desde Junho de 2023, o senhor AA recusou 217 propostas de serviço pela plataforma da Ré, sem que a sua conta tenha sido suspensa ou desactivada.
(específicos do senhor BB – Apenso A)
48 – No dia 27.09.2023, pelas 12h30, o senhor BB encontrava-se, no exercício da descrita actividade de estafeta, no supermercado Continente da Amadora, mais precisamente, na porta lateral de acesso, a aguardar a preparação pelo restaurante do pedido efectuado pelo «cliente», para proceder à recolha desse pedido e posterior entrega na morada indicada por aquele, quando foi identificado por inspectores da ACT.
49 – No momento da abordagem pelos elementos da ACT, o senhor BB encontrava-se equipado com a mochila necessária para o transporte de refeições, tinha veículo próprio para transportar as encomendas e tinha a aplicação (App) da plataforma Glovo instalada e activa no seu smartphone.
50 – Para o efeito, o senhor BB registou-se na plataforma, aderindo aos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas» no dia 29.06.2023, procedendo à criação de conta própria na mencionada plataforma, mediante o respectivo registo na modalidade de «utilizador estafeta».
51 – O senhor BB iniciou esta actividade de «estafeta» através da plataforma em 30.06.2023.
52 – Este senhor está online na plataforma todos os dias de semana, em regra, distribuindo refeições de almoço, de jantar e outras.
53 – A área geográfica preferencial que indicou na plataforma para prestação da sua actividade corresponde às zonas de Amadora, Reboleira e Queluz.
54 – Como contrapartida dos fretes que realiza, a Ré paga-lhe quinzenalmente, mediante transferência bancária para conta bancária por titulada por aquele senhor e indicada por si à Ré para esse efeito.
55 – O senhor BB serviu-se do «multiplicador» diversas vezes, sendo que normalmente optava pelo multiplicador 1,1.
(específicos do senhor CC – Apenso B)
56 – No dia 27.09.2023, pelas 11h42, o senhor CC encontrava-se, no exercício da descrita actividade de estafeta, no Parque de estacionamento do hipermercado Continente da Amadora, a aguardar a preparação pelo restaurante do pedido efectuado pelo «cliente», para proceder à recolha desse pedido e posterior entrega na morada indicada por aquele, quando foi identificado por inspectores da ACT.
57 – No momento da abordagem pelos elementos da ACT, o senhor CC encontrava-se equipado com a mochila necessária para o transporte de refeições, tinha veículo próprio para transportar as encomendas e tinha a aplicação (App) da plataforma Glovo instalada e activa no seu smartphone.
58 – Para o efeito, o senhor CC registou-se na plataforma, aderindo aos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas» no dia 19.06.2023, procedendo à criação de conta própria na mencionada plataforma, mediante o respectivo registo na modalidade de «utilizador estafeta».
59 – O senhor CC iniciou esta sua actividade de «estafeta» através da plataforma em 19.06.2023.3
60 – Este senhor está online na plataforma todos os dias de semana, por regra, distribuindo refeições de almoço, de jantar e outras.
61 – A área geográfica preferencial que indicou na plataforma para prestação cidade de Lisboa e arredores.
62 – Como contrapartida dos fretes que realiza, a Ré paga-lhe quinzenalmente, mediante transferência bancária para conta bancária por titulada por aquele senhor e indicada por si à Ré para esse efeito.
63 – O senhor CC recusou 140 propostas de serviço pela plataforma da Ré, sem que a sua conta tenha sido suspensa ou desactivada.
(específicos da senhora DD – Apenso C)
64 - No dia 27.09.2023, pelas 20h15, a senhora DD encontrava-se, no exercício da descrita actividade de estafeta, no supermercado Continente - Mafra, sito na Rua ..., em Mafra, a aguardar a preparação pelo restaurante do pedido efectuado pelo «cliente», para proceder à recolha desse pedido e posterior entrega na morada indicada por aquele, quando foi identificado por inspectores da ACT.
65 – No momento da abordagem pelos elementos da ACT, a referida senhora encontrava-se equipado com a mochila necessária para o transporte de refeições, tinha veículo próprio para transportar as encomendas e tinha a aplicação (App) da plataforma Glovo instalada e activa no seu smartphone.
66 – Para o efeito, aquela senhora registou-se na plataforma, aderindo aos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas» no dia 11.04.2023, procedendo à criação de conta própria na mencionada plataforma, mediante o respectivo registo na modalidade de «utilizador estafeta».
67 – A senhora DD iniciou a actividade de «estafeta» através da plataforma em 11.04.2023. 4
68 – A senhora DD estava, por regra, online na plataforma todos os dias de semana, distribuindo refeições de almoço, de jantar e outras, o que sucedeu até final desse ano.
69 – A área geográfica preferencial que indicou na plataforma para prestação correspondeu à zona de Mafra.
70 – Como contrapartida dos fretes que realizou, a Ré pagou-lhe quinzenalmente, mediante transferência bancária para conta bancária por titulada por aquela senhora e indicada por si à Ré para esse efeito.
(específicos do senhor EE – Apenso D)
71 – No dia 04.10.2023, pelas 12h45, o senhor EE, encontrava-se, no exercício da descrita actividade de estafeta, no exterior do Centro Comercial Babilónia, mais precisamente no Parque de Estacionamento Gago Coutinho, Amadora, junto à estação ferroviária da Amadora, a aguardar a preparação pelo restaurante do pedido efectuado pelo «cliente», para proceder à recolha desse pedido e posterior entrega na morada indicada por aquele, quando foi identificado por inspectores da ACT.
72 – No momento da abordagem pelos elementos da ACT, o senhor EE encontrava-se equipado com a mochila necessária para o transporte de refeições, tinha veículo próprio para transportar as encomendas e tinha a aplicação (App) da plataforma Glovo instalada e activa no seu smartphone.
73 – Para o efeito, o senhor EE registou-se na plataforma, aderindo aos «Termos e condições de utilização da plataforma Glovo para estafetas» em Dezembro de 2021, procedendo à criação de conta própria na mencionada plataforma, mediante o respectivo registo na modalidade de «utilizador estafeta».
74 – O senhor EE iniciou a actividade de «estafeta» através da plataforma em 15.12.2021.
75 – Este senhor está online na plataforma por regra todos os dias de semana, em média de 10 a 11 horas, distribuindo refeições de almoço, de jantar e outras.
76 – A área geográfica preferencial que indicou na plataforma para prestação corresponde à área metropolitana de Lisboa.
77 – Como contrapartida dos fretes que realiza, a Ré paga-lhe quinzenalmente, mediante transferência bancária para conta bancária por titulada por aquele senhor e indicada por si à Ré para esse efeito.
78 – Em 2023, o senhor EE recusou 1283 propostas de serviço pela plataforma da Ré, sem que a sua conta tenha sido suspensa ou desactivada.
Factos não provados:
i - A este valor devido a título de retribuição ao «estafeta» podia ainda ser recompensado pela Ré com valores pecuniários adicionais auferidos em função de factores diversos previamente definidos pela Ré, entre o mais e a saber, o de alteração de morada pelo cliente, «desafios» e programa de recomendações.
ii– O senhor AA está online na plataforma em média de 10 a 11 horas por dia, todos os dias de semana.
iii – O rendimento mensal deste senhor pela actividade de «estafeta» para a plataforma ascende a cerca de 800 € a 1.000 €.
iv – O rendimento do senhor BB mensal pela actividade de «estafeta» para a plataforma ascende a quantia não inferior a 1.200 €.
v – O senhor CC, opta, com regularidade, por prestar actividade em períodos cujos pagamentos pelas entregas são superiores, por exemplo em dias de chuva.
vi – ... actuando habitualmente no Centro Comercial Continente da Amadora, Centro Comercial UBBO, na Amadora
vii – ... ascendendo mensalmente a cerca de 600 €.
viii – A senhora DD, opta, com regularidade, por prestar actividade em períodos cujos pagamentos pelas entregas são superiores, por exemplo em dias de chuva.
ix – ... Em valor mensal não inferior 700 €.
x – O senhor EE presta o seu serviço essencialmente na Amadora.
xi – ... ascendendo mensalmente ao valor mensal de cerca de 800 a 1200 euros, conforme Inverno ou Verão.
xii - a ré estabeleça limites máximos na fixação do preço do serviço.
xii -o «estafeta» deva manter a permissão de acesso à sua geolocalização pela plataforma”.
xiv - “o «estafeta» se encontre impedido pela Ré de, por si, decidir sobre a sua substituição por terceira pessoa, sem que previamente a informe dessa sua intenção «para fins organizacionais».
V- Fundamentação de Direito
1. Nos termos do disposto no art.º 1152.º do Código Civil (CC), por contrato de trabalho entende-se “(…) aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direção desta. “
Por sua vez a noção legal de contrato de prestação de serviço mostra-se consagrada no art.º 1154º do CC, que o define como “(…) aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.”
O art.º 11.º do Código do Trabalho (CT) sob a epígrafe “Noção de Contrato de Trabalho” estabelece que “contrato de trabalho é aquele pela qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito da organização e sob a autoridade destas”.
A diferença entre os dois contratos é apontada tradicionalmente como residindo nos seguintes elementos distintivos:
1º - No objeto do contrato: no contrato de trabalho será a prestação da atividade do trabalhador e, no caso da prestação de serviço, a obtenção de um resultado, que aquele efetiva por si, com autonomia;
2º - No relacionamento entre as partes: aqui, a distinção radica, no contrato de trabalho, na subordinação jurídica, traduzida na conformação com as ordens e diretrizes emanadas do empregador, e a que o trabalhador se obrigou, e no caso do contrato de prestação de serviço assenta na autonomia destituída dessa subordinação, nos termos jurídicos em que é conceptualmente entendida.
Reconhecendo a dificuldade de, em concreto, traçar uma fronteira definida entre os dois tipos de contrato supra enunciados, o legislador optou por consagrar uma presunção, vertida no artigo 12.º do CT, nos termos do qual se presume existir contrato de trabalho sempre que se verifiquem determinadas circunstâncias ali elencadas, com a finalidade de facilitar a prova da existência de contrato de trabalho, uma vez que, nos termos do art.º 350.º, n.º 1, do CT “quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto que a ela conduz”.
Assim, nos termos deste artigo 12.º do CT, “[p]resume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma atividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características:
a) a atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;
b) os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da atividade;
c) o prestador de atividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma;
d) seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como contrapartida da mesma;
e) o prestador de atividade desempenhe funções de direção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.”
Em 01 de maio de 2023 entrou em vigor o art.º 12º-A do CT, aditado pela Lei nº 13/2023, de 03/04, o qual veio estabelecer nova “presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital”.
Dispõe este artigo, precisamente sob a epígrafe “Presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital”, que:
“1 - Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre o prestador de atividade e a plataforma digital se verifiquem algumas das seguintes características:
a) A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela;
b) A plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade;
c) A plataforma digital controla e supervisiona a prestação da atividade, incluindo em tempo real, ou verifica a qualidade da atividade prestada, nomeadamente através de meios eletrónicos ou de gestão algorítmica;
d) A plataforma digital restringe a autonomia do prestador de atividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos, através da aplicação de sanções, à escolha dos clientes ou de prestar atividade a terceiros via plataforma;
e) A plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta;
f) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação.
2 - Para efeitos do número anterior, entende-se por plataforma digital a pessoa coletiva que presta ou disponibiliza serviços à distância, através de meios eletrónicos, nomeadamente sítio da Internet ou aplicação informática, a pedido de utilizadores e que envolvam, como componente necessária e essencial, a organização de trabalho prestado por indivíduos a troco de pagamento, independentemente de esse trabalho ser prestado em linha ou numa localização determinada, sob termos e condições de um modelo de negócio e uma marca próprios. (…)”.
2. No caso em apreço, a relação jurídica estabelecida entre a recorrente e AA iniciou-se em 28.06.2023 (cfr. pontos 43 e 44 dos factos provados), entre a recorrente e BB em 30.06.2023 (cfr. ponto 51 dos factos provados), entre a recorrente e CC em 19.06.2023 (cfr. ponto 59 dos factos provados), entre a recorrente e DD em 11.04.2023 (cfr. ponto 67 dos factos provados) e finalmente entre a recorrente e EE em 15.12.2021 (cfr,. ponto 74 dos factos provados).
Atentas as datas em que se iniciaram as relações jurídicas – quanto aos trabalhadores DD e EE - colocava-se a questão da aplicação da presunção de laboralidade a que alude o art.º 12º A do CT.
Na sentença recorrida entendeu-se que a presunção ínsita no art.º 12º A não podia ser aplicada às relações contratuais estabelecidas antes do dia 01.05.2023.
Entendimento que se mostrava consolidado de forma uniforme na jurisprudência, segundo o qual “(…) estando em causa a qualificação de uma relação jurídica estabelecida entre as partes, antes da entrada em vigor das alterações legislativas que estabeleceram o regime da presunção de laboralidade, e não se extraindo da matéria de facto provada que tenha ocorrido uma mudança na configuração dessa relação, há que aplicar o regime jurídico em vigor na data em que se estabeleceu a relação jurídica entre as partes.” 5
Recentemente no Ac. do STJ, de 15.05.20256 afirmou-se que “relativamente a relações jurídicas iniciadas antes da entrada em vigor do art.º 12.º-A, do CT, a presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital é aplicável aos factos enquadráveis nas diferentes alíneas do seu nº 1 que, no âmbito dessas relações jurídicas, tenham sido praticados posteriormente àquele momento (01.05.2023)”.
Considerando o decidido neste Acórdão, e relativamente às relações contratuais estabelecidas entre os trabalhadores DD e EE e a recorrente iniciadas, em momento anterior a 01.05.2023, também serão analisadas na perspetiva do seu enquadramento no art.º 12º A do CT, sem prejuízo de se proceder, ainda, à sua análise à luz do art.º 12º do CT.
3. No recurso que interpõe, a recorrente refere que da matéria de facto resultam factos provados (os que não foram impugnados e na medida da impugnação que efetuou) que demonstram a ausência de subordinação jurídica.
Na sentença recorrida procedeu-se ao enquadramento jurídico dos factos apurados com recurso à aplicação do método ou modelo indiciário.
Apesar da utilidade do modelo indiciário, e tendo o legislador consagrado o método presuntivo, a apreciação da questão que se prende com o reconhecimento do vínculo laboral deve iniciar-se pela aferição dos vários factos índice presuntivos que o integram, intervindo o denominado método indiciário numa fase subsequente, pelo que apreciação dos factos apurados nos autos iniciar-se-á pela presunção contida no art.º 12.º-A, do CT, seguindo-lhe, depois, por apelo à análise global da situação jurídica em presença a que também importa proceder, a apreciação do chamado método indiciário.
4. No caso em apreço, o Tribunal recorrido, embora usando método indiciário não deixou se estabelecer relação com o art.º 12 A do CT, analisando os seguintes itens: a relação de trabalho dever ser intuitu personae (a que corresponde à alínea d) do art.º 12 A), que a relação de trabalho assume a característica de permanência, ainda que seja por um breve período (alínea d) do art.º 12 A), que os equipamentos e instrumentos pertencem ao beneficiário (alínea f) do art.º 12- A), ausência de concorrência, o poder de direcção e de conformação como é prestado a atividade (alínea b) do art.º 12º A), o poder sancionatório (alínea e) do art.º 12º A), a retribuição (alínea a) do art.º 12º A) e o modo de contratação.
Concluindo que se mostram “preenchidos por cada um dos prestadores os índices de subordinação jurídica” e que” os contratos que celebraram com a ré são de trabalho.”
5. A alínea a) do art.º 12º A do CT prevê a situação da plataforma digital fixar a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelecer limites máximos e mínimos para essa retribuição.
A recorrente entende que não se mostra preenchida esta característica dado que assume um papel de mera intermediária cobrando taxas aos três intervenientes, sendo que os valores propostos pelos serviços dependem de vários fatores que não são por si controlados.
Em matéria retributiva ou de pagamentos resultou apurado que como contrapartida dos fretes a recorrente paga-lhe quinzenalmente, mediante transferência bancaria para conta bancária por si titulada e indicada para esse efeito.
Resultou, ainda, apurado que a recorrente estabelece limite mínimos para o preço a pagar pelo serviço de transporte, acrescido das variáveis por si unilateralmente fixadas, não existindo qualquer negociação [prévia] entre si e o «estafeta» quanto aos critérios subjacentes à fixação dos respetivos valores, designadamente quanto à taxa base de entrega, à distância percorrida (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega), o tempo de espera (tempo de espera do «estafeta» na entrega do pedido), o horário (sendo que a remuneração é mais elevada nas horas em que o afluxo de pedidos é maior), condições meteorológicas adversas e do multiplicador que pode ser alterado pelo estafeta uma vez por dia, no intervalo pré-fixado pela ré (cfr. ponto 30)
Ora, o pagamento que se apurou ser feito aos estafetas, em função dos fretes que estes realizam, surge indexado a cada serviço que executem e concluam, não se destinando, assim, a contraprestar, como é próprio do contrato de trabalho, a atividade.
Por outro lado, nada se apurou quanto às quantias que receberam sabendo-se apenas que serão pagas quinzenalmente e, ainda assim, sem se saber se efetivamente receberam valores quinzenalmente.
Acrescenta-se que o pagamento da taxa de €1,85 cobrada pela ré configura o pagamento pela disponibilidade de acesso à plataforma e não um incentivo à assiduidade, como se preconiza na sentença recorrida que de todo o modo terá de ser liquidado quer se aceite propostas de serviço ou não.
Entende-se, assim, que assiste razão à recorrente não se tendo demonstrado o índice presuntivo contido na al. a) do n.º 1 do art.º 12.º-A do Código do Trabalho.
A alínea b) do art.º 12º A do CT refere que a plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade.
Esta alínea b), juntamente com as alíneas c) e e) do n.º 1 do art.º 12.º-A do CT referem-se aos poderes típicos do contrato de trabalho, ou seja, poderes de direção, de fiscalização e disciplinar.
Em concreto a al. b) do n.º 1 do art.º 12.º A do CT refere a presença, na relação jurídica que se estabeleça entre a plataforma e o trabalhador, do poder de direção, que constitui um dos poderes típicos e essenciais que a lei atribui ao empregador, previsto no art.º 97.º do CT, indicando-se, na referida al.) b), ainda que a título exemplificativo, situações em que se pode verificar esse poder, a forma de apresentação do prestador de atividade, a sua conduta perante o utilizador do serviço e o modo como há-de prestar a atividade.
A recorrente invoca que os estafetas se inscrevem voluntariamente na plataforma, os requisitos de inscrição não podem ser confundidos com regras quanto à prestação da atividade, a documentação exigida prende-se com obrigações legais, apenas propõem serviços, a verificação da identidade destina-se a garantir que a pessoa que está a utilizar a conta esta legalmente a exercer a atividade profissional em Portugal.
Na sentença recorrida para afirmar que o estafeta apenas obedece às diretrizes da aplicação e de que a ré tutela toda a operação considerou-se que (i) o estafeta apenas pode exercer a atividade depois de aderir às condições unilateralmente fixadas pela ré, de natureza contratual e material, designadamente acesso à internet, veículo e smartphone, (ii) a subcontratação está fortemente limitada, (iii) não tem controlo do valor real do transporte cobrado ao cliente, (iv) não negoceia a existência de acordos de privilégio entre restaurantes e a plataforma,(v) é o aplicativo que indica o local de recolha e o local de entrega, (vi)o login é individual e pode ser exigido reconhecimento, (vi) a plataforma impõe um tempo de espera de 10 minutos e a de tolerância de 200 metros aos locais de recolha ou entrega que lhe indica.
Em face do afirmado na sentença recorrida, não se pode deixar de assinalar que nem todas as afirmações têm respaldo na factualidade apurada nos autos.
Não obstante, há que reconhecer que, do elenco dos factos provados resulta que a recorrente, de forma organizada, estabelece a ligação entre o parceiro e o cliente final, usando, para o efeito, entre um e outro, o estafeta, sendo essa ligação gerida por via de aplicação informática.
Porém, o estafeta só se integra na organização, a fim de receber pedidos de entrega e proceder à sua execução quando entende, e mesmo recebendo pedidos de entrega, porque se coloca na situação de os poder receber ao ligar-se na aplicação, pode recusá-los sem qualquer justificação adicional e sem que a sua conta seja suspensa ou desativada, o que resulta dos pontos 19, 21, 47, 63 e 78 dos factos provados.
Mesmo admitindo-se que é a recorrente quem define o parceiro e o cliente final, para a execução do pedido, o estafeta tem de aceder à plataforma (pontos 15 e 19 dos factos provados) sendo ele que escolhe o local onde vai prestar a sua atividade (pontos 8 e 17 dos factos provados) podendo alterá-lo bastando para tal solicitar à ré essa alteração (ponto 9 dos factos provados) e sem que lhe seja dado qualquer tipo de indicação onde deve estar para receber as propostas (ponto 18 dos factos provados) escolhe o percurso que quer realizar (ponto 27 dos factos provados).
Do confronto destes factos não se pode afirmar que a plataforma surja como um meio, direto ou indireto, de controlo da prestação por parte do estafeta ou mesmo da sua fiscalização.
Por fim, refira-se que não encontramos nos factos provados a indicação quanto ao modo de apresentação dos estafetas junto dos parceiros ou quanto à forma como com eles se hão-de relacionar.
Entendemos, assim, que assiste razão à recorrente na ausência de preenchimento do facto base presuntivo previsto nesta alínea.
A alínea d) do art.º 12 A do CT refere que a plataforma digital restringe a autonomia do prestador de atividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos, através da aplicação de sanções, à escolha dos clientes ou de prestar atividade a terceiros via plataforma.
Esta alínea assenta, essencialmente, na natureza subordinada do vínculo laboral aludindo-se à existência ou fixação de um horário e períodos de ausência, às condições a que estão sujeitas a aceitação e a recusa de tarefas, a possibilidade de substituição (aqui se apelando a característica intuito personae associada ao vínculo laboral e a exclusividade na prestação da atividade).
A recorrente insurge-se contra a decisão do Tribunal a quo, por não se verificar a necessidade de prévia autorização a que se alude no facto provado 35, além de assinalar a diferença entre a possibilidade de o estafeta, depois de aceitar a proposta de serviço, incumbir outrem de realizar a tarefa, sem que a recorrente saiba ou tenha forma de impedir se isso se verifica e a subcontratação. Nesta, o prestador da atividade é totalmente livre de o fazer, bastando, para o efeito, enviar documento de identificação e fotografia do subcontratado para estar coberto pelo seguro. Acrescenta, ainda que a alegada caraterística de permanência intermitente não tem qualquer semelhança com a situação dos autos.
Na sentença recorrida considerou-se que o estafeta se encontra impedido de, por si, decidir sobre a sua substituição por terceira pessoa, sem dar conhecimento para fins organizacionais para depois analisar diferenças de regime para o período anterior a maio de 2023 e concluir que seria no período antecedente que o estafeta estaria impedido de decidir sobre a sua substituição por terceira pessoa. Mais se considerou que o trabalho assume a característica de permanência ainda que por um breve período e que Código de Trabalho prevê a possibilidade de trabalho intermitente e finalmente que a ausência de horário beneficia a ré que apenas paga por cada transporte efetuado e não os tempos de espera.
O ponto 35 dos factos provados foi alterado, de todo modo e pese embora, na sua redação primitiva, não se apreendesse que se estivesse a referir ao período antecedente a maio de 2023, salvo o devido respeito por opinião contrária, que o que releva, serão as condições de subcontratação que se encontram agora em vigor.
Ora, estas permitem a subcontratação mediante comunicação prévia por escrito à Glovo acompanhada da identidade da pessoa que ira ser subcontratada, juntamente com a autorização de prestação de serviços e fotografia, cfr. pontos 35 e 40 (in fine) dos factos provados.
Esta possibilidade de subcontratar, nos termos em que é permitida, afasta em nosso entender, que os contratos em causa possam ser considerados intuitu personae e, tendo o prestador da atividade liberdade de se fazer substituir na prestação, ainda que não seja um elemento decisivo - porque mesmo em contratos de trabalho o trabalhador pode ser substituído por outro no exercício das mesmas funções – o certo é que não se impõe que a recorrente autorize essa subcontratação.
A propósito do trabalho intermitente refira-se que o mesmo está previsto para empresas que exerçam atividade com descontinuidade ou intensidade variável o que não foi alegado nem resulta demonstrado.
Quanto a existência de um horário, de maior ou menor amplitude ou de maior ou menor flexibilidade, é facto que se não apura, antes estando provado que o estafeta é livre para decidir em que dia concreto desenvolve a sua atividade e em horário que o próprio define (facto provado constante do ponto 16).
Entendemos, assim, que assiste razão à recorrente na ausência de preenchimento do facto base presuntivo previsto nesta alínea.
A alínea e) do art.º 12 A) do CT refere que a plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta.
A recorrente insurge-se quanto à decisão do Tribunal por entender que os termos e condições referem-se a poderes de uma plataforma digital e não se confundem com os de um empregador, não se tendo provado que aplicasse penalizações aos estafetas ou sanções inserindo-se a possibilidade de desativar a conta de uma prerrogativa dos serviços de intermediação que se encontra prevista no art.º 4º do Regulamento (EU)2019/1150.
A propósito do poder sancionatório, refere-se na sentença recorrida que se transcreveu as cláusulas contendo as (extensas) obrigações do estafeta e, ainda que, seja comum aos contratos conterem normas que permitam a sua resolução com justa causa por um dos contraente, as que se impõem aos estafetas em concreto, permitem um amplo poder de tutela que « não se compagina com uma relação de trabalho autónomo » e, acrescenta que, sendo um contrato de adesão, naturalmente não contém no seu texto um real equivalente a favor do estafeta.
Discordamos do entendimento de que os estafetas estão sujeitos a poder sancionatório por parte da plataforma, o mesmo é dizer da sua entidade empregadora, subscrevendo o entendimento que se cita infra.
O “poder disciplinar surge associado, naturalmente, o poder de direcção e de fiscalização, bem como o poder de conformação da prestação, destinando-se aquele a sancionar as condutas do trabalhador que sejam desconformes com a disciplina da empresa. (…). O poder disciplinar não sobrevive desligado do substracto que lhe é inerente. Nesta medida e tendo nós concluído, como concluímos, pela inexistência de factos que, provados, se integrem no exercício de algum daqueles poderes, por maioria de razão não podemos ter por existente o poder disciplinar. Este poder disciplinar destinar-se-ia, então, a sancionar que tipologia de condutas? Nesta conformidade, o apelo às condições que permitem à apelada a restrição do acesso do estafeta à plataforma ou mesmo a desactivação da sua conta, (…)não podem, (…) ser eleitas enquanto manifestação típica do poder disciplinar, posto que as condições ou obrigações a que cada contraente está sujeito quando contratualmente vinculado sempre poderão conduzir à resolução do contrato se incumpridas, o que é próprio dos contratos sinalagmáticos.”7
Entendemos, assim, que assiste razão à recorrente na ausência de preenchimento do facto base presuntivo previsto nesta alínea.
A alínea f) do art.º 12 A) do CT refere que os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação.
A recorrente entende que a plataforma digital não é um instrumento de trabalho sendo antes um código informático que é utilizado pelo telemóvel, e que os instrumentos de trabalho, no caso, são o telemóvel e veículo, instrumentos estes, propriedade do prestador de atividade. Acrescenta, ainda que, os estafetas pagam uma taxa de acesso de utilização da plataforma à ré.
Da leitura que fazemos do segmento da sentença em que se pronuncia sobre esta questão, afigura-se-nos que o Tribunal a quo não considerou a plataforma digital como instrumento de trabalho. Contudo, tendo-se afirmado na sentença recorrida que estão preenchidos para cada um dos prestadores os índices de subordinação jurídica(onde se incluiu a questão de saber se os equipamentos e instrumentos de trabalho pertencem ao beneficiário), não deixaremos de analisar a questão de saber se plataforma digital é um instrumento de trabalho, já que não se questiona que a mochila térmica, telemóvel e veiculo não pertencem à recorrente (pontos 12 e 13 dos factos provados)
Adiantando, desde já, se refira se entende que a aplicação detida pela plataforma digital não constitui instrumento de trabalho.
Com efeito e como se refere no acórdão proferido no processo n.º 729/24.8T8LSB.L1 (já citado), entendimento com o qual concordamos, [s]em embargo de nada nos impelir a que assim não seja, isto é, que o conceito de instrumentos e equipamentos de trabalho é suficientemente amplo e, por isso, capaz de abranger elementos incorpóreos, há que relevar que, no caso em apreço, o empregador é uma plataforma digital que opera através de meios electrónicos e, em particular, a partir de uma app ou aplicação. Vale o que vem de ser dito, sem prejuízo, naturalmente, de todo o respeito que nos merecem as considerações em sentido oposto, que a aplicação por via da qual a plataforma opera ou se manifesta não pode desta ser autonomizada e, assim, ser considerada um instrumento ou um equipamento de trabalho, do mesmo passo que não o será o software que nela se incorpora. Uma e outra realidades – a plataforma e o meio por que se manifesta – são indissociáveis, afigurando-se-nos a separação uma da outra, para efeitos de erigir a aplicação em um equipamento ou instrumento de trabalho, operação assinalavelmente artificial.”
Temos, assim, por certo que também não se mostra preenchida esta alínea.
*
6. Tendo a relação contratual de DD e de EE se iniciado em data anterior a 1 de maio de 2023 cumprirá, ainda, referir que não se verificam os requisitos de presunção de laboralidade a que alude o art.º 12º do CT.
Na análise de cada uma das alíneas do citado art.º 12º do CT, pode ler-se, no Ac. do STJ proferido no 182/14.4TTGRD.C1.S1, de 2 de Julho de 2015 e disponível in www.dgsi.pt, que «no âmbito da alínea a) do n.º 1 deste dispositivo, surge como elemento indiciário o facto de a atividade prestada ser “realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado”.
O local de prestação da atividade, pertença ele ao beneficiário da atividade prestada, ou seja, da sua responsabilidade (por ele determinado), funciona, assim, como um dos factos indiciadores da existência de uma situação de trabalho subordinado, nos termos da lei de contrato de trabalho.
Neste caso é a relação entre o local de exercício da atividade e o respetivo beneficiário que é relevado pelo legislador como elemento caracterizador das relações de trabalho subordinado.
No âmbito da alínea b) é assumido como elemento indiciador o facto de “os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados perten[cerem] ao beneficiário da atividade”.
Trata-se de um elemento que se prende intimamente com o da alínea a), tendo aqui o legislador assumido como elemento referenciador da relação de trabalho subordinado a titularidade pelo destinatário da atividade, ou, no mínimo, a sua responsabilidade pelos “equipamentos e instrumentos de trabalho”.
Está em causa uma multiplicidade de elementos que são necessários à concreta prestação da atividade e que cabem nas categorias de equipamentos ou instrumentos de trabalho, com destaque para as máquinas e outros dispositivos que permitem concretizar e efetivar a atividade prestada.
O elemento caracterizador do facto descrito nesta alínea, como índice de uma situação de trabalho subordinado, encontra-se na disponibilização pelo destinatário da atividade prestada de bens necessários à sua concretização que se enquadrem nos conceitos de equipamentos e instrumentos de trabalho.
Não é excludente do preenchimento desta alínea a circunstância de o destinatário da atividade não ser proprietário em sentido técnico-jurídico dos bens em causa, contentando-se a lei com o facto de o mesmo, por um título legítimo, ter a disponibilidade desses bens e de os facultar ao prestador da atividade de que é destinatário.
Nos termos da alínea c), daquele dispositivo, é caracterizado como indiciador de trabalho subordinado a circunstância de o prestador de atividade “observar horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma”.
É a sujeição da prestação da atividade pelo beneficiário a “horas de início e termo” que é assumido pela lei como elemento relevante na caracterização do trabalho subordinado nesta alínea.
Na abordagem deste elemento importa que se destaque que está apenas em causa a sujeição da prestação da atividade a um tempo concreto, definido pelas horas de início e termo, relevando o tempo da prestação da atividade, ou seja, a sua duração, imposto pelo destinatário da atividade.
Na alínea d), por sua vez, coloca-se o acento na forma de pagamento ao prestador exigindo-se que “seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como contrapartida da mesma”.
A quantia paga há-de ser assumida como contrapartida da atividade prosseguida, deve ser prestada periodicamente, e deve ser “certa”.
A norma faz apelo ao conceito de “quantia certa”, o que pressupõe um quantitativo pré-determinado, líquido, com uma dimensão tendencialmente fixa.
Este critério associa-se e cruza-se com o da periodicidade, igualmente exigido na norma, exprimindo, em conjunto, uma dimensão de estabilidade e continuidade nas tarefas executadas e na sua remuneração, o que evidencia uma relação de subordinação jurídica.
Finalmente na alínea e) consagra-se como elemento indiciador o facto de “o prestador de atividade desempenh[ar] funções de direção ou chefia na estrutura orgânica da empresa”.
Nesta alínea é assumida como elemento indiciador a integração na estrutura do beneficiário da atividade, ao nível do desempenho de funções de direção ou chefia. Não é a mera integração na estrutura do beneficiário que releva, mas é uma integração qualificada, ao nível do desempenho de funções de direcção»
Da verificação, pois, de pelo menos duas das características constantes do citado artigo 12.º, do Código do Trabalho, a lei faz decorrer um efeito jurídico específico, qual seja, a da existência de uma relação de trabalho subordinado entre as partes envolvidas na prestação da atividade.
Decorre do contexto factológico apurado que os prestadores realizam a atividade de entrega conforme os pedidos disponibilizados na plataforma digital, na qual se encontram registados e à qual acedem através de uma aplicação instalada no seu telemóvel.
A atividade dos estafetas não é realizada em local pertencente à ré, mas sim na via pública, sendo que a ré tão pouco determina o concreto local da via pública onde a atividade deve ser prestada; pelo contrário são os estafetas que escolhem a área geográfica onde pretendem prestar atividade, sem qualquer tipo de intervenção da ré, escolhendo também o local, dentro dessa área, onde aguardam pelos pedidos, ao que acresce que podem ainda escolher o percurso a efetuar entre o ponto de recolha do pedido e o ponto de entrega, cfr. ponto 27 dos factos provados Em face do que vem de se expor, conclui-se, pois, não estarem provados factos aptos ao preenchimento da al. a) do n.º 1 do art.º 12.º do CT.
Quanto aos instrumentos de trabalho resultou provado, com relevo, que, para se que se pudessem registar na plataforma tinham que ter veículo próprio, possuir um telemóvel /smartphone e uma mochila para transporte dos bens. Nenhum destes instrumentos de trabalho pertence à recorrente ou foi por ela disponibilizado, e aqui se dando por reproduzido o entendimento relativo à plataforma digital, conclui-se, pois, não estarem provados factos aptos ao preenchimento da al. b) do n.º 1 do art.º 12.º do CT.
A propósito da alínea c) assinala-se que nos factos provados não há nenhum do qual resulte que a ré determine as horas de início e termo de prestação da atividade, sendo antes os estafetas que, sem qualquer intervenção da ré, decidem em que dias, a que horas e durante quanto tempo prestam a sua atividade. Em face do que vem de se expor, conclui-se, pois, não estarem provados factos aptos ao preenchimento da al. c) do n.º 1 do art.º 12.º do CT.
Quanto à retribuição dá-se por aqui reproduzidas as considerações acima referidas para se concluir que não estão provados factos aptos ao preenchimento da al. d) do n.º 1 do art.º 12.º do CT.
Finalmente não há qualquer facto do qual resulte que os estafetas desenvolvessem para a recorrida, qualquer função que se assemelhe às de direção ou chefia. Em face do que vem de se expor, conclui-se, pois, não estarem provados factos aptos ao preenchimento da al. d) do n.º 1 do art.º 12.º do CT.
7. Apesar de não se verificarem os indícios do art.º 12, n.º 1, nem do art.º 12 A do CT impõe-se, ainda, efetuar um juízo de globalidade em relação à situação concreta evidenciada na factualidade apurada, com mais acuidade, no caso concreto, por forma a abarcar a complexidade e a diversidade da atividade que se desenvolve entre a plataforma digital e o prestador/trabalhador/estafeta, com o objetivo de aferir pela existência (ou não) de subordinação jurídica que caracteriza uma relação jurídico laboral.
Relativamente aos indícios relacionados com o local onde é exercida a atividade, o horário de trabalho, a utilização de instrumentos ou equipamentos de trabalho pertença do empregador ou por este disponibilizados, pagamento de quantia certa, inserção do trabalhador na organização produtiva da recorrente, existência de controlo externo do modo de prestação da atividade, obediência a ordens e a sujeição à disciplina da empresa, por sobre os mesmos já nos termos pronunciado supra, não serão alvo de nova análise, por manifesta desnecessidade.
Centraremos, assim, a nossa análise na possibilidade de os estafetas estarem a prestar atividades para outras plataformas ao mesmo tempo que presta atividade através da plataforma da recorrente (ponto 36 dos factos provados).
A possibilidade do estafeta de estar simultaneamente ligado a plataforma concorrente resulta na possibilidade de os estafetas serem livres para escolher a sua entidade empregadora de acordo com interesses puramente unilaterais. Com efeito, o estafeta pode escolher a quem vai prestar a atividade sendo essa escolha condicionada, de acordo com as regras da experiência comum, pelo maior lucro que possa obter da sua atividade. Ora, este facto indicia que o estafeta é um trabalhador independente.
Por outro lado, e quanto ao modo de contratação não resultou demonstrado a existência de uma qualquer seleção de estafetas que para acederem à plataforma digital, tendo estes apenas que adotar o procedimento a que se alude no ponto 6 dos factos provados.
Refira-se, ainda que, a subordinação jurídica está ligada ao poder de controlo, supervisão e de qualidade de prestação da atividade assistindo à plataforma, a possibilidade de dirigir e conformar a prestação.
Mas para afirmar a sua verificação a par de se poder instruir o trabalhador a adotar uma determinada conduta teria de existir mecanismo que permita aferir se essa instrução foi cumprida.
Nos autos inexistem factos que permitam afirmar que a plataforma efetua esse controlo, ainda que, o mesmo pudesse ser concretizado, designadamente através de meios eletrónicos ou do algoritmo.
Assim, não sendo possível afirmar a existência de uma subordinação jurídica, não será possível concluir pela existência de contratos de trabalho entre a recorrente e AA, BB, CC, DD e EE.
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8. Mas, ainda que, se colocasse a hipótese de considerar verificados os factos índice consagrados nos artigos 12º, 12º-A do CT ainda, assim, entendemos que a ré logrou ilidir a presunção de laboralidade, quando se encontra demonstrado que:
(i) o estafeta é que decide se e quando presta atividade, não tendo qualquer obrigação de regularidade, assiduidade e disponibilidade ou modo como presta atividade (factos provados 15, 16, 27,28);
(ii) o estafeta pode escolher os pedidos que pretende ou não realizar e mesmo tendo, inicialmente aceite prestar um serviço, enquanto não tiver a encomenda recolhida, pode desistir de efetuar esse serviço livremente e sem qualquer penalização (factos provados 21, 23);
(iii) o estafeta pode prestar serviços de estafeta utilizando outras plataformas, nomeadamente plataformas concorrentes da Recorrente (facto provado 36);
(iv) o estafeta pode subcontratar mediante comunicação prévia por escrito à recorrente (facto provado 35).
VI- Responsabilidade pelas custas.
Apesar de vencido no recurso o Ministério Público está isento de pagar custas, art.º 4 n.º1 al a) do Regulamento das Custas Processuais e nº1 do art.º 186º K do CPT
VII – Decisão
Face ao exposto, acorda-se em dar provimento ao recurso revogando-se a sentença recorrida.
Sem custas.

Lisboa, 28 de maio de 2025
Alexandra Lage
Paula Santos
Alda Martins
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1. A inserção desta conclusão só poderá resultar de lapso de escrita já que o autor não é neste processo recorrente mas recorrido.
2. Não consta nenhuma conclusão neste ponto.
3. A referência na sentença recorrida a 28.06.2023 deve-se a manifesto lapso de escrita.
4. A referência na sentença recorrida a 14.04.2023 deve-se a manifesto lapso de escrita.
5. Acórdão do STJ de 4/07/2018, Proc.º 1272/16.4T8SNT.L1.S1, disponível in www.dgsi.pt. Sendo essa a posição subscrita pela aqui Relatora, no acórdão de 2025-02-26, proferido no processo nº 29252/23.6T8LSB.L1, onde foi 1ª Adjunta e, ainda, pela ora 1º Adjunta que aí foi 2ª Adjunta.
6. Acórdão proferido no processo n.º 1980/23.3T8CTB.C2.S1, disponível in www.dgsi.pt
7. Acórdão proferido no processo n.º 729/24.8T8LSB.L1, disponível in www.dgsi.pt, já citado.