EXPROPRIAÇÃO
LAUDO PERICIAL
VALOR DA INDEMNIZAÇÃO
BENFEITORIAS
Sumário


I) No domínio das expropriações importa sempre ter em consideração que um dos princípios que rege a fixação da justa indemnização é o princípio da normalidade, ou seja, de que o valor a atribuir ao bem expropriado deve basear-se no real valor económico que lhe conferem as suas caraterísticas, face à utilização que no mercado é normalmente dada a bens de caraterísticas idênticas.
II - No processo de expropriação, sendo a peritagem obrigatória e traduzindo-se a avaliação do bem expropriado num problema essencialmente técnico, o tribunal deve aderir, em princípio, aos pareceres dos peritos, dando preferência ao valor resultante desses pareceres, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, quando não sejam coincidentes, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo Tribunal quando haja unanimidade entre eles, porquanto este é o meio de prova que melhor habilita o julgador a apurar o valor do bem expropriado, com vista à atribuição da justa indemnização.
III) - Em face de laudos divergentes e não possuindo o juiz conhecimentos técnicos justifica-se que considere o laudo maioritário ou o laudo dos peritos do tribunal por se dever presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos, reunindo maior consenso, terão maior aptidão para atingir o objetivo da fixação da justa indemnização ou que os peritos do Tribunal, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objetividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização.
IV) Estando em causa uma parcela de terreno que apresenta uma orografia plana, situando-se a uma cota inferior de sensivelmente 1 metro, à da EN...03, e um muro, em pedra, encimado por rede metálica com 0,90m de altura, numa extensão de 25m, não pode afirmar-se que este muro seja exclusivamente ou essencialmente um muro de suporte de terras e se destine a aumentar o rendimento agrícola e a capacidade produtiva da parcela, tornando-a mais aproveitável, e que, por isso, se deva considerar englobado no cálculo da produtividade do próprio solo, pelo que, no caso concreto deve ser considerado como uma benfeitoria útil ao prédio, indemnizável por aumentar o valor da coisa.

Texto Integral


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I. Relatório

Nos presentes autos de expropriação por utilidade pública, em que é Expropriante o EMP01... SA e Expropriados AA e BB, por despacho do Secretário de Estado das Infraestruturas, ..., datado de 13 de fevereiro de 2020, publicado no Diário da República n.º 41, 2.ª Série, de 27-02-2020, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, para efeitos de expropriação de uma parcela de terreno, com a área de 1.152 m2, correspondente a uma faixa de terreno a destacar do prédio sito na União das Freguesias ... e ..., concelho ..., inscrito na matriz predial rústica da referida freguesia sob o artigo ...96 e descrito na Conservatório do Registo Predial ... sob o n.º .../..., a qual confronta a norte e nascente com a Estrada Nacional ...03, a sul com CC, e a poente com DD e EE.
No dia 06 de maio de 2020 realizou-se a vistoria ad perpetuam rei memoriam (fls. 26 a 30).
A entidade expropriante tomou posse administrativa da referida parcela no dia 15 de junho de 2020 (fls. 37).
Procedeu-se à realização de arbitragem, tendo sido fixada, por unanimidade dos árbitros nomeados, a quantia de 73.656,00€ como justa indemnização a atribuir aos expropriados (fls. 52 e ss).
Por despacho proferido em 27 de dezembro de 2020 foi judicialmente adjudicada à expropriante a propriedade da mencionada parcela (fls. 73).
Os Expropriados interpuseram recurso do acórdão arbitral invocando, em síntese, que o valor de indemnização fixado no laudo de arbitragem é reduzido, não tendo atendido às reais características do imóvel, pelo que computam o valor da justa indemnização em 152.000,00 euros, sendo 134.000,00 euros relativo ao valor do imóvel e 18.000,00 referente a benfeitorias.
A Expropriante veio responder ao recurso pugnando pela improcedência do recurso interposto pelos expropriados.
Procedeu-se à avaliação prevista na lei.
Os Peritos indicados pelo Tribunal e pelos Expropriados consideraram que o valor da justa indemnização a atribuir aos expropriados é de 103.756,33 euros e o Perito indicado pela Expropriante entendeu que o valor da justa indemnização é de 81.059,49 euros.
Ambas as partes apresentaram as alegações finais, concluindo os Expropriados que a indemnização deverá ser fixada nos valores indicados no seu recurso, e a Expropriante que o valor da indemnização não deverá exceder o montante indicado no acórdão arbitral ou laudo minoritário.

Foi proferida sentença que decidiu:
“Nestes termos e nos das disposições legais citadas, julga-se parcialmente procedente o recurso interposto pelos Expropriados e, em consequência, fixa-se a indemnização a atribuir aos Expropriados, a pagar pela entidade expropriante, em € 103.756,33€ (cento e três mil setecentos e cinquenta e seis euros e trinta e três cêntimos), por referência à data da publicação da Declaração de Utilidade Pública,
O montante indemnizatório será atualizado de acordo com a evolução do índice de preços ao consumidor desde a data da declaração de utilidade pública até ao trânsito em julgado da decisão final do presente processo, ao abrigo do disposto no artigo 24.º, do Código das Expropriações.

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Custas a cargo de expropriante e expropriados na proporção dos respetivos decaimentos (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
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Valor da causa:

Nos termos dos artigos 296.º e 306.º, nº 1, do Código de Processo Civil, a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, que representa a utilidade económica imediata do pedido, pertencendo a competência para a fixação do valor da causa ao juiz, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes.
Os critérios para a fixação do valor da causa constam do artigo 38.º, do Código das Expropriações.
Este preceito determina que o valor da causa, para efeitos de admissibilidade do recurso, corresponde ao maior dos seguintes valores: a) decréscimo da indemnização pedida no recurso da entidade expropriante ou acréscimo global das indemnizações pedidas nos recursos do expropriado e dos demais interessados, a que se refere o número seguinte ou b) diferença entre os valores de indemnização constantes do recurso da entidade expropriante e o valor global das indemnizações pedidas pelo expropriado e pelos demais interessados nos respetivos recursos.
In casu não houve recurso da entidade expropriante, pelo que é de aplicar o critério do art. 38.º, n.º 2, al. a), do Código das Expropriações, que é o da diferença entre o valor da indemnização peticionada no recurso dos expropriados -  152.000,00 euros - e o fixado pelo tribunal -103.756,33€.
Termos em que se fixa à presente ação o valor de 48.243,67.
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Registe, notifique e dê conhecimento (com cópia) aos Peritos, nos termos do artigo 19.º, do Decreto – Lei n.º 125/2002, de 10 de maio.”

Inconformada, a Expropriante apelou da sentença concluindo as suas alegações da seguinte forma:

“I. A perícia suscitou questões de direito com relevância para o cálculo do valor do bem expropriado o que implicava que o julgador não estivesse vinculado a uma mera subscrição do laudo pericial.
II. Os peritos maioritários cometeram lapsos graves na avaliação do bem, dos quais resulta que o valor obtido excede o que justamente deveria ser atribuído a título de indemnização pela expropriação do bem.
 III. O   laudo minoritário encontrava-se devidamente fundamentado, preconizando critérios sensatos e ponderados o que contribuía para que o valor nele fixado correspondesse ao da justa indemnização.
IV. Todavia, a perícia não é único elemento técnico ao dispor do Tribunal, uma vez que não pode ser ignorado o laudo arbitral, o qual foi elaborado, por unanimidade, por 3 peritos da lista oficial.
V. Quando estejam em causa especiais conhecimentos técnicos ou científicos que em razão da sua formação académica escapem ao juiz, este tem ao seu dispor, não apenas os critérios e parâmetros fornecidos pela perícia, mas também os que se encontram presentes na decisão arbitral.
VI. Na parcela com a área de 1152m2, encontra-se implantada uma construção de r/c e cave, com uma área de implantação de 108m2.
VII. Toda a parcela está inserida em zona non aedificandi, devido ao prédio se localizar à margem da Estrada Nacional ...03, tendo por isso a sua capacidade edificativa esgotada.
VIII. Note-se que a servidão non aedificandi não é provocada pela expropriação, mas sim já existia anteriormente a ela, pelo que nos termos do artigo 23.º/1 do C.E. deve ser considerada na avaliação que determina a justa indemnização.
IX. Sem prescindir, caso se entenda que o solo deve ser avaliado como apto para construção, não obstante não dispor de capacidade construtiva, o que não se concede, então tem de ser aplicados escrupulosamente os critérios constantes no artigo 26º e segs do C.E.
X. O parâmetro do art.º 26/6 do CE/99 tem de ser graduado de forma que seja possível diferenciar a qualidade dos locais onde se encontram inseridos os vários prédios.
XI. E não se deve esquecer que o prédio em causa se situa em zona de características marcadamente rurais em que a maior parte dos prédios circundantes se encontram afetos à exploração agrícola ou florestal.
XII. Não se encontrando a parcela expropriada localizada em grande centro urbano, mas sim em meio rural de zona situada no interior do nosso país, não se não se pode aplicar uma percentagem como se o terreno fosse localizado, por exemplo, em certas zonas do centro cívico do Porto ou de Lisboa.
XIII. Pelo que este coeficiente valorativo, não deverá ultrapassar os 8%, acrescidos naturalmente das percentagens associadas ao nível de cada infraestrutura, em serviço efetivo na parcela.
XIV. Quanto ao solo da parcela, todo o prédio misto está praticamente inserido em zona de servidão non aedificandi que é nos termos do artigo 32º do Estatuto das Estradas Nacionais, Lei nº 34/2015, de 27 de Abril, de 20 metros para cada lado do eixo da Estrada Nacional.
XV. Na parte mais a norte essa distância é cerca de 25 metros, a meio cerca de 22 metros e na estrema sul cerca de 17 metros.
XVI. Assim nunca será autorizada qualquer construção no prédio.
XVII. Os expropriados apenas podem manter a existente e, até mesmo obras de beneficiação, carecem de autorização, nomeadamente da administração rodoviária de acordo com a lei acima referida.
XVIII. Assim sendo os Árbitros corretamente calcularam o valor do terreno com base na construção existente.
XIX. Pelo que se afigura que o custo de construção fixado pelos Árbitros é o mais justo.
XX. Não se pode idealizar uma hipotética construção a edificar no prédio misto, porque nunca seria aprovada.
XXI. Existindo uma construção e caso se decida avaliar o solo como para construção, é com base nela que o valor do terreno tem de ser calculado.
XXII. Os Peritos que subscreveram o laudo majoritário avaliaram o artigo urbano recorrendo ao método comparativo, mas não identificam, por um lado, onde obtiveram as amostras (qual a fonte) e por outro onde se localizam os prédios que se serviram de amostra.
XXIII. Ou seja, não é fornecido aos autos matéria de facto suficiente que permita sustentar tal critério de avaliação, o qual, além do mais, é ilegal, violando o disposto no Código das Expropriações.
XXIV. Requeremos tal ao abrigo do artigo 23.º/5 do C.E, o qual habilita a entidade expropriante a requerer tal avaliação complementar, por entender que o método aplicado pelos peritos não conduz, no seu entender, ao valor real e corrente, porém não foi elaborado o laudo pericial complementar requerido.
XXV. Porém, o tribunal, para sustentar todas as soluções plausíveis de direito, dispõe não apenas do laudo pericial minoritário, mas também do laudo arbitral, o qual foi elaborado por 3 peritos da lista oficial nomeados pelo tribunal da Relação.
XXVI. Uma vez que não consta dos autos matéria de prova sólida que permita ao tribunal desviar-se dos critérios de avaliação prescritos no Código das Expropriações, julgamos que deverá ser subscrita a avaliação que os respeite e não a avaliação discricionária, não fundamentada, dos peritos maioritários.
XXVII. Relativamente às benfeitorias, não podemos aceitar que o valor dos muros de vedação seja calculado em separado do valor do artigo urbano, pois quando os Peritos comparam o valor dos imóveis estes incluem todas as benfeitorias existentes no prédio (veja-se as amostras 1, 2, 3, 5, 6 e 7 — estamos perante construções que possuem logradouros).
XXVIII. Ou seja, os peritos maioritários adotam um critério em que o valor das benfeitorias está incluído no valor do prédio e depois aditam ao valor a que chegam com esse critério o valor das benfeitorias existentes na área expropriada.
XXIX. O valor de venda de um imóvel inclui muros, vedações, portões pelo que não se pode aceitar que as vedações do prédio sejam valorizadas individualmente
XXX. Pois estes elementos, tal como nos imoveis que serviram de amostra, são parte integrante do prédio urbano.
XXXI. Pelo mesmo motivo também não se pode indemnizar autonomamente a armação da ramada, das videiras e dos muros de suporte de terra.
XXXII. Se a determinação do valor do prédio for efetuada através do critério do rendimento, não devem ser contabilizadas, sob pena de se efetuar uma dupla valorização (o seu valor já está contido no valor unitário do terreno).
XXXIII. O rendimento agrícola líquido do solo expropriado provém da vinha, pelo que ao atribuir uma indemnização pela vinha como benfeitoria, é efetuada uma dupla valorização.
XXXIV. Quanto ao muro de suporte, este é uma benfeitoria necessária, isto é, tem por objetivo aumentar a área útil do prédio, sendo parte integrante do terreno.
XXXV. Caso ele não existisse, a área que ele suporta não poderia ser avaliada como terreno de cultivo.
 XXXVI. A sua valorização autónoma conduz igualmente a uma duplicação da indemnização.
XXXVII. Face ao exposto considera-se que a determinação da justa indemnização deve se fundar na avaliação preconizada pelos Árbitros e perito da expropriante, por serem as que melhor traduzem o valor real da Parcela ...02”.

Pugna a Recorrente pela procedência do recurso e consequentemente pela revogaçãoda sentença recorrida.
Os Expropriados apresentaram contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Delimitação do Objeto do Recurso

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (artigo 639º do Código de Processo Civil, de ora em diante designado apenas por CPC).

As questões a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pela Recorrente, são as seguintes:
1 – Da avaliação da parcela expropriada;
2 - Da valorização das benfeitorias existentes na parcela expropriada.
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III. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Os factos
Factos considerados provados em Primeira Instância (transcrição):
1. Por despacho do Secretário de Estado das Infraestruturas, com o n. º2673/2020, datado de 13 de fevereiro de 2020, publicado no Diário da República n.º 41, 2.ª Série, de 27-02-2020, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, para efeitos de expropriação, de diversas parcelas de terreno necessárias à construção da obra de ligação do Parque Empresarial ... à A..., (Nó de ... – ...).
2. De entre as parcelas referidas em 1, consta uma parcela de terreno, a que foi atribuído o n.º ...02, com a área de 1.152 m2, com uma área sobrante correspondente a 68m2.
3. Trata-se de uma faixa de terreno a destacar do prédio misto sito na União das Freguesias ... e ..., concelho ..., inscrito na matriz predial rústica da referida freguesia sob o artigo ...96, e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...27 - ..., a qual confronta a norte e nascente com a Estrada Nacional ...03, a sul com CC, e a poente com DD e EE.
4. O prédio rústico com o n.º ...82 apresenta uma área descria de 620,00 m2 e o prédio urbano n.º ...96 apresenta uma área descrita de 298,00m2, com uma construção afeta a habitação implantada numa área de 108,00m2.
5. AA, casado em comunhão geral de bens com BB, adquiriu o citado prédio, através de compra, conforme AP. ..., de 10-04-1984.
6. O terreno da parcela apresenta uma orografia plana, a uma cota inferior sensivelmente de 1m, na confrontação com a EN...03, com uma configuração irregular.
7. No limite nascente da parcela encontra-se implantada uma construção constituída por cave e rés-do-chão, encontrando-se a parcela totalmente vedada.
8. Contíguo ao edifício existe um terreno de cultivo ocupado em parte com uma ramada situada no seu perímetro exterior junto da EN...03.
9. Na envolvente da parcela de terreno identificada existem um café/snack bar, um edifício destinado ao comércio de caixilharias de alumínio e próximo encontra-se o ....
10. A cerca de 400 metros da parcela encontra-se a sede da junta de freguesia; a cerca de 750 metros da parcela encontra-se a Igreja Paroquial de ..., assim como o ... e o cemitério; a cerca de 850 metros encontra-se o Parque Empresarial ....
11. O prédio em causa possuía boas acessibilidades, quer diretamente através da EN...03 (limite norte), quer junto ao cruzamento desta via com a EM...13 (limite nascente), ambas com pavimentação betuminosa em bom estado de conservação, sendo a parcela servida por rede de transportes rodoviários, com paragem de autocarros encastrada no muro da parcela.
12. Conforme descrição da vistoria ad perpetuam memoriam rei a envolvente da parcela é “uma zona urbanisticamente caracterizada pela ocupação pouco densa, de edifícios isolados de um ou dois pisos, destinados essencialmente à habitação unifamiliar, dispostos ao longo de arruamento sem grande disciplina de implantação. É uma freguesia onde não se consegue identificar um centro cívico. Mesmo a zona envolvente da EN...03, da igreja ou da Junta de Freguesia não têm essas características. A freguesia é muito fraca no que respeita a equipamentos/Serviços. O acesso à sede do concelho realiza-se pela Estrada Nacional ...03, que se apresenta com boas características quer no que respeita ao traçado, quer á qualidade do piso. Para se atingir a zona central é necessário percorrer 2,6 km”.
13. A parcela expropriada beneficia de todas as características urbanísticas adequadas a servir edificações urbanas, designadamente: acesso rodoviário pavimentado, passeios em toda a extensão do arruamento, rede de abastecimento de agua, rede de saneamento, rede de distribuição de energia elétrica em baixa tensão, rede de drenagem de aguas pluviais, rede telefónica, não beneficiando de rede de gás, que se situa a cerca de 1km da parcela.
14. De acordo com os instrumentos de gestão territorial em vigor à data da DUP, designadamente o Plano Diretor Municipal de ..., a ocupação do solo da parcela é classificada como:
a. Planta de ordenamento: Solo Urbano – Solo Urbanizado – Espaço Urbano de Baixa Densidade;
b. Planta de Condicionante: zona de servidão non aedificandi da EN...03, numa faixa de 20 metros contada do eixo da estrada.
15. A parcela expropriada encontra-se maioritariamente em zona de servidão non aedificandi, sendo apenas permitida a reabilitação da construção existente.
16. À data da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a parcela expropriada apresentava no item “benfeitorias” as seguintes indicações:
a.  “Moradia: com dois pisos, rés-do-chão e cave, com 108 m2 de implantação. A cave não tem o pé direito regulamentar, apenas 2,10, pelo que a sua utilização está limitada a armazenagem e arrumos. Apesar disso, e conforme se deduz das fotografias, deve ter tido outras utilizações. O edifício apresenta-se num bom estado de conservação atendendo ter sido construída há mais de 35 anos e a sua utilização - na zona ampla ocupando toda a frente nascente funcionaria um estabelecimento comercial - estar desativada há cerca de 6. Salienta-se, particularmente o bom estado do telhado. Na vista todo o espaço se encontrava limpo e vazio de qualquer mobiliário";
b.  “Muro de pedra junto à EN...03: com 43 m de extensão e 0,50 de altura média (medida do passeio) e 0,40 de largura; junta ao portão o muro torna-se mais elevado para atingir a altura do portão”;
c. “Vedação junta ao portão a nascente: extensão de 8m de extensão; 0,40 em pedra seca e cerca de 0.70 em gradeamento de ferro”;
d. “Portões metálicos: um com 2,60m de comprimento e 1,30m de altura, lateralmente está apoiado em dois pilaretes de granito com 1,10m de altura”;
e. “Esteios: 22 em granito com altura média de 1, 70m”;
f.  “Muro de suporte no topo poente: 1, 60177 de altura média em pedra de 0,30 de espessura; e' encimado por rede metálica com 0,90m de altura; (com uma extensão de 25m)”;
g. “Armação da ramada: 14 fiadas de arame apoiadas em estrutura metálica ligeira que por sua vez apoiada nos esteios de granito; comprimento 55m correspondendo ao contorna poente e norte, aqui a partir da paragem de autocarros”;
h. “Videiras: 27 pés; de videiras velhas”;
i. “Poço: com cerca de 8m de profundidade revestido com aduelas de betão e dotado de motor e tubos para utilização de água”;
j. “Vedação com a parcela ...03: extensão de 58m; sebe e estrutura de apoio. Trata-se de uma vedação em rede apoiada em esteios de granito ficando estes umas vezes por dentro e outras vezes por fora da rede. (Obs. Não foi possível clarificar qual o proprietário desta vedação uma vez que são contraditórias as opiniões: o expropriado da Parcela ...02 diz que os postes de granito e a rede são meeiros, o da parcela ...03 afirma que os postes são dele e apenas a rede é meeira.)".
17. Em sede de acórdão arbitral foi fixada, por unanimidade dos árbitros nomeados, a quantia de 73.656,00€ como justa indemnização a atribuir aos expropriados.
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3.2. Do valor da justa indemnização devida pela parcela expropriada: da avaliação da parcela expropriada e da valorização das benfeitorias nela existentes
Está em causa nos presentes autos determinar qual o valor da justa indemnização pela expropriação da parcela n.º ...02, sendo que, para o efeito, se mostra assente a matéria fixada em 1ª Instância, suscitando-se a questão da sua avaliação e da valorização das benfeitorias nela existentes
Vejamos.
Nos termos do artigo 1º do Código das Expropriações (Lei n.º 169/99 de 18 de setembro, sendo que daqui adiante será a este diploma que nos referimos) os bens imóveis podem ser expropriados por causa de utilidade pública mediante o pagamento de uma justa indemnização; esta visa ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação medida pelo valor do bem expropriado tendo em consideração as circunstâncias e as condições de facto existentes à data da declaração de utilidade pública.

O próprio conceito constitucional de justa indemnização leva implicada a ideia da proibição de uma indemnização meramente simbólica, do respeito pelo princípio da igualdade de encargos e da consideração do interesse público da expropriação.
O n.º 1 do artigo 62º da Constituição da República Portuguesa consagra o direito de propriedade privada (“a todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição”) e o n.º 2 estabelece que a requisição e a expropriação por utilidade pública só podem ser efetuadas com base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização.
Conforme já escreveu o Tribunal Constitucional “a indemnização só é justa se conseguir ressarcir o expropriado do prejuízo que efetivamente sofreu. Não pode ser de montante tão reduzido que a torne irrisória ou meramente simbólica, mas também não pode ser desproporcionada à perda do bem expropriado. (...) Há-que observar um princípio de igualdade e proporcionalidade – um princípio de justiça em suma. O quantum indemnizatório a pagar a cada expropriado há-de realizar a igualdade dos expropriados entre si e a destes com os não expropriados (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 243/2001, publicado no Diário da República n.º 153/2001, Série II de 04/07/2001, páginas 11119 - 11121).
Como salienta Fernando Alves Correia (As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, 1992, p. 129), o dano patrimonial suportado pelo expropriado é ressarcido de forma integral e justa, se a indemnização corresponder ao valor comum do bem expropriado, ou, por outras palavras, ao respetivo valor de mercado ou ainda ao seu valor de compra e venda, permitindo-lhe, assim, com o mesmo montante, adquirir, se quiser, outro bem idêntico ou semelhante e assegurando-lhe a inalterabilidade do ativo da sua situação patrimonial pela substituição daquele bem pelo respetivo valor equivalente, proporcionando-lhe dinheiro suficiente para assegurar a adequada substituição do bem de que foi privado e prevenindo com isso a violação do princípio da igualdade dos particulares perante os encargos públicos e da imparcialidade da atuação da Administração perante os bens particulares.
A indemnização para ser justa terá de corresponder ao valor normal que no mercado atingem os bens equivalentes ao bem expropriado (v. Meneses Cordeiro e Teixeira de Sousa, Expropriação por Utilidade Pública, Parecer na CJ Ano XV, Tomo V, p. 22 a 30), sendo este critério do valor real em condições normais de mercado que melhor assegura o princípio constitucional da justa indemnização (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 408/2008 de 31/07/2008, citado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31/01/2012, Processo nº. 5253/04.2TBVNG, disponível em www.dgsi.pt).
Os critérios destinados a fixar a justa indemnização devem respeitar os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade, não podendo conduzir a indemnizações irrisórias ou manifestamente desproporcionadas pois, como é consabido “o princípio da igualdade (artigo 13º da CRP) desdobra-se, por sua vez, em dois planos, o da igualdade no plano das relações internas e ao nível das relações externas. O primeiro não autoriza que particulares posicionados numa situação idêntica recebam indemnizações substantivamente diversas, impondo critérios uniformes de determinação da indemnização. O segundo está virado para a dimensão da igualdade perante os encargos públicos, ao determinar a admissibilidade de o direito de propriedade privada ser sacrificado por exigências de interesse público, não podendo permitir que o particular afetado não seja compensado de forma justa, sob pena de a sua posição jurídica ser tratada de forma discriminatória, obstando, por essa via, a um tratamento desigual entre expropriados e não expropriados. (…) Paralelamente, o princípio da proporcionalidade (artigo 266º, n.º 2 da CRP) obriga, como atrás se salientou, a que o sacrifício imposto ao expropriado seja adequado ao interesse público em presença – concretizando, são de excluir indemnizações irrisórias ou excessivas” (Francisco Calvão/Fernando Jorge Silva, Código das Expropriações – Anotações adaptadas ao Novo Código de Processo Civil, novembro de 2013, Coimbra Editora, p. 171 e 172).
Desta forma, na fixação da indemnização terá de se recorrer ao critério do valor real, corrente ou de mercado do bem expropriado, sob pena de a indemnização se traduzir num verdadeiro confisco.
Conforme resulta do artigo 23º do Código das Expropriações “a justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efetivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.”
Por isso, na fixação da justa indemnização não são considerados quaisquer fatores, circunstâncias ou situações criadas com o propósito de aumentar o valor da indemnização e o valor dos bens calculado de acordo com os critérios referenciais constantes dos artigos 26º e seguintes deve corresponder ao valor real e corrente dos mesmos, numa situação normal de mercado, podendo a entidade expropriante e o expropriado, quando tal se não verifique requerer, ou o tribunal decidir oficiosamente, que na avaliação sejam atendidos outros critérios para alcançar aquele valor (cfr. artigo 23º n.ºs 2, 3 e 5 do Código das Expropriações).
O montante da indemnização, segundo prescreve o artigo 24º n.º 1 do Código das Expropriações, calcula-se com referência à data da declaração de utilidade pública, sendo atualizado à data da decisão final do processo de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação.
E, para efeito do cálculo da indemnização o artigo 25º nº. 1 do Código das Expropriações classifica os solos em: “solo apto para construção” e “solo para outros fins”.

O n.º 2 do mesmo preceito prevê que seja considerado solo apto para construção:
a) o que dispõe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de energia elétrica e de saneamento com características adequadas para servir as edificações nele existentes ou a construir;
b) o que apenas dispõe de parte das infraestruturas referidas na alínea anterior, mas se integra em núcleo urbano existente;
c) o que está destinado de acordo com instrumento de gestão territorial, a adquirir as características descritas em a) e o que não estando abrangido pelas alíneas anteriores possui, todavia alvará de loteamento ou licença de construção em vigor no momento da declaração de utilidade pública desde que o processo respetivo se tenha iniciado antes da data da notificação a que se refere o n.º 5 do artigo 10º.

Por outro lado, considera-se solo apto para outros fins o que não é abrangido pelo estatuído anteriormente.
O Tribunal a quo, partindo de tais considerandos considerou que no caso concreto o solo deve ser classificado como solo apto para a construção, o que, aliás, se encontrava pacificamente assente uma vez que a parcela expropriada, constituída por um artigo urbano (artigo 1096) e um artigo rústico (1782), se enquadrava na alínea a), do n.º 2, do referido artigo 25º, ainda que, uma vez que a parcela se encontra maioritariamente em zona de servidão non aedificandi, apenas seja permitida a reabilitação da construção existente, e já não a realização de nova construção, o que foi tido em consideração pelos peritos no método de avaliação utilizado.
Efetivamente, e tal como se afirma na sentença recorrida, quanto à classificação do solo, inexistia qualquer discórdia entre as partes, não tendo nenhum interveniente impugnado esta classificação do solo.
Conforme resulta dos autos, no acórdão arbitral o solo foi classificado como apto para a construção, o que não foi questionado no recurso dele interposto pelos Expropriados, e nem na resposta apresentada pela Expropriante.
Analisado o relatório pericial apresentado constatamos também que todos os Peritos convergiram no mesmo sentido classificando como solo apto para a construção, não obstante a salvaguarda de que uma vez que a parcela se encontra maioritariamente em zona de servidão non aedificandi, apenas seria permitida a reabilitação da construção existente, e já não a realização de nova construção.
Da factualidade provada decorre que a parcela n.º ...02, com a área de 1.152 m2, com uma área sobrante correspondente a 68m2, constitui uma faixa de terreno a destacar do prédio misto sito na União das Freguesias ... e ..., concelho ..., inscrito na matriz predial rústica da referida freguesia sob o artigo ...96, e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...27 - ..., encontrando-se implantada, no limite nascente da parcela, uma construção constituída por cave e rés-do-chão, encontrando-se a parcela totalmente vedada.
O prédio em causa possuía boas acessibilidades, quer diretamente através da EN...03 (limite norte), quer junto ao cruzamento desta via com a EM...13 (limite nascente), ambas com pavimentação betuminosa em bom estado de conservação, sendo a parcela servida por rede de transportes rodoviários, com paragem de autocarros encastrada no muro da parcela e a parcela expropriada beneficia de todas as características urbanísticas adequadas a servir edificações urbanas, designadamente: acesso rodoviário pavimentado, passeios em toda a extensão do arruamento, rede de abastecimento de agua, rede de saneamento, rede de distribuição de energia elétrica em baixa tensão, rede de drenagem de aguas pluviais, rede telefónica, não beneficiando de rede de gás, que se situa a cerca de 1km da parcela; de acordo com os instrumentos de gestão territorial em vigor à data da DUP, designadamente o Plano Diretor Municipal de ..., a ocupação do solo da parcela é classificada como: a. Planta de ordenamento: Solo Urbano – Solo Urbanizado – Espaço Urbano de Baixa Densidade; b. Planta de Condicionante: zona de servidão non aedificandi da EN...03, numa faixa de 20 metros contada do eixo da estrada. Não obstante, encontrando-se a parcela expropriada maioritariamente em zona de servidão non aedificandi, apenas é permitida a reabilitação da construção existente.
Não obstante a Recorrente parecer colocar agora em causa, em sede de alegações de recurso, tal classificação, não vemos qualquer fundamento em face da referida factualidade, para divergir da classificação constante da sentença recorrida, a qual se mostra coincidente com a classificação constante do acórdão arbitral, sendo que, como já referimos também os Peritos convergiram no mesmo sentido classificando como solo apto para a construção, o que não contende com a circunstância de, em face da servidão non aedificandi, apenas ser permitida a reabilitação da construção existente, e já não a realização de nova construção, o que foi tido em consideração pelos Peritos na avaliação a que procederam.
O que verdadeiramente não foi gerador de consenso, tal como se afirma na sentença recorrida, é qual o método de avaliação a utilizar na concreta avaliação para determinação do valor da parcela expropriada, sendo certo que, nesta parte, divergiram os Peritos indicados pelo Tribunal e pelos Expropriados, que subscreveram o laudo maioritário, e o Perito da Expropriante.

Vejamos então.
Os Peritos indicados pelo Tribunal e pelos Expropriados, distinguindo entre a avaliação do artigo urbano (com uma área de 298 m2) e do artigo rústico (com uma área de 854 m2) onerado pela servidão non aedificandi, consideraram quanto ao primeiro (composto pela edificação existente e terreno a ela afeto) que a avaliação devia ser efetuada com recurso ao método comparativo, depreciando a construção em função da idade e do seu estado de conservação, em conformidade com o disposto no artigo 28.º, n.ºs 1 e 2, do Código das Expropriações, por considerarem que é o que melhor se adapta à previsão do artigo 23.º, do Código das Expropriações, tendo presente as características do imóvel em avaliação, por ser este método o que melhor reflete o valor real e corrente do bem, em conformidade com o preceituado no artigo 23º n.º 5 do Código das Expropriações, conforme esclarecimentos que prestaram por escrito (a fls. 160 dos autos) e reiteraram presencialmente nos esclarecimentos prestados, tanto mais que em causa não se encontrava qualquer ruina mas uma casa perfeitamente habitável.
 Assim, e com recurso ao método comparativo, conforme resulta do ponto 7.2.1. do relatório pericial, depreciando a construção em função da idade e do seu estado de conservação, por recurso ao método de “Ross-Heidecke” (o qual tem em linha de conta estes dois parâmetros), atribuindo o fator de desvalorização de 0,574, os Peritos indicados pelo Tribunal e pelos Expropriados avaliaram o artigo urbano à data da DUP em €90.565,13 e, quanto ao artigo rústico, onerado com a servidão non aedificandi, considerando o tipo de culturas ali existentes, bem como os rendimentos e encargos possíveis à data do DUP, e uma área de 854,00 m2, avaliaram em €6.390,00, calculado a uma taxa de atualização à perpetuidade de 3%.
Por seu turno, o Perito indicado pela Expropriante, entendeu que, uma vez que a parcela expropriada mantém a classificação de “solo apto para construção”, o valor do solo deve ser determinado nos termos previstos no artigo 26º, do Código das Expropriações, com base no valor da construção existente, considerando o seu valor atualizado (reposição a novo), conjugado com o índice fundiário.
Assim, para determinação do valor da construção existente, atendeu ao disposto no n.º 1 do artigo 28º do Código das Expropriações, tendo o valor da sua depreciação sido calculado com recurso ao método de “Ross-Heidecke”.
Para determinação do valor unitário de construção atendeu ao disposto no artigo 26º, n.º 5 e, tendo considerado o valor de €654,73/m2 (custo de construção em regime de habitação de renda condicionada, portaria 353/2013) insuficiente e o valor de €956,30/m2 (custo de construção em regime de habitação de custos controlados – portaria 65/2029) desenquadrado por excesso, determinou um valor médio dos valores de referência que fixou em €756,41/m2, atendendo ainda ao índice fundiário de 18% (artigo 26º n.ºs 6 e 7 do Código das Expropriações) e a uma área de bruta de 162 m2 (108,00 m2 para o rés-do-chão e 54,00 m2 para a cave, correspondendo a 50%) alcançou os seguintes valores:
- valor da construção (reposição a novo) = 162,00x€756,41m2 = €122.538,42;
- valor do solo = 162,00x€756,41m2x18% = €22.056,92.
- valor real e corrente do edifício existente = 162,00x€756,41m2x(1-0,574) = €52.201,37.
A estes valores somaram o valor das benfeitorias, consideradas de forma unânime por todos os Peritos (o edifício não foi avaliado como benfeitoria, tendo sido integrado na avaliação do artigo urbano) e o valor global atribuído foi de €6.801,20.
Assim, os Peritos indicados pelo Tribunal e pelos Expropriados fixaram em €103.756,33 (€90.565,13+€6.390,00+€6.801,20) o valor da justa indemnização e o Perito indicado pela Expropriante fixou em €81.059,49 (€52.201,37+€22.056,92+€6.801,20) o valor da justa indemnização.
No presente recurso a Recorrente sustenta que a avaliação efetuada pelos Peritos indicados pelo Tribunal e pelos Expropriados não se mostra correta e o valor obtido excede o da justa indemnização.
Contudo, não obstante, se encontrar implantada na parcela uma construção de rés-do-chão e cave, e concluir que a determinação da justa indemnização se deve fundar na avaliação preconizada pelos Árbitros e pelo Perito da Expropriante, a Recorrente parece sustentar que o terreno não pode ser avaliado como apto para construção, ainda que a ser avaliado dessa forma pretende que o seja nos termos do artigo 26º do Código das Expropriações, considerando que os Árbitros calcularam corretamente o valor do terreno com base na construção existente.
A primeira nota a salientar é que quer a avaliação efetuada pelos Árbitros, quer a efetuada pelo Perito da Expropriante, nas quais a Recorrente alega dever fundar-se a determinação da justa indemnização, se fundam na consideração do terreno como apto para construção.
A segunda que importa referir é que considerando ambas as avaliações do terreno como apto para construção, a que resulta do acórdão arbitral e a que foi levada a cabo pelo Perito indicado pela Expropriante não são de todo coincidentes nos critérios utlizados, e nem nos resultados obtidos.
Vejamos.
Enquanto no acórdão arbitral, calculando o valor do solo de acordo com o n.º 4 do referido artigo 26º, foi considerado um preço unitário da habitação (portaria 353/2013) para o ano de 2020 de €654,74/m2, um fator de conversão de área útil em área bruta de 85%, logo um valor unitário de construção de €557,00/m2, e um valor unitário do solo de €15,30/m2, o qual, multiplicado pela área expropriada (1152 m2) perfez a quantia de €17.626,00, correspondente ao valor do solo; avaliando depois as benfeitorias onde consideraram o edifício ali construído que avaliaram em €49.629,00, considerando a área de 108 m2 do rés-do-chão, multiplicada pelo valor unitário de construção de €557,00, e avaliando a cave em 50% do valor do rés-do-chão.
Já o Perito indicado pela Expropriante, partindo também da portaria 353/2013, considerou para o ano de 2020 o valor de €654,73 (em vez dos €654,74/m2) e, aplicando o mesmo fator de conversão de área útil em área bruta de 85%, chegou ao valor de €556,52, em vez dos €557,00/m2, mas considerou este valor insuficiente, utilizando na sua avaliação o valor de €756,41/m2, um valor médio que obteve a partir dos valores de referência, nos termos já referidos.
Por outro lado, avaliou dessa forma o solo e a construção existente, considerando quanto a esta a área de 162,00 m2, que multiplicou por €756,41/m2, e um fator de depreciação de k=0,574, obtido nos termos do n.º 1 do artigo 28º, de forma unânime entre todos os Peritos, recorrendo ao método de método de “Ross-Heidecke”; e considerando para a avaliação do solo o mesmo valor de €756,41/m2, um índice fundiário de 18% e apenas uma área de 162,00 m2.
Assim, e na avaliação efetuada pelo Perito indicado pela Expropriante, foi considerada a construção existente com uma área de 162,00 m2, e apenas, na avaliação do solo, a área correspondente de 162,00 m2, nada se considerando relativamente à restante área da parcela expropriada de 990,00 m2, enquanto os Árbitros consideraram na avaliação do solo a área total de 1152,00 m2. Não foi, por isso, a mesma a forma de determinação da justa indemnização levada a cabo por um e outros.
Aliás, o laudo maioritário, que considerou também a área total da parcela expropriada, avaliou em €6.390,00 o valor do solo respeitante ao artigo rústico (com a área de 854,00 m2), atendendo ao tipo de culturas, rendimentos e encargos, possíveis à data da DUP uma vez que se encontra onerado com a servidão non aedificandi.
O método comparativo utilizado pelos Peritos indicados pelo Tribunal e pelos Expropriados, contra o qual se insurge a Recorrente, foi utilizado apenas para avaliação do artigo urbano, composto por um edifício e terreno a ele afeto, numa área total de 298,00 m2 [e não apenas de 162,00 m2; veja-se que, relativamente a esta área de 162,00 m2, o Perito indicado pela Expropriante avaliou em €74.258,29 (€52.201,37 do edifício +€22.056,92 do solo correspondente) enquanto o valor de €90.565,13 indicado pelo laudo maioritário se reporta a todo o artigo urbano composto pelo edifício e solo numa área de 298,00 m2; se na avaliação efetuada pelo Perito indicado pela Expropriante fosse considerada toda esta área ao edifício a avaliação seria de €92.775,20 (€52.201,37 do edifício+€40.573.83 do solo)].
 
Conforme decorre do n.º 1 do artigo 23º a justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efetivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.
Permite o n.º 5 deste preceito que na avaliação sejam atendidos outros critérios para alcançar o valor real e corrente dos bens, pois a avaliação de acordo com os critérios referenciais constantes dos artigos 26.º e seguintes deve sempre corresponder ao valor real e corrente dos mesmos, numa situação normal de mercado.

O artigo 28º reporta-se especificamente ao cálculo do valor de edifícios ou construções e das respetivas áreas de implantação e logradouros, estabelecendo no n.º 1 que na determinação do valor dos edifícios ou das construções com autonomia económica atende-se, designadamente, aos seguintes elementos:
a) Valor da construção, considerando o seu custo atualizado, a localização, o ambiente envolvente e a antiguidade;
b) Sistemas de infraestruturas, transportes públicos e proximidade de equipamentos;
c) Nível de qualidade arquitetónica e conforto das construções existentes e estado de conservação, nomeadamente dos pavimentos e coberturas, das paredes exteriores, partes comuns, portas e janelas;
d) Área bruta;
e) Preço das aquisições anteriores e respetivas datas;
f) Número de inquilinos e rendas;
g) Valor de imóveis próximos, da mesma qualidade;
h) Declarações feitas pelos contribuintes ou avaliações para fins fiscais ou outros.

No caso de o aproveitamento económico normal da área de implantação e do logradouro não depender da demolição dos edifícios ou das construções, a justa indemnização corresponde ao somatório dos valores do solo e das construções, determinados nos termos do presente Código (n.º 2) e no caso contrário, calcula-se o valor do solo, nele deduzindo o custo das demolições e dos desalojamentos que seriam necessários para o efeito, correspondendo a indemnização à diferença apurada, desde que superior ao valor determinado nos termos do número anterior (n.º 3)
Os Peritos indicados pelo Tribunal e pelos Expropriados procederam à avaliação da edificação e terreno afeto nos termos do nºs 1 e 2 deste preceito, com recurso ao método comparativo por considerarem ser o mais adequado a obter o valor real e corrente, tendo em atenção as características do imóvel, designadamente que em causa não se encontrava qualquer ruina, mas uma casa perfeitamente habitável, e que a avaliação segundo o preceituado no artigo 26º está mais vocacionada para a construção e não espelhar o mercado atual da habitação, recolhendo uma seleção de amostras na mesma freguesia (onde consideraram a área bruta de construção, a área bruta privativa, a área bruta dependente, a área bruta equivalente, a área total do terreno, a área do logradouro, o estado do edifício, o nível de conservação e acessibilidades, calculando o valor total dos imóveis, o valor dos logradouros e o valor dos imóveis sem logradouro) e procedendo também a uma homogeneização da amostragem (conforme tabelas que apresentaram).
Veja-se que também o Perito indicado pela Expropriante considerou que o valor obtido a partir da portaria 353/2013, usando o critério seguido na arbitragem, era insuficiente para a avaliação, tendo recorrido ainda à portaria 65/2029 e ao custo de construção em regime de habitação de custos controlados, que considerou excessivo determinando um valor médio desses dois valores de referência, tendo também atendido para determinação do valor da construção existente, ao disposto no n.º 1 do artigo 28º, tendo calculado o valor da depreciação com recurso ao método de “RossHeidecke” de forma unânime com os demais Peritos.
Ora, os Peritos nomeados pelo Tribunal e pelos Expropriados justificaram o critério utilizado, não só nos esclarecimentos que prestaram por escrito mas também presencialmente, e o mesmo, desde que justificado, pode ser admitido (cfr. artigo 23º n.º 1 e 5).
Como se afirma no sumário do Acórdão desta Relação de 14/02/2019 (subscrito pela aqui Relatora como Adjunta, Processo n.º 132/11.0TBVRL.G2, Relator Desembargador António Figueiredo de Almeida, disponível em www.dgsi.pt) “4) Existindo laudos divergentes e não possuindo o juiz quaisquer conhecimentos ou elementos concretos que lhe permitam aferir qual deles tem melhor aptidão para alcançar o valor da justa indemnização, justifica-se que considere ou adira ao laudo maioritário ou ao laudo dos peritos do Tribunal por se dever presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos, reunindo maior consenso, terão maior aptidão para atingir aquele objetivo ou que os peritos do Tribunal, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objetividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização”; também neste sentido se pode ler no sumário do Acórdão desta Relação de 27/09/2018 (Processo n.º 1792/11.7TBVRL.G1  , relatado por Afonso Cabral de Andrade, também disponível em www.dgsi.pt) que “1. Nos processos de expropriação a prova pericial assume uma importância central, pois as perguntas a que importa responder exigem conhecimentos técnicos altamente especializados, que o Julgador, por natureza, não domina. 2. Existindo laudos divergentes e não possuindo o juiz conhecimentos técnicos que lhe permitam aferir qual deles é o mais correto, deve aderir ao laudo maioritário ou ao laudo dos peritos do Tribunal, uma vez que estes, não tendo sido indicados pelas partes, oferecem mais garantias de isenção e imparcialidade”.
De facto, apresentando o processo de expropriação em grande parte um cariz notoriamente técnico, a prova pericial assume-se como particularmente relevante por estarem em causa conhecimentos especializados que o juiz por regra não domina, sendo que, por isso, também não está o julgador em condições de sindicar o juízo científico emitido pelos peritos, a não ser em caso de erro manifesto ou de critério legalmente inadmissível ou desadequado (cfr. neste sentido, entre vários, os Acórdãos desta Relação de 01/06/2017, Processo nº. 1446/09.4TBBCL, Relatora Desembargadora Rita Romeira e de 13/06/2019, Processo n.º 6209/17.0T8GMR.G1, relatado pela Desembargadora Cristina Cerdeira e também subscrito pela aqui Relatora como Adjunta, ambos acessíveis em www.dgsi.pt).
Como é consabido a prova pericial tem por fim, em termos gerais, a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuam, ou quando os factos, relativos a pessoas não devam ser objeto de inspeção judicial (cfr. artigo 388º do Código Civil); assim, é pressuposto essencial da realização de prova pericial que a perceção e/ou a apreciação de factos assente em conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, por envolverem conhecimentos de natureza científica, técnica, artística, profissional ou de mera experiência não detidos por aqueles (v. Antunes Varela/Miguel Bezerra/Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Coimbra Editora, p. 578).
Decorre do disposto nos artigos 389º do Código Civil e 489º do CPC que a prova pericial é livremente apreciada pelo tribunal, uma vez que “apesar de a resposta do perito assentar, por via de regra, em conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, é ao tribunal, de harmonia com o prudente critério dos juízes, que se reconhece o poder de decidir sobre a realidade do facto a que a perícia se refere. Parte-se do princípio de que aos juízes não é inacessível o controlo do raciocínio que conduz o perito à formulação do seu laudo e de que lhes é de igual modo possível optar por um dos laudos ou por afastar-se mesmo de todos eles, no caso frequente de divergência entre os peritos” (Antunes Varela/Miguel Bezerra/Sampaio e Nora, ob. cit., p. 583).
No entanto, estando em causa a perceção ou apreciação de factos que envolvam conhecimentos especiais que, em regra, o julgador não detém, tais factos assim percecionados e apreciados pelos peritos, possuem o que podemos designar de força probatória especial que decorre do juiz, para se afastar do respetivo parecer pericial, ter de fundamentar a sua posição com recurso a conhecimentos da mesma ordem e natureza que presidiu ao juízo pericial emanados pelos senhores peritos.
Embora se nos afigure ser entendimento uniforme na jurisprudência que também no processo de expropriação a força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal, tem-se entendido que sendo a perícia obrigatória e o meio de prova que melhor habilita o julgador a apurar o valor do bem expropriado, com vista à atribuição da justa indemnização, pois que a avaliação da parcela conterá, em regra, questões de natureza essencialmente técnicas,  o tribunal deve aderir, em princípio, aos pareceres dos peritos, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, quando não sejam coincidentes, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo tribunal quando haja unanimidade entre eles;  para além da presumida competência técnica que se lhes reconhece, a posição assumida pelos peritos nomeados pelo tribunal é aquela que, em princípio, oferece maiores garantias de independência, imparcialidade e objetividade, face ao distanciamento que mantêm em relação às partes e aos interesses em litígio (v. os já citados Acórdãos desta Relação e ainda a jurisprudência ai citada, designadamente os Acórdãos da Relação de Coimbra de 15/01/2013, Processo n.º 637/10.0TBSEI, de 14/02/2012, Processo n.º 550/09.3TBVIS e de 14/12/2010, Processo n.º 4714/07.6TBVIS, e da Relação de Lisboa de 31/05/2012, Processo n.º 763/1994 e de 22/11/2012, Processo nº. 2352/08.5TJLSB, também todos acessíveis em www.dgsi.pt ).
Perfilhamos a posição defendida no citado Acórdão desta Relação de 13/06/2019 (Processo n.º 6209/17.0T8GMR.G1), onde se refere que “sem prejuízo da força probatória da perícia ser fixada livremente pelo tribunal – art. 389º do Cód. Civil –, no processo de expropriação a perícia assume uma particular relevância – evidenciada até pela circunstância de se tratar de diligência obrigatória, nos termos do artigo 61º, nº 2 do CE – de tal forma que podemos, seguramente, afirmar que as conclusões apresentadas pelos peritos – unanimemente ou por maioria, preferindo-se as que provêm dos peritos nomeados pelo tribunal, pela maior equidistância relativamente às partes – só devem ser afastadas quando se constata que foram elaboradas com base em critérios legalmente inadmissíveis ou desadequados, ou quando se nos deparam erros ou lapsos evidentes, que importem correção”; isto é, ainda que o juiz aprecie livremente as respostas dos peritos, não estando vinculado aos laudos apresentados, e tenha o dever de os analisar criticamente, designadamente verificando se se mostram fundamentados e a sua conformidade com os critérios legais, a verdade é que, no que toca às questões técnicas, o juiz não estará, por regra, habilitado a contrariar as conclusões dos peritos e a formular o seu próprio juízo técnico.
Por isso, em face de laudos divergentes e não possuindo o juiz conhecimentos técnicos justifica-se que considere o laudo maioritário ou ao laudo dos peritos do tribunal por se dever presumir que “as conclusões subscritas por um número maior de peritos, reunindo maior consenso, terão maior aptidão para atingir aquele objetivo ou que os peritos do Tribunal, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objetividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização.”
Tal não significa, obviamente, uma irrestrita vinculação ao laudo maioritário, ou uma pura adesão acrítica ao mesmo, ou à posição dos peritos nomeados pelo tribunal, podendo o tribunal “introduzir-lhe ajustamentos, fazer correções, colmatar falhas ou seguir o laudo ou critérios diferentes, se os tiver por mais justos, de acordo com outros critérios técnicos, objetivamente sustentados, ou com os elementos probatórios que possuir” (v. o citado Acórdão desta Relação de 13/06/2019).  
In casu, os Peritos nomeados pelo Tribunal e pelos Expropriados de forma fundamentada e justificada, entenderam mostrar-se adequada a avaliação da edificação e terreno afeto nos termos do nºs 1 e 2 deste preceito, com recurso ao método comparativo por considerarem ser o mais adequado a obter o valor real e corrente, tendo em atenção as características do imóvel.
Conforme já deixamos expresso o juiz, em regra, só deverá afastar-se do laudo maioritário dos peritos, no caso concreto subscrito pelos três Peritos nomeados pelo Tribunal, caso verifique que estes se afastaram da aplicação dos critérios legais ou que o laudo padece de erro manifesto ou ainda quando a sua fundamentação é inexistente ou insuficiente, o que entendemos não ocorrer no caso concreto considerando o teor do relatório pericial e dos esclarecimentos prestados.
Não entendemos que tal ocorra no caso concreto e nem que a sua utilização configure o afastamento da aplicação de critérios legais.
Acresce ainda dizer que, no domínio das expropriações, importa sempre ter em consideração que um dos princípios que rege a fixação da justa indemnização é o princípio da normalidade, ou seja, de que o valor a atribuir ao bem expropriado deve basear-se no real valor económico que lhe conferem as suas caraterísticas, face à utilização que no mercado é normalmente dada a bens de caraterísticas idênticas.
Assim, não merece censura nesta parte a sentença recorrida que deu prevalência ao laudo maioritário, que foi também subscrito pelos Peritos do Tribunal.
Insurge-se ainda a Recorrente relativamente às benfeitorias sustentando que no laudo maioritário, seguindo o critério aí adotado, existe uma duplicação indevida do valor da indemnização uma vez que os muros, vedações e portões não podem ser avaliados em separado do valor do artigo urbano; e também não podem ser indemnizadas autonomamente a armação da ramada, das videiras e dos muros de suporte de terra; quanto ao muro de suporte é uma benfeitoria necessária não devendo ser indemnizada.
Vejamos.
Segundo o disposto no n.º 1 do artigo 216º do Código Civil benfeitorias são todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa, e podem ser necessárias, úteis ou voluptuárias (n.º 2 do mesmo preceito).
São benfeitorias necessárias as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa, são úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam, todavia, o valor e são voluptuárias as benfeitorias que, não sendo indispensáveis para a conservação da coisa nem lhe aumentando o valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante.
No cálculo da indemnização devida pela expropriação não está expressamente prevista a exclusão de qualquer benfeitoria ou de outro elemento do património expropriado, antes impondo a lei, no n.º 1 do já referido artigo 23º a consideração das circunstâncias e condições de facto existentes, nas quais se podem incluir as benfeitorias (v. acórdão desta Relação de 15/06/2023, Processo n.º 254/19.9T8VPA.G2, Relator Alcides Rodrigues, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
Determinar se as benfeitorias são ou não indemnizáveis tem de ser feita de forma casuística, caso a caso, devendo a entidade expropriante indemnizar o expropriado pela perda das benfeitorias úteis existentes na parcela à data da declaração de utilidade pública.
In casu, resultam demonstradas em face da factualidade provada que à data da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a parcela expropriada apresentava no item “benfeitorias” as seguintes indicações (não incluímos aqui o edifício por não ter sido avaliado como benfeitoria e já nos termos pronunciado sobre a sua avaliação):
- “Muro de pedra junto à EN...03: com 43 m de extensão e 0,50 de altura média (medida do passeio) e 0,40 de largura; junta ao portão o muro torna-se mais elevado para atingir a altura do portão”; - “Vedação junta ao portão a nascente: extensão de 8m de extensão; 0,40 em pedra seca e cerca de 0.70 em gradeamento de ferro”;
- “Portões metálicos: um com 2,60m de comprimento e 1,30m de altura, lateralmente está apoiado em dois pilaretes de granito com 1,10m de altura”;
- “Esteios: 22 em granito com altura média de 1, 70m”;
- “Muro de suporte no topo poente: 1, 60177 de altura média em pedra de 0,30 de espessura; e' encimado por rede metálica com 0,90m de altura; (com uma extensão de 25m)”;
- “Armação da ramada: 14 fiadas de arame apoiadas em estrutura metálica ligeira que por sua vez apoiada nos esteios de granito; comprimento 55m correspondendo ao contorna poente e norte, aqui a partir da paragem de autocarros”;
- “Videiras: 27 pés; de videiras velhas”;
- “Poço: com cerca de 8m de profundidade revestido com aduelas de betão e dotado de motor e tubos para utilização de água;”
- “Vedação com a parcela ...03: extensão de 58m; sebe e estrutura de apoio. Trata-se de uma vedação em rede apoiada em esteios de granito ficando estes umas vezes por dentro e outras vezes por fora da rede. (Obs. Não foi possível clarificar qual o proprietário desta vedação uma vez que são contraditórias as opiniões: o expropriado da Parcela ...02 diz que os postes de granito e a rede são meeiros, o da parcela ...03 afirma que os postes são dele e apenas a rede é meeira.)".
Importa começar por referir que, excluindo o edifício, quer os Árbitros quer todos os Peritos consideram de forma unânime atribuir um valor autónomo às referidas benfeitorias.
Relativamente aos muros, vedações e portões a Recorrente entende que não podem ser avaliados em separado do valor do artigo urbano pois, tal como nos prédios que serviram de amostra são parte integrante do prédio urbano, não podendo ser indemnizados autonomamente.
Porém, e conforme já referimos, no método utilizado no laudo maioritário e na seleção de amostras recolhida na mesma freguesia os Peritos consideraram a área bruta de construção, a área bruta privativa, a área bruta dependente, a área bruta equivalente, a área total do terreno, a área do logradouro, o estado do edifício, o nível de conservação e acessibilidades, não considerando como critério para comparação o concreto tipo de muros, vedações ou portões, pelo que não se nos afigura que se verifique nenhuma duplicação do valor indemnizatório.
Relativamente à concreta armação da ramada existente e às videiras e muros de suporte de terra também entendemos, em face do critério de avaliação dos 850,00 m2 de área da parcela expropriada (correspondente ao artigo rústico), que a sua consideração autónoma não consubstancia a invocada duplicação do valor indemnizatório.
Na verdade, no caso concreto, a avaliação não teve em conta o rendimento efetivo mas, de acordo com as culturas predominantes na região, as condições do solo, morfologia e orografia, bem como excelentes acessos, o tipo de culturas e rendimento possível, segundo o metido analítico de Propriedade Rural para determinação do valor do solo pelo que, também aqui, se nos afigura inexistir a invocada duplicação do valor indemnizatório.
Na verdade, se é certo que relativamente às benfeitorias úteis “haverá que ter o cuidado de evitar uma dupla valorização, não devendo as mesmas serem consideradas «sempre que a mais-valia produzida no bem em causa se traduza no aumento do seu rendimento, e a valorização do bem se determine com base nesse rendimento” (v. o já referido acórdão desta Relação de 15/06/2023, citando Alípio Guedes, Valorização dos Bens Expropriados, 2ª ed., Almedina, 2001, pp. 77/78), a verdade é que, em nosso entender, tal não ocorre no caso concreto.
Por fim, e quanto ao muro de suporte sustenta ainda a Recorrente que, sendo uma benfeitoria necessária, não deve ser indemnizada.
Efetivamente, do que nos é dado conhecer, a doutrina e a jurisprudência parecem convergir de forma unânime no sentido de considerar que os muros de suporte, ao contrário dos muros de vedação, são benfeitorias necessárias e não indemnizáveis autonomamente (v. neste sentido, para além do já citado acórdão desta Relação de 15/06/2023, o acórdão de 24/02/2022, Processo n.º 261/19.1T8VPA.G1, Relatora Margarida Almeida Fernandes, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
Na verdade, se o muro se destina exclusivamente ou primordialmente a servir de suporte das terras assumirá a natureza de benfeitoria necessária, não indemnizável por não aumentar o valor da coisa uma vez que é essencial para se conseguir o rendimento agrícola, contribuindo para a capacidade produtiva da parcela, tornando-a menos íngreme e mais aproveitável, devendo ser englobado no cálculo da produtividade do próprio solo e não podendo ser alvo de indemnização autónoma sob pena de existir uma duplicação.
Contudo, no caso dos autos, conforme consta da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a parcela apresenta uma orografia plana, situando-se a uma cota inferior de sensivelmente 1 metro, à da EN...03 [v. ponto 6) dos factos provados)]; por outro lado, o denominado muro de suporte em causa, no topo poente, em pedra, é encimado por rede metálica com 0,90m de altura, numa extensão de 25m.
Não estamos, por isso, perante um muro de suporte que tenha por finalidade tornar a parcela menos ingreme e mais aproveitável e, tal como se afirma na sentença recorrida, que esteja em causa um muro apenas de suporte, mas um muro também de vedação ou até apenas de vedação, uma vez que a parcela é plana e o muro em causa é encimado por rede com 0,90m de altura.
Assim, e não resultando da matéria de facto que o referido muro de pedra encimado pela rede, seja exclusivamente ou essencialmente um muro de suporte de terras e se destine a aumentar o rendimento agrícola e a capacidade produtiva da parcela, tornando-a mais aproveitável, e que, por isso, se deva considerar englobado no cálculo da produtividade do próprio solo, até porque a parcela é plana, não entendemos que se verifique, também aqui, a invocada duplicação com a sua indemnização a titulo de benfeitoria, a qual, no caso concreto não deve ser classificada de necessária.
Nestes termos, terá de improceder integralmente o recurso.
As custas são da responsabilidade da Recorrente atento o seu integral decaimento (artigo 527º do CPC).
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SUMÁRIO (artigo 663º n.º 7 do Código do Processo Civil):
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IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique.
Guimarães, 15 de maio de 2025
Texto elaborado em computador e integralmente revisto pela signatária

Raquel Baptista Tavares (Relatora)
José Cravo (1º Adjunto)
Alexandra Rolim Mendes (2ª Adjunta)