PLATAFORMA DIGITAL
ESTAFETA
NOVA PRESUNÇÃO DE LABORALIDADE - ART. 12.º-A DO CT
ILISÃO DA PRESUNÇÃO
Sumário


1. Verificando-se as caraterísticas previstas nas alíneas a), b) e e) do n.º 1 do art.º 12-A do CT, está assim preenchida a presunção de existência do contrato de trabalho, sem prejuízo de poder vir a ser ilidida.
2. Para ilidir a presunção não basta a mera contraprova que coloque em dúvida a existência da relação laboral, ao invés impõem-se que da factualidade apurada se possa concluir que apesar da verificação dos índices caracterizadores da relação laboral, a relação concretamente existente tem uma natureza diversa, designadamente poderá tratar-se de uma relação de prestação de serviços.
3. Para ilidir a presunção importa averiguar se a Ré logrou provar, no caso concreto, se o estafeta, apesar das condições impostas, desprovidas de qualquer negociação, pela Ré/Recorrente, tendo em conta o modelo de negócio em causa, ainda assim, dispõe de tal liberdade, que por um lado, não permite que a estrutura organizativa da Ré/Recorrente possa contar com a sua prestação como elemento disponível e útil na sua organização, e por outro que o estafeta não esteja dependente no que respeita ao seu sustento, do rendimento proveniente de tal atividade.
4. A factualidade apurada permite-nos concluir que o AA exerce a atividade de estafeta através da Plataforma da Ré, com efetiva autonomia, ligando-se apenas à hora do jantar, quando tem disponibilidade, para completar o rendimento que mensalmente aufere como trabalhador por conta de outrem, podendo afirmar-se com relativa segurança, que nem o AA se considera integrado na estrutura organizativa da Ré, como esta também não pode contar com a disponibilidade concreta deste parceiro para gerir a sua de mão de obra disponível, indispensável à prossecução do seu negócio. Daqui resulta que a Ré logrou ilidir a presunção de laboralidade.

Texto Integral


I – Relatório:
           
Na sequência de acção inspectiva levado a cabo pela Autoridade para as Condições do Trabalho, no âmbito da qual se deparou com indícios de utilização indevida do contrato de prestação de serviço por parte da EMP01..., UNIPESSOAL, LDA, relativamente a AA deu entrada no Tribunal da Comarca de Braga, Juízo do Trabalho de Vila Nova de Famalicão, a respetiva participação.
Após o recebimento de tal participação, o MINISTÉRIO PÚBLICO intentou a presente ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, nos termos previstos no art.º 186.º-K, n.º 1 e 186.º-L, n.º 1 do CPT, contra EMP01..., UNIPESSOAL, LDA pedindo que se reconheça a existência de contrato de trabalho subordinado, por tempo indeterminado, com início em 20.09.2023, relativo a AA.
Citada a Ré apresentou contestação defendendo-se por exceção e por impugnação, sustentando, em suma, que o AA desenvolve a sua atividade de estafeta de forma autónoma e nega a existência de factos que possam qualificar o contrato que mantém com aquele como de trabalho.
Os autos prosseguiram os seus termos normais e após a realização de audiência de julgamento foi proferida sentença da qual consta o seguinte dispositivo:
“Face ao exposto, julga-se a acção procedente, e, em consequência declara-se reconhecido o contrato de trabalho, por tempo indeterminado, entre AA e a Ré “EMP01..., UNIPESSOAL, LDA.”, com início em Agosto de 2023.
» Custas pela Ré.
» Valor da acção: 30.000,01.
» Notifique.”

*
Inconformada com a sentença, a “EMP01..., UNIPESSOAL, LDA.”, veio interpor recurso de apelação, pugnando pela revogação da sentença recorrida, tendo nas alegações apresentadas e depois de aperfeiçoadas formulado as seguintes conclusões:

“A. A sentença é nula porque os fundamentos estão em oposição com a decisão.
B. O recurso versa sobre matéria de facto e sobre matéria de direito.
Da nulidade da sentença
C. O Tribunal a quo decidiu reconhecer a existência de contrato de trabalho, porque que para apurar se existe efetiva autonomia, deve apurar-se se o prestador de atividade prestava atividade de forma não exclusiva, se prestava atividade concorrencial, se estava disponível permanentemente ou prestava atividade de forma regular.
D. Sucede que o Tribunal a quo deu como provado que:
“46.O prestador da actividade é livre de recorrer a subcontratados, apenas tendo de comunicar à Ré e identificar o subcontratado, por razões de segurança”
“57.AA encontra-se enquadrado no regime de trabalhadores independentes, no regime de trabalhadores por conta de outrem e no regime de membro de órgão estatutário, para efeitos de segurança social.
58.No ano de 2023, AA não emitiu facturas por serviços prestados à Ré, tendo emitido facturas por serviços prestados a outros adquirentes no montante global de € 6.158,31, tendo declarado na declaração modelo 3 de IRS referente a esse ano, rendimento da Categoria B no montante de € 4.817,08 e rendimento da Categoria A no montante de € 9.825,93.”
E. Resulta da informação prestada pelo ISS e pela AT que o prestador de atividade faturou serviços, ao longo dos anos de 2023 e 2024, através da plataforma EMP02... (consubstancia informação do domínio público que o NIPC ...22 pertence à EMP02..., Unipessoal, Lda).
F. Além de tal o estafeta prestou também serviços para várias outras entidades, sendo inclusive Sócio-Gerente de uma empresa, onde aufere um salário, mensal, regular, conforme registos do ISS e AT.
A. A decisão proferida pelo Tribunal a quo, cuja fundamentação é semelhante noutras 16 ações que correram termos naquele tribunal, é contraditória com esta, pois, com base em factualidade e fundamentação semelhante, decidiu em 15 situações não reconhecer contratos de trabalho e em 2 situações reconhecer.
B. Nesta medida, crê-se que apenas por mero lapso terá o Digníssimo Tribunal a quo concluído pela existência de contrato de trabalho nos presentes autos, termos em que se requer a V. Exa. se digne a anular a Sentença proferida, substituindo-a por outra de não reconhecimento da existência de contrato de trabalho.

Do recurso da matéria de facto
C. O ponto 10 dos Factos Provados deve ser considerado não provado por conterem matéria genérica e conclusiva.
D. O Ponto 15 dos Factos Provados deve ser considerado não provado e a redação deve ser alterada.
E. A permissão de acesso à localização apenas é necessária para a proposta de serviços, podendo, a partir desse momento, ser desligada, decorrendo todo o processo de entrega sem a localização ou o GPS ativo, conforme resulta dos factos provados 19 e 20 da própria matéria de Facto Provada da Sentença e conforme declarações da testemunha BB (39:14 a 39:44).
F. Os Pontos 21 e 22 (na parte em que refere “que o estafeta só sabe o que vai receber relativamente a cada pedido a partir do momento em que o aceita”) dos Factos Provados devem ser considerados não provados e a redação deve ser alterada, estando em contradição com os pontos 5, 6, 8, 9, 22 (excluindo a parte “que o estafeta só sabe o que vai receber relativamente a cada pedido a partir do momento em que o aceita”) 23 a 29, 33, 40 a 43, da própria matéria de Facto Provada da Sentença e a matéria de facto não provada b., c., d., e., e m..
G. Em face da prova testemunhal, documental e parecer do EMP03... junto aos autos, o facto 21 deverá ser considerado como não provado e o 22 deverá ser considerado como não provado, devendo, alternativamente, passar a ter a seguinte redação:
22. A remuneração do serviço depende de um conjunto de variáveis, designadamente, a taxa de entrega/base (taxa de cada pedido), a distância (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega que o utilizador cliente seleccionar ao efectuar a encomenda na plataforma), o tempo de espera (tempo de espera do estafeta na recolha do pedido), o horário (sendo os de maior afluxo mais bem pagos), o multiplicador ( que incidirá sobre as taxa de entrega e que só pode ser alterado uma vez por dia) e outras variáveis (no caso de condições meteorológicas adversas, feriados, períodos de alta procura, etc).”
H. O Ponto 39 dos Factos Provados deve ser considerado parcialmente não provado e a redação deve ser alterada.
I. Os estafetas é que definem, a seu exclusivo critério, se lhes interessa aceitar realizar recolhas em determinados estabelecimentos comerciais e/ou entregas a determinados clientes, ou se recusam determinadas (ou todas) as propostas de serviços, por exemplo, de um restaurante onde não queiram ir buscar produtos, etc.
J. O estafeta pode decidir apenas aceitar realizar entregas de produtos de um determinado restaurante, e fazer entregas apenas a determinados clientes, podendo recusar toda e qualquer proposta que não lhe interesse.
Dos factos pretendidos aditar pela Recorrente
K. Refere-se na sentença do Digníssimo Tribunal a quo que:
“Sucede, porém, que, não resulta da matéria de facto provada, que AA prestasse actividade para outras plataformas digitais em simultâneo com a prestação de actividade para a Ré (efectivamente apurou-se que este prestador emitiu facturas para serviços prestados para outros adquirentes; não se apurou, porém, de quem se tratam e mais concretamente se esses serviços foram prestados nas condições acima referidas).
Por outro lado, também não resultou apurada qual a disponibilidade mostrada pelo prestador de actividade, designadamente se era regular ou irregular.”
L. Sucede que em 2024, o prestador de atividade não faturou quaisquer serviços através da plataforma da Recorrente.
M. Relativamente ao ano de 2023, foi dado como provado no ponto 58 que o AA não emitiu faturas por serviços prestados à Ré, “…tendo emitido facturas por serviços prestados a outros adquirentes no montante global de € 6.158,31, tendo declarado na declaração modelo 3 de IRS referente a esse ano, rendimento da Categoria B no montante de €4.817,08 e rendimento da Categoria A no montante de € 9.825,93.”.
N. A conclusão do Tribunal a quo é também contraditada pelas declarações do Estafeta (cfr. gravação citius entre 00:32 e 00:57; 01:29 e 02:31; 03:43 a 03:53; 05:59 a 06:38; 13:45 a 18:37), que refere:
a. Não prestar serviços de estafeta com regularidade, mas apenas de forma esporádica;
b. Prestar serviços com a plataforma EMP02...;
c. Ser Sócio-Gerente (MOE) de uma empresa e Trabalhador por Conta de Outrem.
O. Pelo exposto, deve ser dado como provado que:
a. “No ano de 2024, AA não emitiu faturas por serviços prestados à Ré, tendo emitido faturas por serviços prestados a outros adquirentes, tendo ainda emitido faturas por serviços prestados à plataforma da EMP02..., nos anos de 2023 e 2024”.
b.“AA prestou serviços de estafeta de forma intermitente e irregular, em função da sua disponibilidade”.

Do recurso da matéria de Direito
P. O Tribunal a quo não procedeu à correta interpretação da matéria de direito, em particular dos artigos 11.º, 12.º e 12.º-A do Código do Trabalho, não apenas porque não se podem considerar preenchidas características que pudessem presumir a existência de contrato de trabalho, como, sobretudo, da matéria de facto provada e não provada, resultam factos suficientes que permitem concluir pela ilisão de uma eventual presunção de existência de contrato de trabalho, e, portanto, que determinavam uma decisão de direito diferente.
Da suficiência da matéria de facto considerada na Sentença que determina uma decisão de direito e a consequente absolvição da Recorrente
Q. Ainda que o recurso da matéria de facto não procedesse, o que não se concede e apenas por dever de patrocínio se teoriza, da matéria de facto provada na sentença resultam desde logo factos provados que demonstram a ausência de subordinação jurídica.
R. É suficiente para se concluir que a prestação da atividade do interveniente acidental e a respetiva relação com a Recorrente nunca poderia consubstanciar um contrato de trabalho, desde logo porque:
a. O estafeta é que decide se e quando presta atividade, não tendo qualquer obrigação de regularidade, assiduidade e disponibilidade;
b. Depende exclusivamente do estafeta ligar-se ou desligar-se da aplicação para receber propostas de serviços;
c. O estafeta ligar-se à plataforma gerida pela Recorrente aplicação possibilita-lhe oferecer os seus serviços de estafeta a um universo de pessoas maior, em particular aos outros utilizadores da plataforma, podendo conectar-se ou desconectar-se da aplicação em qualquer altura;
d. O estafeta pode escolher os pedidos que pretende ou não realizar e mesmo tendo, inicialmente aceitado prestar um serviço, enquanto não tiver a encomenda recolhida, pode desistir de efetuar esse serviço livremente e sem qualquer penalização;
e. O estafeta presta serviços de estafeta utilizando outras plataformas, nomeadamente concorrentes da Recorrente;
f. O estafeta é trabalhador por conta de outrem e sócio-gerente de uma empresa, utilizando plataforma da Recorrida em complemento à atividade profissional, mediante a sua disponibilidade pessoal;
g. O estafeta pode subcontratar a prestação da sua atividade.
S. O Venerando Tribunal ad quem não conhecerá uma pessoa singular que, no âmbito de um contrato de trabalho, possa, ao contrário do que sucede com o prestador de atividade nos autos, em suma:
a. Decidir quando é que presta atividade sem ter que dar qualquer justificação se não exercer, inexistindo períodos mínimos de regularidade ou de prestação de atividade;
b. Decidir quais os serviços que vai ou não prestar;
c. Possa exercer atividade concorrente;
d. Possa subcontratar a sua atividade a um terceiro.
T. Concluir que um Estafeta é subordinado da Ré Recorrente e que executa a atividade no âmbito da organização é uma conclusão impossível, pois se os Estafetas podem não prestar atividade quando querem, sem necessidade de pré-aviso e sem sofrer qualquer sanção, nunca poderia a Ré organizar nem determinar o exercício de atividade pelo estafeta. Em suma, os estafetas não devem qualquer obediência à Ré!
Da não verificação da característica prevista na alínea a) artigo 12.º do Código do Trabalho
U. Foi o estafeta que decidiu a área geográfica onde pretende receber propostas de serviço de entregas através da plataforma da Ré, podendo alterar essa área quando quiser.
V. Resulta dos pontos 1.2.2. do presente recurso e da factualidade provada e não provada, ao contrário do que foi decidido pela Mma. Juiz do Tribunal a quo, que
Foi o estafeta que, voluntariamente, determinou que utilizaria a aplicação gerida pela Recorrente na área de ...;
É o mesmo que define se e quando está disponível;
O estafeta é que decide se a Recorrente e os outros utilizadores têm acesso à sua geolocalização durante a execução do serviço, podendo desligá-la durante a mesma, sem que o impeça de realizar o serviço;
Não é a Recorrente que indica o ponto de recolha nem o ponto de entrega, mas sim o utilizador estafeta, sendo que o estafeta pode recusar esse serviço.
O prestador de atividade, em circunstância alguma, assumiu a obrigação de estar disponível numa determinada zona. É totalmente livre de se ligar e desligar da aplicação, como resulta da matéria de facto provada.
W. Conclui-se assim que este critério (artigo 12.º n.º 1 al. a) do Código do Trabalho) não se verifica.
Da não verificação das características previstas no artigo 12.º-A do Código do Trabalho
Alínea a): “A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela”
X. Decorre do ponto 22. Dos factos provados da sentença que os valores propostos para os serviços dependem de vários fatores que não são controlados pela Ré Recorrente, não havendo um valor fixo, nem um máximo ou um mínimo:
- a distância do pedido;
- o tempo de espera;
- condições meteorológicas;
- horas de procura mais elevada.
Y. Primeiro, se o preço do serviço varia em função das distâncias, e se é o estafeta que tem liberdade para decidir onde é que aguarda pedidos, constata-se que o próprio define essas distâncias.
Z. Segundo, se o preço varia em função das horas de maior procura e se é o estafeta, livremente, se presta serviços nessas horas ou noutras, constata-se que é o próprio que define quais os serviços, mais caros ou mais baratos, que pretende efetuar.
AA. Terceiro, o estafeta escolhe e define um fator de multiplicação sobre todas as componentes do preço.
BB. Além de tudo quanto foi referido, os Estafetas podem ainda recusar-se a prestar um serviço se não concordarem com o preço proposto.
CC. Se fosse trabalhador de uma empresa de transportes, o que não se concede, e se recusasse a executar os serviços que lhe são ordenados, seria despedido com justa causa.
DD. Mais, uma componente importante da retribuição, totalmente alheia à Ré, é a gratificação/gorjeta, livremente atribuída pelo utilizador cliente e que o Estafeta recebe na totalidade. Se a Ré organizasse a atividade dos estafetas, o que se lhe exigiria é que dividisse as gorjetas por todos os estafetas, o que não sucede.
EE. Não é a plataforma que estabelece o limite mínimo de cada entrega, mas sim o próprio estafeta, nomeadamente através, do multiplicador, sendo que o valor dos serviços depende de vários fatores.
FF. Decorre da matéria de facto provada que o prestador de atividade nem sequer faturou serviços à Ré nos anos de 2023 e 2024.
Alínea b): A plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade
GG. A este propósito, e ao contrário do alegado pelo tribunal a quo, resulta da matéria de facto provada (toda, exceto a impugnada supra, e na medida da impugnação) que os estafetas se limitam a registar na plataforma da Ré, tendo em vista oferecer os seus serviços, mediante a sua colocação online, sem nenhuma exigência ou regra por parte da Ré Recorrente. Se os estafetas quiserem, registam-se na plataforma e depois não executam qualquer atividade, pois a Ré Recorrente não tem possibilidade de os obrigar a aceitar serviços.
HH. A Ré Recorrente não efetua nenhum procedimento de recrutamento, nem atende a quaisquer características, ou experiência, dos estafetas em recolha e entrega de bens.
II. Para que uma pessoa se inscreva na plataforma da Ré Recorrente basta comprovar que reúne os requisitos legais para o efeito.
JJ. Os requisitos de inscrição e utilização da plataforma não podem ser confundidos com regras quanto à prestação da atividade de estafeta
KK. Refere ainda o Recorrente, tendo em vista preencher as características desta alínea, que todo o processo de prestação da atividade está padronizado, limitando-se o Estafeta a seguir o esquema previamente definido pela Ré.
LL. A Ré limita-se a colocar em contacto os 3 utilizadores da plataforma, apresentando a um estafeta, o pedido de entrega solicitado pelo cliente (factos provados 3 a 8), que o aceita ou não.
MM. Os pedidos surgem na aplicação da Ré Recorrente consoante os clientes utilizadores os vão concretizando.
NN. A Ré Recorrente, por sua vez, limita-se a comunicar essa informação ao prestador da atividade (Estafeta).
OO. A Ré Recorrente apenas estabelece a ligação/intermediação entre pedidos e prestadores da atividade.
PP. Pelo que se padronização significa conforme referido pelo Recorrente de que o serviço de recolha, transporte e entrega, decorre sempre “mesma forma, independentemente do local onde é prestado e da pessoa concreta do estafeta”, salvo o devido respeito, decorre da ordem natural que o objeto seja recolhido primeiro e só depois entregue.
QQ. Além disso, nada mais é “padronizado”, isto é, idêntico, na medida em que, conforme já referido, tudo o mais depende daquilo que os clientes utilizadores definam.
RR. Os prestadores de atividade são livres de determinar como, onde e quando exercem a sua atividade.
SS. Também quanto à geolocalização provou-se que a Ré Recorrente não determina quais regras a esse propósito. A geolocalização pode ser desligada logo após a atribuição do pedido. É o Estafeta que decide ligar a geolocalização, mantê-la ligada, ou desligá-la.
TT. A Ré Recorrente não determina quaisquer regras quanto à apresentação dos estafetas, nem tão pouco quanto à conduta do prestador de atividade, ou forma de tratamento/cumprimento aos clientes nada tendo ficado provado a esse propósito.
UU. Também quanto ao meio de transporte, em nenhum momento a Ré Recorrente impôs ao Estafeta a utilização de um determinado veículo para a realização da atividade de estafeta.
VV. O mesmo sucede em relação à mochila, que apenas deve ser térmica no caso de transporte de bens alimentares, devido a regras de HACCP, e não a quaisquer regras impostas pela Ré Recorrente.
WW. O mecanismo de verificação de identidade, como seja o reconhecimento facial, não é uma medida de controlo para efeitos de subordinação jurídica, mas apenas para garantir que a pessoa que está a utilizar a conta está autorizado legalmente a exercer atividade profissional em Portugal, o que se verifica de idêntica forma, caso a contra tenha sido subcontratada. Isto é, o reconhecimento facial apenas visa garantir que a pessoa subcontratada está autorizado legalmente a exercer atividade profissional em Portugal.
XX. Além de que, uma vez mais, tal não está conforme com o facto dado como provado que apenas refere que “41) Periodicamente a aplicação pode pedir reconhecimento facial ao estafeta.”
YY. A Ré não determina ou estipula qualquer horário.
ZZ. Tal significa, simplesmente que fora dessas horas não há restaurantes, lojas, ou seja, não há estabelecimentos comerciais registados na plataforma, que permitam dar resposta aos pedidos de clientes, pelo que também não há entregas para efetuar. A plataforma tecnológica, em si mesmo, está sempre a funcionar e não se desliga.
AAA. Em cidades em que os estabelecimentos comercias estão abertos 24h/dia, já nem se verifica essa alegada interrupção, tal como sucede, nomeadamente em Lisboa e Porto.
BBB. O estafeta é ainda livre de exercer a atividade de estafeta diretamente para terceiros, nomeadamente restaurantes, etc., à semelhança do que fazem já outros estafetas, recebendo as propostas de serviços através de SMS ou telefone, pelo que é falso quando se afirma que o prestador de atividade para exercer a atividade de estafeta precisa da aplicação da Ré Recorrente, tanto que o estafeta exercia a atividade de estafeta com a plataforma EMP02....
CCC. Assim, a Ré Recorrente:
Não utiliza os serviços de estafetas que se encontram registados na sua plataforma, para efetuar a recolha dos produtos nos estabelecimentos comerciais aderentes e realizar o transporte e a entrega desses produtos aos utilizadores clientes;
Não distribui trabalho, pelos estafetas. A Ré Recorrente propõe aos estafetas os vários pedidos de entregas que recebe dos clientes utilizadores que têm a faculdade recusar.
Não indica (no sentido de definir) o local de levantamento e entrega da encomenda, os quais são definidos pelo utilizador cliente, o que é um facto público, evidente e notório – basta a qualquer pessoa ligar-se na aplicação como utilizador cliente e fazer um pedido para confirmar que é o utilizador cliente que define esses pontos.
Alínea e): A plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta
DDD. Não resulta da matéria de facto provada que a plataforma exerça qualquer poder disciplinar sobre o prestador de atividade mediante a exclusão da possibilidade de realização de futuras atividades na plataforma através de suspensão ou desativação da conta.
EEE. Os termos e condições da Ré Recorrente mais não visam que os poderes de uma plataforma digital. Os mesmo não podem confundir-se com os de um empregador.
FFF. Inexiste qualquer prova que o estafeta tenha sido sancionado pela Recorrente.
GGG. No que à possibilidade de a Ré desativar uma conta concerne – de qualquer utilizador, seja ele cliente ou profissional - trata-se de uma prorrogativa dos serviços de intermediação em linha, como o da Ré, que se encontra prevista no artigo 4.º do Regulamento (UE) 2019/1150 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, relativo à promoção da equidade e da transparência para os utilizadores profissionais de serviços de intermediação em linha (Regulamento P2B).
HHH. Um “homem médio” concebe que uma aplicação tenha o direito de desativar a respetiva conta se os termos e condições forem violados, por exemplo, na utilização de uma aplicação de um banco, de uma rede social, de um site de vendas em segunda mão, etc., e ninguém se lembraria de dizer que um utilizador é trabalhador dessas aplicações pelo facto de poder ver a sua conta suspensa ou bloqueada.
III. A Ré apenas procede à desativação da conta em casos que assumem gravidade, nomeadamente quando se verificam situações de violação de lei ou de fraude (entendida como violação dos Termos e Condições, do modo a garantir uma plataforma idónea e segura para todos os utilizadores, nomeadamente, se o utilizador Prestador de Atividade introduzir vírus ou trojans na aplicação da Ré, se facultar dados de identificação ou dados fiscais falsos, etc.).
JJJ. A Ré não procede à desativação de contas por o Prestador de Atividade por motivos qualitativos ou quantitativos, tais como:
a. Ligar ou desligar a aplicação quando entender;
b. Recusar pedidos;
c. Escolher as rotas que pretende efetuar;
d. Ter ou não boas avaliações por parte dos utilizadores clientes, etc.
KKK. Conclui-se, assim, que também este critério (artigo 12.º-A n.º 1 al. e) do Código do Trabalho) não se verifica, sendo que todos os factos dados como provados apenas permitem concluir em sentido oposto ao previsto nesta alínea

Da ilisão da presunção e da existência de indícios negativos
LLL. A decisão que reconheça a existência de contrato de trabalho é contrária ao decidido no acórdão do TJUE, de 22 de abril de 2020, proferido no processo Yodel Delivery Network24, que decide que «a Diretiva 2003/88 deve ser interpretada no sentido de que se opõe a que uma pessoa contratada […] seja qualificada de «trabalhador» […] quando essa pessoa dispõe de poder discricionário:
– Recorrer a subcontratantes ou substitutos para a execução do serviço que se comprometeu a prestar;
– Aceitar ou não as diversas tarefas oferecidas pelo seu suposto empregador, ou fixar unilateralmente o número máximo dessas tarefas;
– Fornecer seus serviços a terceiros, incluindo concorrentes diretos do suposto empregador, e
– Fixar o seu próprio horário de «trabalho» dentro de determinados parâmetros e adaptar o seu tempo à sua conveniência pessoal e não apenas aos interesses do suposto empregador».
MMM. Ao contrário do entendido pelo Tribunal a quo e pelos acórdãos já conhecidos proferidos pelo venerando Tribunal da Relação de Guimarães, não corresponde à verdade que a Recorrente organize a atividade dos estafetas, ou que estes exerçam a atividade no âmbito da organização desta, nem que a plataforma digital consubstancie o instrumento de trabalho principal e / ou determinante.
NNN. Como resulta dos presentes autos, o estafeta era trabalhador por conta de outrem, sócio gerente de uma empresa e prestava serviços de estafeta através da plataforma EMP02..., terceira e concorrente à Recorrente.
OOO. Resulta do Acórdão STJ - processo n.º 2609/19.0T8OAZ.P1.S1, de 11-11-2020, que obteve, inclusive, voto de conformidade dos Exmos. Juízes Conselheiros Adjuntos, António Leones Dantas e Júlio Manuel Vieira Gomes, a propósito da qualificação ou não como contrato de trabalho de uma prestadora de atividade, que faturava à hora a uma unidade de cuidados continuados de uma Misericórdia, prestava serviços de enfermagem aos utentes desta nas instalações da Misericórdia, utilizava os instrumentos de trabalho facultados por esta e utilizava o sistema informático desta, não consubstanciava um contrato de trabalho, nomeadamente em face da liberdade de ausentar-se e não cumprir com qualquer período mínimo de prestação de trabalho.
PPP. Ora, os estafetas que prestam serviços através da plataforma da Recorrente têm consideravelmente mais liberdade, não estando sujeitos a nenhuma regra que sequer se assemelhe às obrigações que aquela enfermeira, cujo contrato de trabalho não se reconheceu, tinha que observar.
QQQ. Muito pelo contrário, resulta da matéria de facto provada da sentença que:
a. Era o prestador de atividade que determinava as horas de início e termo da prestação do serviço;
b. não existe uma remuneração horária fixa;
c. não tinha obrigações mínimas de regularidade / assiduidade, tanto que era trabalhador por conta de outrem para uma empresa terceira, sócio gerente de uma sociedade e prestava serviços à EMP02...;
d. não foi efetuada nenhuma entrevista para aferir das capacidades e qualidades para a prestação do serviço;
e. o local da prestação da atividade é definido pelo próprio que o pode alterar sempre que pretenda e para onde desejar;
f. não existem quaisquer regras de apresentação ou outras semelhantes;
g. não existe obrigatoriedade de aceitação de prestação de serviços quando decidem prestar atividade;
h. podia utilizar subcontratados, exclusivamente escolhidos por si.
i. Podia e exercia atividade concorrente.
RRR. O prestador de atividade não tem sequer de informar a Ré da disponibilidade da sua disponibilidade nem indicação prévia de quando é que vão prestar atividade, pelo que é impossível conceber que a Ré organize uma atividade, se não sabe, sequer, quem vai ter disponível para executar serviços.
SSS. Em suma, a tese defendida até ao momento pelo venerando Tribunal da Relação de Guimarães, no caso das plataformas digitais, improcede por contrariar frontalmente o disposto no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, pois é inegável que aquela enfermeira prestadora de serviços, quando presta serviços de enfermagem aos utentes da Unidade de Cuidados Continuados do Lar, encontra-se inserida no âmbito da atividade da mesma, utilizando, inclusive, as infraestruturas e utensílios aí existentes, e não foi por essas circunstâncias que não se logrou ilidir a presunção, em face da autonomia, liberdade e ausência de subordinação jurídica da enfermeira em relação àquele Lar
TTT. Os Estafetas não só não estão inseridos na organização da Ré, como, desde logo, controlam vários aspetos essenciais: é o estafeta que decide se executa ou não determinada entrega que lhe seja proposta, podendo recusar, livremente, as que quiser, e decidir quando é que se liga ou desliga à aplicação, sem dar qualquer satisfação à Ré Recorrente e não sendo penalizados por isso.
UUU. O ora exposto não só é suficiente como altamente impressivo para se concluir que inexiste aquilo que verdadeiramente caracteriza o contrato de trabalho: inexiste a subordinação jurídica, pelo que uma decisão que reconheça a existência de contrato de trabalho, viola o disposto no artigo 11.º do Código do Trabalho.
VVV. Tudo ponderado, a Ré Recorrente ilidiu qualquer presunção de laboralidade.
WWW. Caso se venha a considerar verificada a presunção constante do artigo 12.º-A do Código do Trabalho, o que não se aceita e teoriza para efeitos de patrocínio, a aplicação do disposto no artigo 12.º-A do Código do Trabalho à situação nos presentes autos seria ilegal, porquanto o teor daquele artigo é manifestamente inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 13.º, 18.º n.º 2 e 3 e 61.º da Constituição da República Portuguesa.
Termos em que:
Deve julgar-se procedente a nulidade de sentença com os devidos efeitos legais, ou, caso assim não se entenda,
O presente recurso deve ser julgado procedente e, em consequência:
a) Alterar-se a decisão sobre a matéria de facto provada:
a. Em que matéria de facto provada deve ser alterada e/ou dada como não provada;
b. Em que matéria de facto não provada deve ser dada como provada;
b) Revogar-se a sentença Recorrente, substituindo-a por outra que não reconheça a existência de contrato de trabalho com o prestador de atividade e absolva a Recorrente. “
O Ministério Público veio responder ao recurso concluindo pela sua total improcedência com a consequente manutenção da decisão recorrida.
O recurso foi admitido com o modo de subida e efeitos próprios.
Colhidos os vistos dos Desembargadores Adjuntos cumpre apreciar e decidir.

II – Do Objeto do Recurso

Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões do Recorrente (artigos 635º, nº 4, 637º n.º 2 e 639º, nºs 1 e 3, todos do Código de Processo Civil), não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, as questões que cumpre decidir são as seguintes:

- Da nulidade da sentença
- Da impugnação da matéria de facto
- Da qualificação do contrato, designadamente apurar se a relação jurídica estabelecida entre a EMP01... e o AA é de qualificar como contrato de trabalho.
- Da inconstitucionalidade da nova presunção de laboralidade

III – Fundamentação de Facto

FACTOS PROVADOS:
1. A Ré tem por objecto social o desenvolvimento e exploração de uma plataforma tecnológica, comércio a retalho por via electrónica, comércio não especializado de produtos alimentares e não alimentares, bebidas e tabaco e, de um modo geral, de todos os produtos de grande consumo, comercialização de medicamentos não sujeitos a receita médica, produtos de dermocosmética e de alimentos para animais, a importação de quaisquer produtos, o comércio de refeições prontas a levar para casa e a distribuição ao domicílio de produtos alimentares e não alimentares, bem como a exploração, comercialização, prestação e desenvolvimento de todos os tipos de serviços complementares das actividades constantes do seu objecto social e a realização de actividades de formação, consultoria, assistência técnica, especialização e de pesquisa de mercado relacionadas com o objecto social e qualquer outra actividade que esteja directa ou indirectamente relacionada com as actividades acima.
2. A Ré disponibiliza serviços à distância através de plataforma digital, nomeadamente através da aplicação informática/plataforma digital “EMP01...”, que é uma aplicação online para pedidos e entregas de alimentos por todo o país, a pedido de utilizadores/consumidores, os quais constituem os seus clientes finais, detendo, por sua vez, estabelecimentos de restauração aderentes a qualidade de parceiros da referida plataforma.
3. Para o exercício da actividade referida em 2., a Ré recorre a estafetas que não estão inscritos como trabalhadores no seu quadro de pessoal, entre os quais AA.
4. A aplicação “EMP01...”, pertencente à Ré, permite, quer a ligação dos estafetas aos estabelecimentos aderentes/parceiros da plataforma digital, quer a ligação aos clientes finais/consumidores a quem fazem as entregas.
5. A Ré junta, através da sua aplicação, três tipos de utilizadores de serviços da plataforma: o parceiro - os estabelecimentos comerciais, sejam restaurantes ou outros estabelecimentos aderentes; o utilizador estafeta; e o utilizador cliente.
6. A Ré exerce a intermediação entre estas três categorias de utilizadores, e recebe os pagamentos das diferentes taxas provenientes desses utilizadores: os estabelecimentos comerciais pagam uma taxa de acesso e utilização da plataforma (denominada “Taxa de Parceria”); os utilizadores prestadores de serviços pagam uma taxa de acesso e utilização da plataforma (denominada “Taxa de Plataforma”); os utilizadores clientes finais pagam uma taxa de acesso e utilização da plataforma (denominada “Taxa de Serviço”).
7. As “taxas” visam remunerar a plataforma pelo acesso aos serviços tecnológicos que a mesma proporciona aos diferentes perfis de utilizadores.
8. A Ré não recebe o pagamento do utilizador final devido pelo serviço do prestador de serviços de entrega, actuando, através de um prestador autorizado de serviços de pagamento, como um mero agente intermediário nos pagamentos entre utilizadores finais, estabelecimentos comerciais e estafetas e transferindo na sua totalidade o montante pago a título de serviços de entrega para os utilizadores prestadores desses serviços.
9. A Ré exerce a intermediação entre os utilizadores, admitindo diferentes possibilidades de utilização: os utilizadores estabelecimentos comerciais que, recebendo pedidos via plataforma e continuando obrigados ao pagamento da respectiva taxa de acesso, optam por recorrer aos seus próprios serviços de entrega, sem se conectar, via aplicação, com os utilizadores prestadores dos serviços; os utilizadores finais que, via plataforma, solicitam os utilizadores prestadores de serviços de entrega, sem efectuar qualquer aquisição junto dos estabelecimentos comerciais utilizadores da plataforma; o utilizador final pode, através da plataforma, dirigir pedidos aos estabelecimentos comerciais e usar a opção “take away”, sem fazer qualquer uso dos prestadores de serviços de entrega registados na plataforma; os utilizadores prestadores de serviços de entrega que aceitam e executam os pedidos provenientes de outras plataformas, ou subcontratam os seus serviços a outros utilizadores prestadores de serviços de entrega, sem alterar os termos da relação com os utilizadores estabelecimentos comerciais e a plataforma.
10. O trabalho é efectuado através da plataforma.
11. Para o desenvolvimento da sua actividade, os estafetas, entre os quais AA, através de um dos sítios da internet pertencentes à Ré, criam sua própria conta na plataforma, efectuando o respectivo registo na modalidade de “utilizador estafeta”, demonstrando cumprir os seguintes requisitos: ser maior de idade; ter veículo próprio (bicicleta, mota, trotinete ou carro); ter documento de identificação (cartão de Cidadão Europeu, Título de Residência ou passaporte com manifestação de interesse, frente e verso); ter comprovativo de actividade aberta nas finanças, comprovativo de ATCUD (código único de documento).  
12. Cumprindo estes passos o estafeta vê activada a sua conta e pode iniciar a actividade.
13. Desde então, sempre que pretende iniciar a sessão, o estafeta acede à sua conta através do nome de utilizador por si escolhido, bem como o respectivo código de segurança, sendo que, para receber pedidos, liga o botão de disponibilidade.
14. A Ré solicita aos estafetas o registo facial, com periodicidade variável.
15. Para prestar a sua actividade, os estafetas têm que activar a permissão de acesso à localização na Plataforma.
16. Para o exercício da actividade a Ré exige aos estafetas o uso de um telemóvel, de uma mochila, ligação à internet e geolocalização activa no momento da recepção dos pedidos.
17. Uma vez aceite o pedido, a tarefa de recolha e entrega de pedidos pode ser feita de forma desvinculada ou desligada da aplicação pelo prestador da actividade, não havendo qualquer obrigação de ligação permanente.
18. A Ré não impõe aos prestadores de serviço a aquisição obrigatória de mochila, que tenha a sua marca, nem proíbe que os mesmos prestadores realizem o serviço através da utilização de marcas dos seus concorrentes.
19. A geolocalização deve estar activa quando o pedido é efectuado para a providenciar os serviços de intermediação tecnológica.
20. Após a aceitação do pedido, e durante toda a respectiva execução, a geolocalização pode ser objecto de desactivação pelo prestador de serviços.
21. A Ré estabelece as condições de remuneração do serviço e deslocações, estabelecendo limites mínimos e máximos para o efeito, não existindo qualquer negociação prévia entre os estafetas e a Ré, quanto aos critérios subjacentes à definição dos valores.
22. A remuneração do serviço depende de um conjunto de variáveis, designadamente, a taxa de entrega/base (taxa de cada pedido), a distância (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega que o utilizador cliente seleccionar ao efectuar a encomenda na plataforma), o tempo de espera (tempo de espera do estafeta na recolha do pedido), o horário (sendo os de maior afluxo mais bem pagos), o multiplicador ( que incidirá sobre as taxa de entrega e que só pode ser alterado uma vez por dia) e outras variáveis (no caso de condições meteorológicas adversas, feriados, períodos de alta procura, etc), sendo que o estafeta só sabe o que vai receber relativamente a cada pedido a partir do momento em que o aceita.
23. Outra componente da retribuição é a gratificação do utilizador-cliente.
24. É o prestador da actividade que define o tempo em que se pretende manter ligado e o número de pedidos que recebe. 
25. É o prestador da actividade que escolhe o local em que se pretende ligar para receber pedidos de entrega.
26. As características do pedido são determinadas pelo utilizador-cliente.
27. O prestador da actividade pode escolher o multiplicador, um valor que é aplicado à totalidade dos elementos que compõem a tarifa proposta.
28. Tendo conhecimento do valor sugerido para cada pedido, o prestador da actividade tem a liberdade de aceitar ou de recusar o pedido. 
29. O prestador da actividade, dispondo de liberdade quanto à realização da sua actividade, determina o número de serviços e também as plataformas para que deseja trabalhar.
30. A Ré paga a retribuição ao estafeta, com periodicidade quinzenal, através de transferência bancária.
31. A partir do momento em que o estafeta faz login na aplicação, a Ré fica a saber, através da plataforma, qual é a sua localização, através de um sistema de geolocalização, indispensável à atribuição dos pedidos dos clientes e ao cálculo do valor do serviço.
32. Caso o prestador da actividade opte por realizar o serviço, não recebe quaisquer instruções da Ré sobre a forma de efectuar a entrega, sendo livre de escolher o meio de transporte, o percurso e definir os seus critérios de eficiência e produtividade.
33. O prestador da actividade tem liberdade para trabalhar através de várias plataformas distintas.
34. Os estafetas têm um “Sistema de Reputação” associada ao seu perfil, actualizado periodicamente à medida que os diferentes utilizadores realizam transacções na plataforma.
35. A Ré não manipula ou intervém neste feedback, apenas consolida a informação obtida dos clientes e torna-a visível apenas para o estafeta.
36.  O mecanismo de feedback é genérico e facultativa, destinando-se a servir de referência meramente informativa para os diferentes utilizadores da plataforma.
37. Os feedbacks não são usados pela Ré para avaliar a qualidade da actividade, nem a forma como o prestador a executa, não afectam a oferta de entregas nem a livre utilização da plataforma.
38. A Ré dispõe de um sistema de reconhecimento facial que permite o controlo da conformidade com os termos e condições previamente definidos e aceites pelo estafeta.
39. O Estafeta não tem qualquer intervenção na escolha dos clientes e dos respectivos pedidos que surgem na aplicação móvel aleatoriamente, sendo, contudo, o estafeta livre de o aceitar ou recusar.
40. Os horários dependem apenas da disponibilidade dos utilizadores-estabelecimentos e dos pedidos dos utilizadores-clientes finais.
41. O Prestador da actividade tem total liberdade para se ligar ou desligar, não tendo de cumprir qualquer horário predefinido nem tendo de cumprir qualquer limite mínimo de tempo de disponibilidade.
42. O prestador de actividade pode recusar pedidos, depois de o ter aprovado previamente.
43. Estando ligado, o prestador da actividade tem total liberdade para aceitar ou recusar os pedidos. 
44. A Ré pode excluir os estafetas de futuras actividades na plataforma através da desactivação da conta, podendo, temporariamente, restringir o acesso à aplicação, ou mesmo desactivar a conta em definitivo, no caso de suspeita de violação das obrigações assumidas pelo estafeta aquando da sua vinculação, designadamente se permitir a utilização da conta por terceiros sem prévia comunicação, ou for apresentada queixa contra o mesmo por motivos de fraude.
45. A utilização da aplicação informática por parte do estafeta, está sujeita ao pagamento de uma taxa quinzenal que permite o acesso à criação do perfil, o acesso à plataforma, a cobertura do seguro pela duração da ligação à plataforma, o acesso ao serviço de apoio técnico e à gestão e à intermediação de pagamentos.
46. O prestador da actividade é livre de recorrer a subcontratados, apenas tendo de comunicar à Ré e identificar o subcontratado, por razões de segurança.
47. A Ré apenas procede à desactivação da conta em casos que assumem gravidade, nomeadamente quando se verificam situações de violação de lei ou de fraude (entendida como violação dos Termos e Condições, do modo a garantir uma plataforma idónea e segura para todos os utilizadores).
48.  O mesmo se aplica aos restaurantes ou clientes, uma vez que as suas contas também podem ser desactivadas em caso de violação de lei ou de fraude (entendida como uma violação dos Termos e Condições a si aplicáveis).
49. O prestador da actividade era ainda responsável pela manutenção e reparações dos equipamentos utilizados no âmbito da sua actividade, suportando todos os custos relacionados com a sua actividade.
50. No âmbito de uma acção inspectiva levada a cabo pelo ACT, no dia 20 de Setembro de 2023, pelas 13 horas, no EMP04... de ..., sito na Av.ª ...,  a Inspectora do ACT identificou AA, com o NIF ...10, nascido em ../../1984, nacionalidade ... e residente na Tv. ..., ... ..., que ali se encontrava a prestar a actividade de estafeta, munido de uma mochila térmica e de um telemóvel, aguardando um pedido de entrega de comida já efectuado por um cliente através da aplicação da Ré, para, de seguida, após recolha do mesmo, se dirigir à morada indicada pelo cliente para proceder à entrega da encomenda.
51. A Ré foi notificada para regularizar a situação, em conformidade com o disposto no artigo 15.º-A, n.º 1, da Lei n.º 107/2009, de 14/09, não o tendo feito, pelo que a ACT elaborou a participação aludida no n.º 3 do artigo 15.º-A, que foi comunicada ao Ministério Público em 05.12.2023
52. AA efectuou a sua inscrição na plataforma “EMP01...” em data não concretamente apurada, mas anterior a Agosto de 2023, prestando a sua actividade pelo menos desde essa data.
53. Para exercer a actividade referida em 50., a Ré determinou que AA tivesse que usar um telemóvel com ligação à internet, com geolocalização activa para providenciar o serviço de intermediação tecnológica, fazer uso de uma mochila adequada para o transporte de alimentos e fazer o registo/login diário.
54. Entre Agosto de 2023 e Novembro de 2023, AA optou 27 vezes pelo multiplicador 1,1 e 30 vezes pelo multiplicador 1.
55. Entre Agosto de 2023 e Outubro de 2023, AA rejeitou 15 entregas.
56. Entre Agosto de 2023 e Novembro de 2023, AA rejeitou 30 entregas, depois de as ter aceite.
57. AA encontra-se enquadrado no regime de trabalhadores independentes, no regime de trabalhadores por conta de outrem e no regime de membro de órgão estatutário, para efeitos de segurança social.
58. No ano de 2023, AA não emitiu facturas por serviços prestados à Ré, tendo emitido facturas por serviços prestados a outros adquirentes no montante global de € 6.158,31, tendo declarado na declaração modelo 3 de IRS referente a esse ano, rendimento da Categoria B no montante de € 4.817,08 e rendimento da Categoria A no montante de € 9.825,93.
59. Os “termos e condições de utilização da plataforma EMP01... para Estafetas” que os prestadores de actividade têm que consentir tinha, em 4 de Maio de 2023, a seguinte redacção: “(…) 1. Condições Gerais:
Os presentes Termos e Condições de Utilização da Plataforma EMP01... aplicam-se à prestação de todos os serviços tecnológicos oferecidos pela EMP01... Unipessoal Lda. (…) a «Plataforma EMP01...», ou «Nós» consoante o contexto), ao país no qual o Prestador de Serviços (o «Estafeta», o «Utilizador» ou «Você», consoante o contexto) tem de se registar na nossa Plataforma. A principal actividade da EMP01... é o desenvolvimento e a gestão de uma plataforma tecnológica através da qual certos estabelecimentos comerciais locais (adiante designados por «Estabelecimentos Comerciais») de algumas cidades oferecem os seus produtos através de uma aplicação móvel ou da Web (adiante designados por «serviços EMP01...», «Serviços» ou «App»); e, acessoriamente, quando apropriado e se solicitado pelo utilizador cliente final (adiante designado por «Utilizador Cliente») dos referidos estabelecimentos comerciais através da aplicação, podem actuar como intermediários na entrega imediata dos produtos. Os seus objectivos incluem a intermediação nos processos de recolha e/ou pagamento e a aceitação e execução de pedidos para fazer recolhas e receber entregas em nome do cliente Utilizador e dos Estabelecimentos Comerciais. (…)

2.2. A sua aceitação:
Ao aceder aos Serviços EMP01... e registar-se pela primeira vez na Plataforma, inserindo os seus dados de identificação de conta (adiante designado por «Dados de Identificação de Conta»), está a aceitar os presentes Termos e Condições, bem como todos os anexos que incluem (…) Tem de aceder à sua conta pessoa (a «Conta») iniciando sessão com o nome de utilizador que escolheu e o código de segurança pessoal (o «Código de Segurança»). Aceita manter a confidencialidade do seu Código de Segurança e alterá-lo frequentemente. Cada Conta é pessoal e única, pelo que está proibido de registar ou ter mais do que uma Conta. Além disso, a Conta é intransmissível, salvo nos países em que legislação local o permita (…) Em caso de utilização ilegítima ou fraude, a EMP01... pode cancelar, suspender ou desactivar duas ou mais Contas com os mesmo dados ou dados relacionados que possa detectar, mediante intervenção humana sempre por parte de um agente da EMP01... e permitindo, em todo o caso, que o Estafeta apresente uma queixa e/ou reclame contra essa decisão em caso de discrepância. Será responsável por todas as transacções realizadas na sua Conta (por Si ou por eventuais substitutos), uma vez que só é possível aceder à mesma com o Código de Segurança e estão sujeitas à aceitação dos nossos Termos e Condições, incluindo, nomeadamente, responsabilidade penal. Aceita notificar imediatamente, através de meios apropriados e seguros, qualquer utilização fraudulenta ou ilegítima da sua Conta, bem como qualquer acesso à mesma por terceiros não autorizados. Para evitar dúvidas, qualquer venda, cessão e transferência da Conta sempre que possa ser considerada ilegal é proibida em quaisquer circunstâncias, salvo nos casos de sublocação/subcontratação da sua conta em conformidade com a regulamentação local aplicável (…)

3.1 Opções de Serviço:
No nosso sítio Web encontrará uma descrição das nossas opções de Serviço de Tecnologia e explicaremos que opções de Serviço tem à sua disposição quando cria uma Conta EMP01.... Os presentes Termos e Condições serão aplicáveis a todos os nossos Serviços Tecnológicos se se registar na Plataforma como Utilizador Estafeta. Serviços incluídos na Taxa de Utilização da Plataforma: - Acesso à plataforma que lhe permitirá oferecer voluntária e livremente os seus serviços de entrega, podendo conectar-se em qualquer altura de acordo com a possibilidade de escolher livremente os pedidos que pretende realizar. Esse acesso inclui a possibilidade de prestar os seus serviços a qualquer um dos Utilizadores da Plataforma (Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, etc.), independentemente da empresa do Grupo EMP01... (EMP01... e/ou as suas filiais e/ou empresas coligadas) que gere a Plataforma à qual se conectou e sempre de acordo com a disponibilidade do país no qual se conecta. - Acesso a cobertura de seguro durante o período de conexão à Plataforma. - Acesso a apoio e serviço de assistência para qualquer inconveniente técnico que possa ocorrer. - Gestão e intermediação no serviço de recolha e pagamentos. - Aquisição e / ou uso de materiais que podem ser solicitados por você. Serviços incluídos dentro da taxa de activação (…) a EMP01... pode oferecer outros Produtos e Serviços não incluídos na Tarifa e que o Estafeta, consoante apropriado de acordo com a legislação de cada país, pode adquirir ou contratar voluntariamente através de um dos nossos canais de venda (…)

4.1. Quem é o Estafeta?
Ao aceitar os presentes Termos e Condições, também se torna um utilizador da aplicação EMP01.... Deste modo, pode usar e conectar-se à Plataforma EMP01... de forma flexível e a seu critério. Acede à Plataforma para usar uma tecnologia da Plataforma que lhe permite conectar-se a outros Utilizadores da Plataforma. Os mesmos poderão ser: Estabelecimentos Comerciais, Utilizadores, outros Estafetas ou outros Utilizadores. Se estiver no seu país, usa a EMP01... como: ● Utilizador Estafeta Independente: pode definir os seus próprios horários para se conectar à Plataforma e manter o seu perfil registado. Actuará em seu próprio nome e interesse, também usando os seus próprios equipamentos para exercer a actividade. ● Utilizador Estafeta numa empresa de serviços de logística: enquanto profissional de uma empresa de serviços de logística que usa os Serviços da Plataforma, estará dependente das instruções da sua empresa. A EMP01... não dirigirá, controlará ou será considerada dirigir ou controlar as acções ou conduta da empresa no âmbito dos presentes Termos e Condições, nomeadamente no que diz respeito à prestação dos seus serviços a outros Utilizadores da Plataforma. Reconhece que não existe nenhuma obrigação ou relação de exclusividade entre Si e a EMP01..., de tal modo que pode, a seu exclusivo critério, oferecer serviços ou exercer qualquer outra actividade comercial ou profissional relacionada ou não com o sector de actividades da EMP01....

4.2. Cessação de Serviços
Antes da cessão dos Serviços, as Partes aceitam liquidar qualquer dívida, obrigações pendentes ou quaisquer compromissos previamente acordados. As Partes podem cessar os Serviços pelas seguintes razões: a. Por vontade própria, em qualquer altura sem aviso prévio, salvo se acordado de outro modo por escrito. b. Por violação de qualquer uma das obrigações previstas nos presentes Termos e Condições. c. Em caso de impossibilidade de cumprir qualquer disposição dos presentes Termos e Condições. d. O não cumprimento das Normas de Ética e Conduta Empresarial para Terceiros da EMP01... e/ou de qualquer outra Política da EMP01... aplicável a todos os Utilizadores da Plataforma. e. Por violação da legislação local por parte do Estafeta que possa constituir uma violação do princípio de boa-fé entre as Partes. f. Quaisquer outras circunstâncias resultantes em danos fiscais, de segurança social, financeiros, comerciais, organizacionais ou de reputação para a outra Parte ou um Terceiro, independentemente do montante ou dimensão do dano causado. g. A utilização da Plataforma EMP01... para fins abusivos ou fraudulentos susceptíveis de causar danos materiais e/ou imateriais a qualquer um dos Utilizadores da plataforma. h. Em situações de força maior, de acordo com a cláusula 8.5 destes Termos e Condições. (…)

5.1. Utilizador Estafeta
5.1.1. A sua Utilização dos Serviços de Tecnologia da EMP01...:
Para utilizar os Serviços de Tecnologia da EMP01... é necessário registar e criar uma Conta completa, actualizada e activa. Tal inclui, consoante apropriado, mas sem carácter exaustivo, as seguintes obrigações: a. Estar registado correctamente para poder exercer a actividade de entrega para todos os fins legais, de segurança social e fiscais e em conformidade com a regulamentação local em vigor na altura. b. Pagar pontualmente os Serviços acordados com a Plataforma. c. Tem de enviar à EMP01... certas informações, pessoais ou enquanto empresa prestadora de serviços, tais como o seu nome, endereço, número de telemóvel e idade (aplicar-se-á a idade legal da sua jurisdição), bem como, pelo menos, um método de pagamento válido. d. Tem de manter informações exactas, completas e actualizadas na sua Conta. Será responsável por quaisquer inexactidões nas informações fornecidas. e. Será responsável por todas as actividades realizadas na sua Conta, incluindo as que terceiros realizam em seu nome, bem como por manter sempre a segurança e o sigilo do nome de utilizador e da palavra-passe (Código de Segurança) da sua conta. f. Aceita cumprir toda a legislação aplicável, incluindo regulamentação local, nacional e supranacional ao utilizar os Serviços de Tecnologia EMP01... e apenas pode utilizar os Serviços para fins legítimos. g. Aceita não utilizar a Plataforma de Tecnologia EMP01... para causar inconvenientes, fraude ou danos materiais a terceiros. h. Caso decida subcontratar a sua Conta de Utilizador Estafeta, tem de fazê-lo em conformidade com a regulamentação local, sempre que a mesma o permita, e serão aplicados processos internos para adaptar a operação. A EMP01... não será responsável por quaisquer danos ou infracção que você e/ou as suas subcontratações possam cometer. Neste sentido, a EMP01..., a fim de evitar comportamento abusivo e/ou fraudulento, pode pedir documentação relativa à conformidade do Estafeta titular da Conta EMP01... e dos seus subcontratantes. i. Declara que dispõe da capacidade jurídica para celebrar contratos e ser de maioridade no país correspondente. j. Apenas os produtos e serviços que não sejam tácita ou expressamente proibidos nos Termos e Condições e outras políticas da EMP01... ou pela legislação em vigor podem ser incluídos no âmbito dos presentes Termos e Condições. Para mais informações sobre os produtos ou serviços proibidos, consulte as nossas Políticas de Artigos Proibidos nos presentes Termos e Condições ou nos Termos e Condições Gerais de Utilização aplicáveis aos Utilizadores Cliente. k. A EMP01... irá sempre dar prioridade à sua experiência de Utilizador enquanto parte dos seus serviços. A EMP01... pode criar painéis de informação para incluir as suas preferências enquanto Utilizador da Plataforma Digital da EMP01... e melhorar a sua experiência na mesma. l. Você, enquanto profissional e Estafeta, é responsável pela prestação dos seus serviços e pelas vicissitudes da sua actividade. Bem como, se for caso disso, pelos estafetas por si subcontratados. m. O Estafeta compromete-se a verificar e cumprir os requisitos legais pertinentes, em termos de saúde e segurança apropriados para diferentes tipos de produtos (a título de exemplo, mas sem carácter exaustivo: os relacionados com farmácia, álcool e tabaco) e isenta a EMP01... de qualquer responsabilidade caso a regulamentação supracitada não seja respeitada. n. No caso de transporte de alimentos, em conformidade com a regulamentação aplicável a este respeito, o Estafeta compromete-se a transportá-los em meios de transporte e recipientes adequados para os mesmos. o. Declara cumprir a legislação aplicável na prestação dos seus serviços de entrega, tais como legislação fiscal, laboral, civil, penal, de transporte de mercadorias, de saúde, segurança e higiene e a legislação inerente à actividade, nomeadamente apólices de seguro aplicáveis à sua região (como o seguro obrigatório de veículos (…)
5.1.4. Ao aceitar um pedido, o Estafeta reconhece que esse pedido pode incluir a entrega/devolução/serviço de devolução ou conforme a morada/localização/descrição indicado pelo Utilizador Cliente ou o Estabelecimento Comercial com o qual celebrou um contrato).
5.1.5. Por força dos acordos alcançados com os Utilizadores Cliente, e para efeitos de evitar fraude, no momento da entrega, os Estafetas e Utilizadores Clientes aguardarão dez minutos antes de cancelar um pedido.
5.1.6. O Estafeta aceita que os Estabelecimentos Comerciais e o Utilizador Cliente peça um serviço de entrega de acordo com o preço e a qualidade em conformidade com as orientações de mercado. (…)
5.2 Restrições
Sem prejuízo de quaisquer medidas adicionais que possam ser adoptadas, uma Conta Estafeta pode ser temporária ou permanentemente desactivada se: a. Em conformidade com o Código de Ética que rege todos os Utilizadores da Plataforma, utilizar a Plataforma para insultar, ofender, ameaçar e/ou agredir Terceiros, nomeadamente, Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, outros Estafetas e pessoal da EMP01.... b. Violar a lei ou quaisquer outras disposições dos Termos e Condições Gerais ou outras políticas da EMP01.... c. Participar em actos ou conduta violentos. d. Violar os seus direitos na aplicação da EMP01..., causando danos materiais e/ou imateriais a outro Utilizador da plataforma (Estafetas, Utilizadores Cliente e/ou Estabelecimentos Comerciais). e. Na prevenção de acções fraudulentas, se a identidade do Utilizador da Plataforma e/ou dos seus substitutos ou subcontratantes não puder ser verificada e/ou qualquer informação prestada por si e/ou os seus substitutos ou subcontratantes estiver incorrecta. f. A fim de prevenir a segurança de todos os Utilizadores da Plataforma em caso de violação da Política de Mercadorias (…)
5.3. Rendimentos
5.3.1 Facturação e pagamentos
O processamento dos pagamentos estará sujeito a todas as condições do Processador de Pagamento, às condições e políticas de privacidade e deverá ter sua própria conta individual ou comercial, dependendo do país em questão, junto do Processador de Pagamento. A EMP01..., através de um processador de pagamento, conectar-se-á e actuará como um intermediário nos pagamentos entre Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais e Estafetas (ou empresa de serviços de logística conexa). Aceita e concorda que, dependendo da regulamentação local aplicável, bem como da forma na qual se conecta à Plataforma (directamente ou através de uma empresa de serviços de logística), os serviços que oferece podem e terão de ser facturados ou refaturados ao Cliente Utilizador e/ou ao Estabelecimento Comercial, que em última instância paga o preço dos serviços por si oferecidos. Aceita que a taxa pelos serviços que pagará à EMP01... inclui, se autorizado por si e conforme apropriado de acordo com a legislação local do seu país, bem como da forma como se conecta à Plataforma (directamente ou através de uma empresa de serviços de logística), a gestão e intermediação da facturação correspondente aos seus serviços. Neste caso, estas facturas serão consideradas aceites caso a EMP01... não receba qualquer comunicação da sua parte no prazo de 5 dias a contar da emissão das facturas. O Estafeta reconhece e concorda que a EMP01..., em conformidade com o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), pode proceder a uma revisão periódica dos pagamentos que lhe são efectuados. Tal revisão pode resultar na retenção do imposto sobre o rendimento caso o limite, em conformidade com o disposto no Artigo 53 do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e no Artigo 101 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), seja ultrapassado. O Estafeta reconhece e aceita a sua responsabilidade pelo dinheiro que lhe foi entregue pelos Utilizadores Cliente e que é propriedade dos Estabelecimentos Comerciais. Neste sentido, aceita que, consoante apropriado à forma como se conecta à Plataforma, o preço que lhe foi pago pelo serviço pelo Estabelecimento Comercial inclui o serviço de recolha do dinheiro que tem de ser entregue ao referido Estabelecimento Comercial.
5.3.2 Pagamento e Taxas da EMP01...
Aceita que a sua utilização dos Serviços EMP01... tem um custo associado para os serviços ou produtos que recebe («Encargos»). A EMP01... pode cobrar a seu exclusivo critério uma taxa padrão, uma taxa adicional ou um ajustamento aplicável pela utilização da Plataforma e os custos de activar o Perfil da sua Conta. A taxa que tem de pagar corresponderá à utilização dos serviços contratados por si através da Plataforma, ou aos eventuais produtos/bens que pode adquirir através da mesma. Para que conste, a utilização dos serviços e os produtos podem ser momentânea ou definitivamente suspensos ou desactivados na Plataforma, dependendo do país a partir do qual se conecta. A EMP01... reserva-se o direito de adoptar as medidas judiciais e extrajudiciais que considere apropriadas para obter o pagamento dos montantes em dívida. A EMP01... reserva-se o direito de modificar, alterar, aumentar ou cancelar as taxas actuais em qualquer altura notificando os Utilizadores da sua Plataforma. Além disso, a EMP01... pode temporariamente modificar a Taxa e a Política e as taxas dos seus Serviços em resultado de promoções ou descontos. Estas modificações produzem efeitos quando a promoção é tornada pública ou o Utilizador beneficiário é notificado. Todas as Taxas para Produtos e/ou Serviços contratados à EMP01... serão cobradas imediatamente em conformidade com o método de pagamento permitido no seu país e o método preferencial indicado na sua Conta e disponibilizado aos Serviços EMP01.... Quando carregado, a EMP01... enviar-lhe-á um recibo por e-mail. O pagamento também pode ser efectuado mediante a compensação de facturas pendentes entre as partes. Se o método de pagamento da sua conta principal for considerado expirado, inválido ou indisponível para a cobrança, a EMP01... irá contactá-lo e/ou providenciar outros métodos de pagamento aplicáveis à sua Conta. A EMP01... envidará esforços razoáveis para o informar sobre quaisquer encargos aplicáveis. A EMP01... pode ocasionalmente eliminar e/ou rever quaisquer taxas, ofertas e/ou descontos aplicáveis a todos os Utilizadores da Plataforma, você incluído. A EMP01... pode aplicar taxas de Serviço ou outras taxas previamente anunciadas nas redes sociais aplicáveis, salvo se a EMP01... não a aplicar na sua região, caso no qual não lhe serão cobradas. A forma de cobrança dos Encargos irá sempre depender da forma na qual se conecta à Plataforma, directamente ou através de uma empresa de serviços de logística. (…)
5.4. Segurança dos Serviços e da Plataforma EMP01...
5.4.1 Em certos casos, por uma questão de prevenção de fraudes, poderá ter de apresentar prova da sua identidade e/ou, se aplicável nos termos da legislação local, dos seus substitutos ou subcontratantes para aceder ou utilizar os Serviços e aceita que lhe pode ser negado acesso aos Serviços e à utilização dos mesmos se você ou os seus substitutos ou subcontratantes recusarem fornecer essa prova de identidade. A EMP01... pode também recorrer a terceiros fornecedores de serviços para efeitos de verificar a sua identidade ou a dos seus substitutos ou subcontratantes.
5.4.2 A EMP01... pode, mas não é obrigada, monitorizar, rever e/ou editar a sua Conta. A EMP01... reserva-se o direito de, em qualquer caso, eliminar ou desactivar o acesso a qualquer Conta por qualquer motivo ou sem motivo, até mesmo se considerar, a seu critério exclusivo, que a sua Conta viola os direitos de terceiros ou direitos protegidos pelos Termos e Condições.
5.4.3 A EMP01... pode adoptar essa acção sem aviso prévio feito a si ou a um terceiro. A eliminação ou desactivação do acesso à sua Conta de Utilizador será a critério exclusivo da EMP01... e não há qualquer obrigação de eliminar ou desactivar o acesso em relação a Estafetas específicos.
5.5. Definição do preço por serviço
5.5.1  Você pode determinar e escolher o preço dos seus serviços através da Plataforma EMP01.... A EMP01..., para fins informativos, com base em informações de mercado, irá sugerir um preço de mercado que poderá ser alterado diariamente pelo Estafeta através do seu Perfil de Utilizador, sem que isso implique de adjudicação do serviço.
5.7 Sistema de Reputação
O Estafeta terá uma Reputação associada ao seu perfil fácil de usar e consultar. Este sistema é automático e é actualizado periodicamente à medida que os diferentes Utilizadores realizam transacções na Plataforma EMP01... e está sujeito às regra aí contidas e sobre as quais os Utilizadores são informados no presente documento e/ou na APP e/ou através dos canais de comunicação apropriados, para que o conheçam exaustivamente e o considerem útil. O sistema baseia-se em dados objectivos, informação numérica e métricas fornecidas pelos Utilizadores da Plataforma e os clientes do Estafeta: Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais. A EMP01... não manipula ou intervém no processo de formação da Reputação, mas apenas consolida informação objectiva obtida dos Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais, beneficiários dos serviços do Estafeta. A EMP01... não verifica a veracidade ou precisão dos comentários feitos por outros Utilizadores e não é responsável pelo que é expresso no sítio Web ou por outros meios, nomeadamente e-mail. Todas as informações fornecidas pelos Utilizadores serão incluídas no sítio Web sob a exclusiva responsabilidade do seu autor.
9. Politica de Proteção de Dados
(…)
9.2 Dados tratados
Os dados do Estafeta recolhidos através da Plataforma e das ferramentas tecnológicas que a EMP01... fornece ao Estafeta estarão, regra geral, limitados aos dados necessários para executar a relação entre as Partes e são necessários para a poder desenvolver correctamente (adiante designados por os «Dados»). Não obstante o que precede, é possível que no momento do registo ou da criação da Conta pelo Estafeta ou durante a relação, sejam pedidos dados adicionais, através de campos opcionais na Conta do Estafeta, ou através de campanhas promocionais ou outras acções que a EMP01... possa realizar. Em consonância com o que precede, a EMP01... pode tratar as seguintes categorias de dados, sem prejuízo de outras que possam ser pedidas durante a relação: (…) Os dados relacionados com a geolocalização do Estafeta são necessários para a execução dos Termos e Condições, bem como para utilizar a Plataforma, a fim de permitir aos Consumidores e Estabelecimentos Comerciais saber o estado e localização do Estafeta durante a recolha ou entrega.
9.3. Geolocalização
Ao utilizar a aplicação fornecida pela EMP01... para a execução da relação e, portanto, para exercer a actividade, a EMP01... pode receber os dados de geolocalização do Estafeta caso o mesmo tenha activado esta função directamente no seu telemóvel. A EMP01... usará os Dados obtidos para prestar os Serviços ao Estafeta e partilhá-los com o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial cujo pedido o Estafeta aceitou executar, para que o Utilizador Cliente e o Estabelecimento Comercial possam contactar o Estafeta no caso de algum incidente. É expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e especificação dos seus serviços e em nenhum caso a EMP01... utilizará esses dados para fins de controlo.
9.4. Finalidade e base jurídica do tratamento
Os Dados serão tratados exclusivamente para cumprir a relação estabelecida e, nomeadamente:
(…) A geolocalização é uma informação importante e básica para a prestação do Serviço, porquanto serve apenas para informar o Estabelecimento Comercial ou o Utilizador Cliente da localização do Estafeta e, portanto, calcular o tempo de recolha ou entrega, mas que é também usada pela EMP01... para a oferta de pedidos. A proximidade do ponto de recolha é um dos critérios utilizados no momento da oferta do pedido, pelo que, se não estiver activada, a EMP01... não poderá garantir que são oferecidos pedidos, ou que são razoáveis em termos do tempo previsto de recolha ou entrega. Neste sentido, e sem prejuízo do sistema operativo do dispositivo do Estafeta que pede consentimento para o uso da geolocalização, a utilização desta informação é necessária para correcta execução dos Termos e Condições. Em todo o caso, o Estafeta pode desactivar a geolocalização quando não está a usar a Plataforma, embora a EMP01... não use esta informação fora do âmbito da oferta de pedidos ou fora das horas em que o Estafeta está a usar a Plataforma. De igual modo, é expressamente indicado que o Estafeta tem total liberdade de decisão em relação ao itinerário e/ou percursos escolhidos para a oferta e concretização dos seus serviços e em nenhum caso a EMP01... utilizará esses dados para fins de controlo do Estafeta. Neste sentido, a geolocalização é meramente temporária e não de modo algum exaustiva. A informação de geolocalização pode também ser usado para efeitos de facturação (…)
9.5 Métricas e outras informações relacionadas com a execução do serviço
Em relação ao sistema de Reputação e às avaliações dos Utilizadores Cliente e Estabelecimentos Comerciais sobre o serviço oferecido pelo Estafeta, o mesmo deverá ter em conta que: - Não são estabelecidos perfis ou realizadas avaliações de pessoas, mas sim sobre a execução do serviço. - O Consumidor e o Estabelecimento Comercial podem avaliar a qualidade do serviço prestado. - Todas as métricas obtidas pela EMP01... referem-se sempre, em qualquer caso e exclusivamente, ao serviço prestado. - Não são recolhidos dados relacionados com a vida privada, a personalidade ou os hábitos do Estafeta. De igual modo, no tocante à existência de decisões automatizadas com efeitos legais para o Estafeta, deve ter-se em conta que: - As decisões não são tomadas baseadas exclusivamente no tratamento automatizado dos dados pessoais do Estafeta, mas quando apropriado baseadas numa avaliação da execução do serviço.- Todos os parâmeros a ter em conta foram gerados manualmente pelos Clientes e Estabelecimentos Comerciais. - Todos os parâmetros e métricas usadas para tomar essas decisões referem-se sempre e exclusivamente ao serviço e à execução dos Termos e Condições independentemente do Estafeta que os executa. - Não são estabelecidos perfis, conforme indicado no ponto anterior. - Em caso algum são tidos em conta características da personalidade ou a esfera não profissional da Parte. - Os resultados dependem de acções anteriores e voluntárias do Estafeta. - Os resultados podem ser corrigidos caso tenha havido um erro e/ou discrepância entre o Estafeta e a EMP01.... - O Estafeta não é impedido de exercer um direito. - O Estafeta não é impedido de aceder a um bem ou serviço. - O Estafeta não é impedido de ser parte num contrato. Com base no que precede, e em conformidade com as disposições do RGPD, não são estabelecidos perfis sobre os Estafetas ou tomadas decisões automatizadas com efeitos legais para o Estafeta com base nos seus dados ou características pessoais, mas apenas são tidas em conta uma avaliação do serviço e características objectivas sobre a capacidade de prestar o serviço pelo Estafeta (…)”.

FACTO ADITADO em conformidade com o decidido em IV.2
60. AA trabalhou nos últimos 2 anos por conta de outrem, designadamente como operador de TVDE e operador de produção, prestou e presta, ainda, serviços de estafeta utilizando, quer a plataforma da ré, quer a plataforma da EMP02..., apenas à hora do jantar, quando tem disponibilidade.
FACTOS NÃO PROVADOS:
a. A Ré, através da plataforma, supervisiona a prestação da actividade do estafeta em tempo real, através do sistema de geolocalização existente na APP, que o estafeta deve ter ligado permanentemente,
b. É a Ré quem fixa o horário dos estafetas (habitualmente entre as 08h30m e as 23h).
c. É a Ré quem negoceia os preços ou as condições com os titulares dos estabelecimentos parceiros e fixa o preço do serviço ao cliente.
d. A Ré verifica a qualidade da execução do trabalho dos estafetas através da APP, controlando os tempos de entrega, percursos seguidos e da avaliação que é feita do mesmo pelos utilizadores (restaurantes e cliente final), controlando e supervisionando a execução do mesmo, incluindo em tempo real, nomeadamente através dos meios electrónicos ou de gestão algorítmica.
e. O tempo de entrega dos pedidos e o percurso efectuado pelo estafeta é controlado em tempo real pela Ré, através da plataforma. f. A Ré tem ainda a possibilidade de, através da plataforma, gravar chamadas efectuadas pelos estafetas.
g. A avaliação dada pelos restaurantes ou clientes ao estafeta podem condicionar a prestação da actividade pela plataforma e proporcionar-lhe até benefícios pois a Ré disponibiliza-lhes um clube de descontos designado “EMP01... +”.
h. A Ré determina aos estafetas a forma da sua apresentação, a sua conduta perante o utilizador do serviço, ou a prestação da actividade, exigindo que chegado ao cliente, se não estiver na morada, aguarde 10 minutos, dando nota disso ao “Suporte”, que entra, ele próprio, em contacto com o cliente.
i. AA está abrangido por um seguro de responsabilidade civil contratado e disponibilizado pela plataforma, titulado pela ..., com a apólice n.º ...12.
j. Na formação online prévia à inscrição prestada ao estafeta, este é informado que tem acesso ao seguro “...”, caso esteja a utilizar a plataforma, estando coberto enquanto estiver online e atá uma hora após ficar offline.
k. Para exercer a actividade referida em 50., a Ré determinou a AA que tivesse a geolocalização sempre activa para controlo da sua localização e supervisionamento da sua actividade.
l. A Ré determinou, ainda, que AA fizesse o seu registo facial várias vezes, que se apresentasse bem e fosse educado com os utilizadores e que não se podia fazer substituir por outro estafeta.
m. O Cliente final, em regra, paga o serviço à Ré e não ao estafeta.

IV – Fundamentação de Direito

1. Da nulidade da sentença
Considera a recorrente que a sentença é nula por contradição entre as conclusões e os factos provados, bem como entre a decisão proferida nestes autos e nas restantes 15 em que o Tribunal a quo não reconheceu a existência de contrato de trabalho.
O tribunal a quo pronunciou-se sobre a arguida nulidade tendo concluído pela sua inexistência, esclarecendo que embora o tribunal tivesse concluído em 15 ações de reconhecimento da existência e contrato de trabalho pela sua inexistência, fê-lo porque, ao contrário dos presentes autos, considerou que não se aplicava o atual artigo 12.º-A do Código do Trabalho e que não se verificavam as características presuntivas previstas no artigo 12.º do Código do Trabalho.
Antes de mais cumpre dizer que as causas de nulidade da sentença são taxativas, constando o seu catálogo elencado no n.º 1 do artigo 615.º do CPC, o qual sob a epígrafe, “Causas de nulidade da sentença”, prescreve o seguinte:
“1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
2 - A omissão prevista na alínea a) do número anterior é suprida oficiosamente, ou a requerimento de qualquer das partes, enquanto for possível colher a assinatura do juiz que proferiu a sentença, devendo este declarar no processo a data em que apôs a assinatura.
3 - Quando a assinatura seja aposta por meios eletrónicos, não há lugar à declaração prevista no número anterior.
4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.”
Daqui resulta inequívoco que “as nulidades da sentença são vícios intrínsecos da formação desta peça processual, taxativamente consagrados no nº 1, do art. 615.º, do CPC, sendo vícios formais do silogismo judiciário relativos à harmonia formal entre premissas e conclusão, não podendo ser confundidas com hipotéticos erros de julgamento, de facto ou de direito, nem com vícios da vontade que possam estar na base de acordos a por termo ao processo por transação.”   Ou seja, as nulidades da sentença para além de se encontrarem taxativamente previstas no artigo 615.º do CPC. reportam-se a vícios estruturais ou intrínsecos da decisão, também, designados por erros de atividade ou de construção da própria sentença, que não se confundem com eventual erro de julgamento de facto e/ou de direito.
Defende a recorrente que não tendo o AA emitido faturas por serviços prestados à recorrente não podia o Tribunal a quo concluir pelo reconhecimento de um contrato de trabalho, como fez, a final, verificando-se assim a contradição entre os factos provados e a decisão assumida pelo tribunal a quo.
Para que se verifique a arguida nulidade da sentença impõe-se que exista uma verdadeira contradição entre os fundamentos e a decisão, apontando a fundamentação num sentido e a decisão num sentido diferente. Tal verifica-se quando a sentença sofre de um vício intrínseco à sua própria lógica, traduzido no facto da fundamentação em que se apoia não poder suportar o sentido da decisão que vem a ser proferida. Esta nulidade da sentença não abrange as situações em que está em causa apurar o adequado enquadramento jurídico feito na sentença e a conclusão que nela se chegou, se é ou não acertada ou injusta – erro de julgamento –, nem abrange as situações em que existe contradição entre os factos provados e a decisão, uma vez que contende apenas com a estrutura formal da decisão.
Como também refere o Prof. Antunes Varela, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 689, o seguinte: “a lei refere-se, na alínea c) do n.º 1 do artigo 668º à contradição real entre os fundamentos e a decisão e não às hipóteses de contradição aparente, resultantes de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão. (…) Nos casos abrangidos pelo artigo 668º, 1, c), há um vício real no raciocínio do julgador (e não um simples lapsus calami do autor da sentença): a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos direcção diferente.”
Como se refere a este propósito no Ac. do STJ de 03-03-2021, proc. n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt ”… essa nulidade verifica-se quando existe contradição entre os fundamentos exarados pelo juiz na fundamentação da decisão e não entre os factos provados e a decisão (cf. neste sentido acórdãos Supremo Tribunal de Justiça de 18.1.2018, Procº nº 25106/15.8T8LSB.L1.S1 e 31.1.2017, Procº nº 820/07.5TBMCN.P1.S1), ou, como se afirmou no acórdão de 11.1.2018, Procº nº 779/14.2TBEVR-A.E1.S1 “II – A errada interpretação e valoração jurídica de facto envolve erro de natureza jurídica que, comprometendo o acerto da fundamentação nessa parte, se repercute no mérito do aresto, sem beliscar, todavia, a sua regularidade formal”.
 Na verdade, a nulidade da sentença a que se reporta o artigo 615.º n.º 1 alínea c) do Código do Processo Civil, pressupõe um erro de raciocínio lógico que consiste no facto da decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la. Ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto.
De tudo isto resulta, que estamos na presença desta nulidade quando os fundamentos invocados pelo juiz deveriam logicamente conduzir ao resultado oposto ao que vem expresso na sentença, ou seja, a argumentação desenvolvida ao longo da sentença aponta de forma clara para um determinado sentido ou direcção e não obstante, a decisão é proferida em sentido oposto, ou pelo menos em direcção diferente.
Assim, não ocorre a dita nulidade quando o resultado a que o juiz chega na sentença deriva, não de qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão, mas da subsunção legal que entendeu melhor corresponder aos factos provados. Saber se tal enquadramento é ou não acertado constitui matéria que não cabe indagar em sede de nulidade de sentença.
Lendo e relendo a sentença recorrida, teremos desde já de dizer que não vislumbramos que ocorra a apontada contradição entre os fundamentos de facto invocados pelo juiz a quo (o direito aplicável) e a decisão proferida, pois esta traduz a conclusão lógica resultante da fundamentação, dela não constando qualquer erro de raciocínio.
Com efeito, os factos 57 e 58 dos pontos de facto provados, resultam das informações prestadas pela AT e pela Segurança Social e da sua conjugação com a restante factualidade apurada revelou-se de insuficiente para afastar o reconhecimento da existência de um contrato de trabalho estabelecido entre a recorrente e AA, conforme se alcança da decisão recorrida. Acresce dizer que, o facto de não se ter provado que no ano de 2023 o AA não emitiu faturas por serviços prestados à recorrente não põe em causa que tenha prestado serviços, nem tal é questionado pela recorrente. As razões porque não faturou em seu nome os serviços prestados não foram apuradas, nem tal nos parece ter qualquer relevo, já que não foi posto em causa que não tivesse prestado qualquer serviço, nem que não tivesse recebido a respetiva contrapartida.
Não se vislumbra assim que tenha sido cometida a arguida nulidade da sentença por contradição entre a fundamentação e a decisão.
Voltamos a reforçar que não ocorre qualquer violação às regras necessárias à construção lógica da sentença, já que os fundamentos de facto e de direito que dela constam estão em concordância lógica com a decisão, o silogismo seguido pelo julgador que se revela claramente compreensível, e que de forma alguma conduz a conclusão oposta ou diferente da que se encontra nela enunciada.
Poderá sim, discordar-se do suporte factual que conduziu à decisão, mas tal constituirá apenas um erro de julgamento e não a nulidade da sentença.
Defende ainda a Recorrente que a sentença é nula porque tendo dado como provada a mesma factualidade em 17 ações, deveria ter concluído também nesta pela inexistência do um contrato de trabalho, tal como sucedeu nas outras 15 ações idênticas.
Basta atentar na alegação da recorrente para se concluir que não se verifica nenhuma das causas de nulidade enumeradas nas diversas alíneas do n.º 1 do art.º 615.º do CPC., aliás porque a própria recorrente não indica qual a concreta nulidade cometida pelo Tribunal a quo, limitando a invocar a nulidade da sentença sem apontar a sua causa.
Na verdade, na sentença recorrida constam os fundamentos de facto e de direito que conduzem à decisão, tais fundamentos de facto e de direito não estão em oposição com a decisão proferida, nem tal sentença é ininteligível, antes pelo contrário, nada tem de ambígua ou obscura. Nem tão pouco se verifica qualquer uma das causas de nulidade da sentença previstas no art.º 615.º, n.º 1, al. d), pois o despacho incidiu sobre os requerimentos da recorrente e da recorrida, não indicando a Recorrente nenhuma verdadeira questão sobre a qual tivesse sido omitida pronúncia, e não tendo o Tribunal a quo conhecido de qualquer questão de que não podia conhecer, que, aliás, nem a recorrente identifica.
Por outro lado, voltamos a repetir que as nulidades da sentença reportam-se a vícios estruturais ou intrínsecos da decisão, designadamente da construção da própria sentença, que não se confundem com eventual erro de julgamento de facto e/ou de direito. Ainda que os factos apurados nas diversas decisões elencadas pela Recorrente possam ser idênticos o facto de conduzirem a desfechos diversos, poderá ou não constituir um erro de julgamento, mas não determinará seguramente a nulidade da decisão.
A questão suscitada pela Recorrente não consubstancia qualquer causa de nulidade da sentença, ao invés apenas traduz o motivo de discordância quanto à sentença que se pretende que seja revogada.
Pelo exposto, improcedem as conclusões da alegação de recurso atinentes à arguição de nulidades da sentença.

2. Da impugnação da matéria de facto
A Recorrente/Apelante veio impugnar a decisão da matéria de facto proferida pelo tribunal recorrido pretendendo que se dê como não provado, ou se altere a redação dos pontos 10, 15, 21, 22 (apenas na parte impugnada) e 39 dos pontos de facto provados, sustenta a sua pretensão no teor dos documentos juntos aos autos, no parecer do EMP03... junto aos autos e no teor dos depoimentos prestados pelas testemunhas em audiência de julgamento.
Vejamos:
A Recorrente/Apelante pretende a alteração da decisão sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova documental e na proa testemunhal gravada.
Dispõe o artigo 662.º n.º 1 do CPC. aplicável por força do disposto no n.º 1 do artigo 87.º do CPT. e no que aqui nos interessa, que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Importa salientar que se trata de meios de prova que imponham decisão diversa da impugnada e não que permitam, ou admitam, ou consintam decisão diversa da impugnada.

Por seu turno, o art.º 640.º do C.P.C. que tem como epígrafe o “ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, dispõe que:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b)Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
Do citado preceito resulta que quando se impugne a decisão proferida quanto à matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios que impõe decisão diversa, bem como, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Parcialmente cumprido pela Recorrente o ónus de impugnação cumpre apreciar.
Pretende a Recorrente que o ponto de facto 10 dos pontos de facto provados passe a constar dos factos não provados, porque contêm matéria genérica e conclusiva que está diretamente relacionada com o thema decidendum.
Do referido ponto de facto consta o seguinte:
10. O trabalho é efetuado através da plataforma.
Salvo o devido respeito por opinião em contrário, afigura-se-nos dizer que não assiste razão à recorrente, pois se é certo que o trabalho em questão não é efetuado na plataforma, pois a atividade do estafeta é realizada na rua, já que consiste no transporte de determinado bem de um sítio para o outro. Também é certo, como aliás resulta claro quer das condições de contratação dos estafetas, quer do afirmado no articulado apresentado pela recorrente, que o trabalho é efetuado através da plataforma, já que a mesma, tal como alega a recorrente, serve para intermediar o contato/pagamento entre os diversos utilizadores da aplicação, neles se incluindo o estafeta.
A factualidade que se fez constar do ponto 10 dos pontos de facto provados é de manter, uma vez que traduz apenas o papel que desempenha a plataforma na atividade desenvolvida pelo estafeta, sendo desprovida do cariz conclusivo que a recorrente lhe pretende atribuir.
Pretende a Recorrente que o ponto de facto 15 dos pontos de facto provados passe a constar dos factos não provados, defendendo que permissão de acesso à localização, apenas é necessária para a proposta de serviços, podendo, a partir desse momento, a mesma ser desligada, decorrendo todo o processo de entrega sem a localização ou o GPS ativo, resultando tal dos pontos 19 e 20 dos pontos de facto provados.
Do referido ponto de facto consta o seguinte:
15. Para prestar a sua actividade, os estafetas têm que activar a permissão de acesso à localização na Plataforma.
E dos pontos 19 e 20 dos pontos de facto provados consta o seguinte:
19. A geolocalização deve estar activa quando o pedido é efectuado para a providenciar os serviços de intermediação tecnológica.
20. Após a aceitação do pedido, e durante toda a respectiva execução, a geolocalização pode ser objecto de desactivação pelo prestador de serviços.
Ora, da conjugação destes pontos de facto resulta evidente que para iniciar a atividade o estafeta tem de ativar a permissão de acesso à localização na Plataforma, pois caso contrário não receberá qualquer proposta de serviço provinda da plataforma em causa. Assim, ainda que posteriormente o estafeta possa desligar a permissão de acesso à plataforma, o certo é que para iniciar a sua atividade tem de ativar tal permissão.
Não se vislumbra assim qualquer razão para dar como não provada tal factualidade, uma vez que o depoimento da testemunha arrolada pela recorrente também não a contraria, pois resulta de tal depoimento que os estafetas não estão obrigados a ter a geolocalização sempre ligada, contudo é necessário que a tenham no momento inicial em que estão a receber os pedidos, caso contrário, como nos parece óbvio, não receberão qualquer pedido.
Em suma, ao invés do entendido pela recorrente da globalidade da prova produzida, designadamente da conjugação do depoimento da testemunha CC com o depoimento de AA, afigura-se-nos ser de manter a redação do ponto 15 dos pontos de facto provados, já que os estafetas para poderem prestar o seu trabalho, designadamente, iniciá-lo, têm efetivamente de ativar a permissão de acesso à localização na Plataforma
Improcede nesta parte a impugnação da matéria de facto.
Pretende a Recorrente que se proceda à alteração dos pontos de facto 21 e 22, devendo o ponto 21 ser considerado de não provado e deverá proceder-se à alteração do ponto 22 dos pontos de facto provadas, da qual deverá passar a constar o seguinte:
22. A remuneração do serviço depende de um conjunto de variáveis, designadamente, a taxa de entrega/base (taxa de cada pedido), a distância (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega que o utilizador cliente seleccionar ao efectuar a encomenda na plataforma), o tempo de espera (tempo de espera do estafeta na recolha do pedido), o horário (sendo os de maior afluxo mais bem pagos), o multiplicador ( que incidirá sobre as taxa de entrega e que só pode ser alterado uma vez por dia) e outras variáveis (no caso de condições meteorológicas adversas, feriados, períodos de alta procura, etc).”
Dos pontos 21 e 22 dos pontos de facto provados consta o seguinte:
21. A Ré estabelece as condições de remuneração do serviço e deslocações, estabelecendo limites mínimos e máximos para o efeito, não existindo qualquer negociação prévia entre os estafetas e a Ré, quanto aos critérios subjacentes à definição dos valores.
22. A remuneração do serviço depende de um conjunto de variáveis, designadamente, a taxa de entrega/base (taxa de cada pedido), a distância (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega que o utilizador cliente seleccionar ao efectuar a encomenda na plataforma), o tempo de espera (tempo de espera do estafeta na recolha do pedido), o horário (sendo os de maior afluxo mais bem pagos), o multiplicador ( que incidirá sobre as taxa de entrega e que só pode ser alterado uma vez por dia) e outras variáveis (no caso de condições meteorológicas adversas, feriados, períodos de alta procura, etc), sendo que o estafeta só sabe o que vai receber relativamente a cada pedido a partir do momento em que o aceita.
A Recorrente depois de fazer umas extensas considerações sobre o que entendem acerca do estabelecimento das condições de remuneração dos serviços prestados pelos estafetas acaba por concluir que a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento confirma a sua tese ao entender que é totalmente infundada  a afirmação de que a ré/recorrente “estabelece as condições de remuneração do serviço e deslocações, estabelecendo limites mínimos e máximos para o efeito”, uma vez que a Recorrente não fixa quaisquer retribuições pelos serviços prestados pelo Estafeta, ou quaisquer limites.
Ora, é certo que da prova testemunhal produzida, quer até do teor do parecer junto aos autos, e, tal como resulta dos termos e condições de utilização da plataforma EMP01... para Estafetas, o valor da remuneração auferida pela prestação de cada serviço varia em face dos diversos critérios, todos eles fixados pela Ré/recorrente, ou seja, quem fixa ou fixou os critérios, bem como a sua relevância no estabelecimento do preço final, é a Ré, sendo certo que atenta a sua especificidade não se pode afirmar que é a Ré quem diretamente fixa o preço de determinado serviço, mas é ela quem fixa os critérios que determinam o preço do concreto serviço prestado.
Em suma, nem da prova testemunhal produzida, nem o parecer junto aos autos, impõe que se proceda à alteração da factualidade agora impugnada, pois tal prova não afasta nem contraria a outra prova documental – condições gerais de contratação dos estafetas – da qual resulta inequívoco que é a Ré quem estabelece as condições de remuneração do serviço e deslocações, estabelecendo limites mínimos e máximos para o efeito, não existindo qualquer negociação prévia entre os estafetas e a Ré, quanto aos critérios subjacentes à definição dos valores. Por outro lado, quer do relato das testemunhas, quer da demais prova produzida, documentos, parecer e depoimento do próprio estafeta, também se nos afigura de suficientemente apurado, que o estafeta só sabe o que vai efetivamente receber relativamente a cada pedido a partir do momento em que o aceita, até lá designadamente quando recebe a proposta só fica a saber do preço estimado, que poderá ou não coincidir com o preço auferido.
É de manter os pontos 20.º e 21.º dos pontos de facto provados.
Pretende a Recorrente que o ponto de facto 39 dos pontos de facto provados passe a constar dos factos não provados, para o efeito efetua uma série de considerações subjetivas e retira conclusões sem dar minimamente cumprimento ao prescrito na al. b) do n.º 1 do art.º 640.º, do CPC. ou seja, não indica os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham que tal factualidade tivesse sido dada como não provada, o que desde logo impõe que nesta nesta parte seja rejeitada a impugnação.
Em face do exposto rejeita-se a impugnação da factualidade que consta do ponto 39 dos pontos de facto provados.
Por fim pretende o recorrente que seja aditada à factualidade provada os seguintes factos:
A - “No ano de 2024, AA não emitiu faturas por serviços prestados à Ré, tendo emitido faturas por serviços prestados a outros adquirentes, tendo ainda emitido faturas por serviços prestados à plataforma da EMP02..., nos anos de 2023 e 2024.”
B - “AA prestou serviços de estafeta de forma intermitente e irregular, em função da sua disponibilidade.”
Para o efeito sustenta a sua pretensão no teor dos documentos juntos aos autos pela autoridade tributária e pela Segurança Social e transcreve parte do depoimento prestado por AA do qual resulta que, desde maio de 2024, trabalha como operador de produção por conta da empresa EMP05..., na ..., antes disso trabalhou durante cerca de um ano e meio, como condutor de TVDE, na EMP02... e por ter necessitado de um rendimento extra começou a trabalhar como estafeta primeiro na EMP02... e posteriormente na EMP01.... Por hábito fazia o horário dos jantares e só quando tinha disponibilidade. “Ligava quando tinha tempo e por regra à hora de jantar, por ser a hora em que há mais pedidos”. Não trabalha nas duas plataformas em simultâneo porque quando liga uma e lhe caía um pedido desliga logo a outra para não atrapalhar. Desta atividade de estafeta o máximo que conseguiu fazer numa quinzena foram €300,00 ou €350,00 e ultimamente, numa quinzena não retira mais do que €50,00 porque tem estado menos disponível para exercer esta atividade.
Mais refere a Recorrente que para além do carácter não regular e meramente esporádico da atividade de estafeta exercida pelo AA, este prestou várias outras atividades, inclusive, para a plataforma EMP02... e também como Sócio-Gerente e Trabalhador por Conta de Outrem, tudo conforme decorre dos documentos juntos pela Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) e pelo Instituto Segurança Social, I.P. De tudo isto resultando que os rendimentos de categoria A (TCO) auferidos pelo estafeta foram sempre muito superiores aos rendimentos de categoria B (trabalhador independente, onde supostamente se incluem os rendimentos auferidos pelos serviços prestados à Ré)
Ora, a Recorrente não esclareceu, nem indicou onde está alegada tal factualidade, nem se descortina que a mesma tenha sido alegada por qualquer um dos intervenientes, porém se sobre a mesma tivesse incidido discussão em audiência de julgamento, como terá sucedido, nos termos do prescrito no art.º 72 n.º 1 in fine do CPT, o Tribunal deveria ter tomado tal factualidade em consideração na decisão proferida.
Ora, a factualidade em questão não sendo de considerar de essencial poderia ser considerada pelo menos de complementar.
Atento o prescrito no art.º 72.º do CPT a segunda instância quando estejam em causa factos essenciais, complementares ou concretizadores que embora não alegados surjam no decurso da produção de prova, não pode fazer uso dos mesmos, por estar impossibilitada de dar cumprimento ao n.º 2 do citado preceito.[1]
Contudo, caso se possa concluir que a factualidade não alegada e carecida de alegação, de alguma forma tenha sido objeto de pronuncia pelo tribunal a quo, ao abrigo do prescrito no art.º 5 do CPC. não vislumbramos que haja qualquer obstáculo a que relativamente a ela sejam considerados os factos instrumentais concretizadores de outros que constem da factualidade apurada.
Melhor concretizando, de forma não explicita o Tribunal a quo utilizou o mecanismo prescrito no art.º 72.º do CPT, para dar como provados os seguintes factos, que não se encontravam alegados e que não foram objeto de qualquer impugnação.
“57. AA encontra-se enquadrado no regime de trabalhadores independentes, no regime de trabalhadores por conta de outrem e no regime de membro de órgão estatutário, para efeitos de segurança social.
58.No ano de 2023, AA não emitiu facturas por serviços prestados à Ré, tendo emitido facturas por serviços prestados a outros adquirentes no montante global de € 6.158,31, tendo declarado na declaração modelo 3 de IRS referente a esse ano, rendimento da Categoria B no montante de € 4.817,08 e rendimento da Categoria A no montante de € 9.825,93.”
Relativamente ao primeiro facto que se pretende aditar, por não ter não ocorrido qualquer pronúncia, nem o mesmo ser concretizador de quaisquer outros apurados, não se procederá à sua apreciação. De qualquer forma por tal factualidade se reportar a factos ocorridos depois de já ter sido proposta a presente ação sempre seriam de considerar de desprovidos de interesse para a boa decisão da causa.
No que respeita ao outro facto que se pretende aditar, apesar do seu caracter conclusivo o mesmo constitui a concretização parcial dos pontos de facto provados sob os n.ºs 57 e 58, resultando tal de forma inequívoca quer dos documentos juntos aos autos, dos quais resulta que o rendimento global do AA é preponderantemente proveniente do trabalho dependente, quer do depoimento do próprio estafeta AA, ao afirmar que trabalhou até Maio de 2024 como TVDE e atualmente trabalha como operador de produção numa empresa na ..., prestando este serviço de estafeta à hora do jantar quando tem disponibilidade, razão pela qual será deferido tal aditamento com uma redação concretizadora do pretendido.
Em face do exposto decide-se aditar aos factos provados o seguinte facto, que se fará constar do local próprio:
60 - “AA trabalhou nos últimos 2 anos por conta de outrem, designadamente como operador de TVDE e operador de produção, prestou e presta, ainda, serviços de estafeta utilizando, quer a plataforma da ré, quer a plataforma da EMP02..., apenas à hora do jantar, quando tem disponibilidade.”
Quanto ao mais improcede a impugnação da matéria de facto. 
3.Da qualificação do contrato
Cumpre agora proceder à análise da questão de direito que respeita à qualificação jurídica da relação contratual estabelecida entre a EMP01... e o AA, com início pelo menos desde Agosto de 2023 (ponto 52 dos pontos de facto provados), designadamente, apurar se a relação contratual não é de trabalho subordinado, como defende o Recorrente, por considerar que da matéria de facto provada resulta evidente a inexistência de subordinação jurídica e de inexistência de prestação de atividade no âmbito da organização da Recorrente. Mais defende a Recorrente que a factualidade apurada resulta evidente a existência de autonomia e independência do prestador de atividade face à Recorrente.
Antes, porém, deixamos consignado que a questão suscitada é similar às já apreciadas em diversos arestos deste Tribunal da Relação, alguns relatado pela ora relatora, designadamente o proferido, no passado dia 3 de Outubro de 2024, no Proc. n.º 2800/23....[2], em que a Ré/Recorrida era também a EMP01..., razão pela qual iremos seguir de perto o anterior entendimento, com as devidas adaptações que ao caso se imponham.
Na sentença recorrida foi reconhecida a existência de uma relação de trabalho subordinado, por considerar de existente um dos indicadores capazes de fazer funcionar a presunção de laboralidade prevista no art.º 12.º do Código do Trabalho e por se considerar de verificados os indicadores capazes de fazer funcionar a presunção de laboralidade prevista no art.º 12.º-A do Código do Trabalho, não resultando da factualidade provados quaisquer factos que ilidissem a presunção da existência de contrato de trabalho.
Em tal decisão considerou-se que o local de trabalho é determinado pela Ré/Recorrente, a globalidade dos instrumentos de trabalho não pertence à Ré, inexiste qualquer determinação de horários de inicio e termo da prestação da atividade pela Ré, inexiste com determinada periodicidade, o pagamento de uma quantia certa ao prestador de actividade, como contrapartida da mesma. Mas, por outro lado, considerou-se ainda na referida decisão, que é a Ré quem fixa o preço do serviço, os termos do seu pagamento ao prestador de actividade, apresentando-lhe um, preço para a entrega que este aceita ou recusa, inexistindo qualquer negociação, seja com a plataforma, seja com os estabelecimentos comerciais, seja com os clientes finais, não sendo suficiente para afastar este entendimento o facto de o prestador de actividade poder escolher um multiplicador, pois que, mesmo este, é padronizado pela Ré. A plataforma digital regula a tarefa a prestar pelos estafetas desde o momento da aceitação até à faturação, o que permite concluir que a Ré exerce o poder de direção e regulamenta a prestação da atividade e dos aspetos que a envolvem. A Ré tem, efetivamente, a faculdade de excluir o prestador de atividade de futuras atividades na plataforma, através da desativação da conta, nas situações previstas no ponto 5.2 dos termos e condições, ou seja, a Ré detém o controlo e supervisão da atividade e disponibilidade do prestador de atividade manifestado na possibilidade de aplicação de sanções.
Consigna-se que para apreciação do pleito iremos convocar apenas as normas da Código do Trabalho de revisto aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro na sua versão atualizada, designadamente com as alterações introduzidas pela Lei n.º 13/2023, de 13.04 (doravante CT) e do Código Civil, atenta a data de início da relação contratual, Agosto de 2023, sendo certo que a questão que desde já se coloca é a de saber se a relação contratual estabelecida entre o estafeta e a Recorrente é de natureza laboral, verificando-se a presunção estabelecia no art.º 12.º - A do CT.
Estabelece o artigo 11.º do CT, indo de encontro ao disposto no artigo 1152.º do Código Civil, que o contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas.
Por seu turno prescreve o artigo 1154.º do Código Civil, que contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.
Destes conceitos resulta que o contrato de trabalho tem por objeto a prestação de uma atividade e o contrato de prestação de serviço a obtenção de um certo resultado proveniente do trabalho prestado por outrem, sendo certo que apenas o primeiro é necessariamente oneroso.
Quer a doutrina[3], quer a jurisprudência[4] têm vindo ao longo dos anos a salientar, que o que verdadeiramente distingue o contrato de trabalho do contrato de prestação de serviços é a chamada subordinação jurídica de uma das partes em relação à outra, subordinação essa que só no contrato de trabalho existe. Tenha-se presente que a subordinação jurídica atualmente não está apenas associada à sujeição de ordens e instruções, pois as atuais formas de organização laboral que premeiam a autonomia técnica dos trabalhadores, levam a que a subordinação jurídica signifique que o prestador esteja inserido num ciclo de trabalho produtivo alheio, estando vinculado à observação dos parâmetros de organização e funcionamento definidos pelo beneficiário da atividade.
Ora, o contrato de trabalho tem assim como objeto a prestação de uma atividade e como elemento que o distingue dos demais a subordinação jurídica, que se traduz não só no poder que o empregador tem de através de ordens, instruções e diretivas, conformar a prestação a que o trabalhador se obrigou, mas também que o prestador do trabalho esteja integrado na estrutura organizativa do beneficiário da actividade.
Por seu turno, o contrato de prestação de serviço visa, apenas, a obtenção de um determinado resultado que a parte sujeita a tal obrigação obterá por si, em regime de autonomia, não sendo este trabalho dominado e organizado pelo beneficiário da atividade (que apenas controla o produto final), mas sim por quem o fornece. Em suma não está sujeita ao poder de direção e de fiscalização da outra parte.
Nem sempre é fácil distinguir estas duas figuras contratuais, atenta a dificuldade em perceber o que ficou estabelecido e o que era pretendido – se a atividade em si ou se o seu resultado, razão pela qual a subordinação jurídica é, pois, o elemento fundamental e diferenciador do contrato de trabalho e traduz-se numa posição de supremacia do credor da prestação de trabalho (o empregador) e na correspondente sujeição do prestador da atividade (o trabalhador), cuja conduta pessoal, na execução do contrato, está necessariamente dependente das ordens, regras ou orientações ditadas pelo empregador, dentro dos limites do contrato e das normas que o regem.
Podemos assim concluir que o contrato de trabalho se caracteriza essencialmente pelo estado de dependência jurídica em que o trabalhador se coloca face à entidade empregadora e que resulta da circunstância do trabalhador se encontrar inserido na organização produtiva do empregador e submetido à autoridade e direção deste, enquanto na prestação de serviço não se verifica essa subordinação, considerando-se apenas o resultado da atividade.
Importa salientar que em termos de repartição do ónus da prova, cabe ao trabalhador fazer a prova dos elementos constitutivos do contrato de trabalho, isto é, demonstrar que presta uma atividade remunerada para outrem, sob a autoridade e direção do beneficiário (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil).
Reconhecendo a dificuldade na identificação em concreto dos dois tipos de contrato, o legislador optou por consagrar no art.º 12.º do Código do Trabalho a presunção de laboralidade, vindo assim a inverter o ónus da prova da existência do contrato de trabalho nos termos do art.º 350.º do Código Civil, dai decorrendo que na presença de alguns dos indícios enunciados no citado art.º 12.º do CT, fica-se dispensado de demonstrar, nos termos gerais do artigo 342.º do Código Civil, que a atividade desenvolvida para o empregador mediante o pagamento de uma importância monetária é prestada numa posição de subordinação (no caso, estando o Ministério Público colocado na posição do trabalhador, beneficia da presunção de laboralidade se ficar demonstrada a respetiva factualidade). Naturalmente esta qualificação pode ser afastada se o empregador lograr provar a autonomia do trabalhador ou a falta de qualquer outro elemento essencial do contrato de trabalho.
Contudo, os novos desafios na área laboral, designadamente o crescer das novas formas de trabalho, na área digital, como seja o trabalho nas plataformas digitais, veio a revelar que a presunção consagrada no artigo 12.º do CT não dava resposta satisfatória, para enfrentar os novos tipos de dependência resultantes da prestação de serviços via plataformas digitais.
Como se refere no “Livro Verde Sobre o Futuro do Trabalho 2021”, a propósito do trabalho nas plataformas digitais «a circunstância de o prestador de serviço utilizar instrumentos de trabalho próprios, bem como o facto de estar dispensado de cumprir deveres de assiduidade, pontualidade e não concorrência, não é incompatível com a existência de uma relação de trabalho dependente entre o prestador e a plataforma digital».
Como salienta Teresa Coelho Moreira e Marco Carvalho Gonçalves[5]  “atualmente há uma app para tudo ou quase tudo, desde atividades mais simples, como entrega de alimentação, até atividades mais complexas, como prestação de serviços jurídicos, surgindo todos os dias novas plataformas digitais. Na verdade, em teoria, qualquer atividade pode ser plataformizada”.
O trabalho prestado com recurso a plataformas digitais, designadamente o que nos proporciona uma alternativa de transporte ao táxi, seja o que nos permite encomendar o almoço ou o jantar através de uma app, tem colocado diversas questões jurídicas a quais cabe destacar a qualificação da relação que se estabelece entre a empresa que opera na plataforma digital e os respetivos prestadores de serviços, designadamente os que se dedicam à recolha e entrega de mercadoria, conhecidos por “estafetas”.
Perante a dificuldade na qualificação da referida relação contratual e a inadequação da presunção de laboralidade, nos moldes estabelecidos pelo CT, para enfrentar os problemas emergentes das novas formas de trabalhar através de plataformas digitais, o legislador português reconheceu a necessidade criar uma presunção de laboralidade, adaptada às novas formas de prestar trabalho via apps e após várias versões foi aprovado o artigo 12º-A, pela Lei n.º 13/2023, de 13.04 (lei que alterou o Código do Trabalho), com a epígrafe Presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital, que entrou em vigor em 1.05.2023. Trata-se de uma presunção legal, o que origina a inversão do ónus da prova nos termos do art.º 344.º do CC, mas é ilidível e, por isso, admite prova em contrário. Contudo basta a verificação de pelo menos duas das caraterísticas elencadas nas alíneas do n.º 1 do citado artigo 12.º-A do CT, para se presumir a existência de contrato de trabalho.
É quanto ao entendimento assumido pelo Tribunal a quo, ao sustentar que estão verificados os requisitos previstos nas alíneas a), b) e e) do n.º 1 do artigo 12.º-A, do CT, concluindo, assim, pela existência presumida do contrato de trabalho entre a Ré e AA, que a Recorrente se insurge.
Sustenta, assim, a Recorrente que os requisitos que constam das alíneas a), b) e e) do n.º 1 do referido artigo não se verificam não estando assim provada a presunção de contrato de trabalho, sendo por isso de revogar a sentença recorrida. Caso assim não se entenda, defende a recorrente que atenta a factualidade provada a presunção se mostra ilidida, a que acresce ainda o facto da aplicação do art.º 12-A do CT ser ilegal, por violação do disposto nos artigos 13.º, 18.º, n.º 2 e 3 e 61.º da Constituição da Republica Portuguesa.
Como referem Teresa Coelho Moreira e Marco Carvalho Gonçalves[6]o que está na lei é uma presunção e ilidível que visa facilitar e clarificar a distinção entre quem é verdadeiro trabalhador autónomo e quem é um falso trabalhador autónomo perante estas novas formas de prestar trabalho. Não significa que todos que prestam atividade nas plataformas sejam trabalhadores. Quem for verdadeiro autónomo continuará a ser.”

Vejamos se o AA é um verdadeiro ou um falso trabalhador autónomo:

Decorre do disposto no art.º 12.º-A do CT, que se presume a existência de um contrato de trabalho sempre que entre o prestador de atividade e a plataforma digital se verifiquem algumas (pelo menos duas) das seguintes características enunciadas ao longo das seis alíneas que integram o seu n.º 1:
a) A plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela;
b) A plataforma digital exerce o poder de direção e determina regras específicas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade;
c) A plataforma digital controla e supervisiona a prestação da atividade, incluindo em tempo real, ou verifica a qualidade da atividade prestada, nomeadamente através de meios eletrónicos ou de gestão algorítmica;
d) A plataforma digital restringe a autonomia do prestador de atividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos, através da aplicação de sanções, à escolha dos clientes ou de prestar atividade a terceiros via plataforma;
e) A plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta;
f) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem à plataforma digital ou são por esta explorados através de contrato de locação.
Por outro lado, resulta dos n.ºs 3 e 4 do citado artigo 12.º A do CT, que o disposto no n.°1 se aplica, independentemente da denominação que as partes tenham atribuído ao respetivo vínculo jurídico (n.° 3); e que a presunção prevista no n.°1 pode ser ilidida nos termos gerais, “nomeadamente se a plataforma digital fizer prova de que o prestador de atividade trabalha com efetiva autonomia, sem estar sujeito ao controlo, poder de direção e poder disciplinar de quem o contrata” (n.° 4).
Acompanhando e subscrevendo a apreciação critica à presunção de laboralidade efetuada pelo Prof. Leal Amado[7] diremos “que aludir, na base da presunção, ao exercício de “poder de direção” (al. b) e de “poder disciplinar” (al. e) por parte da plataforma digital “constitui uma autêntica petição de princípio, já que se o prestador de atividade provar que a plataforma digital exerce sobre ele tanto o poder de direção como o poder disciplinar não parece que tenha nada mais a provar para que o tribunal conclua, diretamente e sem dar um salto no desconhecido, que está perante um contrato de trabalho. Não há, aqui, qualquer ilação, o que há é um mero raciocínio circular.
Por outro lado, o preceito merece também críticas pelo que falta nas suas alíneas, porque cremos que a lei deveria ter concedido atenção, neste âmbito, à circunstância de o prestador não dispor, perante o cliente, de uma organização empresarial própria, encontrando-se inserido numa organização de trabalho alheia. Isto tanto mais quanto se sabe que a própria noção legal de contrato de trabalho, vertida no artigo 11° do CT, deixou de aludir à “direção” patronal, tendo substituído esse termo pela ideia de inserção do trabalhador no “âmbito de organização” da entidade empregadora.”
E mais à frente a propósito dos n.ºs 3 e 4 do art.º 12-A do CT, assertivamente refere o seguinte: “(…) está muito bem, dado que a presunção legal surge como forma de auxiliar o aplicador do direito na tarefa de qualificar corretamente uma dada relação jurídica, aplicando o chamado “princípio da primazia da realidade”, segundo o qual “os contratos são o que são, não o que as partes dizem que são”. Mas, por outro, denota a fraca técnica jurídica do legislador, o qual, a um tempo, se refere ao poder de direção e ao poder disciplinar da plataforma, como base da presunção, e, em simultâneo, usa a ausência de poder de direção e de poder disciplinar como forma de ilidir a presunção por ele estabelecida…”
Aqui chegados, e não se questionando que a Recorrida EMP01... é detentora de uma plataforma digital para efeitos de aplicação do artigo 12º-A do CT, cabe proceder à análise da matéria de facto apurada a fim de se concluir ou não pelo preenchimento de duas ou mais das circunstâncias descritas nas alíneas do n. º1 do art.º 12.º-A do CT
Quanto à al. a) do n.º 1 do art.º 12º. -A do CT da qual resulta que “… a plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela.”
Resulta da factualidade provada que é através da App que o “estafeta” recebe a informação relativa à oferta de serviço de entrega e remuneração a receber. Mais se apurou que a remuneração do serviço depende de um conjunto de variáveis, designadamente, a taxa de entrega/base (taxa de cada pedido), a distância (número de quilómetros do ponto de recolha até ao ponto de entrega que o utilizador cliente seleccionar ao efectuar a encomenda na plataforma), o tempo de espera (tempo de espera do estafeta na recolha do pedido), o horário (sendo os de maior afluxo mais bem pagos), o multiplicador (que incidirá sobre as taxa de entrega e que só pode ser alterado uma vez por dia) e outras variáveis (no caso de condições meteorológicas adversas, feriados, períodos de alta procura, etc), sendo que o estafeta só sabe o que vai receber relativamente a cada pedido a partir do momento em que o aceita.
Daqui resulta inequívoco que não ocorre qualquer negociação quanto aos termos em que a remuneração do estafeta é fixada, sendo da exclusiva responsabilidade da ré/recorrente a determinação dos critérios, nele se incluindo o multiplicador que é o único critério que, ainda que de forma residual, permite ao estafeta alguma margem de manobra, ao que tudo indica sem grande sucesso, pois se opta pelo multiplicador mais elevado passa a receber menos pedidos, tal como o estafeta afirmou. O certo é que a margem de manobra do estafeta na determinação do preço pelo serviço se reduz aos limites máximos e mínimos do multiplicador, esses também fixados pela Ré.
Importa referir que resulta dos “Termos e Condições de Utilização da Plataforma EMP01... para Estafetas” – a que os estafetas têm que aderir (contrato de adesão) -, no seu ponto 5.1.6 que “o Estafeta aceita que os Estabelecimentos Comerciais e o Utilizador Cliente peça um serviço de entrega de acordo com o preço e a qualidade em conformidade com as orientações de mercado”. E no ponto 5.5.1 “(…) Você pode determinar e escolher o preço dos seus serviços através da Plataforma EMP01.... A EMP01..., para fins informativos, com base em informações de mercado, irá sugerir um preço de mercado que poderá ser alterado diariamente pelo Estafeta através do seu Perfil de Utilizador, sem que isso implique garantias de adjudicação do serviço. (…)”.
Desta factualidade resulta que a alteração do preço pelo estafeta verifica-se pela definição do multiplicador, entre valores pré-fixados, pela EMP01..., sendo o valor da taxa de entrega determinado pela ré. O que significa que é a ré quem fixa o “preço de mercado”, e não o estafeta, que tendo uma intervenção praticamente nula ou inexistente na fixação da taxa de entrega (apenas pode dentro dos limites definidos, alterar o multiplicador), a opção que tem, caso não aceite o preço do serviço, é recusá-lo, ficando assim impedido de auferir o rendimento.
Por fim, acresce dizer que não podemos concordar, nem concluir, que o valor da contrapartida devida ao estafeta por cada entrega seja determinado pela intervenção de três agentes - o estafeta, o cliente e o estabelecimento comercial - , pois apesar de no seu cálculo pesar o concreto serviço pedido pelo cliente, a distância do estabelecimento ao cliente, bem como o multiplicador escolhido pelo estafeta, o certo é que é a Ré, quem assume o papel determinante na fixação do valor da contrapartida, já que é quem estipula os valores de referência que constam da plataforma e que determina o preço a cobrar por cada serviço, que se reflete no valor que vem a ser liquidado ao estafeta.
 Em suma, não ocorre qualquer negociação quanto aos termos como a remuneração do estafeta é fixada, sendo da exclusiva responsabilidade da ré a determinação dos critérios, ainda na parte em que permite ao estafeta alguma manobra, pois, mesmo esta, é padronizada pela plataforma EMP01....
Como se refere no Ac. desta relação, processo n.º 2838.223.1T8VRL.G1, “o pensamento atual que acompanha as ditas novas forma de organização de trabalho, acentua que o mais importante é saber se os critérios de determinação da retribuição são ditados pelo beneficiário da atividade (no caso a taxa de encargo, por quilómetro), ou se são verdadeiramente negociados entre as partes, em pé de igualdade, o que, isso sim, é próprio do trabalho autónomo.”
É de salientar que ao depararmos com as novas formas de organização do trabalho os critérios de determinação da retribuição também se alteraram, importando distinguir quem os dita: o beneficiário da atividade ou se são negociados entre as partes, em pé de igualdade, como é típico do trabalho autónomo.
Por último, diremos que o facto do estafeta, não estar obrigado a aceitar todas as propostas apresentadas pela App, ou seja, tem à sua disposição a faculdade de recusar qualquer proposta de entrega, designadamente por não concordar com a contrapartida, revela-se de insuficiente para afastar o facto de ser a plataforma quem determina a retribuição do estafeta. Ao invés, reforça até a convicção de que efetivamente há uma fixação unilateral da contrapartida pela prestação do serviço do estafeta determinada pela plataforma, pois este pode, caso assim, o entenda aceitar ou não prestar o serviço, mas daqui não resulta qualquer possibilidade de negociação do seu preço.
Em suma, está verificada a circunstância prevista na alínea a) do n.º 2 do art.º 12-A do CT, ou seja, «a plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efectuado na plataforma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela», uma vez que os critérios de determinação da retribuição são ditados pelo beneficiário da atividade.
Da alínea b) do n.º 1 do art.º 12-A do CT resulta que a plataforma digital exerce o poder de direcção e determina regras especificas, nomeadamente quanto à forma de apresentação do prestador de atividade, à sua conduta perante o utilizador do serviço ou à prestação da atividade.
Esta alínea reporta-se ao poder de direção no que respeita ao modo do exercício da atividade e sua regulamentação.
Da factualidade provada, designadamente dos pontos 2 a 4, 11 a 16, 19, 31, 38, 53 e 59, resulta que o serviço de entregas gerido pela Recorrente impõe a observação de algumas regras designadamente o dever dos estafetas se inscreverem na App, a necessidade de ligação à App para poderem receber propostas de entregas e aceitá-las, recurso à geolocalização para poder ser aceite determinada proposta de entrega, sendo também obrigatório possuir mochila isotérmica para o transporte de refeições. Daqui resulta manifesto que existe um procedimento prévio padronizado que está definido para todos os interessados em exercer a atividade em causa e que estes têm de observar, para o acesso/inscrição na plataforma por parte dos estafetas. Trata-se de requisitos prévios ao início da atividade, razão pela qual não podemos falar de regras específicas conformadoras da atividade.
Contudo da referida factualidade também resultou apurado que após a observação do procedimento prévio o estafeta tem ainda que observar outros procedimentos referentes ao exercício concreto da sua atividade.
Assim, o estafeta quando aceita o serviço de um cliente tem que cumprir o procedimento instituído pela recorrida, o que significa que tem que se dirigir à morada do estabelecimento, onde recolhe o produto e depois tem de se dirigir à morada do utilizador cliente onde efetua a entrega. Ao estafeta são fornecidos os dados relevantes para fazer a recolha e a entrega do produto, tais nome e morada do estabelecimento e do utilizador como a distância estimada os dados do pagamento, lista dos artigos do pedido e valor do mesmo. Estão também definidos pela recorrida, designadamente nos “Termos e Condições de Utilização da plataforma EMP01... para Estafetas” os procedimentos referentes à recusa de entregas, bem como as regras a observar quanto ao pagamento do preço. Ou seja, a Ré/Recorrente organiza e gere através da App, os serviços de entregas de mercadorias, assegurados por estafetas, designadamente quanto à indicação de locais de recolha e entrega dos produtos, recebendo em contrapartida os estafetas um valor por cada entrega, valor este que é determinado por critérios ditados pela Ré.
Daqui resulta inequívoco que a ré/recorrente não definiu apenas regras especificas prévias ao início da atividade, mas definiu e regulou o próprio exercício da atividade dos estafetas, através de procedimento padronizado, ou seja, regulou todos os passos essenciais da conduta a observar por qualquer estafeta quer para aceder, quer para executar o serviço proposto pela plataforma gerida pela Recorrente, ao estipular as regras respeitantes ao momento da aceitação do pedido de entrega, ao momento da entrega propriamente dito, à facturação dos serviços prestados, à reputação associada ao seu perfil e à utilização da geolocalização.
 Em suma, Ré atenta a atividade que desenvolve regulou no essencial todo o seu ciclo produtivo nele se incluindo as tarefas e a conduta que o estafeta tem de observar perante o utilizador/cliente, bem como a própria prestação da atividade em si, que é o que basta para podermos concluir pela verificação da alínea b) do n.º 2 do 12.º -A do CT. no segmento que prevê que a ré exerce o poder de direção ao ditar regras especificas quanto à conduta do estafeta perante o utilizador do serviço e quanto à prestação da atividade.
Está assim verificada a característica presuntiva prevista na al. b), do n.º 1 do art.º 12.º A do CT.
Da alínea e) do n.º 1 do art.º 12-A do CT resulta que “A plataforma digital exerce poderes laborais sobre o prestador de atividade, nomeadamente o poder disciplinar, incluindo a exclusão de futuras atividades na plataforma através de desativação da conta”
Esta alínea reporta-se ao controlo, à supervisão da atividade, bem como à possibilidade de aplicação de sanções.
Quanto à alínea e) sustenta a Recorrente que a mesma não se encontra verificada porque apesar de sempre o ter admitido, apenas procede à desativação da conta em casos que assumem gravidade, nomeadamente quando se verificam situações de violação de lei ou de fraude e tal não se confunde com a aplicação de sanções, nem com o exercício dos poderes laborais, designadamente como poder disciplinar.
Dos factos provados apurou-se que a Ré pode excluir os estafetas de futuras atividades na plataforma através da desativação da conta, podendo, temporariamente, restringir o acesso à aplicação, ou mesmo desativar a conta em definitivo, no caso de suspeita de violação das obrigações assumidas pelo estafeta aquando da sua vinculação, designadamente se permitir a utilização da conta por terceiros sem prévia comunicação, ou for apresentada queixa contra o mesmo por motivos de fraude, sendo que, apenas procede à desactivação da conta em casos que assumem gravidade, nomeadamente quando se verificam situações de violação de lei ou de fraude (entendida como violação dos Termos e Condições, do modo a garantir uma plataforma idónea e segura para todos os utilizadores).
Melhor concretizando prevê nos “Termos e Condições de Utilização da Plataforma EMP01... para Estafetas”, designadamente no ponto 5.2 que “(…) uma Conta Estafeta pode ser temporária ou permanentemente desativada se: a. Em conformidade com o Código de Ética que rege todos os Utilizadores da Plataforma, utilizar a Plataforma para insultar, ofender, ameaçar e/ou agredir Terceiros, nomeadamente, Utilizadores Cliente, Estabelecimentos Comerciais, outros Estafetas e pessoal da EMP01... b. Violar a lei ou quaisquer outras disposições dos Termos e Condições Gerais ou outras políticas da EMP01... c. Participar em atos ou conduta violentos. d. Violar os seus direitos na aplicação da EMP01..., causando danos materiais e/ou imateriais a outro Utilizador da plataforma (Estafetas, Utilizadores Cliente e/ou Estabelecimentos Comerciais). e. Na prevenção de ações fraudulentas, se a identidade do Utilizador da Plataforma e/ou dos seus substitutos ou subcontratantes não puder ser verificada e/ou qualquer informação prestada por si e/ou os seus substitutos ou subcontratantes estiver incorreta. f. A fim de prevenir a segurança de todos os Utilizadores da Plataforma em caso de violação da Política de Mercadorias (…)”,
E mais consta dos “Termos e Condições de Utilização da Plataforma EMP01... para Estafetas”, designadamente no ponto 5.4, com a epígrafe “Segurança dos Serviços e da Plataforma da EMP01...”, o seguinte:
5.4.1 Em certos casos, por uma questão de prevenção de fraudes, poderá ter de apresentar prova da sua identidade e/ou, se aplicável nos termos da legislação local, dos seus substitutos ou subcontratantes para aceder ou utilizar os Serviços e aceita que lhe pode ser negado acesso aos Serviços e à utilização dos mesmos se você ou os seus substitutos ou subcontratantes recusarem fornecer essa prova de identidade. A EMP01... pode também recorrer a terceiros fornecedores de serviços para efeitos de verificar a sua identidade ou a dos seus substitutos ou subcontratantes.
5.4.2 A EMP01... pode, mas não é obrigada, monitorizar, rever e/ou editar a sua Conta. A EMP01... reserva-se o direito de, em qualquer caso, eliminar ou desativar o acesso a qualquer Conta por qualquer motivo ou sem motivo, até mesmo se considerar, a seu critério exclusivo, que a sua Conta viola os direitos de terceiros ou direitos protegidos pelos Termos e Condições.
5.4.3 A EMP01.... pode adotar essa ação sem aviso prévio feito a si ou a um terceiro. A eliminação ou desativação do acesso à sua Conta de Utilizador será a critério exclusivo da EMP01... e não há qualquer obrigação de eliminar ou desativar o acesso em relação a Estafetas específicos.”
Daqui resulta inequívoco, tendo presente esta nova realidade laboral, que é o trabalho nas plataformas, que no contrato de adesão a Ré dispõe de um grande poder de tutela sobre o estafeta, quanto a variadas regras e exigências que constam do contrato, que vão muito além das situações de proteção de terceiros e do cometimento de fraudes ou crimes, podendo vedar-lhe o acesso à plataforma.
 Tal como se refere no Ac. RG de 3-10-2024, processo nº 2838/23.1T8VRL.G1, disponível em www.dgsi.pt “tal corresponde a um amplo poder de tutela que não se compagina com uma relação de trabalho autónomo, quer pela amplitude de razões que levam a “sanções” (utilizando-se clausulas abertas como “violação das obrigações” ou “deixar de cumprir ou atingir os requisitos destes Termos”), bem assim como pela gravidade das consequências do eventual incumprimento (cessação da atividade).”
Em suma, a faculdade de exercício de poderes de autotutela pela ré, em face do eventual incumprimento pelo estafeta, que permite à ré suspender, eliminar ou desativar o acesso a qualquer conta do estafeta, com motivo ou sem motivo, a seu critério exclusivo, quando a visualização de propostas de entrega depende necessariamente da consulta da App., significa que a Ré nestas circunstâncias se mune de poderes laborais sobre o prestador da atividade, que não podem deixar de ser considerados como manifestação do poder disciplinar.
Mostra-se assim preenchida a característica presuntiva referida na al. e), do n.º 1 do art.º 12.º - A do CT.
Em suma, consideramos, tal como foi entendido na sentença recorrida, que se verificam as caraterísticas previstas nas alíneas a), b) e e) do n.º 1 do art.º 12-A do CT, estando assim preenchida a presunção de existência do contrato de trabalho, sem prejuízo de poder vir a ser ilidida.
Cumpre agora verificar se a factualidade apurada nos permite ilidir a presunção de contrato de trabalho, desde logo demonstrando a Ré/Recorrente que o estafeta presta a sua atividade de forma autónoma.
Tal como refere o n.º 4 do citado art.º 12.º-A do CT a plataforma digital tem de fazer prova de que “o prestador da atividade trabalha com efetiva autonomia, sem estar sujeito ao controlo, poder de direção e poder disciplinar de quem o contrata”.
Importa realçar que para ilidir a presunção não basta a mera contraprova que coloque em dúvida a existência da relação laboral, ao invés impõem-se que da factualidade apurada se possa concluir que apesar da verificação dos índices caracterizadores da relação laboral, a relação concretamente existente tem uma natureza diversa, designadamente poderá tratar-se de uma relação de prestação de serviços.
Como referem a propósito da ilisão da presunção João Leal Amado e Teresa Coelho Moreira[8]a prova por presunção ilidível assume o valor de prova plena, apenas podendo ser afastada mediante a prova do contrário, ou seja, de que o facto presumido não se verificou ou de que se verificou outro com ele incompatível, não bastando a mera contraprova, ou seja, a prova que gere a simples dúvida no espírito do julgador (vide, a este propósito, o disposto nos artigos 346.º e 347.º do Código Civil). Os tribunais deverão, por isso, ser exigentes quanto a esta prova em contrário, não se bastando com a simples presença de elementos factuais que gerem dúvida na mente do julgador. A presunção legal serve, precisamente, para isso, para guiar o tribunal nos casos de dúvida, estabelecendo que quem tem a seu favor a presunção escusa de provar o facto (in casu, o contrato) a que ela conduz.”
Para ilidir a presunção importa assim averiguar se a Ré logrou provar, no caso concreto, se o estafeta, apesar das condições impostas, desprovidas de qualquer negociação, pela Ré/Recorrente, tendo em conta o modelo de negócio em causa, ainda assim, dispõe de tal liberdade, que por um lado, não permite que a estrutura organizativa da Ré/Recorrente possa contar com a sua prestação como elemento disponível e útil na sua organização, e por outro que o estafeta não esteja dependente no que respeita ao seu sustento, do rendimento proveniente de tal atividade.
Como se refere no Ac. de 17.10.2024, deste tribunal[9] “As “prerrogativas” de que o trabalhador dispõe, são no essencial, e tendo em consideração a realidade económica e social em que a relação se desenvolve, ou sem relevo prático ou conferindo embora alguma autonomia sem desvirtuar e essencialidade da subordinação económica do estafeta e da sua dependência da “estrutura económica organizada” pertença da ré.
No que respeita à escolha dos tempos de trabalho, circunstância que constitui uma das caraterísticas novas desta realidade de trabalho (à peça – on demand), importa não esquecer que a mesma constitui uma decorrência deste tipo de trabalho, não sendo desfavorável à ré, que assim não tem que custear os tempos “mortos”. Esta nova forma de fixação de tempos de trabalho, e do ponto de vista das “plataformas”, como que se centra, não na relação individual (com um concreto estafeta), mas no conjunto de estafetas disponíveis – e queremos significar que, do ponto de vista da ré (como prestadora da atividade através do estafeta), importa assegurar a execução do serviço, seja por qual deles for, sabendo que tal ocorrerá, devido ao “exercito” de estafetas disponíveis, e à dependência económica destes.
A dependência económica do estafeta, fará com que ele esteja disponível, de outro modo não aufere rendimento. Volvem-se assim tais prerrogativas em alguma autonomia, que não põem em causa, considerando o quadro desta nova realidade, a dependência do estafeta em relação à ré.
O trabalhador vê-se compelido a prestar mais horas a manter-se conectado, sendo aparente a autonomia. Teresa Coelho, loc. referido, fala de “servidão voluntária”, pela interiorização das ideias pelo trabalhador, e uma “gestão realizada por objetivos”, que torna desnecessário o comando expresso do empregador. Pág. 162 e 163.”
Importa salientar que perante as novas formas de trabalhar através das plataformas digitais alguns dos indícios clássicos de subordinação jurídica, não são de considerar operacionais, nem são de valorizar, pois só por si não afastam o novo tipo de dependência resultante de serviços prestados via plataforma digital. Entre os mencionados indícios estão os relativos ao local de trabalho, à propriedade dos instrumentos de trabalho e equipamentos, ao horário de trabalho determinado pelo beneficiário da atividade e o pagamento de retribuição certa, porque efetivamente não se adequam à atividade desempenhada por estes trabalhadores. Nesta nova era digital temos um trabalhador subordinado com contornos distintos dos tradicionais, mas ainda assim dependente e subordinado na forma como desenvolve a sua atividade, sendo certo que a ausência dos mencionados indícios é compensada por outros que são reveladores da subordinação perante a empresa que gere a plataforma, tais como o facto do estafeta estar inserido dentro da estrutura organizativa da empresa que gere a plataforma, recebendo ordens e instruções através do procedimento padronizado que se mostra instituído, estando também sujeito ao regime sancionatório por aquela implementado.
A recorrente refere que a situação em causa não constitui um contrato de trabalho, ao invés reveste as características do contrato de prestação de serviços atenta a autonomia com que é exercida a atividade.
Vejamos;
Os factos com relevo para apreciação desta questão são os seguintes:
- Para o exercício da atividade de comércio a retalho por via eletrónica (exploração de uma plataforma), a Ré recorre a estafetas que não estão inscritos como trabalhadores no seu quadro de pessoal, entre os quais AA.
- Para o desenvolvimento da sua atividade, os estafetas, entre os quais AA, através de um dos sítios da internet pertencentes à Ré, criam sua própria conta na plataforma, efetuando o respetivo registo na modalidade de “utilizador estafeta”, demonstrando cumprir os seguintes requisitos: ser maior de idade; ter veículo próprio (bicicleta, mota, trotinete ou carro); ter documento de identificação (cartão de Cidadão Europeu, Título de Residência ou passaporte com manifestação de interesse, frente e verso); ter comprovativo de atividade aberta nas finanças, comprovativo de ATCUD (código único de documento).  
- No âmbito de uma acção inspectiva levada a cabo pelo ACT, no dia 20 de Setembro de 2023, pelas 13 horas, no EMP04... de ..., sito na Av.ª ...,  a Inspectora do ACT identificou AA, com o NIF ...10, nascido em ../../1984, nacionalidade ... e residente na Tv. ..., ... ..., que ali se encontrava a prestar a actividade de estafeta, munido de uma mochila térmica e de um telemóvel, aguardando um pedido de entrega de comida já efectuado por um cliente através da aplicação da Ré, para, de seguida, após recolha do mesmo, se dirigir à morada indicada pelo cliente para proceder à entrega da encomenda.
- AA efectuou a sua inscrição na plataforma “EMP01...” em data não concretamente apurada, mas anterior a Agosto de 2023, prestando a sua actividade pelo menos desde essa data.
- Entre Agosto de 2023 e Novembro de 2023, AA optou 27 vezes pelo multiplicador 1,1 e 30 vezes pelo multiplicador 1.
- Entre Agosto de 2023 e Outubro de 2023, AA rejeitou 15 entregas.
- Entre Agosto de 2023 e Novembro de 2023, AA rejeitou 30 entregas, depois de as ter aceite.
- AA encontra-se enquadrado no regime de trabalhadores independentes, no regime de trabalhadores por conta de outrem e no regime de membro de órgão estatutário, para efeitos de segurança social.
- No ano de 2023, AA não emitiu facturas por serviços prestados à Ré, tendo emitido facturas por serviços prestados a outros adquirentes no montante global de €6.158,31, tendo declarado na declaração modelo 3 de IRS referente a esse ano, rendimento da Categoria B no montante de €4.817,08 e rendimento da Categoria A no montante de €9.825,93.
- AA trabalhou nos últimos 2 anos por conta de outrem, designadamente como operador de TVDE e operador de produção, prestou e presta, ainda, serviços de estafeta utilizando, quer a plataforma da ré, quer a plataforma da EMP02..., apenas à hora do jantar, quando tem disponibilidade.”
Perante esta factualidade podemos já adiantar que a mesma se revela de suficiente para afastar a presunção de laboralidade e concluir que o estafeta, AA presta a sua atividade de forma autónoma, esporádica, provida de total liberdade, pois o estafeta faz as suas entregas quando tem disponibilidade, com o fito de receber um rendimento extra, relativamente à atividade profissional que desempenha.
Da factualidade provada resulta desde logo que a atividade principal do AA nunca foi a de estafeta, uma vez que trabalha por conta de outrem, dedicando, quando possível parte do seu tempo à atividade de estafeta que executa, pelo menos, para duas plataformas distintas – a da Ré e da EMP02.... Acresce dizer que da factualidade provada também resulta, não só que o rendimento do estafeta, provêm preponderantemente do trabalho dependente, como também se apurou que tendo auferido no ano de 2023 rendimentos por trabalho independente, que poderá até ter sido obtido pelos serviços prestados para a EMP02..., o certo é que não emitiu faturas por serviços prestados à Ré. Tendo ainda em atenção que se provou que no ano de 2023 o AA declarou rendimentos da categoria B no montante de €4.817,08 e rendimento da Categoria A no montante de €9.825,93, tendo-se ainda apurado que trabalhava por conta de outrem, como operador de TVDE e posteriormente como operador de produção, podemos concluir no sentido de o trabalho dependente ser um trabalho a tempo inteiro, atento o rendimento obtido a esse título.
Por outro lado, atento o rendimento obtido a título de trabalho independente, bem como o facto de resultar da factualidade provada que o AA realiza serviços de estafeta utilizando, quer a plataforma da ré, quer a plataforma da EMP02..., apenas à hora do jantar, quando tem disponibilidade, tendo num período correspondente a 4 meses, rejeitado 45 entregas, permite-nos concluir, apesar de não se ter apurado nem os dias da semana, nem as horas semanais, nem o rendimento obtido com a atividade de estafeta da EMP01..., que a atividade que exerce para a Ré, quer o rendimento que retira da mesma tem de ser considerada de residual e pouco relevante, uma vez que o tempo que disponibiliza para além de ser reduzido é ainda distribuído pelo menos por duas plataformas distintas, pois exerce esta atividade de estafeta, na referida janela de horário, para a EMP02... e para a Ré, permitindo-se ainda, com alguma frequência recusar as entregas da EMP01....
Embora, o facto de o estafeta prestar a sua atividade para duas plataformas concorrentes entre si, não ser um critério decisivo para afastar a qualificação do contrato como de trabalho, o certo é que executado o serviço de forma tão residual para a Ré/Recorrente (só na hora do jantar, quando está disponível, recusando entregas com alguma frequência) demonstra de alguma forma que esta não pode contar com a sua prestação como elemento disponível e útil na sua organização, não se podendo considerar que o estafeta AA se mostra integrado na estrutura organizativa da Ré. Por outro lado, o sustento do estafeta também não depende da prestação daquela atividade, uma vez que atento o rendimento que retira do trabalho independente no qual se inclui o liquidado pela EMP01..., nos permite concluir que não depende economicamente da Ré/Recorrente.
Em suma, a factualidade apurada permite-nos concluir que o AA exerce a atividade de estafeta através da Plataforma da Ré, com efetiva autonomia, ligando-se apenas à hora do jantar, quando tem disponibilidade, para completar o rendimento que mensalmente aufere como trabalhador por conta de outrem, podendo afirmar-se com relativa segurança, que nem o AA se considera integrado na estrutura organizativa da Ré, como esta também não pode contar com a disponibilidade concreta deste parceiro para gerir a sua de mão de obra disponível, indispensável à prossecução do seu negócio.
Daqui resulta que a Ré logrou ilidir a presunção de laboralidade, o que conduz à procedência da apelação, deixando consignado que fica prejudicado o conhecimento da a questão da inconstitucionalidade da nova presunção de laboralidade, por violação do disposto nos artigos 13.º, 18.º n.º 2 e 3 e 61.º da CRP.

V– Decisão

Pelo exposto e nos termos dos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 663.º do Código de Processo Civil, acorda-se, neste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente o recurso de apelação interposto pelo EMP01... Unipessoal e consequentemente absolve-se a Ré do pedido.
Sem Custas.
Notifique.
Guimarães, 8 de Maio de 2025

Vera Maria Sottomayor (relatora)
Maria Leonor Barroso
Antero Veiga


[1] Neste sentido, entre outros cfr. Ac. desta Relação de 16-02-2023, Proc. 3741/21.5T8MTS.G1, relatora, Maria Leonor Barroso, Ac. RL de 27-05-2020, Proc. 10818/19.5T8LSB.L1-4, relator Leopoldo Soares, Ac. RE de 15-04-2021, Proc. 570/20.7T8EVR.E1, relator Moisés Silva, Ac. RP de 27-11-2023, Proc. 2875/20.8T8PNF.P1, relatora Rita Romeira, todos disponiveis em www.dgsi.pt
[2] Disponível em www.dgsi.pt.
[3] Maria do Rosário Palma Ramalho, Delimitação do Contrato de Trabalho e Presunção de Laboralidade no Código do Trabalho – Breves Notas, in “Trabalho Subordinado e Trabalho Autónomo: Presunção Legal e Método Indiciário”, 2.ª edição, Selecção Formação Inicial do CEJ, pág 57 e 58. Menezes Cordeiro, in “Manual do Direito do Trabalho” 4.ª edição, pág. 533 e segs.
[4] Ac STJ de 26.09.1990, publicado em Acórdãos doutrinários do STA, n.º 348, págs. 1622 “o elemento essencial para a distinção em concreto deve ser a subordinação pois o tipo de prestação e a retribuição podem ser ambíguos e estar presentes de modo semelhante em ambos os contratos”
[5] “Presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital”: Revista do Ministério Público, n.º 175, pág. 181 e seguintes
[6] “Presunção de contrato de trabalho no âmbito de plataforma digital”: Revista do Ministério Público, n.º 175, pág. 192
[7] As plataformas digitais e o novo artigo 12.°-A do Código do Trabalho: empreendendo ou trabalhando?”, Revista do STJ, n.º 3, disponível em www.arevista.stj.pt, pág. 96 e 97
[8] https://observatorio.almedina.net/index.php/2024/12/02/estafetas-a-presuncao-a-ilisao-e-o-equivoco-da-substituicao/
[9] Proc. n.º 2843/23.8T8VRL.G1, relator Antero Veiga, disponível em www.dgsi.pt