INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO
RESPONSABILIDADE
PRESSUPOSTOS
ÓNUS DA PROVA
PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO
PRINCÍPIO DA AUTO-RESPONSABILIDADE DAS PARTES
DELIBERAÇÕES DO BANCO DE PORTUGAL
LEGALIDADE
Sumário

(Elaborado pelo relator e da sua inteira responsabilidade – art.º 663º nº 7 do Código de Processo Civil)
I - Do art.º 304º CVM extrai-se que os pressupostos da responsabilidade do intermediário financeiro são o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade.
II - Atento o disposto no art.º 342º nºs 1 e 3 do CCivil, conjugadamente com o estabelecido no art.º 344º nº 1 do CCivil, há que concluir que o ónus da prova da verificação dos pressupostos da responsabilidade do intermediário financeiro cabe ao cliente, com excepção da culpa, porquanto esta se presume nos termos do nº 2 do art.º 304º-A CVM, mantendo inteira aplicação o decidido no Acórdão do STJ nº 8/2022, de 06/12/2021, segundo o qual “incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano”.
III - Muito embora o art.º 411º CPC, estabelecendo o princípio do inquisitório, determine que “Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer”, o juiz deve actuar dentro do quadro dos princípios estruturantes do processo civil, quais sejam os princípios do dispositivo, do contraditório, da igualdade das partes e da imparcialidade, porquanto eles consistem nas traves-mestras do princípio fundamental do processo equitativo proclamado no art.º 20º nº 4 da Constituição da República,
IV - …o que determina que o inquisitório se deva orientar por um padrão de objectividade e de necessidade para o apuramento da verdade e justa composição do litígio, não podendo o poder-dever conferido pelo princípio do inquisitório ser exercício como forma de suprimento oficioso de indesculpável negligência das partes em violação do princípio da auto-responsabilidade das partes.
V - Estando em causa deliberações do Banco de Portugal (BdP) tomadas a coberto do estatuído no artigo 145º-H do RGICSF (aprovado pelo DL nº 298/92, de 31/12, sujeito a posteriores alterações, nomeadamente pelo DL nº 31-A/2012, de 10/02), o BdP agiu com poderes de autoridade, e tem vindo a ser unanimemente afirmado na jurisprudência não caber aos Tribunais comuns pronunciarem-se sobre a legalidade das deliberações do BdP, uma vez que este agiu no âmbito de poderes administrativos que a lei lhe confere enquanto entidade reguladora.
VI - As referidas deliberações estão sujeitas aos meios processuais previstos na legislação do contencioso administrativo conforme expressamente dispõe o art.º 145º-AR nº 1 do RGICSF, com as alterações introduzidas pela Lei nº 23-A/2015, de 26/03, e como estipula também o art.º 39º da Lei Orgânica do Banco de Portugal no que concerne aos actos praticados pelo governador, vice-governadores, conselho de administração e demais órgãos do Banco, ou por delegação sua, no exercício de funções públicas de autoridade.
VII - Assim, a apreciação da legalidade das deliberações em causa só poderá ser efectuada no âmbito da jurisdição administrativa, à qual competirá, em exclusivo, o conhecimento de eventual acção de nulidade ou anulação proposta com vista à declaração de invalidade da transferência de activos, passivos, elementos patrimoniais e activos sob gestão de uma instituição de crédito para um banco de transição, ou a retransmissão dos mesmos.
VIII - Não houve transferência para o “Novo Banco, SA” das eventuais responsabilidades do “BES” decorrentes da comercialização e intermediação financeira dos valores mobiliários em causa nesta acção; e se, porventura, alguma responsabilidade relacionada com as pretensões deduzidas nos presentes autos se pudesse ter, por algum meio ou em algum momento, considerada por transmitida para o “Novo Banco, SA”, a mesma sempre seria de considerar retransmitida – com efeitos retroactivos à data da medida de Resolução – para o BES, radicando, sempre, na esfera jurídica desta entidade e não na do banco de transição.

Texto Integral

Acordam as Juízes na 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO
MOC e mulher JSRC, casados no regime de comunhão de adquiridos, residentes em …, na …, por si e em representação de “…, SA”, com sede em … – República do …, registada na Conservatória do registo comercial do …, sob o nº …, contribuinte nº …,
intentaram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma única de processo comum, contra
 “Banco Espírito Santo, SA” [BES], pessoa colectiva com o NIPC …, com sede na Rua …, Lisboa [quanto à qual a instância veio a ser julgada extinta por inutilidade superveniente da lide], 
e
“Novo Banco, SA” [NB], pessoa colectiva com o NIPC …, com sede na Av. …, Lisboa,
alegando, em síntese, que no âmbito das relações que vinham mantendo com o BES, por indicação e intermediação dos gestores de conta que lhes estavam afectos, a Autora “…, SA” adquiriu em 30/03/2005 1.049.000 obrigações da Lehhman Brothers UK Cap Fund, e em 12/07/2007 e 31/07/2007 adquiriu 200.000 obrigações Kaupthing Bank; em 10/03/2009, com financiamento de € 1.200.000,00 do BES adquiriu 2.150.000 obrigações Espírito Santo Finantial Group Internacional Ltd 2017 (obrigações ESFG 2017) que foram dadas em penhor para garantia do mesmo; ao longo dos anos 2010 e 2011 a Autora “…, SA” adquiriu mais obrigações ESFG 2017, tendo adquirido um total de € 3.550.000,00 de obrigações ESFG 2017 correspondente ao seu valor nominal.
Em consequência da crise do sub-prime de 2008, de modo a permitir aos AA. recuperaram perdas do capital por si investido nas obrigações Lehhman Brothers e Kaupthing Bank, os AA. e o Réu “BES, SA” celebraram um acordo em 14/08/2012, com cuja outorga a Autora sociedade subscreveu ordem de venda das 3.550.000,00 obrigações ESFG 2017 à cotação de 41,97%, que adquirira em 2009, 2010 e 2011, das quais as 2.150.000 adquiridas em 10/03/2009 haviam sido dadas em penhor para garantia do financiamento de € 1.200.000,00 para a respectiva aquisição, e correspondentemente a conta de depósitos à ordem da sociedade Autora foi creditada no montante de 1.579.764,54.
Ainda no âmbito desse acordo, a Autora “…, SA” subscreveu uma ordem de compra de 2.961.000 credit linked notes BES Finance Ltd, 6% 2021 (obrigações BES Finance 2021), à cotação de 50,18%, pelo montante de € 1.485.839,80, e passou a deter 500.000 obrigações ESFG 2019 e 89.000 obrigações BES Finance 2021 que o BES entregou à sociedade Autora de forma a que esta pudesse alcançar, na maturidade dos referidos valores mobiliários, a pretendida recuperação do seu investimento.
Ainda no âmbito desse acordo, o Réu “BES”, através da sua sucursal no Luxemburgo, concedeu à sociedade Autora, na data de outorga do citado acordo, um financiamento de € 2.220.000,00 destinado exclusivamente às referidas aquisições e em garantia do mesmo ela constituiu um penhor de primeiro grau sobre um conjunto de obrigações (devidamente identificadas na petição) correspondente à totalidade dos activos detidos pelos AA..
A estrutura desse acordo foi gizada de modo a que na data de maturidade das obrigações ESFG 2019 e BES Finance 2021 a sociedade Autora recebesse a quantia de € 3.550.000,00 que, deduzido o valor do financiamento de € 2.220.000,00, lhe permitiria obter o valor de € 1.330.000,00 e assim recuperar as perdas dos seus investimentos Lehhman Brothers e Kaupthing Bank.
O “BES, SA” não cumpriu o especial dever de informação a que estava obrigada, pois o produto adquirido apontava inequivocamente para um risco que reportava directamente ao BES e este estava ciente da desadequação à A. (e a quem a representava) enquanto cliente não profissional, tendo no entanto recomendado a compra das obrigações da ESFG e não esclareceu a A quanto à globalidade dos riscos incorridos pela compra das mesmas, nem a elucidou da real situação da entidade emitente que conhecia perfeitamente, ou deveria conhecer por fazer parte do grupo GES.
O BES, enquanto intermediário financeiro, aconselhou um investimento que prejudicou os AA., como se veio a verificar com a insolvência da ESFG e a realidade que desencadeou a aplicação de uma medida de resolução do BES por parte do Banco de Portugal (BdP), omitindo informações às quais estava vinculado induzindo a vontade da A. em informações falsas, pois se estivesse na posse das informações verdadeiras sobre a ESFG jamais teria contratado nos termos em que o fez. As informações foram essenciais para celebrar o contrato, havendo causalidade entre a conduta do BES e os danos da A., havendo obrigação de indemnização. A culpa presume-se, pois, estando a ESFG relacionada com o BES deveria saber da real situação financeira daquela, pelo que quando comercializou à A. estava consciente do risco da entidade emitente.
E esses danos causados à sociedade A. decorrem de, com a queda do grupo GES e a consequente insolvência da ESFG, a mesma estar impossibilitada de na maturidade daquelas obrigações alcançar a recuperação do investimento, diversamente do que lhe havia garantido o BES, e não estar a ser reembolsada dos juros remuneratórios de tais obrigações.
São os RR. solidariamente responsáveis pelos danos provocados, pois o NB é a entidade jurídica que passou a ser a beneficiária dos efeitos jurídicos decorrentes do acordo celebrado com a A. em Agosto de 2012 e gestor das contas da A., e fere a noção de justiça que o acordo quanto ao crédito e garantias tenha sido transferido integralmente para o NB e a obrigação de pagamento do valor das obrigações ESFG 2019 não, sendo o NB o credor do financiamento realizado para a aquisição dos valores mobiliários e beneficiário das suas garantias e a sociedade A. não vai receber qualquer capital nem juros remuneratórios.
Mais alegam que a sociedade A. é investidora não qualificada, e como tal foi referenciada pelo BES, constituindo abuso de direito do BES e do NB terem criado legítimas expectativas de reembolso na esfera dos seus clientes para se escudarem agora na consideração que a ESFG é a única entidade devedora, quando asseguraram publicamente o reembolso na maturidade dos investimentos para os clientes não institucionais e não procederam ao reembolso dos montantes investidos, tendo criado expectativas que vieram a ser frustradas.
Por outro lado, os AA. MOC e JSRC sentem-se atraiçoados pois confiaram e sentem-se ofendidos enquanto pessoas sérias que confiaram na palavra do BES, tendo passado por muitas preocupações e transtornos e sofrido ansiedade com a situação descrita.
Com tais fundamentos pediram se condene:
“I. O NB a cumprir com os termos e as condições emergente do acordo celebrado a 14/08/2012 entre a Autora FC e o BES e, consequentemente:
II. O NB a pagar aos AA, o valor de quinhentos mil euros, correspondente ao montante despendido, na aquisição de 500.000 obrigações ESFG 2019;
III. O NB a pagar aos AA a quantia de sessenta e nove mil euros, a título de juros remuneratórios vencidos, correspondente ao rendimento associados à emissão das Obrigações ESFG 2019;
IV. O NB a pagar aos AA., a título de lucros cessantes, a quantia correspondente aos juros que se venceriam associados às Obrigações ESFG 2019, até à sua maturidade, ou seja Outubro de 2019;
V. O NB a pagar aos AA os juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal aplicável até efetivo e integral pagamento;
VI. O NB a pagar aos Autores MOC e JSRC, a título de danos não patrimoniais a quantia de cinquenta mil euros;
VII. O NB nas custas da presente demanda.
Subsidiariamente:
VIII. Os RR solidariamente a pagar aos AA, o valor de quinhentos mil euros correspondente ao montante despendido na aquisição de 500.000 obrigações ESFG 2019;
IX. Os RR solidariamente a pagar aos AA a quantia de sessenta e nove mil euros, a título de juros remuneratórios vencidos, correspondente ao rendimento associados à emissão das Obrigações ESFG 2019;
X. Os RR solidariamente a pagar aos AA a título de lucros cessantes, a quantia correspondente aos juros que se venceriam associados às Obrigações ESFG 2019, até à sua maturidade, ou seja, Outubro de 2019;
XI. Os RR solidariamente a pagar aos AA os juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal aplicável até efetivo e integral pagamento;
XII. Os RR solidariamente a pagar aos Autores MOC e JSRC, a título de danos não patrimoniais a quantia de cinquenta mil euros;
XIII. Os RR nas custas da presente demanda.”

Na sua contestação o NB, a título de questão prévia, pediu a suspensão da instância por probabilidade séria de existência de causa prejudicial; defendeu a inexistência do direito invocado contra o “Novo Banco, SA”; arguiu a sua ilegitimidade; impugnou a matéria alegada e requereu a intervenção provocada da ESFG.
O R. BES contestou e impugnou a matéria alegada, pedindo a improcedência da acção.
Notificados para o efeito, os AA. responderam à matéria de excepção aduzida.

Em sede de audiência prévia, o Tribunal julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide quanto ao “BES em liquidação”; indeferiu a suspensão da instância por causa prejudicial, e indeferiu a intervenção principal provocada da “ESFG, SA”, concedendo às partes dez dias para apresentarem as suas alegações, por os autos conterem todos os elementos para proferir decisão de mérito.
Entretanto, os AA. requereram a alteração do pedido, que foi objecto de despacho de indeferimento, revogado em sede de recurso. Admitida, então, a alteração requerida foram os AA. convidados a concretizar quais os pedidos principais cumulativos e subsidiários cumulativos que constituem a pretensão, na sequência da ampliação admitida.
Por requerimento de 27/05/2021 os AA. concretizaram que os pedidos são:
“1. Seja o Novo Banco condenado a cumprir com os termos e as condições emergentes do acordo celebrado a 14-08-2012 entre a A “…, SA” e o BES.
Caso o antedito improceda:
2. Seja o Novo Banco SA condenado a reconhecer a redução do valor do contrato de financiamento para a quantia de €1.821.155,00 a liquidar pelos As, em virtude de não lhes ser pago o valor de €500.000,00 pelas obrigações ESFG 2019
Em qualquer caso
3. Seja o Novo Banco SA condenado a pagar aos Aas MOC e JSRC a título de danos não patrimoniais de €50.000,00”.

Posteriormente, por requerimento de 01/07/2021, os AA. requereram a alteração/redução do pedido subsidiário atento o vencimento antecipado das obrigações e o consequente reembolso por parte do NB do valor de €146.336,85, que foi aplicado na amortização parcial do valor em dívida no âmbito do aludido contrato financiamento, passando o valor em divida a ser €1.674.818,15.
Desse modo, pediram que o pedido subsidiário passasse a ter a seguinte redacção:  
“2. Seja o Novo Banco SA condenado a reconhecer a redução do valor do contrato de financiamento para a quantia de €1.674.818,15 a liquidar pelos As, em virtude de não lhes ser pago o valor de €500.000,00 pelas obrigações ESFG 2019.”

Seguindo os autos a regular tramitação, foi a final proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu o Réu “Novo Banco, SA” dos pedidos.

Inconformados, vieram os Autores interpor o presente recurso de apelação, com pedido de reapreciação da prova, sustentando que a decisão recorrida deve ser revogada e em seu lugar proferida outra que condene o Réu nos pedidos.
Das suas alegações extraíram os Recorrentes as seguintes
Conclusões
«I - DO OBJECTO DO RECURSO
1. Os Apelantes não se conformam com a Sentença recorrida.
2. Desde logo, porque a prova produzida leva a que alguns factos dados como não provados devessem ter sido dados como provados, impondo-se a alteração das respostas à matéria de facto em conformidade com o que resultou daquela prova.
3. A correta consideração dos elementos de facto e de Direito deveria ter levado o Tribunal a quo a alcançar, inexoravelmente, conclusão diversa.
Aqui chegados,
4. e em jeito sinóptico, alinha-se desde já o âmbito do presente Recurso, enunciando, por ordem lógica, os temas que agora se colocam à superior consideração do Tribunal da Relação:
II- Da impugnação do julgamento da matéria de facto;
III – Do Direito

II- IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
5. Analisada a matéria de facto dada como provada na douta Sentença por contraposição com a prova produzida nos autos, designadamente dos depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento, verifica-se que ocorreu erro de julgamento notório e grave, que conduz, naturaliter, à alteração da matéria de facto, impondo uma decisão diversa da proferida, nos termos do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o que aqui expressamente se invoca para todos os efeitos legais.
*
A - DA IMPUGNAÇÃO MATÉRIA DE FACTO DADA COMO NÃO PROVADA:
A.1. - DO ADITAMENTO À MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA
DO PONTO 2 DADO COMO NÃO PROVADO
6. A douta Sentença em crise dá como Não Provado o ponto 2:
- os funcionários do BES garantiram o reembolso do capital quanto às obrigações ESFG.
Contudo,
7. tal facto deveria ter sido dado como Provado, porquanto existe abundante prova feita nesse sentido, ou seja: que foi garantido o reembolso do capital quanto às obrigações ESFG.
8. Se muitas vezes, neste tipo de processos, é difícil encontrar-se prova testemunhal que ateste tal factualidade, isso não sucedeu in casu.
9. Efetivamente, após várias diligências tomadas e respetivo levantamento do segredo profissional, foi ouvida uma Testemunha, rectius Advogado, com conhecimento direto sobre os factos.
10. A Testemunha foi interrogada sobre factos dos quais tinha conhecimento direto, porquanto vivenciou todos os episódios a que se reportou e tal conhecimento, conjugado com as declarações de parte produzidas, só poderá culminar na prova dos factos em causa.
Pelo que,
Relativamente à prova produzida,
11. não se poderão ignorar os seguintes trechos do depoimento da Testemunha Dr. JAN, Advogado que representou os Recorrentes aquando da celebração dos Contratos, sendo o depoimento essencial para a descoberta da verdade material e para a justa composição do litígio, bem como para transmitir ao Tribunal a perspetiva de quem contactou diretamente com o caso sub judice, maxime na fase pré-contratual e aquando da celebração do contrato.
12. Ao longo do seu longo depoimento, são variadíssimas as expressões referentes à
“obrigação de resultado” e à garantia do reembolso, mais explicando o que motivou a celebração do contrato, asseverando que foi garantido o reembolso.
13. É assaz relevante ter emconta que a Testemunha revelouconhecer o que despoletou
este Contrato e qual seria o seu desiderato.
14. No seu depoimento é abundantemente explicado que o Banco havia criado o que apelidou de engenharia financeira para no final obter um valor já definido.
15. A Testemunha conhece o momento da formação da vontade, o que é essencial para avaliar a bondade do Recurso e da pretensão dos Autores.
16. Dessarte, veja-se o teor do seu depoimento, mais ao pormenor e em cumprimento
do artigo 640º do CPC que serve de impugnação à matéria de facto para o ponto supra indicado:
Depoimento de JAN
[00:06:00 a 00:07:11 do depoimento da Testemunha]
Testemunha:
Sim, sim, portanto, penso que posso explicar as circunstâncias em que levou a esse acordo, porque, como sabem eu fui advogado da Família C…, do veículo que eles utilizavam para ter as suas contas no … Espírito Santo e essencialmente o que teve na base da discussão e depois o acordo alcançado.
Foi que o Senhor MOC tinha, era cliente do Private Banking e enquanto cliente do Private Banking ele entrou num período de grande aflição, porque quando se deu a crise do suprime e depois com todo o problema com o Lehman Brothers e aí por fora, o Sr. MOC que tinha obrigações no Private Banking do Kaupting e do Lehamn Brothers sofreu avultadíssimos prejuízos.
Sofreu avultados prejuízos e nessa altura depara-se com a situação em que também na sua conta de Private tinha obrigações do Banco Espírito Santo, isto, pronto, sintetizando porque … já vai há alguns anos e eu tenho medo de não poder ser se calhar fiel aos detalhes, mas essencialmente quando o Sr. MOC me consulta vem indignadíssimo porque o Banco essencialmente teria utilizado o seu dinheiro e a sua conta do Private Banking entenda-se, à época, para um conjunto de investimentos que eram completamente contra a sua vontade.
E ele o que mais pedia ao seu gerente de conta e, portanto, estou aqui a citar o que é que ele, a mensagem que o cliente na altura me transmite, aquilo que ele mais queria era ter uma taxa de juro e um menor risco possível e estava chocado com as opções que o Banco Espírito Santo e o seu gestor de conta tinham tomado.
Na altura, quando começamos a analisar os documentos e a ver, de facto deparamo-nos com um conjunto de situações que na nossa opinião, à época, eram suscetíveis de lhe dar razão, às reivindicações do Sr. MOC. Efetivamente, na nossa ótica, o Private e os seus gestores de conta gostavam de frisar aqui algumas características que para mim foramessenciaisna minha opinião, a própriaanálise de risco do banco considerava que o Sr. MOC não era um investidor profissional, basta conhecer o Sr. MOC, lidar com o Sr. MOC
[…]
Eu só quero dizer é que este acordo só surgiu e é por isso que como me perguntou as circunstâncias do acordo eu tenho que determinar coisas do facto que tiveram na base da formação da vontade.
E os factos que tiveram na formação da vontade é que … chegamos a um momento em que nós íamos para a via judicial e depois do (…) houve um entendimento em que o Banco Espírito Santo vem com uma proposta onde essencialmente propunha-se que através do financiamento, através de adquirir as obrigações que eles tinham na altura comprado em nome do Sr. MOC com o poder discricionário que o ato tinha, eles essencialmente estabeleciam um acordo onde, COM A ENGENHARIA FINANCEIRA NO FINAL DE UM DETERMINADO PERÍODO O SR. MOC ACABARIA POR RECUPERAR O DINHEIRO QUE TERIA PERDIDO COM AQUELAS DECISÕES, e, portanto, foi nesse contexto, num contexto de evitar que, portanto, litígios e num contexto de alcançar um acordo extrajudicial que este acordo é lavrado
Mais à frente,
Depoimento de JAN
[00:08:37 a 00:12:02 do depoimento da Testemunha]
Testemunha:
Vamos ver, Sr. Doutor, há aqui, quando falamos deste tipo de negociações, há aqui hoje duas ou três dimensões, para ser fiel e muito rigoroso ao que de facto se sucedeu que tem de se explicar.
Primeiro facto, eu estou numa interação com o BancoEspírito Santo porque pretendo que o Banco Espírito Santo reconheça prejuízos que causou ao meu cliente e pretendendo evitar ações judiciais que acho que é a nossa função, ter uma paz social e, portanto, encontrar soluções que não sejam para … os tribunais, encontrar com o banco uma solução que não fosse ir para a via judicial.
O Sr. MOC que me acompanhou, aliás, nós tivemos variadíssimas, agora não lhe sei dizer a quantidade, de interações por via telefónica e tivemos, se a memória não me atraiçoa, duas, pelo menos duas reuniões presenciais que foram essenciais para desbloquear isto.
A princípio as condições estavam muito extremadas, o Sr. MOC estava profundamente desagradado com o Sr… P, achava-o um burlão, achava que tinha sido literalmente enganado por  ele e, portanto, a situação  estava muito extremada.
Com o diálogo, com a tentativa que também empenhei para chegar a um entendimento, quando o Banco Espírito Santo vem com esta engenharia, quer dizer nós não estivemos, eu não tive qualquer capacidade de influência ou negociação aliás, eu confesso que agora, não é, porque é quase impossível eu não ser influenciado pelo que sei que aconteceu agora, mas na altura quando me apresentam e dizem “Olhe, essencialmente nós vamos fazer aqui um acerto de contas, nós vamos apresentar aqui umas obrigações que vocês vão comprar com quase desconto de 50%, vão deixar passar x tempo e elas vão ser recompradas […] por quem o Banco Espírito Santo … que arranja e ao ser comprados pelo seu valor nominal  VÃO LHE DAR  OS SEUS TRÊS MILHÕES QUINHENTOS E CINQUENTA, VALOR QUE DEDUZIDO AO FINANCIAMENTO DÁ O VALOR DO PREJUÍZO DO SR. MOC.
Portanto, quanto à questão financeira eu confesso que aquilo que me preocupei foi pôr claramente no contrato, que ficasse muito claro que aquilo está a determinar o Sr. MOC a aceitar este acordo eram duas coisas: UMA QUE IA RECEBER TRÊS MILHÕES QUINHENTOS E CINQUENTA GARANTIDO PELO BANCO ESPÍRITO SANTO;
Eu sinceramente naquela altura nem era que desconfiasse de nada que achava que o Banco Espírito Santo era à prova de bala, mas não tinha capacidade para dar um conselho ao meu cliente de decência se aqueles emitentes estavam ou não estavam, portanto, aqui eu absolutamente as questões de garantia que para mim foram as que serviram para a formação da vontade eram as do Banco Espírito Santo e foi isso que eu quis … nessa parte, o acordo tem uma própria negociação e o banco teve de acolher também as sugestões que eu fazia.
Agora, se me pergunta se nós tivemos a discutir se queríamos as obrigações A ou as obrigações B ou se o financiamento ia ser cinco euros acima ou cinco euros abaixo, nem o Sr. MOC sequer percebe nada disto nem eu que chegava a abordar o problema nesse sentido, para mim, não passava pela cabeça que uma obrigação emitida pelo universo Espírito Santo não valesse dinheiro e, portanto, era inócua, quer dizer hoje eu, se calhar o Sr. Doutor vai dizer “então o Sr. não devia … diligência” […]
Mandatário Autor:
É um bocadinho nessa linha que eu queria questionar, uma coisa é negociar ou tentar vincar algum tipo de garantia ou pelo menos a certeza que, findo determinado período, ou seja, este acordo VISAVA UM RESULTADO QUE ERA RECEBER DETERMINADA QUANTIA PARA DEPOIS DE PAGO O FINANCIAMENTO O SR. MOC RECEBER O VALOR QUE HAVIA PERDIDO DAS SUAS POUPANÇAS.
Isso ficou, digamos, salvaguardado ou ficou impresso, digamos, para as partes neste acordo?
(…)
Depoimento de JAN
[00:12:42 a 00:12:55 do Depoimento da Testemunha] Testemunha:
[…] Eu tenho aqui na minha posse o acordo que na altura ajudei o Sr. MOC e o qual ele subscreveu. A Sra. Doutora permite-me que é mais fácil do que eu estar a pedir que me exibam o documento.
Meritíssima Juiz:
Sim, sim, ele também está no processo. Pode ver, Sr. Doutor, documento n.º 1
Depoimento de JAN
[00:13:26 a 00:16:28 do Depoimento da Testemunha]
Testemunha:
Pronto, eu só estou a pedir o acordo porque é mais fácil não é, Sra. Doutora, os documentos falam sempre melhor.
O essencial tendo no ponto três onde explico o acerto de contas portanto, repare, isto é um acordo que é um acerto de contas quando o Banco vai acertar as contas que tem aqui com o Sr. MOC e depois para mim foi essencial um ponto quatro que claramente tem epígrafe “da formação da vontade” e a formação a vontade era o Banco Espírito Santo declarar e garantir que as ações eram pagas pelos emitentes.
ISTO ERA UMA OBRIGAÇÃO DE RESULTADO.
Eu não quero, eu já sei que o Banco Espírito Santo depois porque ele está, desculpe a expressão, mas é verdade, não é bonita mas é verdade, entaladíssimos com o que tinham feito e portanto eles não tinham este acordo que iam escrever que tinham dado todas as explicações porque não sei quê e eu compreendi também que não tinha conseguido alcançado o acordo se dissesse “vocês não deram” eles nunca iam assumir isso por escrito e, portanto, aquilo que eu quis não foi uma obrigação de meios, onde eu ficava sujeito ao pecado, foi uma obrigação de resultado, o Banco Espírito Santo declara e garante e declara e garante o quê? Que elas vão ser obrigatoriamente pagas pelo emitente.
Isto é um ponto  absolutamente essencial e tanto assim é que se vir na sistematização do acordo, que é um  acordo muito simples, a seguir têm a preocupação do reembolso, é que o banco diz “bom, mas quando vocês receberem os três milhões quinhentos e cinquenta primeiro vão pagar o nosso financiamento”, pronto, sim […] quitações o banco quer-se salvaguardar de todos os disparates, mas está sempre lá especificamente “sem prejuízo de receber três milhões, quinhentos e cinquenta” não é sem prejuízo de receber o que aquelas obrigações valessem, porque eu nessa conversa a posterior eu ouvi do banco, depois aconteceu o que aconteceu eu vim a interagir com o banco e aquilo que me vieram dizer “era o mercado” isso duma falta de honestidade absoluta.
[…] mas eu estou aqui a testemunhar por consciência, porque podiam todos ter-me autorizado mas se eu sentisse que estava a violar o meu privilégio profissional ou o meu dever profissional eu não testemunhava, eu estou a testemunhar por dever de consciência porque eu tive em reuniões com o Sr. PFV e eu não tenho Sr. Doutora Juíza qualquer estado de alma nisto, eu não tenho qualquer interesse, eu não tenho qualquer estado de alma, eu só me limito a de consciência gostar da minha profissão, tendo estado sentado com o Sr. PFV e com o Sr. RP e saber perfeitamente que o aqui estava aqui em causa era criar um mecanismo para pagar três milhões quinhentos e cinquenta e o acordo é isso que estipula. Sr. Doutora a ver se muito claro, esse era … de negociação, mais nada.
E ainda:
Depoimento de JAN
[00:17:12 a 00:18:05 do Depoimento da Testemunha]
Testemunha: O Sr. MOC é uma pessoa inteligente… é um homem de vida, mas de literacia financeira ele percebe mal o mecanismo sequer dos juros.
Ele sabe que quer receber, isso ele sabe e sabe ganhar dinheiro no negócio dele, agora, literacia financeira zero e da minha parte, que o representava que tenho a ousadia e a falta de modéstia alguma literacia financeira nem sequer. Primeiro eu não dou conselhos sob valores mobiliários nem qualidade de investimentos, não tenho competência para tal isto extrapola a minha função.
Mas o Sr. Doutor eu gostava que tivessem muito bem presente isto: é que a questão nem se colocou, isto era apresentado como se fosse dinheiro, portanto nem se discutiu.
Zero Doutor, respondendo à sua questão: Zero, eram só estas obrigações e não há outras.
Veja-se ainda:
Depoimento de JAN
[00:18:24 a 00:18:40 do Depoimento da Testemunha]
Mandatário Autor
Diga-me só uma coisa: nessa sequência foi explicado, foi mostrado, foi demonstrado, foi apresentado algum tipo de vantagem ou desvantagem ou informação acerca de quem era o Espírito Santo Financial Group, quem era o BES Finance, sob a sua solvabilidade, se eram entidades com muito património, com muito, enfim, muitos ativos, sólidas, houve alguma explicação a este propósito?
Testemunha:
Absolutamente nenhuma.
O princípio era sempre: o BES declara e garante que são pagas.
(…)
Ainda no seu depoimento,
Depoimento de JAN
[00:19:24 a 00:23:58 do Depoimento da Testemunha]
Mandatário do Autor:
Sr. Doutor foi, ou seja, neste acordo o Sr. Doutor já explicou, mas se consegue, se conseguir mais ou menos quantificar, ou seja, tem uma ideia de quanto é que o Sr. MOC, já referiu que o Sr. MOC ia receber três milhões quinhentos e cinquenta.
Tem noção mais ou menos quanto é que iria pagar e qual seria então a obrigação de resultado, ou seja, qual seria então o resultado final desta operação?
Testemunha:
Oh Sr. Doutor eu, portanto … posso dizer o que tenho na minha memória.
Seria, portanto, depois de pagar o financiamento qualquer coisa como 1.4 ou 1.3 milhões de euros, seria qualquer coisa por aí.
Ele pagava o financiamento e ficava com uma diferença que era aquele dinheiro que era dele de início e que de facto devido à autorização do Banco Espírito Santo tinha perdido ou da contraparte que não era o Banco Espírito Santo, mas era outra entidade …
Mandatário Autor:
Ou seja, é lícito para mim ou é aceitável eu poder concluir, daquilo que o Sr. Doutor tem vindo a dizer de que esta obrigação de resultado, como o Sr. Doutor qualificou, ou seja, estes três milhões quinhentos e cinquenta com o pagamento do financiamento, isso é que foi de alguma forma a pedra de toque que permitiu ao Sr. MOC e de alguma forma também ao Sr. Doutor perceber e aceitar este acordo ou seja, ter a certeza que findo este prazo do acordo receberiam 3 milhões quinhentos e cinquenta mil euros, pagariam o financiamento e ficariam com um milhão trezentos e trinta mil euros?
Foi estes resultados, estes números que foram efetivamente discernimentos para a celebração do acordo, para o Sr. MOC aceitar subscrever este acordo?
Testemunha:
Sr. Doutor eu volto repetir: formação da vontade, isso é cristalino, é esse o motivo pelo qual o Sr. MOC aceita o acordo e é esse o motivo pelo qual eu disse “aceito” porque para mim aquela garantia do Banco Espírito Santo na altura era dinheiro em caixa, não há outra razão, é essa, três milhões e quinhentos cinquenta que ele iria receber.
Mandatário Autor:
E foi pelo facto de ser o BES a propor isto e no fundo a estruturar este documento da forma que o estruturou que havendo vá, perdoe-me a expressão “chancela BES”, porque o BES em 2012 tinha peso no mercado, tinha uma marca que era sinonimo dessa solidez foi ou não também um fator determinado para o Sr. MOC, enfim, acreditar e perceber que isto era um acordo vantajoso?
Testemunha:
Oh Sr. Doutor à época e repare que isto é negociado em 2012, mas eu já tinha, sendo que eu tinha interação anteriores, a família Espírito Santo e mesmo o próprio Doutor RE Santo era uma das famílias europeias de banqueiros.
O Banco Espírito santo era uma instituição nacional e eu não vou repetir o que certamente estes nossos tribunais têm ouvido agora à saciedade e de algumas questões que ainda estão em discussão.
O Banco Espírito Santo até tinha o seu presidente do conselho de administração um … se é justo ou não é justo que era o autor disto tudo.
Portanto, sem ironia, sem qualquer tipo de ironia, aliás porque eu disse eu sou cliente do Banco Espírito Santo que tinha uma ideia que a reputação do banco era absoluta, mas essa ideia Sr. Doutor não era só por passar na televisão, era o que decorria das contas, era porque as … dos resultados, era por o Banco dizer que não tinha necessidade de ter recorrido a ajudas mais tarde quando veio, não necessitava de ajudas, portanto, havia todo um ambiente que nos fazia absolutamente acreditar que a instituição era sólida.
Portanto, eram vários clientes meus que iam para a Suíça para as reuniões e que vinham de lá muito … com a solidez do Grupo Espírito Santo, portanto, eu tinha essa ideia, olhe completamente errada, mas era o que é, de facto.
Mandatário Autor:
Nessa lógica, o Sr. Doutor e o naturalmente o Sr. MOC desconheciam ou não o estado de solvabilidade o estado de solidez financeira, por exemplo da Espírito Santo Financial Group, da BES Finance e do próprio Espírito Santo?
Testemunha:
Sr. Doutor, eram obrigações do BES, para o Sr. MOC e para mim, como bens a garantir pelos emitentes bancários, repito, era dinheiro em caixa. Nunca na minha vida eu pensei que passado anos ia estar sentado a discutir que aquilo não foi pago. Foi uma grande lição de vida.
E AINDA, para terminar:
Depoimento de JAN
[00:24:19 até 00:26:20 do Depoimento da Testemunha]
Mandatário Autor
Naturalmente quase que já me deu a resposta, naturalmente que não houve da parte dos funcionários, perdoe-me assim, do BES, o Sr. RP, do Sr. PFV, não houve nenhuma explicação acerca de quem era a Espírito Santo Financial Group, como é que estava financeiramente.
Testemunha:
Sr. Doutor até lhe digo um pormenor que … eu insisti para este “declaro e garanto” estar aqui.
Eu lembro-me uma altura, numa interação, já não vou precisar agora porque não quero estar aqui a faltar à verdade, se foi o Sr. RP ou se foi o Sr. PFV ou até se foi o meu colega que na altura se não me engano até se chamava (…) “Oh Doutor mas para que é que está a complicar são obrigações do Banco Espírito Santo” e eu disse “não, deixe  estar aí que é o Banco Espírito Santo Portugal, que a instituição portuguesa declara e garante” nunca me passou pela cabeça que aquilo não era pago, nunca.
Portanto, nem se discutia, repare o Sr. Doutor está-me a fazer perguntas e eu compreendo o alcance dessas perguntas e percebo completamente o interesse delas no processo, mas eu gostava que o meu testemunho anotasse o que aconteceu, e o que aconteceu na altura é que o Banco não explicou rigorosamente nada e a presunção do Banco a apresentar aquilo é: “isto é uma oferta irrecusável, nós conseguimos fazer aqui uma engenharia mas isto é irrecusável, pronto nós vamos resolver ao Sr. MOC e muito excecionalmente”, aliás, eles fizeram questão, Sr. Doutor, de pôr algures no acordo, isto é só procurar, olhe na cláusula 7 “composição da carteira: o cliente reconhece a existência de circunstâncias ta ta ta ta tendo, pelo que o Banco Espírito Santo não fica obrigado … mesmo que noutras situações de carácter excecional a atuar do mesmo modo” isto era uma solução excecional para um erro que eles assumiram que tinham feito, que não devia ter acontecido, excecional e portanto estavam aqui a propor.
Portanto, não houve explicação nenhuma, oh Sr. Doutor isto não, não houve explicação zero. Eu não tenho mais que lhe diga, zero, não houve explicação rigorosamente nenhuma nem foi tema, era dinheiro que nos iam entregar, sob forma de valores mobiliários.
Mandatário Autor:
Ou seja, foi no fundo quando terminou isto e quando o Sr. Doutor, o Sr. MOC, a Sra. JSRC e da parte do Banco naturalmente, assinaram este acordo foi com a firme certeza de que cumprido este acordo, tal qual mente se encontrava escrito seria sempre a garantia que o Sr. MOC teria de que findo recebia o seu dinheiro, recuperava as suas poupanças, pagava o que tinha a pagar e quer ele, quer o Banco, sairiam de bem nesta negociação.
17. Veja-se ainda que a referida Testemunha, de forma bastante assertiva e coerente, explicou ao pormenor os termos em que os Contratos foram celebrados, não tendo dúvidas ao afirmar que se tratava de uma obrigação de resultado.
18. Compulsada a prova supra citada e transcrita, conclui-se – sem sombra de dúvidas - que foi garantido o reembolso do capital quanto às obrigações ESFG.
Concomitantemente, não é apenas esse depoimento que aponta nesse sentido:
19. Atente-se, agora, nas declarações de parte do aqui Recorrente que devem ser valoradas por serem corroboradas por outros meios de prova como é exemplo a transcrição acima apontada.
MOC
(Ficheiro áudio 24693-15.5T8LSB_2022-03-25_10-55-21 assinado em ata de 25-03-2022)
(00h06m20s a 00h08m10s das declarações de parte do Autor)
Mandatário dos Autores:
Nós estamos aqui a discutir está aqui em causa um acordo que o senhor fez com o Banco Espírito Santo, certo?
O que eu lhe pedia era de forma muito objetiva, muito sucinta, muito uito resumida, nos explicasse o acordo como é que surgiu o acordo, porque é que surgiu o acordo e em que condições surgiu o acordo?
Autor:
Sô Doutor o acordo surgiu na na na sequência do banco Lehman LemhanBrotherquecomo eles tinhamdinheiro no banco Leham Brother segundo eles me disseram que era um banco americano, mas sempre me disseram, após a falência, sempre me diziam que o banco estava aqui em Lousada, em em 2008, surgiu a falência do Lehman, eu ia para o trabalho, ouvi as notícias contactei o senhor JPC, disse «Senhor JPC eu estou a ouvir uma notícia e que vocês dizem que o dinheiro está num banco Lehman Brother que o banco faliu», e ele disse «oh sô MOC ou você dormiu mal ou está a sonhar, olhe eu estou a tomar banho, mas vou daqui a bocado para o banco e já lhe falo, já lhe ligo», passado mais tarde ligou-me e disse-me «sim, tem razão, nem eu estava à espera disto, nem ninguém» e eu »diga-me e agora o que é da minha vida?» e ele «tenha calma, tenha calma porque por detrás disto tudo está o Banco Espírito Santo, nós fazemos aquilo que o Banco nos manda fazer» e eu «mas é que eu não tenho nada na minha conta, tenho dívidas, eu fiquei em 0, ainda fico a dever», «o senhor tenha calma, não se irrite que nós vamos arranjar uma solução para que o senhor recupere o seu capital». Enfim, entrei assim em pânico, depois contactaram-me várias vezes e vieram a minha casa, como acabei de dizer, não vieram a casa, mas vieram a Zurique e aí que eles disseram diziam que iam arranjar uma forma de recuperar os meus capitais e começaram
[…]
MOC
(00h08m11s a 00h09m49s das declarações de parte do Autor)
Mandatário do Autor:
Como é que era essa forma?
Autor:
Compra disse que ia comprar obrigações e, de uma forma, e umas, ia comprar e vender e etc. e eu disse-lhe «Senhor PC respeite-me, eu não quero mais ouvir falar em obrigações porque eu não sabia o que era uma obrigação, não sabia o que era, mas hoje, a partir de hoje, estou a saber que os senhores investem o meu capital em produtos de risco e ele respondeu-me «Senhor MOCrepito-lhe pela terceira vez que a responsabilidade é Banco Espírito Santo e a prova está aqui, nós estamos a arranjar um mecanismo para que o senhor recupere esse dinheiro», «oh Senhor JPC se os senhores têm um mecanismo para recuperar o meu dinheiro, o meu capital, porque é que não depositam o dinheiro numa conta e eu vou-me embora, deixem o meu dinheiro num depósito a prazo», «não, não podemos fazer isto porque o banco tem de arranjar uma forma de recuperar o dinheiro, mas numa conta vai entrar já o dinheiro que lá estava, só que o senhor vai ter um crédito», e eu, « assim ainda pior fico», que chego a um certo ponto, que eu cheguei a um ponto que o estado de saúde ficou degradado de tal ordem que não sabia o que havia de fazer que eu entrei, como é que se diz, um esgotamento cerebral e não sabia o que havia de fazer, pronto, daí que eles andaram sempre com créditos e mais créditos até chegarem ao acordo de 2012. Quando fizeram o acordo final para recuperar todas as finanças perdidas, nomeadamente um milhão e quarenta e nove do Lehman Brother, duzentos mil do Kaupting, e juros que não recebi do Lehman Brother, por isso, considero danos tudo isso
[…]
MOC
(00h09m51s a 00h11m01s das declarações de parte do Autor)
Autor:
Chegamos a um acordo em 2012.
Mandatário do Autor:
Quando diz chegamos, chegamos quem? Quem é que fez parte desse acordo?
Autor:
O senhor MP que já era, só ele, o gestor, que o senhor JPC já não era, já era o senhor MP meu gestor e foi ele que me propôs que me disse Senhor MOC, nós agora aqui vamos arranjar uma solução final e credível para que o senhor recupere todas as suas poupanças. Para isso nós vamos arranjar um financiamento, este financiamento para recuperar os capitais o senhor vai ficar com uma dívida 2.220.000 Euros, eu fiquei mal disposto e parei um pouco, eu disse eu isso não quero mais na minha vida, vocês estão-me a arrastar para uma situação, estão me a arruinar a saúde, eu já estou incapacitado 50% de trabalhar, isto daqui a pouco eu não posso trabalhar na situação em que me encontro. Ele disse «senhor MOC aquilo que estamos a fazer é o banco, é da responsabilidade do banco». Chegamos ao dia em que fomos assinar um crédito de 2.220.000, eu estava calado.
Nessa medida, perante o que antecede,
20.       da conjugação dos depoimentos acima reproduzidos, deve o ponto 2 da matéria de facto dada como não provada ser aditado à matéria dada como provada, o que hic et nunc se requer.
*
A.2. - DO ADITAMENTO À MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA

DO PONTO 5 DADO COMO NÃO PROVADO
21. A instância recorrida deu como não provado o ponto 5 maxime:
- que os As não foram informados sobre as características e natureza e riscos das obrigações ESFG2019.
22. Em primeiro lugar, como resulta de jurisprudência assente, o ónus da prova dessa comunicação e explicação era da Ré, aqui Recorrida, o que não logrou fazer/provar.
Assim,
23. por essa razão, deve o ponto ser desde logo dado como provado.
24. Mesmo que assim não fosse, o que não se concede, sobre tal factualidade, atente-se no pormenorizado depoimento da Testemunha JAN, relatando – em suma - o seguinte:
Depoimento de JAN
[00:07:25 a 00:07:45 do depoimento da Testemunha]
Mandatário Autor:
Ok, relativamente a isso tenho ainda algumas questões para colocar ao Sr. Doutor.
O Sr. Doutor esteve directamente presente, teve intervenção nessa negociação, ou seja, acompanhou a negociação até à celebração do acordo, correto?
Testemunha:
Diretamente, fui eu que negociava e fui eu que estive a comentar as possíveis propostas de acordo.
Portanto, o acordo foi proposto pelo Banco Espírito Santo e pronto, e quer dizer depois como é normal na redação dos acordos a gente ia tentando fazer sugestões para aproximar o valor do …
Mandatário Autor:
Pronto, tocou aí numa parte que eu também o iria questionar, que era: o acordo em si, o documento e como referiu de acordo com as suas palavras esse tal mecanismo de “engenharia financeira” foi algo que o Sr. MOC, enfim, quando eu digo o Sr. MOC digo também o seu Sr. Doutor, tiveram possibilidade de conformar e de discutir e de rever cláusula a cláusula ou houve, no fundo, uma apresentação da parte do Banco Espírito Santo e depois uma mera verificação, ou seja, se houve efetivamente uma discussão e uma intervenção direta no clausulado ou foi algo que foi apresentado pelo Banco Espírito Santo e analisado da parte do Sr. MOC e do Sr. Doutor.
Consegue explicar que capacidade, digamos, de conformação do documento tiveram, teve o Sr. Doutor e o Sr. MOC?
Depoimento de JAN
[00:08:37 a 00:12:02 do depoimento da Testemunha]
Testemunha
Vamos ver, Sr. Doutor, há aqui, quando falamos deste tipo de negociações, há aqui hoje duas ou três dimensões, para ser fiel e muito rigoroso ao que de facto se sucedeu que tem de se explicar.
Primeiro facto, eu estou numa interação com o Banco Espírito Santo porque pretendo que o Banco Espírito Santo reconheça prejuízos que causou ao meu cliente e pretendendo evitar ações judiciais que acho que é a nossa função, ter uma paz social e, portanto, encontrar soluções que não sejam para … os tribunais, encontrar com o banco uma solução que não fosse ir para a via judicial.
O Sr. MOC que me acompanhou, aliás, nós tivemos variadíssimas, agora não lhe sei dizer a quantidade, de interações por via telefónica e tivemos, se a memória não me atraiçoa, duas, pelo menos duas reuniões presenciais que foram essenciais para desbloquear isto.
A princípio as condições estavam muito extremadas, o Sr. MOC estava profundamente desagradado com o Sr. RP, achava-o um burlão, achava que tinha sido literalmente enganado por ele e, portanto, a situação estava muito extremada.
Com o diálogo, com a tentativa que também empenhei para chegar a um entendimento, quando o Banco Espírito Santo vem com esta engenharia, quer dizer nós não estivemos, eu não tive qualquer capacidade de influência ou negociação aliás, eu confesso que agora, não é, porque é quase impossível eu não ser influenciado pelo que sei que aconteceu agora, mas na altura quando me apresentam e dizem “Olhe, essencialmente nós vamos fazer aqui um acerto de contas, nós vamos apresentar aqui umas obrigações que vocês vão comprar com quase desconto de 50%, vão deixar passar x tempo e elas vão ser recompradas […] por quem o Banco Espírito Santo vai garantir … que arranja e ao ser comprados pelo seu valor nominal vão lhe dar os seus três milhões quinhentos e cinquenta, valor que deduzido ao financiamento dá o valor do prejuízo do Sr. MOC.
Portanto, quanto à questão financeira eu confesso que aquilo que me preocupei foi pôr claramente no contrato, que ficasse muito claro que aquilo está a determinar o Sr. MOC a aceitar este acordo eram duas coisas: uma que ia receber três milhões quinhentos e cinquenta garantido pelo Banco Espírito Santo; eu sinceramente naquela altura nem era que desconfiasse de nada que achava que o Banco Espírito Santo era à prova de bala, mas não tinha capacidade para dar um conselho ao meu cliente de decência se aqueles emitentes estavam ou não estavam, portanto, aqui eu absolutamente as questões de garantia que para mim foram as que serviram para a formação da vontade eram as do Banco Espírito Santo e foi isso que eu quis … nessa parte, o acordo tem uma própria negociação e o banco teve de acolher também as sugestões que eu fazia.
Agora, se me pergunta se nós tivemos a discutir se queríamos as obrigações A ou as obrigações B ou se o financiamento ia ser cinco euros acima ou cinco euros abaixo, nem o Sr. MOC sequer percebe nada disto nem eu que chegava a abordar o problema nesse sentido, para mim, não passava pela cabeça que uma obrigação emitida pelo universo Espírito Santo não valesse dinheiro e, portanto, era inócua, quer dizer hoje eu, se calhar o Sr. Doutor vai dizer “então o Sr. não devia … diligência”
Mandatário Autor:
É um bocadinho nessa linha que eu queria questionar, uma coisa é negociar ou tentar vincar algum tipo de garantia ou pelo menos a certeza que, findo determinado período, ou seja, este acordo visava um resultado que era receber determinada quantia para depois de pago o financiamento o Sr. MOC receber o valor que havia perdido das suas poupanças. Isso ficou, digamos, salvaguardado ou ficou impresso, digamos, para as partes neste acordo? […]
Depoimento de JAN
[00:13:26 a 00:16:28 do Depoimento da Testemunha]
Testemunha
Pronto, eu só estou a pedir o acordo porque é mais fácil não é, Sra. Doutora, os documentos falam sempre melhor.
O essencial tendo no ponto três onde explico o acerto de contas portanto, repare, isto é um acordo que é um acerto de contas quando o Banco vai acertar as contas que tem aqui com o Sr. MOC e depois para mim foi essencial um ponto quatro que claramente tem epígrafe “da formação da vontade” e a formação a vontade era o Banco Espírito Santo declarar e garantir que as ações eram pagas pelos emitentes.
Isto era uma obrigação de resultado.
Eu não quero, eu já sei que o Banco Espírito Santo depois porque ele está, desculpe a expressão, mas é verdade, não é bonita mas é verdade, entaladíssimos com o que tinham feito e portanto eles não tinham este acordo que iam escrever que tinham dado todas as explicações porque não sei quê e eu compreendi também que não tinha conseguido alcançado o acordo se dissesse “vocês não deram” eles nunca iam assumir isso por escrito e, portanto, aquilo que eu quis não foi uma obrigação de meios, onde eu ficava sujeito ao pecado, foi uma obrigação de resultado, o Banco Espírito Santo declara e garante e declara e garante o quê?
Que elas vão ser obrigatoriamente pagas pelo emitente.
Isto é um ponto absolutamente essencial e tanto assim é que se vir na sistematização do acordo, que é um acordo muito simples, a seguir têm a preocupação do reembolso, é que o banco diz “bom bom, mas quando vocês receberem os três milhões quinhentos e cinquenta primeiro vão pagar o nosso financiamento”, pronto, sim senhora … porque este era o … que estava aqui e depois temos que quando … quitações o banco quer-se salvaguardar de todos os disparates, mas está sempre lá especificamente “sem prejuízo de receber três milhões, quinhentos e cinquenta” não é sem prejuízo de receber o que aquelas obrigações valessem, porque eu nessa conversa a posterior eu ouvi do banco, depois aconteceu o que aconteceu eu vim a interagir com o banco e aquilo que me vieram dizer “era o mercado” isso duma falta de honestidade absoluta, eu tenho que dizer, aliás eu estou a testemunhar, é óbvio que a relação dispensou-me e eu não iria desobedecer à minha … mas eu estou aqui a testemunhar por consciência, porque podiam todos ter-me autorizado mas se eu sentisse que estava a violar o meu privilégio profissional ou o meu dever profissional eu não testemunhava, eu estou a testemunhar por dever de consciência porque eu tive em reuniões com o Sr. PFV e eu não tenho Sr. Doutora Juíza qualquer estado de alma nisto, eu não tenho qualquer interesse, eu não tenho qualquer estado de alma, eu só me limito a de consciência gostar da minha profissão, tendo estado sentado com o Sr. PFV e com o Sr. RP e saber perfeitamente que o aqui estava aqui em causa era criar um mecanismo para pagar três milhões quinhentos e cinquenta e o acordo é isso que estipula. Sr. Doutora a ver se muito claro, esse era … de negociação, mais nada.
[…]
Depoimento de JAN
[00:16:40 a 00:16:52 do depoimento da Testemunha]
Mandatário Autor:
Sr. Doutor, a esse propósito diga-me uma coisa: a seleção dos produtos, ou seja, das obrigações se eram Espírito Santo Financial Group, se eram BES, se eram BES finance, o que fosse da Toyota, da Audi, o que fosse, a selecção dos produtos teve alguma influência, alguma negociação, alguma intervenção do Sr. MOC ou do Sr. Doutor?
Testemunha:
Sr. Doutor, do Sr. MOC de todo… Vamos ver o perfil do Sr. MOC …
Eu tenho muito respeito pelo Sr. MOC, nem sei se está aí na sala.
Mandatário Autor
Não…
Testemunha
[00:17:12 a 00:18:05 do depoimento da Testemunha]
O Sr. MOC é uma pessoa inteligente… é um homem de vida, mas de literacia financeira ele percebe mal o mecanismo sequer dos juros.
Ele sabe que quer receber, isso ele sabe e sabe ganhar dinheiro no negócio dele, agora, literacia financeira zero e da minha parte, que o representava que tenho a ousadia e a falta de modéstia alguma literacia financeira nem sequer.
Primeiro eu não dou conselhos sob valores mobiliários nem qualidade de investimentos, não tenho competência para tal isto extrapola a minha função.
Mas o Sr. Doutor eu gostava que tivessem muito bem presente isto: é que a questão nem se colocou, isto era apresentado como se fosse dinheiro, portanto nem se discutiu.
Zero Doutor, respondendo à sua questão: Zero, eram só estas obrigações e não há outras. (…)
Depoimento de JAN
[00:18:24 a 00:18:40 do Depoimento da Testemunha]
Mandatário Autor
Diga-me só uma coisa: nessa sequência foi explicado, foi mostrado, foi demonstrado, foi apresentado algum tipo de vantagem ou desvantagem ou informação acerca de quem era o Espírito Santo Financial Group, quem era o BES Finance, sob a sua solvabilidade, se eram entidades com muito património, com muito, enfim, muitos ativos, sólidas, houve alguma explicação a este propósito?
Testemunha:
Absolutamente nenhuma.
O princípio era sempre: o BES declara e garante que são pagas.
[…]
Depoimento de JAN
[00:19:24 a 00:23:58 do Depoimento da Testemunha]
Mandatário do Autor:
Sr. Doutor foi, ou seja, neste acordo o Sr. Doutor já explicou, mas se consegue, se conseguir mais ou menos quantificar, ou seja, tem uma ideia de quanto é que o Sr. MOC, já referiu que o Sr. MOC ia receber três milhões quinhentos e cinquenta.
Tem noção mais ou menos quanto é que iria pagar e qual seria então a obrigação de resultado, ou seja, qual seria então o resultado final desta operação?
Testemunha:
Oh Sr. Doutor eu, portanto … posso dizer o que tenho na minha memória.
Seria, portanto, depois de pagar o financiamento qualquer coisa como 1.4 ou 1.3 milhões de euros, seria qualquer coisa por aí.
Ele pagava o financiamento e ficava com uma diferença que era aquele dinheiro que era dele de início e que de facto devido à autorização do Banco Espírito Santo tinha perdido ou da contraparte que não era o Banco Espírito Santo, mas era outra entidade …
Mandatário Autor:
Ou seja, é lícito para mim ou é aceitável eu poder concluir, daquilo que o Sr. Doutor tem vindo a dizer de que esta obrigação de resultado, como o Sr. Doutor qualificou, ou seja, estes três milhões quinhentos e cinquenta com o pagamento do financiamento, isso é que foi de alguma forma a pedra de toque que permitiu ao Sr. MOC e de alguma forma também ao Sr. Doutor perceber e aceitar este acordo ou seja, ter a certeza que findo este prazo do acordo receberiam 3 milhões quinhentos e cinquenta mil euros, pagariam o financiamento e ficariam com um milhão trezentos e trinta mil euros?
Foi estes resultados, estes números que foram efetivamente discernimentos para a celebração do acordo, para o Sr. MOC aceitar subscrever este acordo?
Testemunha:
Sr. Doutor eu volto repetir: formação da vontade, isso é cristalino, é esse o motivo pelo qual o Sr. MOC aceita o acordo e é esse o motivo pelo qual eu disse “aceito” porque para mim aquela garantia do Banco Espírito Santo na altura era dinheiro em caixa, não há outra razão, é essa, três milhões e quinhentos cinquenta que ele iria receber.
Mandatário Autor:
E foi pelo facto de ser o BES a propor isto e no fundo a estruturar este documento da forma que o estruturou que havendo vá, perdoe-me a expressão “chancela BES”, porque o BES em 2012 tinha peso no mercado, tinha uma marca que era sinónimo dessa solidez foi ou não também um fator determinado para o Sr. MOC, enfim, acreditar e perceber que isto era um acordo vantajoso?
Testemunha:
Oh Sr. Doutor à época e repare que isto é negociado em 2012, mas eu já tinha, sendo que eu tinha interação anteriores, a família Espírito Santo e mesmo o próprio Doutor RE Santo era uma das famílias europeias de banqueiros.
O Banco Espírito santo era uma instituição nacional e eu não vou repetir o que certamente estes nossos tribunais têm ouvido agora à saciedade e de algumas questões que ainda estão em discussão.
O Banco Espírito Santo até tinha o seu presidente do conselho de administração um … se é justo ou não é justo que era o autor disto tudo.
Portanto, sem ironia, sem qualquer tipo de ironia, aliás porque eu disse eu sou cliente do Banco Espírito Santo  que tinha uma ideia que a reputação do banco era absoluta, mas essa ideia Sr. Doutor não era só por passar na televisão, era o que decorria das contas, era porque as … dos resultados, era por o Banco dizer que não tinha necessidade de ter recorrido a ajudas mais tarde quando veio, não necessitava de ajudas, portanto, havia todo um ambiente que nos fazia absolutamente acreditar que a instituição era sólida.
Portanto, eram vários clientes meus que iam para a Suíça para as reuniões e que vinham de lá muito … com a solidez do Grupo Espírito Santo, portanto, eu tinha essa ideia, olhe completamente errada, mas era o que é, de facto.
Mandatário Autor:
Nessa lógica, o Sr. Doutor e o naturalmente o Sr. MOC desconheciam ou não o estado de solvabilidade o estado de solidez financeira, por exemplo da Espírito Santo Financial Group, da BES Finance e do próprio Espírito Santo?
Testemunha:
Sr. Doutor, eram obrigações do BES, para o Sr. MOC e para mim, como bens a garantir pelos emitentes bancários, repito, era dinheiro em caixa. Nunca na minha vida eu pensei que passado anos ia estar sentado a discutir que aquilo não foi pago. Foi uma grande lição de vida.
[…]
Depoimento de JAN
[00:24:19 até 00:26:20 do Depoimento da Testemunha]
Mandatário Autor:
Naturalmente quase que já me deu a resposta, naturalmente que não houve da parte dos funcionários, perdoe-me assim, do BES, o Sr. RP, do Sr. PFV, não houve nenhuma explicação acerca de quem era a Espírito Santo Financial Group, como é que estava financeiramente.
Testemunha:
Sr. Doutor até lhe digo um pormenor que … eu insisti para este “declaro e garanto” estar aqui.
Eu lembro-me uma altura, numa interação, já não vou precisar agora porque não quero estar aqui a faltar à verdade, se foi o Sr. RP ou se foi o Sr. PFV ou até se foi o meu colega que na altura se não me engano até se  chamava(…)“Oh Doutor mas para que é que está a complicar são obrigações do Banco Espírito Santo” e eu disse “não, deixe estar aí que é o Banco Espírito Santo Portugal, que a instituição portuguesa declara e garante” nunca me passou pela cabeça que aquilo não era pago, nunca.
Portanto, nem se discutia, repare o Sr. Doutor está-me a fazer perguntas e eu compreendo o alcance dessas perguntas e percebo completamente o interesse delas no processo, mas eu gostava que o meu testemunho anotasse o que aconteceu, e o que aconteceu na altura é que o Banco não explicou rigorosamente nada e a presunção do Banco a apresentar aquilo é: “isto é uma oferta irrecusável, nós conseguimos fazer aqui uma engenharia mas isto é irrecusável, pronto nós vamos resolver ao Sr. MOC e muito excecionalmente”, aliás, eles fizeram questão, Sr. Doutor, de pôr algures no acordo, isto é só procurar, olhe na cláusula 7 “composição da carteira: o cliente reconhece a existência de circunstâncias ta ta ta ta tendo, pelo que o Banco Espírito Santo não fica obrigado … mesmo que noutras situações de carácter excecional a atuar do mesmo modo” isto era uma solução excecional para um erro que eles assumiram que tinham feito, que não devia ter acontecido, excecional e portanto estavam aqui a propor.
Portanto, não houve explicação nenhuma, oh Sr. Doutor isto não, não houve explicação zero. Eu não tenho mais que lhe diga, zero, não houve explicação rigorosamente nenhuma nem foi tema, era dinheiro que nos iam entregar, sob forma de valores mobiliários.
Mandatário Autor:
Ou seja, foi no fundo quando terminou isto e quando o Sr. Doutor, o Sr. MOC, a Sra. JSRC e da parte do Banco naturalmente, assinaram este acordo foi com a firme certeza de que cumprido este acordo, tal qual mente se encontrava escrito seria sempre a garantia que o Sr. MOC teria de que findo recebia o seu dinheiro, recuperava as suas poupanças, pagava o que tinha a pagar e quer ele, quer o Banco, sairiam de bem nesta negociação.
Assim sendo,
25. Perante a forma com a situação foi sendo conduzida pela entidade bancária, como se extrai/conclui das declarações da Testemunha, os As não foram informados sobre as características e natureza e riscos das obrigações ESFG2019.
26. Do depoimento acabado de transcrever vislumbra-se que não foi fornecida absolutamente nenhuma informação sobre as características, natureza e riscos das obrigações.
Por tudo isto,
27. deve ser aditado à matéria de facto dada como provada que: “os As não foram informados sobre as características e natureza e riscos das obrigações ESFG2019”, o que aqui expressamente se peticiona para todos os efeitos legais.
*

A.3. - DO ADITAMENTO À MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA DO PONTO 6 DADO COMO NÃO PROVADO
28. Segundo o Tribunal a quo, foi dado como Não Provado o ponto 6, ou seja, que
- os As desconheciam a natureza e características das obrigações ESFG2019.
29. Por economia processual, os mesmíssimos meios de prova que servem de
impugnação para o ponto 5 são aqui integralmente reproduzidos para impugnação do ponto 6.
30. Id est, os meios de prova acima transcritos a propósito do ponto 5 que cumprem o
ónus estatuído no artigo 640º da lei processual civil, dão-se aqui por reproduzidos para servir de fundamento à impugnação do ponto 6 acima citado.
31. É jurisprudência assente que nada obsta a que a impugnação da matéria de facto
seja efetuada por “blocos de factos”, quando os pontos integrantes de cada um desses blocos apresentem entre si evidente conexão e, para além disso - tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, nomeadamente, o número de factos impugnados e a extensão e conexão dos meios de prova -, o conteúdo da impugnação seja perfeitamente compreensível pela parte contrária e pelo Tribunal, não exigindo a sua análise um esforço anómalo, superior ao normalmente suposto.
32. Do depoimento acima transcrito a propósito do ponto 5 que aqui se reproduz, está claramente demonstrado que os Recorrentes desconheciam a natureza e as características das obrigações.
Por conseguinte,
33. deve ser aditado à matéria dada como Provada que “os As desconheciam a natureza e características das obrigações ESFG2019”, o que aqui expressamente se peticiona para todos os efeitos legais.
A.4. - DO ADITAMENTO À MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA DO PONTO 4 DADO COMO NÃO PROVADO
34. Segundo o Tribunal a quo, foi dado como Não Provado o ponto 4, ou seja:
- vontade viciada dos autores na aquisição dos produtos obrigações ESFG e respectivo conhecimento do BES.
35. Muito mal andou o Tribunal a quo a decidir como decidiu.
36. Sobre este tema, não se poderá ignorar o depoimento da Testemunha JAN, explicando o seguinte ao Tribunal:
Depoimento de JAN
[00:06:00 a 00:07:11 do depoimento da Testemunha]
Testemunha:
Sim, sim, portanto, penso que posso explicar as circunstâncias em que levou a esse acordo, porque, como sabem eu fui advogado da Família MOC, do veículo que eles utilizavam para ter as suas contas no … Espírito Santo e essencialmente o que teve na base da discussão e depois o acordo alcançado.
Foi que o Senhor MOC tinha, era cliente do Private Banking e enquanto cliente do Private Banking ele entrou num período de grande aflição, porque quando se deu a crise do suprime e depois com todo o problema com o   Lehman Brothers e aí por fora, o Sr. MOC que tinha obrigações no Private Banking do Kaupting e do Lehamn Brothers sofreu avultadíssimos prejuízos.
Sofreu avultados prejuízos e nessa altura depara-se com a situação em que também na sua conta de Private tinha obrigações do Banco Espírito Santo, isto, pronto, sintetizando porque … já vai há alguns anos e eu tenho medo de não poder ser se calhar fiel aos detalhes, mas essencialmente quando o Sr. MOC me consulta vem indignadíssimo porque o Banco essencialmente teria utilizado o seu dinheiro e a sua conta do Private Banking entenda-se, à época, para um conjunto de investimentos que eram completamente contra a sua vontade.
E ele o que mais pedia ao seu gerente de conta e, portanto, estou aqui a citar o que é que ele, a mensagem que o cliente na altura me transmite, aquilo que ele mais queria era ter uma taxa de juro e um menor risco possível e estava chocado com as opções que o Banco Espírito Santo e o seu gestor de conta tinham tomado.
Na altura, quando começamos a analisar os documentos e a ver, de facto deparamo-nos com um conjunto de situações que na nossa opinião, à época, eram suscetíveis de lhe dar razão, às reivindicações do Sr. MOC. Efetivamente, na nossa ótica, o Private e os seus gestores de conta gostavam de frisar aqui algumas características que para mim foramessenciaisna minha opinião, a própriaanálise de risco do banco considerava que o Sr. MOC não era um investidor profissional, basta conhecer o Sr. MOC, lidar com o Sr. MOC.
Meritíssima Juiz:
Sr. Doutor, isto está um bocadinho fora, se não se importa senão…
Mandatário Autor:
Oh Sr. Doutor se puder só reconduzir, ou seja, no sentido de teve consciência e noção desses prejuízos e se puder, ou seja, já teve a circunstanciar essa situação dos prejuízos e depois se puder…
Testemunha:
Eu pronto, peço desculpa, não me vou alongar.
Eu só quero dizer é que este acordo só surgiu e é por isso que como me perguntou as circunstâncias do acordo eu tenho que determinadas coisas do facto que tiveram na base da formação da vontade.
E os factos que tiveram na formação da vontade é que chegamos a um momento em que nós íamos para a via judicial e depois do (…) houve um entendimento em que o Banco Espírito Santo vem com uma proposta onde essencialmente propunha-se que através do financiamento, através de adquirir as obrigações que eles tinham na altura comprado em nome do Sr. MOC com o poder discricionário que o ato tinha, eles essencialmente estabeleciam um acordo onde, com a engenharia financeira no final de um determinado período o Sr. MOC acabaria porrecuperar o dinheiro que teria perdido com aquelas decisões, e, portanto, foi nesse contexto, num contexto de evitar que, portanto, litígios e num contexto de alcançar um acordo extrajudicial que este acordo é lavrado (…)
Depoimento de JAN
[00:07:25 a 00:07:45 do depoimento da Testemunha]
Mandatário Autor:
Ok, relativamente a isso tenho ainda alguma questões para colocar ao Sr. Doutor.
O Sr. Doutor esteve diretamente presente,teve intervenção nessa negociação, ou seja, acompanhou a negociação até à celebração do acordo, correto?
Testemunha:
Diretamente, fui eu que negociava e fui eu que estive a comentar as possíveis propostas de acordo.

Portanto, o acordo foi proposto pelo Banco Espírito Santo e pronto, e quer dizer depois como é normal na redação dos acordos a gente ia tentando fazer sugestões para aproximar o valor do …
Mandatário Autor:
Pronto, tocou aí numa parte que eu também o iria questionar, que era: o acordo em si, o documento e como referiu de acordo com as suas palavras esse tal mecanismo de “engenharia financeira” foi algo que o Sr. MOC, enfim, quando eu digo o Sr. MOC digo também o seu Sr. Doutor, tiveram possibilidade de conformar e de discutir e de rever cláusula a cláusula ou houve, no fundo, uma apresentação da parte do Banco Espírito Santo e depois uma mera verificação, ou seja, se houve efetivamente uma discussão e uma intervenção direta no clausulado ou foi algo que foi apresentado pelo Banco Espírito Santo e analisado da parte do Sr. MOC e do Sr. Doutor.
Consegue explicar que capacidade, digamos, de conformação do documento tiveram, teve o Sr. Doutor e o Sr. MOC?
Depoimento da testemunha JAN:
[00:08:37 a 00:12:02 do depoimento da Testemunha]
Testemunha
Vamos ver, Sr. Doutor, há aqui, quando falamos deste tipo de negociações, há aqui hoje duas ou três dimensões, para ser fiel e muito rigoroso ao que de facto se sucedeu que tem de se explicar.
Primeiro facto, eu estou numa interação com o Banco Espírito Santo porque pretendo que o Banco Espírito Santo reconheça prejuízos que causou ao meu cliente e pretendendo evitar ações judiciais que acho que é a nossa função, ter uma paz social e, portanto, encontrar soluções que não sejam para … os tribunais, encontrar com o banco uma solução que não fosse ir para a via judicial.
O Sr. MOC que me acompanhou, aliás, nós tivemos variadíssimas, agora não lhe sei dizer a quantidade, de interações por via telefónica e tivemos, se a memória não me atraiçoa, duas, pelo menos duas reuniões presenciais que foram essenciais para desbloquear isto.
A princípio as condições estavam muito extremadas, o Sr. MOC estava profundamente desagradado com o Sr. RP, achava-o um burlão, achava que tinha sido literalmente enganado por ele e, portanto, a situação estava muito extremada.
Com o diálogo, com a tentativa que também empenhei para chegar a um entendimento, quando o Banco Espírito Santo vem com esta engenharia, quer dizer nós não estivemos, eu não tive qualquer capacidade de influência ou negociação aliás, eu confesso que agora, não é, porque é quase impossível eu não ser influenciado pelo que sei que aconteceu agora, mas na altura quando me apresentam e dizem “Olhe, essencialmente nós vamos fazer aqui um acerto de contas, nós vamos apresentar aqui umas obrigações que vocês vão comprar com quase desconto de 50%, vão deixar passar x tempo e elas vão ser recompradas […] por quem o Banco Espírito Santo vai garantir … que arranja e ao ser comprados pelo seu valor nominal vão lhe dar os seus três milhões quinhentos e cinquenta, valor que deduzido ao financiamento dá o valor do prejuízo do Sr. MOC.
Portanto, quanto à questão financeira eu confesso que aquilo que me preocupei foi pôr claramente no contrato, que ficasse muito claro que aquilo está a determinar o Sr. MOC a aceitar este acordo eram duas coisas: uma que ia receber três milhões quinhentos e cinquenta garantido pelo Banco Espírito Santo; eu sinceramente naquela altura nem era que desconfiasse de nada que achava que o Banco Espírito Santo era à prova de bala, mas não tinha capacidade para dar um conselho ao meu cliente de decência se aqueles emitentes estavam ou não estavam, portanto, aqui eu absolutamente as questões de garantia que para mim foram as que serviram para a formação da vontade eram as do Banco Espírito Santo e foi isso que eu quis … nessa parte, o acordo tem uma própria negociação e o banco teve de acolher também as sugestões que eu fazia.
Agora, se me pergunta se nós tivemos a discutir se queríamos as obrigações A ou as obrigações B ou se o financiamento ia ser cinco euros acima ou cinco euros abaixo, nem o Sr. MOC sequer percebe nada disto nem eu que chegava a abordar o problema nesse sentido, para mim, não passava pela cabeça que uma obrigação emitida pelo universo Espírito Santo não valesse dinheiro e, portanto, era inócua, quer dizer hoje eu, se calhar o Sr. Doutor vai dizer “então o Sr. não devia … diligência”
Mandatário Autor:
É um bocadinho nessa linha que eu queria questionar, uma coisa é negociar ou tentar vincar algum tipo de garantia ou pelo menos a certeza que, findo determinado período, ou seja, este acordo visava um resultado que era receber determinada quantia para depois de pago o financiamento o Sr. MOC receber o valor que havia perdido das suas poupanças.
Isso ficou, digamos, salvaguardado ou ficou impresso, digamos, para as partes neste acordo?
Depoimento de JAN
[00:12:42 a 00:12:55 do Depoimento da Testemunha]
Testemunha:
A Meritíssima Juiz permite-me que eu vim com esse documento porque tive de o ir buscar ao meu arquivo. Eu tenho aqui na minha posse o acordo que na altura ajudei o Sr. MOC e o qual ele subscreveu.
A Sra. Doutora permite-me que é mais fácil do que eu estar a pedir que me exibam o documento. Meritíssima Juiz:
Sim, sim, ele também está no processo. Pode ver, Sr. Doutor, documento n.º 1
[…]
Depoimento de JAN
[00:13:26 a 00:16:28 do Depoimento da Testemunha]
Testemunha:
Pronto, eu só estou a pedir o acordo porque é mais fácil não é, Sra. Doutora, os documentos falam sempre melhor.
O essencial tendo no ponto três onde explico o acerto de contas portanto, repare, isto é um acordo que é um acerto de contas quando o Banco vai acertar as contas que tem aqui com o Sr. MOC e depois para mim foi essencial um ponto quatro que claramente tem epígrafe “da formação da vontade” e a formação a vontade era o Banco Espírito Santo declarar e garantir que as ações eram pagas pelos emitentes.
Isto era uma obrigação de resultado.
Eu não quero, eu já sei que o Banco Espírito Santo depois porque ele está, desculpe a expressão, mas é verdade, não é bonita mas é verdade, entaladíssimos com o que tinham feito e portanto eles não tinham este acordo que iam escrever que tinham dado todas as explicações porque não sei quê e eu compreendi também que não tinha conseguido alcançado o acordo se dissesse “vocês não deram” eles nunca iam assumir isso por escrito e, portanto, aquilo que eu quis não foi uma obrigação de meios, onde eu ficava sujeito ao pecado, foi uma obrigação de resultado, o Banco Espírito Santo declara e garante e declara e garante o quê?
Que elas vão ser obrigatoriamente pagas pelo emitente.
Isto é um ponto absolutamente essencial e tanto assim é que se vir na sistematização do acordo, que é um acordo muito simples, a seguir têm a preocupação do reembolso, é que o banco diz “bom bom, mas quando vocês receberem os três milhões quinhentos e cinquenta primeiro vão pagar o nosso financiamento”, pronto, sim senhora … porque este era o … que estava aqui e depois temos que quando … quitações o banco quer-se salvaguardar de todos os disparates, mas está sempre lá especificamente “sem prejuízo de receber três milhões, quinhentos e cinquenta” não é sem prejuízo de receber o que aquelas obrigações valessem, porque eu nessa conversa a posterior eu ouvi do banco, depois aconteceu o que aconteceu eu vim a interagir com o banco e aquilo que me vieram dizer “era o mercado” isso duma falta de honestidade absoluta, eu tenho que dizer, aliás eu estou a testemunhar, é óbvio que a relação dispensou-me e eu não iria desobedecer à minha … mas eu estou aqui testemunhar por consciência, porque podiam todos ter-me autorizado mas se eu sentisse que estava a violar o meu privilégio profissional ou o meu dever profissional eu não testemunhava, eu estou a testemunhar por dever de consciência porque eu tive em reuniões com o Sr. PFV e eu não tenho Sr. Doutora Juíza qualquer estado de alma nisto, eu não tenho qualquer interesse, eu não tenho qualquer estado de alma, eu só me limito a de consciência gostar da minha profissão, tendo estado sentado com o Sr. PFV e com o Sr. RP e saber perfeitamente que o aqui estava aqui em causa era criar um mecanismo para pagar três milhões quinhentos e cinquenta e o acordo é isso que estipula. Sr. Doutora a ver se muito claro, esse era … de negociação, mais nada.
[…]
Depoimento de JAN
[00:16:40 a 00:16:52 do depoimento da Testemunha]
Mandatário Autor:
Sr. Doutor, a esse propósito diga-me uma coisa: a seleção dos produtos, ou seja, das obrigações se eram espírito santo financial group, se eram BES, se eram BES finance, o que fosse da Toyota, da audi, o que fosse, a seleção dos produtos teve alguma influência, alguma negociação, alguma intervenção do Sr. MOC ou do Sr. Doutor?
Testemunha:
Sr. Doutor, do Sr. MOC de todo…
Vamos ver o perfil do Sr. MOC …
Eu tenho muito respeito pelo Sr. MOC, nem sei se está aí na sala.
Mandatário Autor:
Não
Testemunha:
[00:17:12 a 00:18:05 do depoimento da Testemunha]
O Sr. MOC é uma pessoa inteligente… é um homem de vida, mas de literacia financeira ele percebe mal o mecanismo sequer dos juros.
Ele sabe que quer receber, isso ele sabe e sabe ganhar dinheiro no negócio dele, agora, literacia financeira zero e da minha parte, que o representava que tenho a ousadia e a falta de modéstia alguma literacia financeira nem sequer. Primeiro eu não dou conselhos sob valores mobiliários nem qualidade de investimentos, não tenho competência para tal isto extrapola a minha função.
Mas o Sr. Doutor eu gostava que tivessem muito bem presente isto: é que a questão nem se colocou, isto era apresentado como se fosse dinheiro, portanto nem se discutiu.
Zero Doutor, respondendo à sua questão: Zero, eram só estas obrigações e não há outras.
[…]
Depoimento de JAN
[00:18:24 a 00:18:40 do Depoimento da Testemunha]
Mandatário Autor:
Diga-me só uma coisa: nessa sequência foi explicado, foi mostrado, foi demonstrado, foi apresentado algum tipo de vantagem ou desvantagem ou informação acerca de quem era o Espírito Santo Financial Group, quem era o BES Finance, sob a sua solvabilidade, se eram entidades com muito património, com muito, enfim, muitos ativos, sólidas, houve alguma explicação a este propósito?
Testemunha:
Absolutamente nenhuma.
O princípio era sempre: o BES declara e garante que são pagas.
(…)
Depoimento de JAN
[00:19:24 a 00:23:58 do Depoimento da Testemunha]
Mandatário do Autor:
Sr. Doutor foi, ou seja, neste acordo o Sr. Doutor já explicou, mas se consegue, se conseguir mais ou menos quantificar, ou seja, tem uma ideia de quanto é que o Sr. MOC, já referiu que o Sr. MOC ia receber três milhões quinhentos e cinquenta.
Tem noção mais ou menos quanto é que iria pagar e qual seria então a obrigação de resultado, ou seja, qual seria então o resultado final desta operação?
Testemunha:
Oh Sr. Doutor eu, portanto … posso dizer o que tenho na minha memória.
Seria, portanto, depois de pagar o financiamento qualquer coisa como 1.4 ou 1.3 milhões de euros, seria qualquer coisa por aí.
Ele pagava o financiamento e ficava com uma diferença que era aquele dinheiro que era dele de início e que de facto devido à autorização do Banco Espírito Santo tinha perdido ou da contraparte que não era o Banco Espírito Santo, mas era outra entidade…
Mandatário Autor:
Ou seja, é lícito para mim ou é aceitável eu poder concluir, daquilo que o Sr. Doutor tem vindo a dizer de que esta obrigação de resultado, como o Sr. Doutor qualificou, ou seja, estes três milhões quinhentos e cinquenta com o pagamento do financiamento, isso é que foi de alguma forma a pedra de toque  que permitiu ao Sr. MOC e de alguma forma também ao Sr. Doutor perceber e aceitar este acordo ou seja, ter a certeza que findo este prazo do acordo receberiam 3 milhões quinhentos e cinquenta mil euros, pagariam o financiamento e ficariam com um milhão trezentos e trinta mil euros?
Foi estes resultados, estes números que foram efetivamente discernimentos para a celebração do acordo, para o Sr. MOC aceitar subscrever este acordo?
Testemunha:
Sr. Doutor eu volto repetir: formação da vontade, isso é cristalino, é esse o motivo pelo qual o Sr. MOC aceita o acordo e é esse o motivo pelo qual eu disse “aceito” porque para mim aquela garantia do Banco Espírito Santo na altura era dinheiro em caixa, não há outra razão, é essa, três milhões e quinhentos cinquenta que ele iria receber.
Mandatário Autor:
E foi pelo facto de ser o BES a propor isto e no fundo a estruturar este documento da forma que o estruturou que havendo vá, perdoe-me a expressão “chancela BES”, porque o BES em 2012 tinha peso no mercado, tinha uma marca que era sinonimo dessa solidez foi ou não também um fator determinado para o Sr. MOC, enfim, acreditar e perceber que isto era um acordo vantajoso?
Testemunha:
Oh Sr. Doutor à época e repare que isto é negociado em 2012, mas eu já tinha, sendo que eu tinha interação anteriores, a família Espírito Santo e mesmo o próprio Doutor RE Santo era uma das famílias europeias de banqueiros.
O Banco Espírito santo era uma instituição nacional e eu não vou repetir o que certamente estes nossos tribunais têm ouvido agora à saciedade e de algumas questões que ainda estão em discussão.
O Banco Espírito Santo até tinha o seu presidente do conselho de administração um … se é justo ou não é justo que era o autor disto tudo.
Portanto, sem ironia, sem qualquer tipo de ironia, aliás porque eu disse eu sou cliente do Banco Espírito Santo que tinha uma ideia que a reputação do banco era absoluta, mas essa ideia Sr. Doutor não era só por passar na televisão, era o que decorria das contas, era porque as … dos resultados, era por o Banco dizer que não tinha necessidade de ter recorrido a ajudas mais tarde quando veio, não necessitava de ajudas, portanto, havia todo um ambiente que nos fazia absolutamente acreditar que a instituição era sólida.
Portanto, eram vários clientes meus que iam para a Suíça para as reuniões e que vinham de lá muito … com a solidez do Grupo Espírito Santo, portanto, eu tinha essa ideia, olhe completamente errada, mas era o que é, de facto.
Mandatário Autor:
Nessa lógica, o Sr. Doutor e o naturalmente o Sr. MOC desconheciam ou não o estado de solvabilidade o estado de solidez financeira, por exemplo da Espírito Santo Financial Group, da BES Finance e do próprio Espírito Santo?
Testemunha:
Sr. Doutor, eram obrigações do BES, para o Sr. MOC e para mim, como bens a garantir pelos emitentes bancários, repito, era dinheiro em caixa. Nunca na minha vida eu pensei que passado anos ia estar sentado a discutir que aquilo não foi pago. Foi uma grande lição de vida.
[…]
Depoimento de JAN
[00:24:19 até 00:26:20 do Depoimento da Testemunha]
Mandatário Autor: 
Naturalmente quase que já me deu a resposta, naturalmente que não houve da parte dos funcionários, perdoe-me assim, do BES, o Sr. RP, do Sr. PFV, não houve nenhuma explicação acerca de quem era a Espírito Santo Financial Group, como é que estava financeiramente
Testemunha:
Sr. Doutor até lhe digo um pormenor que … eu insisti para este “declaro e garanto” estar aqui.
Eu lembro-me uma altura, numa interação, já não vou precisar agora porque não quero estar aqui a faltar à verdade, se foi o Sr. RP ou se foi o Sr. PFV ou até se foi o meu colega que na altura se não me engano até se chamava(…)“Oh Doutor mas  para que é que está a complicar são obrigações  do Banco Espírito Santo” e eu disse “não, deixe estar aí que é o Banco Espírito Santo Portugal, que a instituição portuguesa declara e garante” nunca me passou pela cabeça que aquilo não era pago, nunca.
Portanto, nem se discutia, repare o Sr. Doutor está-me a fazer perguntas e eu compreendo o alcance dessas perguntas e percebo completamente o interesse delas no processo, mas eu gostava que o meu testemunho anotasse o que aconteceu, e o que aconteceu na altura é que o Banco não explicou rigorosamente nada e a presunção do Banco a apresentar aquilo é: “isto é uma oferta irrecusável, nós conseguimos fazer aqui uma engenharia mas isto é irrecusável, pronto nós vamos resolver ao Sr. MOC e muito excecionalmente”, aliás, eles fizeram questão, Sr. Doutor, de pôr algures no acordo, isto é só procurar, olhe na cláusula 7 “composição da carteira: o cliente reconhece a existência de circunstâncias ta ta ta ta tendo, pelo que o Banco Espírito Santo não fica obrigado … mesmo que noutras situações de carácter excecional a atuar do mesmo modo” isto era uma solução excecional para um erro que eles assumiram que tinham feito, que não devia ter acontecido, excecional e portanto estavam aqui a propor.
Portanto, não houve explicação nenhuma, oh Sr. Doutor isto não, não houve explicação zero. Eu não tenho mais que lhe diga, zero, não houve explicação rigorosamente nenhuma nem foi tema, era dinheiro que nos iam entregar, sob forma de valores mobiliários
Mandatário Autor:
Ou seja, foi no fundo quando terminou isto e quando o Sr. Doutor, o Sr. MOC, a Sra. JSRC e da parte do Banco naturalmente, assinaram este acordo foi com a firme certeza de que cumprido este acordo, tal qual mente se encontrava escrito seria sempre a garantia que o Sr. MOC teria de que findo recebia o seu dinheiro, recuperava as suas poupanças, pagava o que tinha a pagar e quer ele, quer o Banco, sairiam de bem nesta negociação.
Neste conspecto,
37. o depoimento aponta verdadeiramente no sentido de que a vontade dos Autores estava fortemente viciada, resultando do mesmo que os Recorrentes incorreram em erro na formação da vontade relativamente a elementos essenciais do contrato – nomeadamente quanto à natureza, origem, garantias e reembolso, até porque como supra se demonstrou também a propósito de outro ponto impugnado, havia sido assegurado um resultado.
Destarte, perante o que antecede,
38. deve ser aditado à matéria dada como Provada: “a vontade viciada dos autores na aquisição dos produtos obrigações ESFG e respetivo conhecimento do BES”, o que aqui expressamente se peticiona para todos os efeitos legais.
A.5. - DO ADITAMENTO À MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA DO PONTO 7 DADO COMO NÃO PROVADO
39. A instância recorrida estatuiu que foi dado como Não Provado o ponto 7, ou seja
- assunção pelo BES em 24-07-2014 que reembolsaria na maturidade do capital investido pelos seus clientes não institucionais junto das redes comerciais do GES todas as emissões de papel comercial.
40. A Ré em sede de Contestação não deu cumprimento ao ónus de impugnação especificada da matéria vertida a esse propósito, razão pela qual o ponto sempre deveria ter sido dado como provado.
41. Assim, requer-se a V. Exa. seja o facto considerado como provado.
42. Ad cautelam, se assim não se entender, o que não se concede, sempre se diga que a verdade é que a 24 de Julho de 2014 e na sequência da nota de imprensa da ESFG conexa com a candidatura ao regime de gestão controlada, o BES emitiu comunicado adicional, assegurando “o reembolso, na maturidade, do capital investido pelos seus clientes não institucionais junto das redes comerciais do GBES todas as emissões de papel comercial”,5 o que foi tornado público.
43. Portanto, confrontado, com a elevada probabilidade de incumprimento por parte da ESFG, da ESI e da Rioforte o BES de livre e espontânea vontade divulgou e veiculou publicamente a sua intenção de reembolsar os seus clientes não institucionais.
44. Se as FAQ publicadas no site do Novo Banco, disponíveis até ao dia 15 de janeiro de 2015 como aponta o link da notifica supra desapareceu, sempre o douto Tribunal deveria ter lançado mão de meios de prova que apurassem a realidade, seja através de notificação expressa da entidade bancária, seja através de Perícia.
45. Se não o fez, cometeu uma nulidade que aqui expressamente se invoca para todos os efeitos legais, ou quanto muito uma insuficiente pelo que, ad cautelam, ao abrigo do artigo 662º da lei processual civil, als. a) e b) requer-se a V. Exa. seja ordenada a renovação da prova quanto a essa matéria
Face ao retro exposto,
46. de uma forma ou de outra, se não for ordenada a baixa dos autos à primeira instância ao abrigo do artigo 662º do CPC, perante a matéria supra, deve ser dado como provada a “assunção pelo BES em 24-07-2014 que reembolsaria na maturidade do capital investido pelos seus clientes não institucionais junto das redes comerciais do GES todas as emissões de papel comercial”, o que aqui expressamente se peticiona para todos os efeitos legais.
***
POR ESSA RAZÃO,
47. requer-se a alteração da referida matéria de facto, devendo aditar-se os Pontos 2, 4, 5, 6 e 7 à matéria de facto dada como Provada,
48. o que aqui expressamente se peticiona para todos os efeitos legais.
* *
*
IV - DO DIREITO:
DO ABUSO DE DIREITO:
49. Quer a conduta do BES, quer a do NB ao recusar pagar aos Recorrentes colide com as diretrizes impostas pelo instituto do abuso de direito, repugnando ao sistema que o BES e o NB gerem deliberadamente como geraram — legitimas expectativas de reembolso na esfera dos seus clientes, para seguidamente se escudarem no formalismo jurídico, conducente à consideração da ESFG como única entidade devedora.
50. Fundamentalmente, as linhas estruturantes que presidem ao abuso do direito caracterizam-se, segundo a jurisprudência pela:
a. Valoração negativa de situações de venire contrafactum proprium;
b. Tutela da confiança legitimamente gerada;
c. Objetivação das situações reputadas como ilegítimas, por abusivas;
d. Possibilidade de ser oficiosamente ponderado.
51. O julgador goza de considerável margem decisória no que concerne aos efeitos jurídicos que decorrem da ilegitimidade prevista no artigo 334º do CC, sendo que as consequências emergentes do abuso do direito podem consistir:
a. Na supressão do direito (ou do mero poder legal) exercido;
b. Na cessação (ou, a forteriori, na suspensão) do exercício abusivo;
c. Na paralisação de certos efeitos decorrentes do exercício do direito;
d. Na invalidade do direito exercido;
e. No dever da restituição;
f. No dever de indemnização;
g. No alongamento de um prazo de prescrição ou de caducidade.
52. Ora, atenta a factualidade carreada para os autos, constata-se ser este um caso clássico de venire contra factum próprium, com a inerente lesão das legítimas expectativas incutidas nos Recorrentes, o que aqui expressamente se invoca.
53. Ora, o BES e o NB incorreram na prática, sucessiva, dos seguintes comportamentos:
 Declararam, pública, livre e reiteradamente, assegurar o reembolso, à data do vencimento, dos montantes investidos aos clientes não institucionais;
 Não procederam ao reembolso dos montantes investidos.
54. Sucede, porém, que o primeiro daqueles comportamentos gerou nos Recorrentes a legitima expectativa de, no mínimo, serem reembolsados dos montantes que haviam investido e tal expectativa, de resto, modelou o seu comportamento face à cadeia de eventos ocorridos entre julho e novembro do 2014, tendo a Autora depositado confiança nas declarações publicamente veiculadas pelo BES e, posteriormente, pelo NB, pelo que tomou diversas opções com base na expectativa gerada.
55. Como tal, a recusa do BES e do NB em proceder ao reembolso das quantias em divida não pode deixar de se considerar como a frustração das expectativas legítimas a que ambas as entidades deram azo, pelo que se está demonstrada a figura do abuso de direito, o que é suficiente para a procedência da presente via recursal.
VIOLAÇÃO DOS DEVERES DE INFORMAÇÃO E RECOMENDAÇÕES DE INVESTIMENTO:
56. À data da outorga do acordo em consideração, o BES era uma instituição de crédito autorizada a exercer a atividade de intermediação financeira em Portugal e, por conseguinte, os seus administradores e empregados encontravam-se adstritos à obrigação de proceder com diligência, neutralidade, lealdade, discrição e respeito consciencioso dos interesses confiados, nas relações com os seus clientes cfr. artigo 74º do RGICSF.
57. Adicionalmente, sobre o BES impendia um conjunto de deveres tendentes à proteção dos investidores, até porque nos termos da alínea e), do n.º 1, do artigo 312º do CVM, o intermediário financeiro deve, em relação aos serviços que ofereça, prestar todas as informações necessárias, para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, nomeadamente quanto aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar.
58. Acresce que, ao abrigo do n.º 3, do artigo 309.° do CVM, o “intermediário financeiro deve dar prevalência aos interesses do cliente, tanto em relação aos seus próprios interesses ou de sociedades com as quais se encontra em relação de domínio ou de grupo, como em relação aos interesses dos titulares dos seus órgãos sociais ou dos de agente vinculado e dos colaboradores de ambos”.
59. Por outro lado, o nº1 do artigo 314º, do CMV impõe sobre o intermediário financeiro a obrigação de coligir junto dos seus clientes informação relativamente aos conhecimentos e experiência em matéria de investimento, no que respeita ao tipo de instrumento financeiro considerado em concreto. Complementarmente, e com base na informação que lhe seja facultada, o intermediário financeiro deve advertir o cliente, por escrito, caso entenda que a operação equacionada não é adequada ao mesmo.
60. O produto adquirido pelos Recorrentes apontava inequivocamente para um risco que se reportava diretamente ao BES e este estava perfeitamente ciente da inadequação do produto que aconselhou aos Recorrentes enquanto cliente não profissional. 61. O BES incorreu em manifesta violação do disposto no artigo 314º do CMV e este incumprimento é gerador de responsabilidade civil contratual, conforme entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, vertido no recente Acórdão de 6 de Fevereiro de 2014, proferido no processo nº 1970/09.9TVPRT.P1.S1
62. Como resulta de vários arestos “(. . .) as informações prestadas por um banco são inexatas, incompletas ou falsas e foram causais da celebração de um ato ou contrato, então terá aquele de ser responsabilizado pelos danos que assim causa, quer por via contratual quer extra-contratual” - cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 9 de outubro de 2012, proferido no processo n° 1432/O9.4T2AVR.C1. 22.
63. Como decorre do acervo factual carreado para os autos, a outorga do acordo em consideração só foi celebrado por insistência do BES; rigorosamente, foi o BES que, por sua iniciativa, levou ao conhecimento dos Recorrentes a operação financeira subjacente à outorga do acordo.
64. Todavia, o BES coibiu-se de prestar informações adicionais, que eram ou deveriam ser do seu conhecimento, a respeito da entidade emitente das obrigações que a Recorrente adquiriu.
65. Quer isto dizer que o BES recomendou à Autora a compra de obrigações da ESFG; não esclareceu a Autora quanto à globalidade (concreta e real) dos riscos incorridos pela compra daquelas obrigações e não elucidou a Recorrente FC da real situação da entidade emitente que conhecia perfeitamente.
66. Dispõe nº 1, do artigo 12.°-A, do CVM: “Constituem recomendações de investimento os relatórios de análise financeira ou qualquer outra informação emitida por analistas independentes, empresas de investimento, instituições de crédito, entidades cuja atividade principal seja formular recomendações e pessoas que neles exerçam a sua atividade profissional, em que se formula, directa ou indiretamente uma recomendação ou sugestão de investimento ou desinvestimento sobre um emitente de valores mobiliários,  valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros e que se destinem a canais de distribuição ou ao público”‘, acrescentando no artigo 12.°-C, do CVM que as instituições de crédito devem, em conjunto com a recomendação divulgar “(...) todas as relações e circunstancias suscetíveis de prejudicar a objectividade da recomendação (. . .)”.
67. Ora, o BES não divulgou aos Autores as circunstâncias que efectivamente prejudicaram a objetividade da sua recomendação. Tais circunstâncias são, por seu turno, refletidas na evidente interconexão entre (i) a cadeia de eventos que culminou com a declaração de insolvência da ESFG e (ii) a factualidade relevante que desencadeou a aplicação de uma medida de resolução ao BES por parte do Banco de Portugal.
68. Afigura-se evidente que o BES se encontrava juridicamente adstrito a dar recomendações e informações aos Recorrentes; o BES atuou negligentemente, omitindo informações a cuja divulgação se encontrava legalmente vinculado.
69. Em face da conduta ilegalmente omissiva do BES, a Recorrente formou a sua vontade em contratar com base em informações falsas, absolutamente desconhecidas dos Recorrentes.
70. Se os Recorrentes tivessem sido informados acerca da real situação financeira da ESFG jamais teria a Recorrente FC outorgado em agosto de 2012 o acordo em apreciação nestes autos. Ou seja, a incompletude/falsidade das informações prestadas pelo BES foi determinante para a formação da vontade dos Recorrentes e para a concomitante decisão de outorgar o supra mencionado acordo, verificando-se, deste modo, um evidente nexo de causalidade entre a conduta do BES e os danos sofridos pelos Recorrentes.
Por conseguinte,
71. dúvidas não subsistem quanto à obrigação de indemnizar os Recorrentes, até porque como expendido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, “(. . .) tendo em conta que o  produto financeiro em questão «tinha as reais características descritas, sempre será de concluir que o Banco violou de forma grosseira o dever de informação a que estava obrigado, convencendo desse modo a A. a subscrever papel comercial que, de outro modo, a mesma não subscreveria, o que a torna responsável pelos prejuízos causados ao A., quer pela sua atuação na formação do contrato, quer na celebração e execução do mesmo” — cf. Acórdão de 10 de Maio de 2015, proferido no processo n° 153/13.8TVLSB.L1-7.
72. De acordo com o disposto no n.º 1, do artigo 304.º-A, do CVM, os “intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação dos deveres respeitantes à organização e ao exercício da sua atividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública”, estatuindo o nº 2 mesmo preceito legal que “[a] culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano; seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação.
73. A ESFG era uma entidade relacionada com o BES, por conseguinte este tinha conhecimento ou era no mínimo exigível que o tivesse, da real situação financeira e patrimonial daquela.
74. Não obstante, o BES comercializou junto dos Recorrentes de forma deliberada e consciente as obrigações emitidas pela ESFG, pelo que consequentemente não se afigura possível demonstrar a ausência de culpa na sua atuação.
75. Assim, por força do disposto no artigo 151º do CVM são os Réus solidariamente responsáveis pelos danos sofridos pelos Recorrentes.
DA MEDIDA DO BANCO DE PORTUGAL:
76. Por Deliberação do Banco de Portugal adotada em 03 de agosto de 2014, foi constituído o ora Réu NB., ao abrigo do n.º 5 do artigo 145.º- G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro.
77. Conforme se comprova pela análise da Deliberação adotada,  por força dessa mesma, conjuntamente com a Deliberação da mesma entidade de 11 de Agosto de 2014, foram transferidos para o NB, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 145.º-H do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, conjugado com o artigo 17.º- A da Lei Orgânica do Banco de Portugal, os ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A.
78. Assim sendo, decorre das referidas Deliberações do Banco de Portugal, conjugadamente com o art.º 11.º do art.145.º-H do RGICSF, aprovado pela legislação supra aludida, a sucessão do NOVO BANCO, S.A. nos direitos e obrigações da instituição de crédito originária (BES, SA), conforme a seguir enunciado:
“Artigo 145.º-H Património e financiamento do banco de transição
1 -O Banco de Portugal selecciona os ativos, passivos, elementos  extrapatrimoniais e ativos sob gestão a transferir para o banco de transição no momento da sua constituição.
(…)
9 - Após a transferência prevista no n.º 1, deve ser garantida a continuidade das operações relacionadas com os ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos, devendo o banco de transição ser considerado, para todos os efeitos legais e contratuais, como sucessor nos direitos e obrigações transferidos da instituição de crédito originária.
10 - A instituição de crédito originária, bem como qualquer sociedade inserida no mesmo grupo e que lhe preste serviços no âmbito da atividade transferida, deve prestar todas as informações solicitadas pelo banco de transição, bem como garantir a este o acesso a sistemas de informação relacionados com a atividade transferida e, mediante remuneração acordada entre as partes, continuar a prestar os serviços que o banco de transição considere necessários para efeitos do regular desenvolvimento da atividade transferida.”
79. A decisão de transferência prevista no n.º 1 produz efeitos, independentemente, de qualquer disposição legal ou contratual em contrário, sendo título bastante para o cumprimento de qualquer formalidade legal relacionada com a transferência.
Atento o exposto,
80. todos os pedidos apresentados contra o BES, a respeito do acordo e das obrigações dele emergente, que a Recorrente FC outorgou em agosto do ano de 2012 são extensíveis in totum ao NB; O NB passou a ser a entidade jurídica que passou a ser a beneficiária dos efeitos jurídicos decorrentes do Acordo outorgado com a Recorrente FC em agosto do ano de 2012. A saber: o recebimento do capital mutuado pelo financiamento do valor de dois milhões duzentos e vinte mil euros, bem como das garantias aí oferecidas (penhor de todos os ativos detidos pelos Recorrentes na sua carteira); Assim como passou a ser a entidade gestora da conta bancária da Recorrente de depósito à ordem nº 0000 0001 2106 da Sucursal Financeira do Luxemburgo, do BES; Bem como foram para Ele transferidas as responsabilidades das Obrigações BES FINANCE 2021.
81. Assim, fere a mais básica noção de justiça que os efeitos do acordo, quanto ao seu crédito e garantias, se transferissem integralmente para o NB e a obrigação de pagamento do valor facial das obrigações adquiridas, no âmbito do mesmo, incluindo as ESFG 2021, não, impedindo dessa forma a recuperação do capital investido aos Recorrentes - razão única pela qual estes acederam em celebrar o referido acordo.
82. Portanto, jamais se pode conceber que as deliberações do Banco de Portugal serão consideradas como obstáculos jurídicos à desresponsabilização do NB para com os AA, pelo que o Recurso deve proceder, condenando a Recorrida no pagamento peticionado.
VIOLAÇÃO DOS DEVERES
83. Quanto aos serviços oferecidos por intermediários financeiros (cfr. artigos 1º/b) e 289º/1, a), do CVM), o legislador consagrou específicos deveres de informação no CVM, aqui se incluindo o dever de prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, nomeadamente as informações respeitantes aos instrumentos financeiros, aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar (artigo 312º do CMV).
84. Deve fazê-lo de forma completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita (artigo 7º do CVM), para que a informação possa ser compreendida pelo destinatário médio e o momento primordial de prestação de informação é o anterior à tomada da decisão de investimento (cfr. artigo 312º-B/1, do CVM) (Paulo da Câmara, ob. cit., p. 712).
85. Os sujeitos abrangidos pelo dever de informação estão identificados no artigo 304º/5, do CVM: os titulares dos órgãos de administração e as pessoas que dirigem a atividade do intermediário financeiro ou do agente vinculado, os colaboradores do intermediário financeiro, do agente vinculado e as entidades subcontratadas, envolvidos no exercício ou fiscalização de atividades de intermediação financeira ou de funções operacionais que sejam essenciais à prestação de serviços deforma contínua e em condições de qualidade e eficiência.
86. Como acima se transcreveu, o artigo 312º/1, do CVM, obriga que o intermediário financeiro preste, relativamente aos serviços que ofereça, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo as respeitantes: ao intermediário financeiro e aos serviços por si prestados; aos instrumentos financeiros e às estratégias de investimento propostas; e aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar (cfr. als. a), d) e d), do normativo citado).
87. O intermediário financeiro é obrigado a transmitir ao investidor os riscos especiais envolvidos na operação, o que não fora cumprido, tendo por outro lado, sido assegurado o reembolso do capital e não foi foram explicadas as características e natureza e riscos das obrigações e tudo isso constituía informação essencial para o investidor.
88. Trata-se de deveres principais do contrato ou quando muito, se assim não se entender, secundários de prestação e de deveres laterais, que se coligam em atenção a uma identidade de fim e constituem o conteúdo de uma relação de carácter unitário e funcional: a relação complexa em sentido amplo (Almeida Costa, Obrigações, 9ª ed., pg. 63).
89. Como escreve Carneiro da Frada, Contrato e Deveres de Protecção, Coimbra, Almedina,1994,p. 39,«[a] envolver os deveres de prestar, qualquer que seja a sua natureza, predispõem-se na relação obrigacional uma série de outros deveres essenciais ao seu correcto processamento; não estão estes virados, pura e simplesmente, para o cumprimento do dever de prestar, antes visam a salvaguarda de outros interesses que devam, razoavelmente, ser tidos em conta pelas partes no decurso da sua relação; de um modo geral, eles exprimem, na formulação de Larenz, a necessidade de tomar em consideração os interesses justificados da contraparte e de adoptar o comportamento que se espera de um parceiro negocial honesto e leal, e costumam fundamentar-se no princípio da boa fé; pela sua índole, são susceptíveis de comparecer em qualquer relação obrigacional, seja o seu tipo aquele que for, e também só se especificam em função dos contornos que o desenrolar da vida da relação contratual venha a manifestar».
90. Enquanto o dever prestar principal visa a satisfação do interesse do credor na prestação, os segundos promovem o interesse do credor na integralidade na própria prestação e, ainda, na intocabilidade dos seus interesses colaterais: património e esferas física e moral (António Menezes Cordeiro, «Responsabilidade bancária, deveres acessórios e nexo de causalidade», in Estudos de Direito Bancário, Coimbra, Almedina, p. 19).
91. Desta forma, os deveres de esclarecimento e aconselhamento em relação ao potencial investidor emergem como uma decorrência da boa-fé, dependendo a sua intensidade consoante os sujeitos envolvidos, requerendo especial atenção os investidores não qualificados, a quem deve ser prestada a informação necessária para proporcionar uma decisão de investimento esclarecida. (nota 6)
92. A matéria aflorada na p.i. constituía informação essencial à decisão de aquisição das obrigações, porque a efetivação dessa possibilidade acarretaria perda de rendimentos, o que é contrário à intenção de qualquer operação de investimento.
93. Decorre a violação dos deveres de informação, de lealdade e respeito consciencioso dos interesses confiados, a que as instituições bancárias, os seus administradores e colaboradores estão vinculados e, por isso, os ditames da boa-fé negocial no quadro da relação contratual estabelecida (cfr. artigo 762º/2, do CCiv) e quando ocorre a violação de deveres acessórios, há que verificar quais são os bens jurídicos tutelados por aqueles, competindo indagar o escopo da norma atingida, de modo a ser estabelecido o nexo causal (António Menezes Cordeiro, ob. cit., pp. 38 e 48).
94. No processo n.º 70/13.1TBSEI, o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 17.03.2016, publicado in www.dgsi.pt, entendeu que «o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação e o dano causado ao autor (art.º 563.º do CC) deve ser analisado através da demonstração (…) de que se tais deveres de informação tivessem sido cumpridos, o autor não teria investido naquela aplicação, mas noutra que lhe garantisse um retorno seguro, condição que ele colocou para fazer o investimento.»
95. No Acórdão do mesmo Supremo Tribunal de Justiça de 24.01.2019 sustentou-se que «A responsabilidade civil do intermediário financeiro pressupõe a verificação de uma situação de incumprimento de deveres legais ou contratuais, a ocorrência de um dano e um nexo de causalidade adequada, sendo presumida a culpa quando haja violação daqueles deveres.
96. Relativamente ao âmbito e conteúdo do dever de informação para com os clientes ou investidores não qualificados, nos termos do art.º 312º do CVM, o intermediário estava obrigado a prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada referente aos produtos financeiros intermediados, de forma completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita (art.º 304º), sendo a extensão e a profundidade da informação inversamente proporcional ao grau de conhecimentos e à experiência do concreto investidor. (…) Ainda que se apurasse ter existido incumprimento do dever de informação por parte do intermediário financeiro, a sua responsabilidade civil dependeria ainda do estabelecimento de um nexo de causalidade, ou seja, de que foi por causa daquele incumprimento que o investidor realizou o concreto investimento que se revelou prejudicial» (relatado por Abrantes Geraldes).
97. Na situação que nos ocupa, caso o dever de informação tivesse sido cumprido o Recorrente não teria investido e omissão relativa ao risco compromete a garantia patrimonial do direito de crédito, que determinou a realização da operação por parte dos Recorrentes.
98. Deste modo, é a omissão na prestação de informação relevante por parte do banco que é determinante para o prejuízo verificado na esfera dos Recorrentes, pois que é ela a causa da realização do investimento, verificando-se, assim, o nexo de causalidade entre a violação dos deveres respeitantes ao exercício da atividade do Banco (dever de informação) e o investimento realizado pelos Recorrentes.
99. Por tudo isto, deve o recurso ser julgado procedente, sendo a Recorrida condenada nos termos peticionados.
DA ASSUNÇÃO DE DÍVIDA
100. A douta instância recorrida entendeu que nunca poderia ocorrer assunção de dívida da Recorrida porquanto a mesma não havia sido reduzida a escrito.
101. Muito mal andou o Tribunal recorrido ao decidir como decidiu porquanto a lei não estabelece forma especial para o contrato em causa (art.º 219º do CC).
Por conseguinte,
102. atenta a procedência da matéria de facto acima peticionada, maxime ponto 7, deve a Recorrida ser condenada nos termos peticionados, não sendo necessária uma declaração escrita.
Neste conspeto,
103. deve a Sentença ser, in totum, revogada.
*
Como corolário do exposto,
resulta evidente que a Sentença proferida violou, entre outros, os artigos 4º, 73º, 74º, 75º, 145º -G, 145º -H do RGICSF, 219º, 485º, 563º, 762º nº2 do Código Civil, 7º, 12º A, 12º C, 151º, 293 º, 304 º, 304 º A, 309 º, 312 º, 314 º, 317 º, 317ºA do CVM.
Exmos. Senhores  Desembargadores:
Por isso,
decidindo em conformidade com as Conclusões agora deduzidas,
Vossas Excelências,
Exmos. Senhores. Desembargadores, contribuirão para a realização do Direito, fazendo cumprir a Lei e a Justiça.

*
Excelentíssimos Senhores
Juízes Desembargadores,
Nestes termos, e nos melhores de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deverá o Recurso ser julgado procedente, por provado, e revogada a Sentença recorrida, com o que V. Exas. farão a sã e costumeira
JUSTIÇA!»

O Réu contra-alegou pugnando pela total confirmação da sentença.
*-*
Colhidos os vistos, importa apreciar e decidir.
**
É sabido que nos termos dos artºs 635º nº 4 e 639º nº 1 do Código de Processo Civil são as conclusões que definem o objecto e delimitam o âmbito do recurso, seja quanto à pretensão dos recorrentes, seja quanto às questões de facto e de Direito que colocam, exercendo as mesmas função equivalente à do pedido (neste sentido cfr. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil” 5ª Ed., Almedina, 2018, pp. 114-117), certo que esta limitação dos poderes de cognição do Tribunal da Relação não se verifica quanto à qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. art.º 5º nº 3 do CPC).
Não obstante, exceptuadas as questões de conhecimento oficioso, não pode este Tribunal conhecer de questões que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas (Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Ed., Almedina, 2018, p. 119).
Assim, as questões a decidir são as seguintes:
- Alteração da matéria de facto,
- Revogação da decisão de mérito, nomeadamente por (a) abuso de direito, (b) violação dos deveres de informação/ responsabilidade do intermediário financeiro, (c) assunção da dívida pelo Réu “Novo Banco, SA”.

II – FUNDAMENTAÇÃO
A) DE FACTO
Na sentença sob recurso foi considerada a seguinte a factualidade:
Factos Provados
«1- A 14 de Agosto de 2012 foi outorgado um Acordo entre a A. “…, SA” e o Banco Espírito Santo, nos seguintes termos:
1.1- A Autora subscreveu a ordem de venda das 3.550.000 Obrigações Espírito Santo Financial Group International Ltd 2017, à cotação de 41,97%, adquiridas em 10/03/2009, 2.150.000 Obrigações Espírito Santo Financial Group International Ltd 2017 - através de um financiamento no valor de 1.200.000.00euros (um milhão e duzentos mil euros), que foram dadas de penhor para garantir esse mesmo financiamento – cfr doc. fls. 46 a 52 cujo teor se da por reproduzido.
1.2- A Conta de depósito à ordem da Autora, nº …, aberta junto do BES, Sucursal Financeira Exterior da Madeira foi creditada pelo montante de 1.579.764,54euros.
1.3- A Autora subscreveu, ainda, no âmbito do mesmo acordo uma ordem de compra de 2.961.000 credit linked notes (CLN) BES Finance LTD, 6 % 2021 (ISIN XS0712907863) à cotação de 50,18% pelo montante de 1.485.839,80euros (um milhão quatrocentos e oitenta e cinco, oitocentos e trinta e nove euros e oitenta cêntimos) (Obrigações BES Finance 2021)
1.4- E passou a deter, 500.000 Obrigações ESFG 2019 e 89.000 Obrigações BES Finance 2021, que o BES entregou à Autora FC;
1.5- No âmbito do mesmo acordo, o Réu BES através da sua sucursal do Luxemburgo, concedeu à A. FC, na data da outorga do mencionado acordo – 14/08/2012 – um financiamento no valor de 2.220.000,00euros (dois milhões duzentos e vinte mil euros), contrato nº R…/12, financiamento esse com vigência até 30/11/2021, com a taxa Euribor a 12 (doze) meses, arredondada à milésima, acrescida de um spread de 2,0% (dois vírgula zero); sendo a taxa de juro fixada no primeiro dia de cada período anual, e o spread fixo até integral liquidação do financiamento; com uma periodicidade de pagamento de juros anual, estipulando-se o primeiro pagamento em 30 de Novembro de 2012 – cfr fls. 55 a 57 cujo teor se dá por reproduzido;
1.6- Como garantia deste Financiamento, a Autora obrigou-se a constituir penhor, de primeiro grau – e celebrou o contrato sobre as seguintes obrigações, ou seja, sobre a totalidade dos ativos detidos pelos AA:
o 3.050.000 Obrigações BES Finance 2021 (ISIN XS0712907863);
o 500.000 Obrigações ESFG 2019 (ISIN XS0458566071);
o 300.000 Axa SA (ISIN XS 0210434782);
o 165.000 BES Finance LTD 2035 (ISIN XS0210172721); o 100.000 Deutsche Bank (ISIN DE000A0DTY34);
o 200.000 Kaupthing Bank 6,75%; o 1.049.000 Lehman Brothers.- cfr doc fls. 51 a 53 cujo teor se dá por reproduzido.
1.7 Com a assinatura do referido acordo a 14/08/2012 e com as supra mencionadas operações Autora FC e Ré BES:
- O Réu BES entregou à Autora FC as referidas 500.000 Obrigações ESFG 2019 e as 89.000 Obrigações BES Finance 2021, e em contrapartida, a Autora restituiu ao Réu BES o montante de 93.924.74euros,
- O Réu BES entregou ainda à Autora os seguintes valores:
- 88.920,00euros no que diz respeito às «Obrigações ESFG 2017
- 7. 789,00euros referente às Obrigações BES Finance 2021,
- 2.260,00euros respeitante às Obrigações “ESFG 2019”.
2. Em anexo ao acordo subscrito pelo A e R descrito em 1. estavam, entre outros, no anexo V: ficha técnica e propecto das obrigações ESFG de 2019.
3. O acordo celebrado entre As e BES descrito nos factos 1 a 3 teve como objectivo a recuperação pela A. “…SA” das perdas financeiras decorrentes da crise financeira de 2008, intitulada de sub prime nos Estados com os Bancos Lehmon Brothers e Kaupting Bank, dos quais o A. tinha adquirido, 1.049.000 e 200.000 obrigações, respectivamente. 
4. Na base desse Acordo, o BES projectou uma solução comercial, com a análise e a escolha de produtos financeiros de forma a que os Aas pudessem recuperar as perdas referidas em 4, tendo sido discutido entre as partes as comissões e taxas de juros no âmbito do financiamento contraído para concretizar essa solução comercial.
5. Nos termos da cláusula 4, com a epígrafe formação da vontade do cliente lê-se: “ O BES declara e garante ao Cliente  que, nos termos dos respectivos prospectos e fichas técnicas, as obrigações BES Finance 2021 e as Obrigações ESFG 2019 serão obrigatoriamente pagas pelos emitentes pelos seus valores nominais na data da sua maturidade o que no presente acordo perfaz o cliente receber, entre ambos os títulos, a quantia de € 3550.000,00.
6. Nos termos da clausula 5.1 Ficará determinado, no contrato de financiamento, referido na cláusula anterior que o cliente, do valor recebido pela venda ou vencimento na data da sua maturidade das Obrigações Finance 2021 e ESFG 2019, quanto a esses valores, das obrigações BES Finance 2021 e ESFG 2019 obriga-se quanto a esses valores a reembolsar antecipadamente o contrato de financiamento, os quais serão imputados, sucessivamente, à liquidação de comissões, custos e encargos , juros moratórios , juros remuneratórios e capital.
7. Nos termos da cláusula 6, sem prejuízo do recebimento dos €3550.000,00 relativas às obrigações BES Finance 2021 e ESFG 2019, com a celebração do presente acordo, o cliente dá plena e integral quitação, confirmando nada mais ter a haver do BES ou de qualquer entidade, directa ou indirectamente dominada, controlada ou participada pelo BES e que com ele consolide para efeitos contabilísticos (Grupo Espirito Santo ou abreviadamente GBES) a qualquer título designadamente a título de eventuais compensações pelos danos, prejuízos ou quaisquer responsabilidades resultantes da aquisição e manutenção (….) das obrigações ESFG2019 ou da sua desvalorização.
8. Nos termos da cláusula 7, n.º 3: em relação à composição da conta de instrumentos financeiros referida nos números anteriores, o cliente reconhecer ser titular de todos os instrumentos financeiros, declarando conhecer todas as suas características e riscos e não tendo nenhuma duvida ou necessidade de qualquer esclarecimento sobre os mesmos.
9. Em 2012, nem os As nem os funcionários do BES conheciam a situação financeira do ESFG que se veio a verificar em 2014 e que conduziu à sua insolvência.
10. As expectativas comuns entre A e R., com a subscrição do acordo descrito de 1 a 4, eram que os AA recuperassem o dinheiro perdido na desvalorização das obrigações Lehmon Brothers e Kaupting Bank, após a falência destes.
11. No ano de 2012, e depois das percas financeiras relativas à desvalorização das obrigações Lehman e Kaupting Bank, o A. sabia o que era uma obrigação e a sua maturidade, e a diferença face a um depósito a prazo.
12. Na sequência da medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal, os As não foram reembolsados do investimento efectuado nas obrigações subordinadas ESFG 2019, na sua maturidade.
13. A. A. recebeu juros remuneratórias sobre as obrigações ESFG 2019 no ano 21.10.2013, no valor de €34.000,00.
14. Os As foram reembolsados de €146.336,85 relativo ao vencimento antecipado das obrigações NBFINANCE LTD 2036 (ISINXS210172721) e respectivos juros.
15. O valor referido em 14 foi aplicado na amortização parcial do valor em dívida, no âmbito do aludido de contrato de financiamento que passou a ser, no valor de €1674 818,15.
16. No dia 03 de agosto de 2014, o Conselho de Administração do Banco de Portugal deliberou o seguinte:
“Ponto Um
Constituição do Novo Banco, S.A.
É constituído o Novo Banco, S.A., ao abrigo do n.º 5 do artigo 145º-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 dezembro, cujos Estatutos constam do Anexo I à presente deliberação.
Ponto Dois
Transferência para o Novo Banco S.A., de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A.
São transferidos para o Novo Banco, S.A., nos termos e para os efeitos do disposto no n.º1 do artigo 145º-H do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, conjugado com os artigos 17º-A da Lei Orgânica do Banco de Portugal, os ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A. que constam dos Anexos 2 e 2A à presente deliberação.
Ponto Três
Designação de uma entidade independente para avaliação dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos para o Novo Banco, S.A.
Considerando o disposto no n.º 4 do artigo 145º-H do Regime Geral das Instituições de
Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, o Conselho de Administração designa a sociedade PricewaterhouseCoopers & Associados - Sociedade de Revisores Oficiais de Contas, Lda. (PwC SROC), para, no prazo de 120 dias, proceder à avaliação dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos para o Novo Banco, S.A.
Ponto Quatro
Nomeação dos membros dos órgãos de administração e de fiscalização do Banco Espírito Santo, S.A.
Nos termos do n.º 2 do artigo 145º-D do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31de dezembro, são designados os seguintes membros para os órgãos sociais do Banco Espírito Santo, S.A. (…).
5. No anexo 2 à deliberação identificada em G), foi deliberado, além do mais, o seguinte:
“Ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do BES, registados na contabilidade, que serão objeto da transferência para o Novo Banco, S.A., de acordo com os seguintes critérios:
(a)…
(b) As responsabilidades do BES perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais deste serão transferidos na sua totalidade para o Novo Banco, S.A., com exceção dos seguintes (“Passivos Excluídos”).
(i)…
(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude, violações de disposições regulatórias, penais e contra-ordenacionais;
(vi)…
(vii) Quaisquer responsabilidades ou contingências relativas a  comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de dívida emitidos por entidades que integram o universo do Grupo Espírito Santo.
No que concerne às responsabilidades do BES que não serão objeto de transferência, estas permanecerão na esfera jurídica do BES.
6. Na reunião extraordinária do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 11 de agosto de 2014, foi deliberado o seguinte:
“O Conselho de Administração, ao abrigo do n.º 1 do artigo 145º-G e dos números 1 e 5 do artigo 145º-H do RGICSF, deliberou clarificar e ajustar o perímetro dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A., transferidos para o Novo Banco, S.A., nos seguintes termos:
(…)
7. A subalínea (v) da alínea (b) do Anexo 2 à deliberação de 3 de agosto, passa a ter a seguinte redação:
“Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou de violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais”.
8. Na subalínea (vii) da alínea(b) do Anexo 2 à deliberação de 3 de agosto, onde se lê: (…) Deve ler-se:
“Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de dívida emitidos por entidades que integram o Grupo Espírito Santo, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados resultantes de estipulações contratuais, anteriores a 30 de junho de 2014, documentalmente comprovados nos arquivos do BES em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.
17. Por Deliberação de 29 de Dezembro de 2015, do Conselho de Administração do Banco de Portugal, foi deliberado, além do mais, alterar a redacção da subalínea (vii) da alínea b) do anexo 2 da deliberação de 03 de agosto de 2014, que passou a ter a seguinte redacção:
“Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por quaisquer entidades, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados, cuja posição devedora não seja excluída por alguma das subalíneas anteriores, designadamente as subalíneas (iii) e (v), que (a) fossem exigíveis à data da medida de resolução em virtude de o respectivo prazo já se ter vencido ou, sendo os créditos condicionais, em virtude de a condição (desde que apenas desta dependesse o respectivo vencimento) já se ter verificado, e cumulativamente (b) resultassem de estipulações contratuais (negócios jurídicos bilaterais) anteriores a 30 de junho de 2014, que tenham cumprido as regras para expressão da vontade e vinculação contratual do BES e cuja existência se possa comprovar documentalmente nos arquivos do BES, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.”
18. Também por deliberação de 29 de Dezembro de 2015, do Conselho de Administração do Banco de Portugal, foi deliberado, além do mais, clarificar o perímetro dos passivos, elementos extrapatrimoniais do BES que a 3 de agosto de 2014 fossem contingentes ou desconhecidos e não foram transferidos para o Novo Banco, designadamente “Clarificar que, nos termos da al. b) do nº 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de Agosto, não foram transferidos do BES para o Novo Banco quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do BES que, às 20.00 horas do dia 3 de agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraudes ou de violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral ou cível) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do BES;”.
19. O NB passou a ser a entidade gestora da conta bancária da A contrato n.º … da Sucursal Financeira SFE Madeira. – cfr doc fls. 170 e 171 cujo teor se dá integralmente por reproduzido.
20. O Novo Banco por força da resolução é a entidade custo diante dos valores mobiliários depositados em conta própria dos clientes do BES, incluindo contas de registo e depósitos de instrumento financeiro.
21. Desde aplicação da Medida de Resolução pelo Banco de Portugal ao BES, e não recebimento do capital e juros remuneratórios relativos às obrigações ESFG 2019, o A sofre de ansiedade e tem dificuldade em dormir e descansar.
22. A ESFG, faz parte do grupo GES, e foi declarada a sua insolvência a 10 de outubro de 2014 pelo tribunal de Luxemburgo.
23. O A enviou mail dirigido a PFV junto aos autos a f.s 76 cujo teor se dá integralmente por reproduzido.»
Factos Não Provados[1]
- «1- Não se provou que o BES garantiu que os activos comprados eram divida do próprio BES, factor decisivo para os As subscreverem o financiamento.
- 2 - Não se provou que os funcionários do BES garantiram o reembolso do capital quanto às obrigações ESFG.
- 3 - Não se provou que os funcionários do BES, à data da subscrição do acordo de financiamento, conheciam que as contas da ESFG não traduziam a realidade.
- 4 - Não se provou a vontade viciada dos autores na aquisição dos produtos obrigações ESFG e respectivo conhecimento do BES.
- 5 - Não se provou que os As não foram informados sobre as características e natureza e riscos das obrigações ESFG2019.
- 6 - Não se provou que os As desconheciam a natureza e características das obrigações ESFG2019.
- 7 - Não se provou a assunção pelo BES em 24-07-2014 que reembolsaria na maturidade do capital investido pelos seus clientes não institucionais junto das redes comerciais do GES todas as emissões de papel comercial.
- 8 - Não se provou que o A toma medicamentos e é seguido por psicólogo.».
B) DE DIREITO

Da alteração da decisão de facto
É sabido ser ónus imposto ao Recorrente a apresentação de alegações, nas quais deve concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão (cfr. art.º 639º nº 1 CPC), sendo as conclusões que delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem (cfr. art.º 635º nº 4 CPC), equivalendo as mesmas, como dito, ao pedido.
Por outro lado, é igualmente sabido que o art.º 640º CPC impõe ao Recorrente ónus próprios quando impugne a decisão da matéria de facto.
De acordo com o estipulado no seu nº 1 als. a), b) e c), quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto deve o Recorrente, sob pena de rejeição, obrigatoriamente especificar na motivação da alegação os concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios que impunham diversa decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, e a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas; e quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao Recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (nº 2 al. a) do citado art.º 640º).
Já quanto às conclusões, atenta a sua essência sintética mas tendo em conta as suas funções delimitadora e definidora do âmbito do recurso, delas deve obrigatoriamente constar a especificação dos concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, não sendo forçoso que delas conste a especificação dos meios de prova, a indicação das passagens das gravações, nem a decisão alternativa pretendida (cfr. Acórdão do STJ de 12/07/2018, proc. 167/11.2TTTVD.L1.S1, in www.dgsi.pt  e Acórdão Uniformizador nº 12/2023, de 17/10/2023 (proc. 8344/17.6T8STB.E1‑A.S1) publicado no Diário da República I série, de 14/11/2023).
Os Recorrentes cumpriram esses ónus e propugnam que os factos não provados 2, 4, 5, 6 e 7 devem integrar o elenco dos factos provados; sendo que se debruçaram sobre os factos 2 a 6 em termos similares e sustentados nos mesmos meios de prova, concretamente nos mesmos e precisos excertos das declarações de parte do Recorrente MOC e do depoimento da testemunha Dr. JAN, seu advogado à época dos factos e da subscrição do acordo de 14/08/2012.
Por isso, e porque efectivamente existe uma ligação entre eles, cuidaremos da análise dos factos não provados 2, 4 e 6 em conjunto, e depois analisaremos os demais.
São eles do seguinte teor:
[2] Não se provou que os funcionários do BES garantiram o reembolso do capital quanto às obrigações ESFG.
[4] Não se provou a vontade viciada dos autores na aquisição dos produtos obrigações ESFG e respectivo conhecimento do BES.
[6] Não se provou que os As desconheciam a natureza e características das obrigações ESFG2019.

Os Recorrentes acentuam a importância do depoimento do Sr. Dr. JAN sobre esta matéria referindo que “11. não se poderão ignorar os seguintes trechos do depoimento da Testemunha Dr. JAN, Advogado que representou os Recorrentes aquando da celebração dos Contratos, sendo o depoimento essencial para a descoberta da verdade material e para a justa composição do litígio, bem como para transmitir ao Tribunal a perspetiva de quem contactou diretamente com o caso sub judice, maxime na fase pré-contratual e aquando da celebração do contrato. 12.   Ao longo do seu longo depoimento, são variadíssimas as expressões referentes à “obrigação de resultado” e à garantia do reembolso, mais explicando o que motivou a celebração do contrato, asseverando que foi garantido o reembolso” (cfr. conclusões 11º e 12º do seu recurso).
A primeira observação que a este respeito nos cabe fazer é a de que a circunstância de uma testemunha, a despeito da sua qualidade profissional, referir variadíssimas vezes que se tratava de uma “obrigação de resultado” e que foi garantido o reembolso não tem, por si só, a virtualidade de fazer com que o Tribunal adira àquela qualificação da obrigação e de, por força da repetição, conduzir à demonstração dos factos em causa.
Isto porque o julgador procede a uma valoração de cada meio de prova produzido interligando-o com os demais elementos probatórios que constem dos autos, socorrendo-se dos conhecimentos científicos adquiridos e das regras de experiência comum da vida, aquilatando, no que à prova pessoal respeita, da credibilidade de cada depoente (seja testemunha ou parte) avaliando a linguagem não verbal, aspecto este apenas reservado ao julgador de 1ª instância mercê do imediatismo da prova pessoal perante si produzida.
Dito isto, há que ter em conta que nos autos se produziu muito mais prova do que o depoimento do Sr. Dr. JAN e as declarações de parte do Autor Sr. MOC.
Embora o Tribunal a quo não tenha apresentado a sua motivação em moldes individualizados para cada facto não provado, o que é aceitável atenta a conexão entre eles, apresentou a sua convicção quanto aos factos não provados nos seguintes termos:
«A factualidade dada como não provada resultou da ausência de prova suficiente e credível quanto à mesma. 
Cumpre salientar que o tribunal não ficou convencido que o BES tivesse garantido o pagamento das obrigações, substituindo-se ao respectivo emitente, bem como que o BES, na pessoa dos seus funcionários, soubesse da falsidade das contas da ESFG e o tivesse omitido. De facto, da cláusula 4 do acordo não resulta essa garantia, tanto assim que, na mesma cláusula, o BES declarou e garantiu que, nos termos dos respectivos prospectos e fichas técnicas, as obrigações ESFG2019 serão obrigatoriamente pagas pelos emitentes, nos termos constantes do prospecto e fichas técnicas, não substituindo ao emitente; acresce que é nesses prospectos e fichas técnicas anexas ao acordo que constam os respectivos riscos de perda total ou parcial do investimento, seja por flutuações do activo, seja pela insolvência do emitente ou do garante, ou por outros motivos de cariz económico, político ou de qualquer outra índole que possam afectar os mercados, o sistema financeiro e a economia em geral, riscos a que o acordo já fazia referência na cláusula primeira e no que respeita às obrigações 2021, mas que não se diferenciavam da subscrição da obrigações realizadas pelos As, nos termos constantes do considerando h) do acordo; ao que acresce que no artigo 35º da petição inicial, o A assume que conhecia os riscos normais decorrentes dos comportamentos dos mercados, o que foi determinante para a subscrição do acordo. Cumpre ainda salientar que o acordo foi negociado pelo Advogado do A., JAN e por tal facto, não se nos afigura crível que não tenha salvaguardado os interesses do seu cliente A. no sentido de terem ficado evidente os riscos inerentes subscrição do instrumento de divida em causa, já que tinha perdido dinheiro nos investimentos em obrigações do Lemon Brother e Kaupting Bank, na sequência da forte desvalorização destes, tal como o próprio confirmou em sede de declarações de parte; assim não se nos afigura credível que venha agora invocar que desconhecia os riscos das obrigações que adquiriu por intermédio do BES, naquele acordo que tinha como objectivo o A. recuperar das percas financeiras com aquelas duas obrigações que sofreram desvalorização na sequência da falência dos emitentes; aliás os A já tinham subscrito obrigações nos anos de 2010 e 2011, não sendo esta a primeira vez (considerandos g) e h) do acordo), pelo que já os As tinham experiência e conhecimento sobre o produto em causa; outrossim, é unânime de todos os depoimentos prestados, designadamente RP, PFV, JAN, já supra identificados, que naquele ano de 2012 era impensável pensar em falência do BES e de todo o seu grupo, pois era um grupo sólido e era o único banco não intervencionado pelo Estado Português, aliás o Ilustre Advogado do A. JAN, aquando da inquirição como testemunha, referiu que, naquele ano, não passava pela cabeça de ninguém que as obrigações do grupo GES não seriam pagas, as mesmas eram como se fossem dinheiro, pelo que tais factos em conjunto levaram o tribunal a concluir que os As sabiam e queriam o que estavam a subscrever.
Da mesma forma e pelos mesmos motivos não ficou convencido o tribunal que o BES garantiu que os activos comprados era do próprio BES, desde logo, pelo teor dos considerandos e cláusulas do acordo constantes nos 1 a 7 que fazem a destrinça de forma clara entre as obrigações adquiridas, que não foram só do Grupo GES, e o financiamento contraído junto do BES, e bem assim com o histórico de subscrição deste tipo de obrigações também com recurso ao financiamento, como resulta do acordo, documento conjugado com o teor do depoimento da testemunha JAN que, de forma objectiva e imparcial, referiu saber que em causa estavam obrigações que não eram activos do BES, facto este também confirmado pelo A MOC que em sede de declarações de parte esclareceu que sabia que a compra das obrigações em conjunto com o financiamento contraído junto do BES tinha como objectivo recuperar o dinheiro perdido com a falência do Lemon Brothers, não se nos afigurando crível o mesmo depoimento na parte que refere desconhecer a entidade emitentes ESFG, desde logo pelas anteriores subscrições de obrigações ESFG2017 em 2009 (al. f) dos considerandos do acordo com recurso ao financiamento) e pelas perdas tidas anteriormente naqueloutras obrigações;
No que concerne à não informação das características e riscos das Obrigações ESFG, nesta matéria também o tribunal não logrou ficar convencido, atendendo a que o A. era um cliente que, pelo menos, desde 2008, aquando da falência do Banco Lehmon Brothers, sabia o que era uma obrigação, tinha uma carteira de obrigações variada (que não apenas do BES), conforme resulta do acordo em causa nos autos e bem assim já tinha adquirido obrigações ESFG 2017, com recurso a financiamento nos termos dos considerandos d) e f)  e também adquiriu obrigações do Futebol Clube do Porto, conforme resulta da sua própria carta junta aos autos a fls. 76, documento valorado na sua objectividade, não obstante a mesma datar de 2015, data posterior à resolução, mas na qual consta que efectivamente o A sabia do que se tratava as obrigações; acresce que resulta do próprio acordo na sua cláusula 1, de forma expressa, os riscos inerentes ao não pagamento das mesmas que de todo passa despercebido. Não se nos afigura crível, depois das percas financeiras, que o A teve em 2008, e das subscrições feitas em 2009 (também com recurso ao financiamento que não se tenha informado sobre os riscos as obrigações; acresce como referiu a testemunha JAN, advogado do A., que em 2012 não passava pela cabeça de ninguém, a resolução do BES e da falência da ESFG, dada a solidez do Banco e do Grupo, aliás, as obrigações, naquela altura, era como se fossem dinheiro, expressão do próprio.“.
Não vemos como é que o depoimento da testemunha Sr. Dr. JAN e as declarações de parte do Autor Sr. MOC, em concreto nos segmentos em que os Recorrentes se baseiam, sejam susceptíveis de debelar a convicção firmada pelo Tribunal a quo, conduzindo a solução diversa da por este alcançada, nomeadamente no sentido de dar por provados os factos 2, 4 e 6 que teve por não provados.
Como se vê da motivação da decisão sobre a matéria de facto acima transcrita, um dos elementos probatórios a que o Tribunal a quo especialmente atendeu foi o acordo subscrito pelos AA. e pelo BES em 14/08/2012, junto pelos AA. com a petição, documento incontroverso porque pacificamente aceite pelas partes e cuja assinatura foi nos autos reconhecida pelas partes.
“Uma vez provada a autoria da assinatura, tem-se de igual modo por reconhecido o contexto do documento. Aplicar-se-á ao corpo do documento, depois de provada a autenticidade da assinatura de quem o subscrever a velha presunção qui subscripsit videtur scripsisse. Quem subscreve o documento quer significar que aprova o seu conteúdo e assume a paternidade deste.
Há apenas que ressalvar a hipótese, não muita rara, da assinatura em branco (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 516).
O art.º 376º do C.C. dispõe o seguinte:
“1 - O documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento.
2 - Os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante; mas a declaração é indivisível, nos termos prescritos para a prova por confissão.
3 – (…)
(…) a confissão extrajudicial inserida em documento autêntico ou particular (cuja falsidade não seja invocada):
a) Goza de força probatória plena, nos termos do art.º 358º, nº 2, do CC;
b) Apenas pode ser contrariada mediante a produção de meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que foi objecto da confissão (art.º 347º, 1ª parte);
c) E para este efeito, o confitente enfrenta as restrições legais quanto ao uso de certos meios de prova (art.º 347º do CC).
Não é difícil compreender os motivos pelos quais o sistema foi assim moldado. Nos casos em que não seja assacado à declaração qualquer vício que infirme o valor intrínseco do respectivo conteúdo, é natural que sejam limitados os meios de prova susceptíveis de a infirmar, evitando os riscos da volatilidade e da subjectividade inerentes à prova testemunhal ou ao uso de presunções judiciais. Representando a confissão extrajudicial o reconhecimento de um facto… o beneficiário de tal declaração não poderia evidentemente ser colocado no mesmo plano em que ficaria se acaso não houvesse qualquer declaração confessória” (cfr. Acórdão do STJ proferido a 17/12/2015 no processo 940/10.9TVPRT.P1.S1, e no mesmo sentido Acórdão do STJ proferido a 06/07/2023 no processo 1721/17.4T8VIS-A.C1.S2, ambos em www.dgsi.pt).
Não tendo sido arguida a falsidade do documento particular em apreço - bem ao invés, as partes têm-no por fidedigno e dele se querem fazer valer - os factos nele declarados desfavoráveis ao declarante não podem ser infirmados por prova testemunhal por força do art.º 393º nº 2 do CCivil.
Ora, o acordo de 14/08/2012 não só não denota que o BES tivesse garantido o pagamento das obrigações, nomeadamente substituindo-se aos emitentes, como a sua cláusula 4ª é clara quanto a que o BES declarou e garantiu que, nos termos dos respectivos prospectos e fichas técnicas, as obrigações serão obrigatoriamente pagas pelos emitentes.
E nos termos constantes dos prospectos e fichas técnicas anexas ao acordo, e dele parte integrante, constam os respectivos riscos de perda total ou parcial do investimento, seja por flutuações do activo, seja pela insolvência do emitente ou do garante, ou por outros motivos de cariz económico, político ou de qualquer outra índole que possam afectar os mercados, o sistema financeiro e a economia em geral, sendo que no nº 2 da Cláusula 1ª do acordo “O Cliente declara, ainda, que leu as Fichas Técnicas das Obrigações BES Finance 2021 e Obrigações ESFG 2019 e que entendeu integralmente as características daquelas obrigações, não tendo qualquer dúvida sobre as mesmas”, e da Cláusula 7ª nº3 consta que “em relação à composição da conta de instrumentos financeiros referida nos números anteriores, o Cliente reconhece ser titular de todos os instrumentos financeiros, declarando conhecer todas as suas características e riscos, e não tendo nenhuma dúvida ou necessidade de qualquer esclarecimento sobre os mesmos”.
Portanto, são as declarações vertidas no próprio documento subscrito e aceite pelos AA., que fazem prova plena e não podem ser infirmadas por prova testemunhal, que permitem concluir linearmente que os factos 2 e 6 se devem manter como não provados, além de que aportam elementos relevantes para concluir não se ter provado o facto 4 (relativo ao alegado vício da vontade). Isto porque os riscos das obrigações em discussão não se diferenciavam do risco da subscrição de obrigações antes realizadas pelos AA., revelando estes logo na petição, o que aliás também consta dos considerandos do acordo, que a Autora “…, SA” – além da aquisição em 30/03/2005 de 1.049.000 obrigações da Lehhman Brothers UK Cap Fund, e da aquisição em 12/07/2007 e 31/07/2007 de 200.000 obrigações Kaupthing Bank – ao longo de 2009, 2010 e 2011 adquiriu um total de € 3.550.000,00 de obrigações ESFG 2017, revelando uma inevitável experiência na aquisição de obrigações, e concretamente de obrigações ESFG, com o inerente conhecimento que essa experiência confere quanto ao comportamentos dos mercados e respectivos riscos, tanto que, como se destaca na motivação da decisão sob recurso, no artigo 35º da petição inicial o A. assume que conhecia os riscos normais decorrentes dos comportamentos dos mercados, não sendo, por isso, credível a imagem que o Autor MOC e o seu então Advogado Dr. JAN quiseram transmitir, de que aquele era um iletrado financeiro. Outrossim, o descrito na petição sobre a génese das relações dos AA. com o BES, quer quanto à própria constituição da A. sociedade “…, SA” e subsequentes operações de aquisição de obrigações, quer os próprios termos do acordo, designadamente nos seus considerandos, revelam que o Autor MOC, por si e em representação da sociedade A., detinha um aprofundado conhecimento do BES e dos mecanismos próprios do mercado mobiliário e inerentes riscos, e detendo esse conhecimento - ademais, sempre acompanhado/aconselhado por advogado ao longo das negociações e da subscrição do acordo - quis conscientemente adquirir as obrigações em causa como instrumento de recuperação das perdas do investimento em obrigações Lemon Brother e Kaupting Bank; devendo referir-se que a assunção do risco não lhe era estranha, pois não obstante as perdas relativas ao investimento em obrigações Lemon Brother e Kaupting Bank no subprime de 2008 continuou a comprar obrigações como denota a circunstância de ao longo de 2009, 2010 e 2011 ter adquirido o total de € 3.550.000,00 de obrigações ESFG 2017.
Refira-se ainda quanto ao conhecimento do BES – remetendo para a alegação de que a vontade negocial dos AA. se mostraria viciada por falta de transmissão de conhecimento/informação quanto à solvabilidade do BES e respectivo grupo – que das declarações do A. Sr. MOC e do depoimento da testemunha Dr. JAN nada – além das suposições que aventam – permite concluir que os funcionários do BES, com os quais foram estabelecidas as relações negociais, tivessem qualquer conhecimento acerca da real situação do Grupo BES que não lhes tenham transmitido podendo tê-lo feito. E a verdade é que os próprios envolvidos expressaram nos seus depoimentos – à semelhança da testemunha dos AA. Dr. JAN – que à época em que celebraram o acordo não era sequer cogitável que o BES e o Grupo BES não fossem financeiramente saudáveis. Como se refere na motivação da sentença “é unânime de todos os depoimentos prestados, designadamente RP, PFV, JAN, já supra identificados, que naquele ano de 2012 era impensável pensar em falência do BES e de todo o seu grupo, pois era um grupo sólido e era o único banco não intervencionado pelo Estado Português.”
Portanto não existem fundamentos para alterar a matéria de facto relativa aos factos não provados 2, 4 e 6, que como se tal se mantêm.

Atentemos agora no facto não provado 5. É ele do seguinte teor: “Não se provou que os As não foram informados sobre as características e natureza e riscos das obrigações ESFG2019.”.
Acerca deste facto referem os Recorrentes nas conclusões 22 e 23 da sua apelação que
“22. Em primeiro lugar, como resulta de jurisprudência assente, o ónus da prova dessa comunicação e explicação era da Ré, aqui Recorrida, o que não logrou fazer/provar.
Assim,
23. por essa razão, deve o ponto ser desde logo dado como provado.”
O facto reporta-se à informação prestada, ou não, no momento da celebração do acordo de 14/08/2012, pelo que, antes de mais, cabe precisar que o sujeito em causa não é a Ré “Novo Banco, SA” - a única Ré que subsiste na lide, e que àquela data ainda não tinha sequer sido constituída – mas o “BES, SA” que nesse acordo foi parte com os AA., e que nele exerceu actividade típica e própria de intermediação financeira (cfr., no caso, artºs 293º nº 1 al. a, 289º nº 1 als. a) e b), 290º e 291º CVM).
Acerca das obrigações de conduta que impendem sobre o intermediário financeiro dispõe o art.º 304º CVM, no que ora interessa, que “(…) 2 - Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência. 3 - Na medida do necessário para o cumprimento dos seus deveres na prestação do serviço, o intermediário financeiro deve informar-se junto do cliente sobre os seus conhecimentos e experiência no que respeita ao tipo específico de instrumento financeiro ou serviço oferecido ou procurado, bem como, se aplicável, sobre a situação financeira e os objetivos de investimento do cliente.(…)” e acerca da sua responsabilidade estabelece o art.º 304º-A do CVM que “1 - Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação dos deveres respeitantes à organização e ao exercício da sua atividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública”, sendo que “2 - A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação”.
Da leitura desta norma extrai-se que os pressupostos da responsabilidade do intermediário financeiro são o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade.
Tendo presente que o art.º 342º do CCivil estabelece a regra segundo a qual àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado (nº 1) e que, em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do direito (nº 3), e, ainda, que de acordo com o art.º 344º nº 1 do CCivil há inversão do ónus da prova sempre que a lei o determine, há que concluir que o ónus da prova da verificação dos pressupostos da responsabilidade do intermediário financeiro cabe ao cliente, com excepção da culpa, porquanto esta se presume.
Na verdade, “Ainda que, nos termos do nº 2 [do art.º 304º-A CVM], se presuma a culpa no âmbito das relações contratuais, tal não afasta o pressuposto prévio da demonstração da ilicitude que recai sobre aquele que invoca o direito de indemnização” (www.dgsi.pt Acórdão do STJ de 06/06/2013, processo 364/11.0TVLSB.L1.S1), mantendo inteira aplicação o decidido no Acórdão do STJ nº 8/2022, de 06/12/2021 segundo o qual “incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.”
Portanto, cabia aos AA. a prova do facto ilícito que imputaram ao BES na sua actuação enquanto intermediário financeiro, qual seja a violação do dever de informação que alegaram como facto constitutivo do direito que pretendem fazer valer.
Dito isto, teremos de concluir, como a sentença de 1ª instância, que os AA. não produziram tal prova, pois é neste âmbito totalmente válida a explanação e análise acima efectuada quanto a que o documento relativo ao acordo firmado em 14/08/2012 subscrito e aceite pelos AA., e cujas declarações nele vertidas fazem prova plena e não podem ser infirmadas por prova testemunhal, expressa de forma inequívoca no nº 2 da sua Cláusula 1ª que “O Cliente declara, ainda, que leu as Fichas Técnicas das Obrigações BES Finance 2021 e Obrigações ESFG 2019  - que fazem parte integrante do dito acordo - e que entendeu integralmente as características daquelas obrigações, não tendo qualquer dúvida sobre as mesmas”, e na sua Cláusula 7ª nº 3 que “em relação à composição da conta de instrumentos financeiros referida nos números anteriores, o Cliente reconhece ser titular de todos os instrumentos financeiros, declarando conhecer todas as suas características e riscos, e não tendo nenhuma dúvida ou necessidade de qualquer esclarecimento sobre os mesmos”; perante o que não resulta demonstrada a violação dos deveres de informação aos AA. acerca das características, natureza e riscos das obrigações ESFG2019.
Deve, por conseguinte, manter-se inalterado o facto não provado 5.

Vejamos agora que dizer quanto ao facto não provado 7.
Reza o mesmo que “Não se provou a assunção pelo BES em 24-07-2014 que reembolsaria na maturidade do capital investido pelos seus clientes não institucionais junto das redes comerciais do GES todas as emissões de papel comercial.”
Em abono da sua pretensão de ver tal facto aditado ao elenco dos factos provados, os Recorrentes referem que
“40.A Ré em sede de Contestação não deu cumprimento ao ónus de impugnação especificada da matéria vertida a esse propósito, razão pela qual o ponto sempre deveria ter sido dado como provado.
41. Assim, requer-se a V. Exa. seja o facto considerado como provado.
42. Ad cautelam, se assim não se entender, o que não se concede, sempre se diga que a verdade é que a 24 de Julho de 2014 e na sequência da nota de imprensa da ESFG conexa com a candidatura ao regime de gestão controlada, o BES emitiu comunicado adicional, assegurando “o reembolso, na maturidade, do capital investido pelos seus clientes não institucionais junto das redes comerciais do GBES todas as emissões de papel comercial”,[2] o que foi tornado público.
43. Portanto, confrontado, com a elevada probabilidade de incumprimento por parte da ESFG, da ESI e da Rioforte o BES de livre e espontânea vontade divulgou e veiculou publicamente a sua intenção de reembolsar os seus clientes não institucionais.
44. Se as FAQ publicadas no site do Novo Banco, disponíveis até ao dia 15 de janeiro de 2015 como aponta o link da notifica supra desapareceu, sempre o douto Tribunal deveria ter lançado mão de meios de prova que apurassem a realidade, seja através de notificação expressa da entidade bancária, seja através de Perícia.
45. Se não o fez, cometeu uma nulidade que aqui expressamente se invoca para todos os efeitos legais, ou quanto muito uma insuficiente pelo que, ad cautelam, ao abrigo do artigo 662º da lei processual civil, als. a) e b) requer-se a V. Exa. seja ordenada a renovação da prova quanto a essa matéria.”
Relativamente ao primeiro argumento adiantado pelos Recorrentes o mesmo não pode colher, porquanto analisada a contestação da Ré é inequívoco que o facto em apreço é antagónico com a posição assumida pela Ré nesse seu articulado de defesa, considerado na sua globalidade, não podendo, por isso, ser considerado admitido por acordo atento o disposto no art.º 574º nº 2 do CPC, o qual prevê que se consideram admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto.
Quanto ao segundo argumento apresentado pelos Recorrentes, que assenta no entendimento de que o Tribunal a quo deveria ter realizado/ordenado diligências de prova para averiguar da existência de um comunicado emitido pelo BES veiculando publicamente a sua intenção de reembolsar os seus clientes não institucionais, a cuja alegada existência os AA./Recorrentes aludiram por referência a uma notícia do jornal “Sol” (para cujo link remeteram em rodapé), divisa-se que os Recorrentes se reportam à violação do princípio do inquisitório.
Cumpre recordar que aos AA. cabe, na petição, alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir que servem de fundamento à acção e com esse articulado apresentar o rol de testemunhas e requerer outros meios de prova (cfr. artºs 5º nº 1 e 552º nº 1 al. d) e nº 6), apresentando de imediato os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção (cfr. art.º 423º nº 1 CPC) ou, tratando-se de documentos em poder da parte contrária ou de terceiros, requerer ao Tribunal a notificação do detentor do documento para que o apresente (cfr. artºs 429º e 432º CPC).
Por isso, muito embora o art.º 411º CPC, estabelecendo o princípio do inquisitório, determine que “Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer”, o juiz deve actuar dentro do quadro dos princípios estruturantes do processo civil, quais sejam os princípios do dispositivo, do contraditório, da igualdade das partes e da imparcialidade, porquanto eles consistem nas traves-mestras do princípio fundamental do processo equitativo proclamado no art.º 20º nº 4 da Constituição da República.
Daí que “no que diz respeito aos poderes instrutórios do juiz, há que reconhecer que, antes de mais, eles encontram um limite natural nas garantias das partes, assumindo particular importância, neste caso, a garantia de imparcialidade do tribunal (…)” (cfr. Nuno Lemos Jorge in “Poderes Instrutórios do Juiz, Alguns Problemas”, in Julgar 3, 2007, pág. 61), o que determina que o inquisitório se deva orientar por um padrão de objectividade e de necessidade para o apuramento da verdade e justa composição do litígio, não podendo o poder-dever conferido pelo princípio do inquisitório ser exercício como forma de suprimento oficioso de indesculpável negligência das partes em violação do princípio da auto-responsabilidade das partes.
E no caso, os AA. não requereram em nenhum passo do processo qualquer tipo de diligência probatória destinada a apurar da existência do alegado comunicado do BES veiculando publicamente a sua intenção de reembolsar os seus clientes não institucionais, não se descortinando que o Tribunal, orientado por princípios de objectividade e imparcialidade, se devesse substituir aos AA., tanto mais que os elementos constantes dos autos não patenteiam a necessidade de realização oficiosa de qualquer diligência probatória no sentido do apuramento da existência do alegado comunicado do BES porque a sua existência é apenas sugerida pela noticia que os AA. indicaram e, além disso, porque o mesmo, a existir ou ter existido, será de autoria do BES, quanto ao qual a instância foi julgada extinta, não se podendo dele extrair qualquer consequência relativamente à Ré “Novo Banco, SA”.
E pela ordem de razões acabadas de apontar não estão reunidos os pressupostos de aplicação do art.º 662º CPC convocado pelos Recorrentes; e não se descortina a que nulidade possam os Recorrentes querer reportar-se, nenhuma nulidade da decisão se vislumbrando tendo em vista que essas se mostram taxativamente previstas no art.º 615º CPC e prendem-se com vícios estruturais ou intrínsecos da decisão, reconduzindo-se a erros de actividade ou de construção da própria sentença, que não se confundem com eventual erro de julgamento de facto e/ou de direito.
Aqui chegados, não existem fundamentos, nomeadamente fundamentos probatórios – que é o que releva em sede de impugnação da decisão de facto -, para, como pretendem os Recorrentes, se dar por provada a “assunção pelo BES em 24-07-2014 que reembolsaria na maturidade do capital investido pelos seus clientes não institucionais junto das redes comerciais do GES todas as emissões de papel comercial”.

Improcede, pois, na totalidade a impugnação da decisão da matéria de facto.

DA DECISÃO DE MÉRITO
Como se alcança do ponto 96 da motivação das alegações, os Recorrentes assentam a pretendida revogação da decisão de mérito na alteração da decisão de facto pelos mesmos propugnada, pelo que, mantendo-se inalterada a decisão sobre a matéria de facto, pode afirmar-se a imodificabilidade da decisão de mérito por prejudicialidade.
Contudo, sempre contribuiremos com algumas considerações jurídicas que revelam a inevitabilidade da improcedência da apelação.
Como a tramitação processual revela, com a extinção da instância relativamente ao “BES” por inutilidade superveniente da lide decidida na fase do saneador, os autos prosseguiram apenas contra a Ré “Novo Banco, SA” e os AA., em resultado de convite para o efeito e depois de redução do pedido, esclareceram que os seus pedidos são os seguintes:
“1. Seja o Novo Banco condenado a cumprir com os termos e as condições emergentes do acordo celebrado a 14-08-2012 entre a A “…, SA” e o BES.
Caso o antedito improceda:
2. Seja o Novo Banco SA condenado a reconhecer a redução do valor do contrato de financiamento para a quantia de €1.674.818,15 a liquidar pelos As, em virtude de não lhes ser pago o valor de €500.000,00 pelas obrigações ESFG 2019.
Em qualquer caso
3. Seja o Novo Banco SA condenado a pagar aos Aas MOC e JSRC a título de danos não patrimoniais de €50.000,00”.

Pode sumariar-se que os AA. sustentam os pedidos formulados na responsabilidade do BES por violação dos seus deveres enquanto banqueiro e intermediário financeiro, responsabilidade essa que entendem ter sido transferida para o “Novo Banco, SA” por força da medida de resolução do Banco de Portugal (BdP) aplicada ao BES e criação daqueloutro como banco de transição.

Devemos referir que as diversas questões suscitadas nestes autos, bem como outras que lhes são conexas, foram já objecto de análise, apreciação e decisão em inúmeros Acórdãos dos Tribunais Superiores, nomeadamente deste Tribunal da Relação de Lisboa, destacando-se aqui o Acórdão de 13/07/2017 proferido no processo 5444/16.3T8LSB.L1-7 (Relator Exm.º Desembargador Luís Espírito Santo), que seguiremos de perto na exposição infra, e do qual consta um extenso elenco, embora apenas exemplificativo, de várias decisões do Tribunal da Relação de Lisboa sobre tais matérias.
Dito isto vejamos:
O BdP é o Banco Central Nacional (art.º 102º da CRP), integrado no Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC), e está sujeito aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.
A Lei Orgânica do Banco de Portugal, aprovada pela Lei nº 5/98, de 31/01, objecto de sucessivas alterações, comete-lhe um conjunto de funções que abarcam o desempenho das funções de autoridade de resolução nacional, incluindo elaborar planos e aplicar medidas de resolução, e ordenar a eliminação de potenciais obstáculos à aplicação de tais medidas (art.º 17-A).
Assim, estando em causa deliberações tomadas a coberto do estatuído nomeadamente no artigo 145º-H do RGICSF (aprovado pelo DL nº 298/92, de 31/12, sujeito a posteriores alterações, nomeadamente pelo DL nº 31-A/2012, de 10/02), afigura-se-nos inquestionável que neste caso o BdP agiu com poderes de autoridade, e tem vindo a ser unanimemente afirmado na jurisprudência não caber aos Tribunais comuns pronunciarem-se sobre a legalidade das deliberações do BdP, uma vez que este agiu no âmbito de poderes administrativos que a lei lhe confere enquanto entidade reguladora.
E na verdade as referidas deliberações estão sujeitas aos meios processuais previstos na legislação do contencioso administrativo, conforme expressamente dispõe o art.º 145º-AR nº 1 do RGICSF, com as alterações introduzidas pela Lei nº 23-A/2015, de 26/03, segundo o qual “Sem prejuízo do disposto no artigo 12º, as decisões do Banco de Portugal que apliquem medidas de resolução, exerçam poderes de resolução ou designem administradores para a instituição de crédito objecto de resolução estão sujeitos aos meios processuais previstos na legislação do contencioso administrativo, com ressalva das especialidades previstas nos números seguintes, considerando os interesses públicos relevantes que determinam a sua adopção”.
Por outro lado, também o art.º 39º da Lei Orgânica do Banco de Portugal, estipula que “dos actos praticados pelo governador, vice-governadores, conselho de administração e demais órgãos do Banco, ou por delegação sua, no exercício de funções públicas de autoridade, cabem meios de recurso ou acção previstos na legislação própria do contencioso administrativo, incluindo os destinados a obter a declaração de ilegalidade de normas regulamentares”.
Assim sendo, a apreciação da legalidade das deliberações em causa só poderá ser efectuada no âmbito da jurisdição administrativa, à qual competirá, em exclusivo, o conhecimento de eventual acção de nulidade ou anulação proposta com vista à declaração de invalidade da transferência de activos, passivos, elementos patrimoniais e activos sob gestão de uma instituição de crédito para um banco de transição, ou a retransmissão dos mesmos (sobre a tutela jurisdicional a efectivar no plano da acção administrativa especial de impugnação da legalidade e a acção administrativa comum de indemnização, ver Luís Cabral de Moncada em “Os poderes de resolução do Banco de Portugal e o Banco Espírito Santo”, pág. 61).
Não tendo as deliberações em causa sido objecto de impugnação nos Tribunais administrativos, está vedado aos Tribunais comuns sindicar a legalidade das mesmas (sua validade substantiva ou formal) (cfr., entre outros, os Acs. da RL de 06.10.2016, P. 1387/15.6T8PRT-A.L1-8 (António Valente), e de 07.03.2017, P 48/16.3T8LSB-L1-7 (Luís Filipe Pires de Sousa), ambos em www.dgsi.pt).
Contudo, tal restrição de competência não é extensível às questões de inconstitucionalidade por a própria Constituição determinar (cfr. art.º 204º) que “Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados”. E considerando que os AA. referem que fere o sentido de justiça a circunstância de o crédito e garantias terem sido transferidos integralmente para o NB mas não ter sido para este transferida a obrigação de pagamento do valor das obrigações ESFG 2019, decorrendo tal das normas subjacentes às deliberações tomadas pelo BdP, não podemos deixar de analisar a situação em presença sob um prisma de (in)constitucionalidade.
Dispõe o art.º 62º da CRP que “1. A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição. 2. A requisição e a expropriação por utilidade pública só podem ser efectuadas com base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização”.
Como escrevem Gomes Canotilho e Vital Moreira, em “Constituição da República Portuguesa Anotada – artigos 1º a 107º”, pág. 801, a menção no citado art.º 62º nº 1 in fine, de que o direito de propriedade é garantido “nos termos da Constituição” parece supérflua, mas não o é, “trata-se de sublinhar que o direito de propriedade não é garantido em termos absolutos, mas sim dentro dos limites e com as restrições previstas e definidas noutros lugares da Constituição (e na lei, quando a Constituição possa para ela remeter ou quando se tratar de revelar limitações constitucionalmente implícitas) por razões ambientais, de ordenamento territorial e urbanístico, económicas, de segurança, de defesa nacional”.
Sobre esta matéria destacamos do Acórdão de 13/07/2017 acima citado, e que logo anunciámos seguir de perto, o seguinte excerto:
«(…) A eventual ou presumível afectação patrimonial dos valores em que se consubstancia o direito invocado pelos AA. prende-se, directa e necessariamente, e nesse sentido tem que ser entendida, com os especiais motivos conjunturais subjacentes à necessidade de resolução bancária do Banco Espírito Santo, S.A., concretamente com a fundamentação, finalidades e alcance da deliberação da adopção pela entidade reguladora e fiscalizadora competente, o Banco de Portugal, de um conjunto de medidas que tiveram por objectivo acudir, sem delongas, a uma grave situação de crise bancária, procurando a todo o transe assegurar a continuidade da actividade da instituição sob resolução e obviar aos enormes riscos sistémicos que poderiam advir para a economia nacional, para a credibilidade da banca em geral e para a confiança dos agentes económicos em geral.
Consta sintomaticamente dos considerandos vertidos na acta da Reunião Extraordinária do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014: “No dia 30 de Julho de 2014, o Banco Espírito Santo, S.A., divulgou, mediante comunicação à Comissão de Mercado dos Valores Mobiliários (CMVM), os resultados do Grupo Espírito Santo relativos ao primeiro semestre de 2014, que registam um prejuízo de 3.577, 3 milhões de euros. (…) o Banco Espírito Santo, S.A. encontra-se numa situação grave de insuficiência de liquidez, sendo que, desde o fim de Junho até 31 de Julho, a posição de liquidez do Banco Espírito Santo, S.A. diminuiu em cerca de 3.350 milhões de euros. Na impossibilidade de esta acentuada pressão sobre a liquidez do BES ser acomodada pela instituição com recurso a fundos obtidos em operações de política monetária, por esgotamento dos activos de garantia aceites para o efeito e também pela limitação imposta pelo BCE em relação ao aumento do recurso ao BES às operações de política monetária, o Banco Espírito Santo, S.A., viu-se forçado a recorrer à cedência de liquidez em situação de emergência (ELA-Emergency Liquidity Assistance) por um valor que atingiu, na data de 1 de Agosto, cerca de 3,500 milhões de euros. No dia 1 de Agosto, o Conselho do Banco Central Europeu (BCE) decidiu suspender o estatuto de contraparte do Banco Espírito Santo, S.A., com efeitos a partir de 4 de Agosto de 2014, a par da obrigação de este reembolsar integralmente o seu crédito junto do Eurosistema, de cerca de 10 milhões de euros, no fecho das operações no dia 4 de Agosto. Assim, a decisão do BCE de suspensão do Banco Espírito Santo, S.A., como contraparte de operações de política monetária tornou insustentável a situação de liquidez deste, que já o tinha obrigado a recorrer excepcionalmente, com especial incidência nos últimos dias, à cedência de liquidez em situação de emergência por parte do Banco de Portugal. Os factos descritos nos números anteriores colocam o Banco Espírito Santo, S.A., numa situação de risco sério e grave de incumprimento a curto prazo das suas obrigações e, em consequência, dos requisitos para a manutenção da autorização para o exercício da sua actividade (…) não sendo tomada, com urgência, a medida de resolução ora adoptada, a instituição caminharia inevitavelmente para a suspensão de pagamentos e para a revogação da autorização nos termos do artigo 23º do RGICSF, com a consequente entrada em processo de liquidação, o que representaria um enorme risco sistémico e uma séria ameaça para a estabilidade financeira. Tal situação tornou imperativa e inadiável uma medida de defesa dos depositantes, de forma a evitar uma ameaça à segurança dos fundos depositados. Além deste objectivo primordial, é imprescindível ter em conta que a dimensão do Banco Espírito Santo, S.A., a sua qualificação como instituição de crédito significativa para efeitos de supervisão europeia e a sua importância no sistema financeiro nacional e no financiamento à economia, são factores que têm associado um inequívoco risco sistémico”.
Foi este, portanto, o quadro factual e objectivo que conduziu, num contexto profundamente excepcional e de eminente crise sistémica, à criação do Novo Banco, S.A., enquanto banco de transição, e à discussão em torno da transferência para a nova entidade das responsabilidades anteriormente contraídas pelo Banco Espírito Santo, S.A.
A situação económica, financeira e comercial, altamente críticas, em que o Banco Espírito Santo, S.A. se viu mergulhado – e que são publicamente conhecidas – obrigou a uma acção rápida e coordenada para manter a confiança nos mercados e minimizar o contágio, não podendo e não devendo as autoridades de resolução adiar a adopção de medidas adequadas de resolução na prossecução do interesse público geral.
Neste contexto, a actuação do Banco de Portugal não poderia, logicamente, passar, na primordial salvaguarda do interesse público, por operar uma mera, inócua e inconsequente transmissão das relações jurídicas financeiras tituladas pela instituição financeira para outra entidade que as recebesse integralmente, passando precisamente a arcar com as dificuldades pré-existentes, sujeitando-se dessa forma à perda da confiança dos mercados e a potenciar ilimitadamente o contágio.
Importa ainda tomar em primordial consideração, a este propósito, a Directiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho da União Europeia de 15 de Maio de 2014, que “estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento”, que veio a ser objecto de transposição para o direito nacional através do Decreto-lei nº 114-A/2014, de 1 de Agosto, e da Lei nº 23-A/2015, de 26 de Março, (que veio, por sua vez, a ser objecto de alteração pela Lei nº 66/2015, de 6 de Julho), que previu inclusivamente, no seu artigo 40ª, nº 1/3: “Os Estados-Membros asseguram que as autoridades de resolução tenham poderes para transferir para uma instituição de transição” “a totalidade ou parte dos activos, direitos ou passivos de uma ou mais instituições objecto de resolução” e que “ao aplicar o instrumento de criação de uma instituição de transição, a autoridade de resolução deve assegurar que o valor total dos passivos transferidos para a instituição de transição não exceda o valor total dos direitos e activos transferidos a partir da instituição objecto de resolução ou disponibilizados por outras fontes”.
Daí a criação, através da intervenção do Banco de Portugal e segundo as orientações gerais das autoridades da União Europeia, do denominado banco de transição que prosseguiria as finalidades da instituição objecto de resolução, servindo igualmente de veículo temporário para a sua alienação futura.
O que verdadeiramente se passou, através da contundente e enérgica intervenção da entidade reguladora e de supervisão nacional, teve a ver com a premente necessidade de repor equilíbrios e evitar a todo o custo o contágio da negatividade financeira e das imparidades verificadas.
Simultaneamente, impunha-se, sem outra solução no horizonte, plausível, credível ou cabal, blindar o restante tecido social face à desagregação interna de uma das mais reputadas instituições de crédito nacionais.
A confirmar a enorme e indisfarçável gravidade da situação que obrigou à intervenção do Banco de Portugal, ocorreu a do Banco Central Europeu, de 13 de Julho de 2016, que revogou a autorização do Banco Espírito Santo, S.A.(“BES”) para o exercício da actividade de instituição de crédito, sendo certo que desta deliberação não foi interposto recurso para o Tribunal Geral da União Europeia, conforme possibilitava o artigo 263º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, tendo por isso mesmo transitado em julgado.
Logo, o próprio princípio do primado do direito comunitário/europeu na ordem jurídica nacional, plasmado no artigo 8º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa, justificou, legitimou e consolidou juridicamente as soluções adoptadas pelo Banco de Portugal na intervenção de resolução bancária a que teve de proceder, numa situação de inegável emergência e excepcionalidade.
No mesmo sentido, não podendo o direito de propriedade ser considerado como um direito absoluto - e face a todo o circunstancialismo de que se deu nota -, não deve considerar-se que a transferência das situações patrimoniais do BES para o Novo Banco de transição, através dos critérios de selecção concretamente seguidos, haja redundado em qualquer tipo de inconstitucionalidade, mormente pela violação do comando ínsito no artigo 62º da Constituição da República Portuguesa.
Quanto a este ponto, não se poderá esquecer que o Novo Banco, S.A, não é uma instituição bancária comum, a desenvolver actividade em condições de normalidade no plano do exercício da actividade financeira e comercial.
Trata-se, ao invés, de um mero banco de transição, criado num contexto de grave emergência, com finalidades de interesse público, e respondendo a especiais exigências europeias/comunitárias que vinculam, directamente e com primazia, a ordem jurídica nacional portuguesa.
Neste mesmo sentido e conforme resulta do disposto nos artigos 145º, nº 3 e 4 a 145º-O do RGICSF este banco de transição rege-se por uma disciplina especial e própria.
Acresce, ainda, que constituindo as deliberações do Banco de Portugal de 29 de Dezembro de 2015 simples concretização e clarificação do sentido da anterior deliberação de 11 de Agosto de 2014, as mesmas não acrescentaram, nem retiraram, quaisquer direitos aos particulares, mormente aos clientes do Banco Espírito Santo, S.A., sendo que a garantia de que estes, em abstracto, dispõem está directamente conectada ao capital social da instituição.
(…)
A actuação do Banco de Portugal foi desenvolvida no âmbito da sua esfera de competência própria, gozando do imprescindível respaldo legal, não lhe devendo ser dirigido, a nosso ver, qualquer pretenso juízo de inconstitucionalidade por violação do artigo 62º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa.
Note-se que a tal intervenção – e em concreto a resolução bancária operada –, tendo em conta todo o circunstancialismo factual que se deixou enfatizado, respeitou indiscutivelmente os princípios gerais da adequação, necessidade e proporcionalidade, encontrando-se em estreita conformidade com o princípio constitucional ínsito no artigo 18º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual: “A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo a restrição limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.
Estabelece, a este respeito, o artigo 139º, nº 2, do RGICSF: “A aplicação das medidas previstas no presente título está sujeita aos princípios da adequação e da proporcionalidade, tendo em conta o risco ou o grau de incumprimento, por parte da instituição de crédito, das regras legais e regulamentares que disciplinam a sua actividade, bem como a gravidade das respetivas consequências na solidez financeira da instituição em causa, nos interesses dos depositantes ou na estabilidade do sistema financeiro”.
Tais finalidades essenciais foram efectivamente ponderadas e prosseguidas, havendo sido as medidas adoptadas aquelas que a gravidade da situação e os ditames do interesse público geral (manutenção em funcionamento da instituição de crédito; salvaguarda dos depositantes; defesa do erário público; afastamento do risco sistémico e da desagregação do tecido social, empresarial e económico) claramente exigiam e impunham, sem outro tipo de alternativas viáveis, seguras e realistas.
(…)
No mesmo sentido, não poderá aceitar-se que as ditas deliberações do Banco de Portugal hajam consubstanciado uma pretensa violação ao disposto no artigo 101º da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual: “o sistema financeiro é estruturado por lei, de modo a garantir a formação, a captação e a segurança das poupanças, bem como a aplicação dos meios financeiros necessários ao desenvolvimento económico e social”, na medida em que as mesmas se dirigiram, por todos os motivos já relatados, à preservação da estabilidade do sistema financeiro no seu todo, defendendo os respectivos depositantes, o erário público e a continuidade das funções bancárias da entidade de crédito em indisfarçável débacle.
(…)
Ora, a actuação, sustentada e coerentemente, prosseguida pelos órgãos competentes e habilitados para o efeito, tendente a preservar a estabilidade e solidez do sistema financeiro, não pode, ao mesmo tempo, ser vista como ofensiva do direito à propriedade privada dos particulares que a ele recorrem.
Não faz naturalmente qualquer sentido.
Não há, pois, dúvidas que a aplicação dos normativos em referência concorreram francamente para o reforço do sistema financeiro, não sendo neste domínio minimamente configurável qualquer juízo de inconstitucionalidade” [fim de citação].

Tendo assim por seguro que as deliberações do Banco de Portugal não se mostram afectadas de qualquer inconstitucionalidade.

Vejamos agora que dizer quanto à transferência de responsabilidade do “BES” para o “Novo Banco, SA”, que constitui o cerne da pretensão dos AA..
A não transferência das responsabilidades em causa para o Novo Banco resulta inequívoca da deliberação do BdP de 11 de Agosto de 2014, através da qual foi rectificado o anexo 2 à deliberação de 3 de Agosto de 2014, ajustando e clarificando o perímetro dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais do BES que se mantiveram na sua esfera jurídica, não tendo sido transferidos para o Novo Banco S.A., antes consideradas expressamente excluídas, “(…) (v) Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais; (vi) Quaisquer responsabilidades ou contingências do BES relativas a acções, instrumentos ou contratos de que resultem créditos subordinados perante o BES; (vii) Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de dívida emitidos por entidades que integram o Grupo Espírito Santo, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados resultantes de estipulações contratuais anteriores a 30 de Junho de 2014, documentalmente comprovadas nos arquivos do BES, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.”.
Posteriormente, em 29 de Dezembro de 2015, o BdP adoptou a denominada Deliberação de Contingências, nos termos da qual “ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para selecionar os ativos e passivos a transferir para o banco de transição, delibera o seguinte:
A) Clarificar que, nos termos da alínea (b) do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto, não foram transferidos do BES para o Novo Banco quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do BES que, às 20:00 horas do dia 3 de agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do BES;
B) Em particular, desde já se clarifica não terem sido transferidos do BES para o Novo Banco os seguintes passivos do BES: (i) Todos os créditos relativos a ações preferenciais emitidas por sociedades-veículo estabelecidas pelo BES e vendidas pelo BES; (ii) Todos os créditos, indemnizações e despesas relacionados com ativos imobiliários que foram transferidos para o Novo Banco; (iii) Todas as indemnizações relacionadas com o incumprimento de contratos (compra e venda de ativos imobiliários e outros), assinados e celebrados antes das 20h00 do dia 3 de agosto de 2014; (…) (vi) Todas as indemnizações e créditos resultantes de anulação de operações realizadas pelo BES enquanto prestador de serviços financeiros e de investimento; e (…)
C) Na medida em que, não obstante as clarificações acima efetuadas, se verifique terem sido efetivamente transferidos para o Novo Banco quaisquer passivos do BES que, nos termos de qualquer daquelas alíneas e da Deliberação de 3 de agosto, devessem ter permanecido na sua esfera jurídica, serão os referidos passivos retransmitidos do Novo Banco para o BES, com efeitos às 20 horas do dia 3 de agosto de 2014”.
A admissibilidade do segmento C) da Deliberação supra decorre do art.º 145º‑Q nº 4 al. c) do RGICSF, aditado pela Lei nº 23-A/2015, de 26/03, nos termos do qual “Após a transferência prevista nos nºs 1 e 2 do artigo 145º-O, o Banco de Portugal pode, a todo o tempo: (…) c) Devolver à instituição de crédito objeto de resolução direitos e obrigações que haviam sido transferidos para a instituição de transição ou devolver a titularidade de ações ou de títulos representativos do capital social da instituição de crédito objeto de resolução aos respetivos titulares no momento da deliberação prevista no n.º 1 do artigo 145.º-P, não podendo a instituição de crédito objeto de resolução ou aqueles titulares opor-se a essa devolução, desde que estejam reunidas as condições previstas no número seguinte”.
Por conseguinte, de acordo com a nova redacção da subalínea (vii), se conclui que não houve transferência para o “Novo Banco, SA” das eventuais responsabilidades do “BES” decorrentes da comercialização e intermediação financeira dos valores mobiliários em causa nesta acção. E se, porventura, alguma responsabilidade relacionada com as pretensões deduzidas nos presentes autos se pudesse ter, por algum meio ou em algum momento, considerada por transmitida para o “Novo Banco, SA”, a mesma sempre seria de considerar retransmitida – com efeitos retroactivos à data da medida de Resolução – para o BES, radicando, sempre, na esfera jurídica desta entidade e não na do banco de transição.

Aqui chegados é inevitável concluir pela improcedência do recurso, mostrando-se prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas nos autos.

III - DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos supra expostos, acorda-se em julgar a apelação improcedente, mantendo-se a sentença de 1ª instância.
Custas a cargo dos Recorrentes.
Notifique.

Lisboa, 10/04/2025
Amélia Puna Loupo
Maria Carlos Calheiros
Teresa Lopes Catrola
___________________________________________________
[1] Cuja numeração aditamos, por uma questão de facilidade expositiva.
[2] https://sol.sapo.pt/2015/02/20/caso-bes-o-ping-pong-do-banco-de-portugal-cmvm-e-novo-banco/