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REQUERIMENTO EXECUTIVO
INDEFERIMENTO LIMINAR
COBRANÇA DE VALORES SUPORTADOS NO PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL PRÉ-EXECUTIVO
Sumário
I – O art. 726.º CPC consagra o poder dever de o juiz indeferir liminarmente o requerimento executivo quando ocorram, nomeadamente, exceções dilatórias não supríveis de conhecimento oficioso. II - Nos termos do art. 33.º/4 da L 32/2014, de 30.5 (PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL PRÉ-EXECUTIVO) os valores suportados pelo exequente no âmbito do procedimento extrajudicial pré-executivo podem ser cobrados no processo executivo que lhe sucede.
Texto Integral
Processo: 1215/24.1T8VLG-A.P1
Sumário do acórdão elaborado pela sua relatora nos termos do disposto no artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil: ……………………………… ……………………………… ………………………………
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Acordam os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:
A..., S.A., com sede na Rua ..., Campo ..., Lisboa, instaurou ação executiva contra AA, residente em Rua ..., ..., R/C, ..., apresentando como título executivo um requerimento de injunção, ao qual foi aposta fórmula executória.
Nesse requerimento é pedida a quantia de € 393,70, de capital; € 11,42, de juros, € 100,00, de “outras quantias” e € 76,50, num total de € 581,62.
O contrato que serve de base ao pedido respeita à prestação de serviços de telecomunicações e às mensalidades cobradas e não pagas.
Foi proferido despacho, a 11.4.2024, com o seguinte teor:
«Convida-se a exequente a vir esclarecer, dos valores que reclama e diz “dependente de simples cálculo aritmético”, quais os que respeitam às quantias exigíveis nos termos do art. 33.º n.º 4 da L. 32/2014 e quais as que reclama ao abrigo do disposto no art. 26.º n.º 3 al. c) do RCP.
Mais deverá esclarecer, dos valores que reclama no procedimento de injunção, qual o que respeita à invocada cláusula penal.»
Por requerimento de 24.4.2024, veio a exequente dizer o seguinte:
«A Autora não peticiona qualquer valor a título de indemnização pelo incumprimento do contrato.
O valor dependente de simples cálculo aritmético resulta da soma das seguintes rubricas:
• Taxa de justiça Pepex: 94,10 Euros - Art. 33.º n.º 4 da L. 32/2014
• Custas de parte: 19,13 Euros - Art. 26.º n.º 3 al. c) do RCP
• Juros compulsórios: 13,94 Euros
• Juros da Execução: 45,13 Euros»
Veio a ser proferido despacho, datado de 30.4.2024, o qual indeferiu liminarmente a execução relativamente aos € 100, 00, por considerar que, tendo sido indicados como encargos relativos à indemnização pelo incumprimento contratual, exorbitam da noção de “cumprimento de obrigação pecuniária” prevista no art. 1.º do DL 269/98. Indeferiu, de igual forma, a execução quanto à quantia de € 19.13, quanto a custas de parte.
Deste indeferimento liminar recorre a exequente, visando a sua revogação com basse nos argumentos que assim deixou em conclusões: 1. Considerou o Tribunal a quo existir exceção dilatória de uso indevido do procedimento de injunção, absolvendo o Apelado da instância na quantia de € 100,00. 2. Por a Autora ter lançado mão de injunção destinada a exigir o cumprimento de obrigação emergente de contrato e do não cumprimento do mesmo. 3. Salvo, porém, o devido respeito, tal decisão carece de oportunidade e fundamento, sendo contrária à Lei. 4. Desde logo porque a lei não habilita o Tribunal a quo a conhecer oficiosamente de exceções dilatórias relacionadas com o conteúdo do título executivo; 5. Das causas admissíveis de indeferimento liminar do requerimento executivo constantes do artigo 726.º do CPC não resulta o uso indevido do procedimento de injunção; 6. Permitir-se ao juiz da execução pronunciar-se ex officio relativamente à exceção dilatória de uso indevido do procedimento de injunção esvaziaria de função o artigo 14.º-A n.º 2 do DL 269/98, de 01 de setembro, e atentaria contra o princípio da concentração da defesa ínsito no artigo 573.º do CPC. 7. A sentença proferida pelo Tribunal a quo trata-se de um indeferimento liminar da petição inicial, o que legitima a apresentação do presente recurso. Sem prescindir, 8. A injunção é um meio adequado para peticionar ao devedor o pagamento dos referidos custos administrativos relacionados com diligências de cobrança da dívida. 9. Outra conclusão seria manifestamente contrário ao “espírito” legislativo associado à criação do DL 269/98, de 01 de Setembro, conforme decorre, indubitavelmente da leitura do preâmbulo deste diploma legal.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Objeto do recurso:
- da possibilidade de indeferimento liminar do requerimento executivo;
- da propriedade do indeferimento das duas parcelas supra identificadas.
FUNDAMENTAÇÃO Fundamentos de facto
Os factos que importa à decisão respeitam ao iter processual acima já descrito.
Fundamentos de direito
No que respeita à primeira questão referimos a nossa adesão ao teor do despacho recorrido, que cita já vasta jurisprudência, mormente desta Relação, acerca da possibilidade de o tribunal poder conhecer do uso indevido do procedimento injuntivo findo o qual é aposta fórmula executória quanto a valores que o exequente não tem direito de peticionar.
Além daqueles arestos, mais recentemente, desta Relação, pode também ver-se o ac. 11.12.2024, Proc. 1261/24.5T8VLG-A.P1,em cujo sumário se lê: I - Só pode ser objeto do pedido de injunção, previsto nos arts. 7º e segs. do Regime Anexo ao DL 269/98, de 01.09, o cumprimento de obrigações pecuniárias diretamente emergentes do contrato, nele não podendo ser peticionadas obrigações com outra fonte, nomeadamente, derivada de responsabilidade civil”. II - O pedido de pagamento de despesas de cobrança da dívida, formulado a título indemnizatório, porque fundado em responsabilidade civil (contratual), não é compatível com a natureza do procedimento de injunção, nem se equipara aos juros de mora nascidos com a constituição em mora do devedor. III - O título executivo que «reconheceu» [com a aposição da fórmula executória no requerimento da injunção] o pedido de pagamento de despesas de cobrança da dívida está, necessariamente, ferido de vício que afeta a exequibilidade desse mesmo título. IV - Tal vício, que pode ser configurado como falta ou insuficiência de título ou como erro, insanável, na forma do procedimento [enquanto exceção dilatóriainominada], é de conhecimento oficioso e leva à rejeição liminar da execução, parcial ou totalmente, conforme os pedidos formulados no requerimento injuntivo a que foi aposta a fórmula executória estejam ou não [ou possam ser ou não] individualizados/autonomizados quanto aos respetivos montantes. V - Decorre da al. a) do nº 2 do art. 14º-A do Regime Anexo ao DL 269/98 e do nº 1 do art. 857º do CPC que, estando em causa o uso indevido do procedimento injuntivo ou ocorram outras exceções dilatórias de conhecimento oficioso, o requerido no indicado procedimento, entretanto já na qualidade de executado na execução movida com base no título ali obtido, poderá deduzir oposição à execução com algum destes fundamentos, não havendo lugar ao efeito preclusivo decorrente da sua inércia no procedimento. VI - Mas de tais preceitos não resulta que as indicadas exceções dilatórias [uso indevido da injunção e/ou outras] só possam ser invocadas pelo executado [mediante embargos à execução] e que o tribunal esteja impedido de conhecê-las ex officio.
E, de 22.4.2024, igualmente subscrito pela ora relatora, no processo n.º 2943/22.1T8VLG-A.P1, com o seguinte sumário: I - Nos termos do disposto no artigo 734º nº 1 do CPC, pode o juiz conhecer oficiosamente e até ao primeiro ato de transmissão de bens penhorados das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo. Artigo 726º que consagra o poder dever de o juiz indeferir liminarmente o requerimento executivo quando ocorram, nomeadamente, exceções dilatórias não supríveis de conhecimento oficioso [vide artigo 726º nº 2 al. b) do CPC]. II - A responsabilidade de pessoa singular, demandada enquanto obrigada a título pessoal, não pode ser discutida ao abrigo do procedimento de injunção instaurado nos termos do DL 62/2013 de 10/05, já que não pode ser considerada empresa para os fins indicados no artigo 3º deste DL. III - O uso indevido da injunção constitui neste caso exceção dilatória que determina a absolvição da instância da pessoa singular. IV - A admissibilidade do recurso ao processo de injunção está dependente de o pedido respeitar ao cumprimento de obrigações pecuniárias diretamente emergentes do contrato que o fundam.
Já quanto aos € 100,00, pedidos, não se concorda com o entendimento sufragado em primeira instância. É que no requerimento de injunção não se diz que esse montante respeite ao valor de indemnização pelo incumprimento do contrato, mas sim a “indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida”.
Ora o tribunal a quo, no despacho de 11.4.2024, referiu-se expressamente aos valores pedidos nos termos do art. 33.º/4 da L 32/2014, de 30.5 (PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL PRÉ-EXECUTIVO) e o certo é que a exequente veio afirmar que as quantias ali incluídas (e que seriam os valores suportados pela requerente no âmbito do procedimento extrajudicial pré-executivo, sendo que, nos termos do art. 2.º daquele diploma, “O procedimento extrajudicial pré-executivo é um procedimento de natureza facultativa que se destina, entre outras finalidades expressamente previstas na presente lei, à identificação de bens penhoráveis através da disponibilização de informação e consulta às bases de dados de acesso direto eletrónico previstas no Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, para os processos de execução cuja disponibilização ou consulta não dependa de prévio despacho judicial”), no montante € 94.10, respeitam a título de taxa de justiça Pepex, ou seja, aos encargos com procedimento extrajudicial pré-executivo, valor que aquele último normativo permite cobrar, sendo que esse procedimento foi adotado in casu, como se vê com a comunicação de 6.4.2024.
Temos, assim, que estes € 94,10, apelidados erradamente de “indemnização”, correspondem aos encargos que a lei (art. 34.º/ cit.) permite ao credor/exequente cobrar ao devedor/executado.
Assim, pelo menos quanto a este valor (€ 94,10), é de manter a execução.
O mesmo já não sucede com o demais, desde logo porque se não vê a que se destine o que sobeja daqueles 100,00, e, quanto aos € 19,13, relativos às custas de parte, as mesmas serão devidas, nos termos do art. 26.º/3 c) do Reg. das Custas de Parte, saindo precípuas do produto dos bens penhorados (art. 541.º CPC.
DISPOSITIVO
Pelo exposto, decidem os Juízes deste Tribunal da Relação julgar o recurso parcialmente procedente, ordenando o prosseguimento da execução quanto à quantia de € 94, 10, mantendo no mais a decisão recorrida.
Custas do recurso pela recorrente (art. 527.º/1, parte final. do CPC).
Porto, 28.4.2025
Fernanda Almeida
Ana Paula Amorim
Miguel Baldaia de Morais