CONTRATO-PROMESSA DE PARTILHA
TORNAS
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
NULIDADE DO CONTRATO
Sumário

A questão da conformidade de uma partilha, consumada ou meramente prometida, com a regra consagrada no n.º 1 do artigo 1730.º do CC, pode ser suscitada:
- Perante os próprios termos do contrato, promessa ou definitivo, de partilha;
- Perante uma alegada desconformidade entre o valor real e o valor declarado dos bens partilhados, geradora de uma desigualdade efectiva de uma partilha formalmente igualitária.

Texto Integral

Processo n.º 6426/19.9T8LSB.E1

Autor/recorrente: (…).

Ré/recorrida: (…).

Pedidos:

a) Que seja declarado que o documento titulado «contrato-promessa de partilha» configura um contrato-promessa de partilha válido, celebrado entre o autor e a ré, sob pena de restituição dos € 15.000,00, a título de tornas, nos termos do enriquecimento sem causa;

b) Que seja declarado que a ré, por factos que lhe são exclusivamente imputados, não cumpriu definitivamente com as obrigações que haviam sido assumidas com o autor, através do «contrato-promessa de partilha»;

c) Que seja declarado que à ré incumbe cumprir tais obrigações e, para os fins prescritos no artigo 830.º, n.º 1, do Código Civil, se profira sentença constitutiva que produza os efeitos da declaração negocial da ré faltosa e que, portanto, decrete a partilha dos bens comuns de modo a ser adjudicada, ao autor, a fracção autónoma descrita no artigo 2.º da petição inicial, comprometendo-se este a liquidar as prestações em dívida à Caixa Geral de Depósitos referentes ao empréstimo contraído para aquisição da aludida fracção.

Sentença recorrida:

Declarou a nulidade do contrato-promessa de partilha celebrado entre o autor e a ré, com todas as consequências legais inerentes a essa declaração, designadamente os efeitos previstos no artigo 289.º, n.º 1, do Código Civil, condenando a ré a restituir ao autor a quantia de € 15.000,00;

Absolveu a ré dos demais pedidos formulados pelo autor.

Conclusões do recurso:

1 – Conforme resulta da própria sentença (recorrida), em sede de motivações e fundamentações jurídicas, o tribunal a quo considerou mal que o diferencial a favor do recorrente de € 4.985,92, face ao passivo global, provisoriamente, calculado em € 193.576,42, é manifestamente desproporcional face à regra da divisão paritária do activo e passivo, o que determinou a nulidade do contrato celebrado.

2 – A sentença em crise atentou que o recorrente ficou beneficiado face à recorrida, não obstante ter dado como provado que «após o decretamento do divórcio, foi o autor (ora recorrente) que passou a habitar na fracção, suportando em exclusivo as despesas a ele inerentes e liquidando a prestação referente ao crédito contraído junto da Caixa Geral de Depósitos para aquisição da mencionada fracção.»

3 – Na fase da celebração do contrato-promessa de partilhas não era possível, aos contraentes aferir com rigor, qual o valor exacto e concreto que o ora recorrente iria despender com a liquidação das prestações (capital + juros) referente ao crédito contraído junto da CGD na aquisição do referido bem imóvel.

4 – Por isso mesmo quiseram celebrar, após ter sido decretado o divórcio, o contrato-promessa, nos exactos termos em que foi celebrado.

5 – Ficando o recorrente com a propriedade do imóvel e com o encargo de liquidar as prestações sobre o crédito habitação (capital + juros).

6 – O n.º 1 do artigo 1730.º do CC prescreve que «os cônjuges participam por metade no activo e no passivo da comunhão, sendo nula qualquer estipulação em sentido contrário.»

7 – Porém, é pacifico tanto na jurisprudência como na doutrina que a regra de metade é um valor ideal, compondo-se a quota de cada cônjuge em bens ou valor equivalente, tal como sucede em qualquer partilha, seja por dissolução do casamento, seja por óbito.

8 – E que a sua violação é uma medida que atribua a um dos cônjuges quotas de bens manifestamente desproporcionais relativamente ao outro cônjuge ou, dito de outra forma, tem-se em vista vedar distribuições manifestamente desigualitárias do património comum.

9 – O divórcio foi decretado a 28.09.2009. O contrato promessa de partilhas só foi celebrado a 15.12.2009, ou seja, após o divórcio, já não existindo um qualquer ascendente de um dos cônjuges sobre o outro.

10 – As partes quiseram estabelecer que, num momento em que já não existia casamento (posterior ao divórcio), já não existindo por isso qualquer comunhão de vida (cfr. artigo 1676.º do CC).

11 – O recorrente prometeu assumir um passivo de € 193.576,42. A recorrida prometeu assumir um passivo de € 77.428,00. A recorrida prometeu adjudicar ao recorrente o bem imóvel, pelo valor (patrimonial) de € 138.760,00. O recorrente prometeu dar a título de tornas € 17.625,66.

12 – As partes não quiseram distribuir desigualitariamente o património comum de ambos. Pelo contrário; atribuíram tornas de forma clara e específica, no valor de € 17.625,66!

13 – Este benefício de € 4.985,92, a favor do recorrente, ficou a dever-se, unicamente ao facto de o recorrente ficar a suportar, exclusivamente todas as obrigações inerentes ao contrato de empréstimo hipotecário a favor do banco CGD, nomeadamente empréstimo com o mútuo (o recorrente já liquidou € 77.546,83, a título de capital, sobre um total contratado de € 197.500,00), seguros de vida dos contraentes, IMI, quotas extraordinárias de condomínio referente ao bem imóvel.

14 – Actualmente, a título meramente exemplificativo, o recorrente liquida de prestação pela habitação, o valor global de € 521,78, a uma taxa de juro efectiva de 3,523%, o que perfaz, a título de capital € 174,71 e a título de juros € 347,07.

15 – O recorrente neste fase da liquidação, não consegue aferir, com exactidão, quanto irá pagar, a título de juros, com a amortização do empréstimo habitação.

16 – Este benefício de € 4.985,92 corresponde apenas a 2,58% de desvio padrão face à regra da metade.

17 – O que não é manifestamente desproporcional é o equilíbrio entre as quotas dos ex-cônjuges, já que o recorrente se comprometeu a assegurar, exclusivamente, o pagamento dos encargos até final do contrato do crédito habitação (passivo), em troca de ½ da propriedade (da recorrida) sobre o bem imóvel (activo).

18 – Neste sentido, a diferença 2,58% de desvio padrão face à regra da metade verificada, não é manifestamente desproporcionada, sendo por isso licita, à luz do preceituado n.º 1 do artigo 1730.º do CC.

19 – Pelo exposto, será de concluir pela validade do documento titulado como «contrato promessa de partilha», face ao artigo 1730.º do CC e seja proferido acórdão constitutivo que produza os efeitos da declaração negocial da ora recorrida faltosa e que, portanto, seja adjudicado ao ora recorrente, a fracção autónoma descrita no artigo 2.º da petição inicial.

Factos julgados provados pelo tribunal a quo:

1 – Autor e ré contraíram casamento em 27.12.2003, sem convenção antenupcial.

2 – Tendo requerido divórcio por mútuo consentimento na Conservatória do Registo Civil de Lisboa, ficou estipulado, entre os diversos acordos, que a casa de morada de família, sita na Rua (…), Lote 1, 1.º C - Amadora, ficava atribuída ao cônjuge marido.

3 – No dia 28 de Setembro de 2009, na 10.ª Conservatória, foi decretado o divórcio.

4 – Na sequência do divórcio, autor e ré celebraram acordo quanto ao recheio da casa (bens móveis comuns a partilhar), através de documento denominado «Acordo de Partilha Extrajudicial de Bens Móveis», datado de 06.12.2009, atribuindo-se aos bens móveis um valor total de € 10.020,00 e sendo adjudicados a cada uma das partes bens no valor de € 5.010,00.

5 – Autor e ré assinaram um documento denominado «Contrato Promessa de Partilhas», datado de 15.12.2009, cujo conteúdo é, além do mais, o seguinte:

«(…)

Cláusula Primeira

Acordam ambos os Contraentes em que o acervo comum do casal é constituído pelos seguintes bens:

1.º – Activo:

Verba Um: Uma habitação composta pela fracção autónoma designada pela Letra "F", correspondente ao 1.º C, com entrada pelo Lote 1, do prédio urbano sujeito ao regime horizontal, sito na Urbanização (…), Rua (…), freguesia de (…), concelho da Amadora, Distrito de Lisboa, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo matricial n.º (…) e descrito na Conservatória do Registo Predial da Amadora, sob o registo n.º (…), com o valor patrimonial actual (CIMI) de 138.760,00 euros (cento e trinta e oito mil e setecentos e sessenta euros), determinado no ano de 2007.

2.º – Passivo:

Verba Um: Devem, pelo contrato relativo à aquisição do bem imóvel descrito na Verba n.º 1 do Activo, a quantia de 192.107,10 euros (cento e noventa e dois mil e cento e sete euros e dez cêntimos).

Verba Dois: Devem, pelo contrato relativo ao empréstimo n.º (…), a quantia de 1.469,32 euros (mil e quatrocentos e sessenta e nove euros e trinta e dois euros).

Verba três: Devem, pelo contrato relativo ao empréstimo n.º (…), a quantia de 21.159,14 euros (vinte e um mil e cento e cinquenta e nove euros e catorze cêntimos).

Verba Quatro: Devem, pelo contrato relativo ao empréstimo n.º (…), a quantia de 18.660,12 euros (dezoito mil e seiscentos e sessenta euros e doze cêntimos).

Verba Cinco: Devem, pelo contrato relativo ao empréstimo n.º (…), a quantia de 37.608,74 euros (trinta e sete mil e seiscentos e oito euros e setenta e quatro cêntimos).

Cláusula Segunda

Pelo presente Contrato a Segunda Contraente, promete adjudicar a favor do Primeiro Contraente, o bem mencionado na Verba Um do Activo, num total de 138.760,00 euros (cento e trinta e oito mil e setecentos e sessenta euros).

Cláusula Terceira

1. Pela presente Promessa, são adjudicadas ao Primeiro Contraente, as Verbas Um e Dois do Passivo, num total de 193,576,42 euros (cento e noventa e três mil e quinhentos e setenta e seis euros e quarenta e dois cêntimos).

2. Pelo presente Promessa, são adjudicadas à Segunda Contraente as verbas Três, Quatro e Cinco do passivo, num total de 77.428,00 euros (setenta e sete mil e quatrocentos e vinte e oito euros).

Cláusula Quarta

1. Para efeitos de preenchimento do quinhão da Segunda Contraente, o Primeiro Contraente promete entregar àquela, a título de tornas, a quantia total de 17.625,66 euros (dezassete mil e seiscentos e vinte e cinco euros e sessenta e seis cêntimos).

2. Com a celebração da presente Promessa, é entregue a quantia de 15.000,00 euros (quinze mil euros);

3. Os remanescentes 2.625,66 euros (dois mil e seiscentos e vinte e cinco euros e sessenta e seis cêntimos) serão entregues no acto de celebração do Contrato Definitivo de Partilhas, deduzindo-se todas as despesas suportadas, pelo Primeiro Contraente com a celebração do referido Contrato.

Cláusula Quinta

1. A Segunda Contraente compromete-se a celebrar o respectivo Contrato Definitivo de Partilhas, na data e local proposto pelo Primeiro Contraente.

2. As despesas com a celebração do referido Contrato Definitivo no número anterior, serão suportadas por ambos os contraentes, em partes iguais.

Cláusula Sexta

1. Pela presente Promessa ambos os Contraentes dão completa quitação da sua meação nos bens comuns, nada mais havendo a tornar ou partilhar.

2. Em caso de incumprimento acordam os Contraentes na possibilidade da Execução Específica do Contrato Promessa de Partilhas.

3. Nos termos e para os efeitos previstos na parte final do n.º 3 do artigo 410.º do Código Civil, as partes prescindem do reconhecimento presencial das suas assinaturas.

(…)».

6 – Com a celebração do acordo referido em 5, o autor entregou 15.000 euros (quinze mil euros) à ré, a título de tornas.

7 – Após o decretamento do divórcio, foi o autor que passou a habitar na fracção autónoma referida em 5, suportando em exclusivo as despesas a ele inerentes e liquidando a prestação referente ao crédito contraído junto da Caixa Geral de Depósitos para aquisição da mencionada fracção.

8 – Sendo que as partes acordaram que o autor pagaria as prestações do empréstimo contraído junto da Caixa Geral de Depósitos e a ré as prestações do empréstimo contraído junto do Banco (…), para pagamento do preço de aquisição da fração “V” sito na Rua (…), n.º 17, (…), 2745-327 – Queluz, inscrito na matriz sob o artigo (…), da União de Freguesias de (…) e (…), relativamente à qual a ré consta na Autoridade Tributária como sendo a única titular da propriedade plena.

9 – O autor marcou a escritura pública de partilha para o dia 11 de Junho de 2018.

10 – Ao que a ré respondeu que não assinava a escritura sem a sua desoneração em simultâneo perante a Caixa Geral de Depósitos.

11 – Por email de 15.02.2019, a ré apresentou propostas alternativas para efectivação da partilha, sendo a primeira a venda do imóvel e a segunda ser a ré a assumir a totalidade do empréstimo junto da CGD, sendo-lhe o imóvel adjudicado, mediante o pagamento ao autor da quantia de € 22.000,00, como contrapartida do capital entretanto abatido pelo autor ao empréstimo através dos pagamentos feitos desde 2009.

Factos julgados não provados pelo tribunal a quo:

1 – A transferência pelo autor de € 15.000 em Dezembro de 2009, a favor da ré, destinou-se a acertar contas relativamente ao escritório de advocacia que ambos detinham.

2 – A ré recusou-se a partilhar o património comum nos termos acordados.

3 – A desoneração da ré do empréstimo não era possível por não aceitação da CGD.

4 – O autor não respondeu a nenhuma das soluções apresentadas e propostas pela ré no email de 15.02.2019.


*


Está em causa a validade do contrato-promessa de partilha cuja execução específica o recorrente pretende.

O tribunal a quo declarou a nulidade deste contrato, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 1730.º do CC, que estabelece que os cônjuges participam por metade no activo e no passivo da comunhão, sendo nula qualquer estipulação em sentido diverso.

O recorrente sustenta que tal violação não ocorre, porquanto:

a) É pacífico, na jurisprudência e na doutrina, que a violação da regra da metade apenas se verifica quando a partilha é feita em termos manifestamente desproporcionais, ou seja, se se proceder a uma distribuição manifestamente desigualitária do património comum;

b) O diferencial que se verifica a favor do recorrente, no valor de € 4.985,92, não é manifestamente desproporcional, como, no seu entendimento, se considerou na sentença recorrida, porquanto corresponde a apenas a 2,58% de desvio face à regra da metade;

c) Esse diferencial ficou a dever-se, unicamente, ao facto de o recorrente ficar a suportar, sozinho, todas as obrigações inerentes ao contrato de empréstimo hipotecário, aos seguros de vida, ao IMI e às quotas extraordinárias do condomínio;

d) Nesta fase, o recorrente não consegue aferir, com exactidão, quanto irá pagar, a título de juros, com a amortização do empréstimo habitação.

O recorrente não tem razão, pelas razões que passamos a expor.

1. Ao afirmar o que sintetizámos na al. a), o recorrente está a confundir questões que, na realidade, são distintas.

A questão da conformidade de uma partilha, consumada ou meramente prometida, com a regra consagrada no n.º 1 do artigo 1730.º do CC, pode ser suscitada:

- Perante os próprios termos do contrato, promessa ou definitivo, de partilha;

- Perante uma alegada desconformidade entre o valor real e o valor declarado dos bens partilhados, geradora de uma desigualdade efectiva de uma partilha formalmente igualitária.

Na primeira hipótese, a violação da regra da metade resulta dos termos do próprio contrato.

Na segunda hipótese, essa violação não resulta dos termos do contrato, seja por falta de elementos[1], seja porque, neste, foram atribuídos, aos bens partilhados, valores desconformes com a realidade, sobrevalorizando aqueles que couberam ao outorgante prejudicado e/ou subvalorizando aqueles que couberam ao outorgante beneficiado.

Apenas na segunda hipótese, em que a formulação de um juízo sobre a conformidade de uma partilha ou de uma promessa de partilha com a regra da metade requer a realização de uma avaliação a posteriori dos bens partilhados, ainda que reportada (como não poderia deixar de ser) ao momento da celebração do contrato, poderá fazer sentido convocar o critério referido pelo recorrente. Ou seja, só nessa hipótese alguma jurisprudência[2] e alguma doutrina fazem apelo à ideia de «manifesta desproporção da partilha», para concluírem que, por estar em causa a formulação de um juízo assente numa reavaliação dos bens feita a posteriori, é exigível que aquela «manifesta desproporção» se verifique para que possa concluir-se no sentido da violação da regra consagrada no n.º 1 do artigo 1730.º do CC.

Na primeira hipótese, não faz sentido a convocação do critério da «manifesta desproporção». Se, logo em face dos termos do contrato de partilha ou de promessa de partilha, se verifica que um dos outorgantes, atento o valor do activo e do passivo que recebe, sai beneficiado relativamente ao outro, é de concluir, sem mais, que se verifica uma violação da regra consagrada no n.º 1 do artigo 1730.º do CC. Esta norma legal, da mesma forma que veda a estipulação, por exemplo, de uma participação de 51% para um dos cônjuges e de 49% para o outro cônjuge no património comum, também veda a estipulação, àquela materialmente equivalente, de uma partilha que tenha por consequência um dos ex-cônjuges receber bens de valor assumidamente superior àqueles que o outro recebe, ainda que esta diferença não seja qualificável como uma «manifesta desproporção».

2. Não é verdade que o tribunal a quo tenha considerado que o diferencial que se verifica a favor do recorrente em prejuízo da recorrida se tenha traduzido numa partilha manifestamente desproporcional entre estes. Esta afirmação do recorrente é desmentida pela leitura da sentença recorrida. Aquilo que o tribunal a quo fez foi considerar o contrato-promessa de partilha nulo em consequência da mera verificação da existência daquele diferencial, sem entrar na análise da questão da sua qualificação como manifestamente desproporcional, certamente por a considerar irrelevante para a decisão do caso, como efectivamente o era.

Perante a verificação, que o recorrente não põe em causa, de uma diferença de € 4.985,92 a seu favor, não oferece dúvida, em face daquilo que referimos, que o contrato-promessa de partilha por ele celebrado com a recorrida é nulo, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 1730.º do CC.

3. Os argumentos que acima sintetizámos nas alíneas c) e d) não são procedem.

A afirmação de que o diferencial de € 4.985,92 a favor do recorrente ficou a dever-se ao facto de este ficar a suportar, sozinho, todas as obrigações inerentes ao contrato de empréstimo hipotecário, aos seguros de vida, ao IMI e às quotas extraordinárias do condomínio, é puramente gratuita, não encontrando sustentação em qualquer meio de prova, nomeadamente nos termos do contrato-promessa de partilha.

Acresce que em caso algum este facto justificaria aquele diferencial, por forma a permitir concluir que a regra da metade teria sido respeitada. O próprio recorrente não explicita como se poderia chegar a tal conclusão.

Note-se, por último, que o contrato-promessa de partilha também atribui, à recorrida, dívidas comuns em relação às quais não se mostra possível aferir, com exactidão, quanto ela iria pagar até ao final de cada um dos planos de amortização.

Nada do que acabámos de referir interessa para a aferição da conformidade do contrato-promessa de partilha com o disposto no n.º 1 do artigo 1730.º do CC. Interessa, sim, o valor do activo e do passivo da comunhão à data da celebração do contrato-promessa de partilha, que não pode deixar de ser dividido igualitariamente.

4. Concluindo, o tribunal a quo decidiu correctamente ao declarar a nulidade do contrato-promessa de partilha celebrado entre o recorrente e a recorrida e ao julgar a acção parcialmente improcedente nos termos em que o fez. Pelo que o recurso terá de ser julgado improcedente.


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Dispositivo:

Delibera-se, pelo exposto, julgar o recurso improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas a cargo do recorrente.

Notifique.


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27.03.2025

Vítor Sequinho dos Santos (relator)

Mário João Canelas Brás (1.º adjunto)

Mário Branco Coelho (2.º adjunto)

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[1] O acórdão do STJ de 05.03.2013 (João Bernardo) versou sobre uma situação desta natureza.

[2] Entre a qual o acórdão desta Relação de 12.03.2020, proferido no processo n.º 322/13.0TVLSB.E1, cujo relator é o mesmo do presente acórdão. Saliente-se, a propósito, que este acórdão foi revogado pelo do STJ de 02.02.2022 (Pedro de Lima Gonçalves), no qual, mesmo numa hipótese com a configuração que acima enunciámos em segundo lugar, foi dispensado o requisito da «manifesta desproporção» para concluir pela nulidade da partilha.