PERSI
COMUNICAÇÃO
REQUISITOS
Sumário

I. O PERSI não é um mecanismo meramente formal passível de findar passivamente ao fim de decorrido um determinado período temporal ao jeito de uma espécie de moratória concedida ao cliente bancário devedor.
II. Existe a obrigatoriedade de concretizar os motivos, ou razões, reveladores da inviabilidade de manutenção do PERSI e que é aplicável quer aos fundamentos de extinção ditos “automáticos”, quer aos restantes fundamentos, uns e outros prevenidos, respectivamente, nos n.ºs 1 e 2 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012.

Texto Integral

Apelação n.º 69/24.2T8ENT.E1

Tribunal Judicial da Comarca de Santarém–Juízo de Execução do ... – Juiz 3


Apelante: Novo Banco, S.A.


Apelados: AA


BB


***


Acordam em conferência os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora no seguinte:


1-No presente recurso de apelação foi proferida, no dia 12/12/2024, pelo relator, decisão singular, ao abrigo do disposto no artigo 652º, n.º 1, b), do CPC, com o teor que de seguida se transcreve:


“I – RELATÓRIO


Por requerimento datado de 09-01-2024 o Novo Banco, S.A. instaurou a presente execução para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo ordinário, contra AA e BB, oferecendo como título executivo uma livrança subscrita pelos identificados Executados.


Por despacho proferido no Tribunal a quo em 29/04/2024 determinou-se o seguinte:


“Antes de mais, importa esclarecer qual a concreta natureza do crédito que esteve na base da emissão da livrança dada à execução tendo em vista aferir se, sendo caso disso, foi dado cumprimento ao Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) estipulado no Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10.


De facto, e na esteira do que tem sido pacificamente entendido ao nível jurisprudencial, sendo o PERSI obrigatório, o seu cumprimento consubstancia uma condição objetiva de procedibilidade para a execução, impondo-se, por conseguinte, perante o seu eventual desrespeito, a absolvição do executado da instância por procedência de excepção dilatória inominada insanável, de conhecimento oficioso - artigo 573.º, n.º 2, e 578.º, do Código de Processo Civil.


Destarte, e sob ponderação do disposto no artigo 726.º, n.º 4, do mesmo diploma, convido o exequente a alegar e demonstrar, no prazo de 10 (dez) dias, o que tiver por conveniente a propósito da questão ora suscitada.


[…]”


A Exequente veio responder em 23/05/2024 invocando concretamente que:


“1 – Serve de base à presente execução, uma livrança vencida aos 29.12.2023, em caução do contrato “Crédito ao Consumo Novobanco” celebrado entre os Executados e o aqui Exequente aos 01.06.2021 no valor de € 21.222,41 (vinte e um mil duzentos e vinte e dois euros e quarenta e um cêntimos) – cfr. Doc. 1.


2 – E, por isso, abrangido pelo Processo Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento, previsto no Decreto-Lei n.º 227/2012 de 25/10.


3 – Pelo que, verificado o incumprimento, por meio de cartas datadas de 07.09.2021, o Exequente comunicou a ambos os mutuários, aqui co-Executados, da consequente integração em PERSI do supra referido contrato de crédito, com vista ao encontro de uma solução adequada ao cumprimento, na hipótese de impossibilidade de pagamento imediato, devendo, para tanto, no fixado prazo, procederem a remessa da aí identificada documentação, cfr. Docs. 2 e 3, que ora se juntam e se dão integralmente por reproduzidos para os devidos efeitos legais.


4 – Não tendo sido possível o acordo, no prazo fixado, por carta datada de 07.12.2021, o Exequente comunicou aos Executados, a extinção do procedimento, cfr. Docs. 4 e 5.


[…]”


As cartas enviadas em 07/12/2021 aos Executados a comunicar a extinção do PERSI tinham, para o que ora releva, o seguinte teor:


Caro Cliente.


O NOVO BANCO, S.A., vem por este meio informá-lo que procedeu nesta data à extinção do procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento “PERSI” no qual foi integrado em 2021/09/08


O PERSI foi extinto por terem decorrido mais de 90 dias desde a integração em processo de PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo.”


Em 12/06/2024 o Tribunal a quo proferiu despacho com o seguinte conteúdo:


“Analisados os teores dos documentos juntos pelo exequente através da ref.ª 10687121 de 23-05-2024, faculto-lhe um prazo de 10 (dez) dias para exercer, querendo, o respectivo contraditório acerca da eventual adopção do entendimento de acordo com o qual as cartas de comunicação de extinção do PERSI datadas de 07-12-2021 não são susceptíveis de traduzir o cabal cumprimento do disposto no artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, por não indicarem qualquer base normativa da extinção nem, de forma conveniente, os factos concretos, materiais e objectivos que terão presidido à consideração da inviabilidade da manutenção dos procedimentos.”


Em 25/07/2024 a Exequente respondeu invocando além do mais que:


“notificado do douto despacho de 12/06/2024,


VEM,


1- Dizer que, das cartas juntas sob os docs. 4 e 5 ao requerimento do Exequente de 23/05/2024, resulta, ao invés, o cumprimento do disposto no artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do DL n.º 227/2012, de 25/10, designadamente por indicação dos factos concretos, materiais e objectivos que presidiram à consideração da inviabilidade da manutenção do procedimento; cfr. o seguinte excerto que se transcreve:


“(…)


O PERSI foi extinto por terem decorrido mais de 90 dias desde a integração em processo de PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo”.


[…]


21- Em conclusão, demonstrado está que as cartas de comunicação de extinção do PERSI datadas de 07/12/2021 são susceptíveis de traduzir o cabal cumprimento do disposto no artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10.”


Seguiu-se o proferimento em 26/09/2024 de decisão final que culminou com o seguinte dispositivo:

“Face ao exposto, declara-se evidenciada a excepção dilatória inominada por falta de cumprimento do PERSI relativamente aos executados, e, subsequentemente, absolve-se os mesmos da instância, determinando a extinção da execução com o consequente levantamento, após trânsito, de quaisquer penhoras realizadas no processo de execução (artigo 732.º, n.º 4, do Código de Processo Civil).

Custas pelo exequente.”

*

Inconformada com a decisão final a Exequente interpôs recurso para este Tribunal da Relação de Évora alinhando no final as seguintes conclusões:

“I- Vem o presente recurso interposto da douta sentença de 26/09/2024 de fls. (…) que decidiu declarar“evidenciada a excepção dilatória inominada por falta de cumprimento do PERSI relativamente aos executados, e, subsequentemente, absolve-se os mesmos da instância, determinando a extinção da execução com o consequente levantamento, após trânsito, de quaisquer penhoras realizadas no processo de execução (artigo 732.º, n.º 4, do Código de Processo Civil).”, por incumprimento dos requisitos atinentes à extinção o PERSI.

II- Afirma o tribunal “a quo” que a Relação de Évora já assumiu a posição de que a indicação apurada - comunicação da extinção do PERSI, a ambos os executados, por terem decorrido mais de 90 dias desde a integração no PERSI - não é suficiente para se considerar cumprido o PERSI, citando, para tanto, os acórdãos de 25/11/2021 (Processo n.º 17026/20.0T8PRT.E1) e de 24/11/2022 (Processo n.º 824/22.8T8ENT.E1).

III- Com o que Recorrente não se conforma.

IV- O citado Tribunal da Relação de Évora já decidiu (e decide) em sentido diverso.

V- Veja-se o acórdão de 09/02/2023, da mesma Relação de Évora, no proc. n.º 3358/20.1T8ENT.E1, Relatora: Maria João Faro, nos termos do qual basta a menção ao decurso de tal prazo após a data da integração do cliente bancário neste procedimento.

VI- Neste sentido também o acórdão de 26/05/2022, da mesma Relação de Évora, no proc. 18/22.2T8ENT.E1, Relator: Mário Coelho.

VII- No nosso caso concreto, houve, inclusivamente, cartas anteriores – de integração no PERSI - onde os executados foram expressamente informados que o PERSI se extinguia no 91.º dia após o seu início; cfr. docs. 2 e 3 juntos ao requerimento do Exequente de 23/05/2024, pág. 2, na rubrica intitulada «extinção do PERSI», onde se lê: «O PERSI extingue.se no 91.º ia após o seu início, se não for prorrogado por acordo entre as partes, ou com a declaração e insolvência do cliente bancário. (…).»

VIII- Ora, como resulta do citado artigo 17º um dos motivos para que o PERSI se extinga é simplesmente o decurso do prazo de 91 dias desde a data da integração do PERSI.

IX- Nada mais é aqui exigido para que a extinção deste Procedimento ocorra, isto é, basta que tenham decorridos 91 dias desde a data da integração do cliente bancário em PERSI para que o procedimento se extinga, salvo se as partes acordarem por escrito a respetiva prorrogação, o que aqui não sucedeu.

X- Das cartas enviadas é bem explícito que o motivo da extinção do PERSI é o decurso do prazo legal exigido desde a data da integração dos executados em PERSI.

XI- Isso resulta de imediato da leitura do segundo parágrafo das referidas cartas, no qual se lê “O PERSI foi extinto por terem ocorrido mais de 90 dias desde a integração em processo de PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo.”

XII- Ou seja, o PERSI está extinto pois ultrapassou os 90 dias em que o cliente obrigatoriamente tem de estar integrado neste procedimento.

XIII- Com este fundamento de extinção do PERSI, que é simplesmente o decurso do prazo legal, não existem quaisquer outros factos que determinem a sua extinção ou que justifiquem a decisão da instituição de crédito de pôr termo ao referido procedimento que tivessem de ser explicados.

XIV- É este o fundamento legal indicado nas cartas e que culmina com a extinção do referido Procedimento, não existindo quaisquer outros factos que tenham determinado esta extinção e que assim tivessem de ser explicados nas referidas cartas aos executados.

XV- Trata-se, até, de uma forma de extinção automática do procedimento.

XVI- Como, aliás, o afirma jurisprudência de outras Relações, como a Relação do Porto, no acórdão de 19/11/2020, no proc. 978/19.0T8AGD-A.P1, o acórdão da Relação de Coimbra de 19/06/2018, no proc. n.º 29358/16.8YIPRT e acórdão da Relação de Lisboa de 07/05/2020, no proc. 2282/15.4T8ALM-A.L1-6.

XVII- Isto posto, a decisão do tribunal “a quo” de considerar que estamos perante uma excepção dilatória inominada insanável é com o devido respeito excessiva e desproporcional.

XVIII- Tanto mais que, além das indicadas cartas anteriores, foram ainda enviadas cartas posteriores onde o Exequente voltou a insistir junto dos Executados no sentido da regularização, extrajudicial, da divida; cfr. docs. 6 a 9 juntos ao requerimento o Exequente de 23/05/2024.

XIX- Após o que, viriam as partes a acordar com o Executado AA, na regularização do atrasado, numa única prestação, conforme carta datada de 07.02.2022; cfr. o doc. 10 identicamente ali junto.

XX- Todavia, incumprido.

XXI- Decorrido um ano, foi, no entanto, alcançado novo acordo entre o Exequente e o mesmo Executado AA, para regularização do atrasado, em 12 prestações, com início em 08.03.2023, cfr. doc. 11 também ali junto.

XXII- Mais uma vez, totalmente incumprido.

XXIII- Donde que, por cartas datadas de 05.12.2023, o Exequente comunicou a ambos os Executados a denúncia do contrato de crédito ao consumo, e o consequente preenchimento das livranças de caução, a pagamento até 29.12.2023; cfr. docs. 12 e 13 ali juntos.

XXIV- Nessa conformidade, atenta a prova documental produzida é forçoso concluir que a Exequente cumpriu o postulado no Decreto-Lei n.º 227/2012.

XXV- Ao assim não decidir, o tribunal a quo violou o disposto no art.º 17.º, n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei n.º 227/2012.

NESTES TERMOS,

Deve ser o presente recurso ser considerado procedente e, em consequência ser a douta sentença de extinção da instância revogada e substituída por outra que ordene o prosseguimento dos autos de execução até efectivo e integral pagamento da quantia exequenda.

Só assim se decidindo, será

CUMPRIDO O DIREITO E FEITA A COSTUMADA JUSTIÇA!”

*


Não foi apresentada resposta ao recurso.


*


O recurso é o próprio e foi correctamente admitido quanto ao modo de subida e efeito fixado, impondo-se apenas fazer alusão à norma aplicável constante do n.º 3 do artigo 853.º do CPC


*


Atendendo à simplicidade da questão a decidir no âmbito do presente recurso e manifesta improcedência do mesmo proferir-se-á de seguida decisão sumária, ao abrigo do disposto nos artigos 652º, nº 1, c) e 656º, do Código de Processo Civil.


*


II – QUESTÕES OBJECTO DO RECURSO


Nos termos do disposto no artigo 635º, nº 4, conjugado com o artigo 639º, nº1, ambos do Código de Processo Civil (doravante apenas CPC), o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recurso, salvo no que concerne à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas pertinentes ao caso concreto e quando se trate de matérias de conhecimento oficioso que possam ser decididas com base em elementos constantes do processo, pelo que no caso concreto impõe-se reapreciar do mérito da decisão impugnada proferida pelo Tribunal a quo, mormente de eventual (in)cumprimento da comunicação da extinção do PERSI onde os Apelados foram integrados pela Apelante.


*


III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO


A matéria factual relevante para o proferimento desta decisão singular consta descrita supra no segmento do “Relatório”.


*


IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO


Entrando na análise da questão objecto do recurso percebemos que a Apelante entende que cumpriu devidamente perante os Apelados o dever de comunicação da extinção do PERSI.


Mas não lhe assiste razão, conforme passaremos a revelar.


Assume aqui particular relevo o disposto nos artigos 13º, 14º e, especialmente, 17º e 18.ºdo Decreto-Lei nº 227/2012 de 25/10:


Vejamos o que estatuem:


“Artigo 13º


Contactos preliminares


No prazo máximo de 15 dias após o vencimento da obrigação em mora, a instituição de crédito informa o cliente bancário do atraso no cumprimento e dos montantes em dívida e, bem assim, desenvolve diligências no sentido de apurar as razões subjacentes ao incumprimento registado


Artigo 14º


Fase inicial


1 - Mantendo-se o incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito, o cliente bancário é obrigatoriamente integrado no PERSI entre o 31.º dia e o 60.º dia subsequentes à data de vencimento da obrigação em causa.


2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a instituição de crédito está obrigada a iniciar o PERSI sempre que:


a) O cliente bancário se encontre em mora relativamente ao cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito e solicite, através de comunicação em suporte duradouro, a sua integração no PERSI, considerando-se, para todos os efeitos, que essa integração ocorre na data em que a instituição de crédito recebe a referida comunicação;


b) O cliente bancário, que alertou para o risco de incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito, entre em mora, devendo, para todos os efeitos, considerar-se que a integração desse cliente no PERSI ocorre na data do referido incumprimento.


3 - Quando, na pendência do PERSI, o cliente bancário entre em mora relativamente ao cumprimento de obrigações decorrentes de outros contratos de crédito celebrados com a mesma instituição, a instituição de crédito deve procurar obter a regularização do incumprimento no âmbito de um único procedimento, informando o cliente bancário desse facto nos termos previstos no número seguinte.


4 – No prazo máximo de cinco dias após a ocorrência dos eventos previstos no presente artigo, a instituição de crédito deve informar o cliente bancário da sua integração no PERSI, através de comunicação em suporte duradouro.


5 - O Banco de Portugal define, mediante aviso, os elementos informativos que devem acompanhar a comunicação prevista no número anterior.”


Por seu turno, estatui o artigo 17.º o seguinte:


“Artigo 17º


Extinção do PERSI


1 - O PERSI extingue-se:


a) Com o pagamento integral dos montantes em mora ou com a extinção, por qualquer outra causa legalmente prevista, da obrigação em causa;


b) Com a obtenção de um acordo entre as partes com vista à regularização integral da situação de incumprimento;


c) No 91.º dia subsequente à data de integração do cliente bancário neste procedimento, salvo se as partes acordarem, por escrito, na respetiva prorrogação; ou,


d) Com a declaração de insolvência do cliente bancário. (negrito nosso).


2 - A instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que:


a) Seja realizada penhora ou decretado arresto a favor de terceiros sobre bens do devedor;


b) Seja proferido despacho de nomeação de administrador judicial provisório, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas;


c) A instituição de crédito conclua, em resultado da avaliação desenvolvida nos termos do artigo 15.º, que o cliente bancário não dispõe de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, designadamente pela existência de ações executivas ou processos de execução fiscal instaurados contra o cliente bancário que afetem comprovada e significativamente a sua capacidade financeira e tornem inexigível a manutenção do PERSI;


d) O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem, bem como na resposta atempada às propostas que lhe sejam apresentadas, nos termos definidos no artigo anterior;


e) O cliente bancário pratique atos suscetíveis de pôr em causa os direitos ou as garantias da instituição de crédito;


f) O cliente bancário recuse a proposta apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo anterior; ou


g) A instituição de crédito recuse as alterações sugeridas pelo cliente bancário a proposta anteriormente apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior.


3 - A instituição de crédito informa o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento. (negrito nosso)


4 - A extinção do PERSI só produz efeitos após a comunicação referida no número anterior, salvo quando o fundamento de extinção for o previsto na alínea b) do n.º 1. (negrito nosso)


5 - O Banco de Portugal define, mediante aviso, os elementos informativos que devem acompanhar a comunicação prevista no n.º 3.” (negrito nosso).


Ora, o Banco de Portugal em cumprimento do disposto no mencionado n.º 5 acabado de transcrever emitiu o aviso n.º 17/2012 (publicado no DR, 2.ª série, Parte E, n.º 243, de 17/12/2012), onde fez constar no respectivo artigo 8.º, epigrafado “Comunicação de extinção do PERSI”, o seguinte:


“A comunicação pela qual a instituição de crédito informa o cliente bancário da extinção do PERSI deve conter, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, as seguintes informações:


a)Descrição dos factos que determinam a extinção do PERSI ou que justificam a decisão da instituição de crédito de por termo ao referido procedimento, com indicação do respectivo fundamento legal;


[…]” (negritos nossos).


Já o artigo 18º, sempre do Decreto-Lei a que vimos fazendo referência, estipula que:


“Artigo 18º


Garantias do cliente bancário


1-No período compreendido entre a data de integração do cliente bancário no PERSI e a extinção deste procedimento a instituição de crédito está impedida de: (negrito nosso)


a)Resolver o contrato de crédito com fundamento em incumprimento;


b) Intentar ações judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito;(negrito nosso)


c) Ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito, ou


d) Transmitir a terceiro a sua posição contratual.


[…]”


Retornando ao caso concreto percebemos, perante as circunstâncias factuais fornecidas pelos presentes autos, que a Apelante comunicou aos Apelados a extinção do PERSI limitando-se a referir como fundamento o seguinte:


O PERSI foi extinto por terem decorrido mais de 90 dias desde a integração em processo de PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo.”


Ora se é verdade que o decurso de tal período de tempo constitui fundamento de extinção do PERSI não é menos verdade que decorre dos n.ºs 3 e 5 do supra transcrito artigo 17.º, do Decreto-Lei nº 227/2012 de 25/10, em devida conjugação com o determinado pelo Banco de Portugal no aviso 17/2012, o dever da instituição de crédito na comunicação de extinção enviada ao cliente bancário descrever, ou especificar, através de factos concretos, as precisas razões pelas quais e por referência ao período de tempo decorrido e indicado entende revelar-se inviável a manutenção do PERSI.


Com efeito, afigura-se-nos indubitável que a obrigatoriedade de concretizar os motivos, ou razões, reveladores da inviabilidade de manutenção do PERSI é aplicável quer aos fundamentos de extinção ditos “automáticos”, quer aos restantes fundamentos, uns e outros prevenidos, respectivamente, nos n.ºs 1 e 2 do aludido artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012 de 25/10.


Na verdade, se atentarmos devidamente na redacção acolhida pelo n.º 3 do mencionado artigo 17.º facilmente nos apercebemos que a mesma refere “fundamento legal”, sem curar distinguir entre causas de extinção do n.º 1 e n.º 2 do dito normativo, razão pela qual deveremos considerar aplicável o dever de discriminar as razões concretas ilustradoras de inviabilidade de manutenção do PERSI quer aos fundamentos de extinção previstos no n.º 1 quer do n. 2.


Além disso impõe-se reconhecer, em face do elenco de razões descritas no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 227/2012 de 25/10, que ao criar o instrumento jurídico consubstanciado no PERSI o legislador não pretendeu seguramente que o mesmo funcionasse como um mecanismo meramente formal passível de findar passivamente ao fim de decorrido um determinado período temporal ao jeito de uma espécie de moratória concedida ao cliente bancário devedor, essa sim independente do dever de descrição de razões concretas ilustrativas da inviabilidade de manutenção do procedimento extrajudicial em que se consubstancia o PERSI.


No caso vertente, a Apelante indicou o fundamento legal (terem decorrido mais de noventa dias desde a integração em PERSI sem a obtenção de um acordo), pese embora não tenha mencionado a norma legal que prevê expressamente esse fundamento, mas não logrou referir as concretas razões da inviabilidade da manutenção do procedimento.
Dito de outro modo, o que a Apelante comunicou aos ora Apelados foi que continuavam em incumprimento decorrido o prazo do PERSI e que por isso considerava-o extinto, ficando-se sem saber quais as concretas razões para a falta de viabilidade da regularização da dívida visada com o PERSI, designadamente se foi devido a inação da entidade bancária, a falta de colaboração dos devedores, a total incapacidade financeira dos mesmos para regularizarem a dívida, a outras razões.


No sentido que abraçamos nesta decisão sumária, que julgamos corresponder actualmente à corrente jurisprudencial maioritária sobre a questão, já se pronunciaram anteriormente vários arestos, (alguns deles mais recentes que os salientados em sentido oposto proferidos por esta Relação e mencionados pela Apelante no presente recurso), de que destacamos os acórdãos proferidos neste Tribunal da Relação de Évora, 1ª Secção, de 25/11/2021 (Proc.º n.º 17026/20.0T8PRT.E1), 07/04/2022 (Proc.º 451/21.7T8ENT.E1), 12/07/2023 (Proc.º n.º 2723/22.5T8ENT.E1, em que fomos adjunto), 12/09/2024 (Proc.º n.º 1160/16.4T8ENT.E1, em que fomos igualmente adjunto), todos acessíveis para consulta in www.dgsi.pt., assim como as, também, recentes decisões singulares proferidas em 22/05/2023, no processo n.º1605/20.9T8ENT.E1 e em 13/12/2023, no processo n.º 1680/22.1T8ENT-A.E1, ambas devidamente transitadas em julgado, respectivamente em 05/06/2023 e 10/01/2024.


Por seguirem a mesma linha de raciocínio e tratarem-se igualmente de arestos recentes, também disponíveis para consulta in www.dgsi.pt, cumpre ainda acrescentar, o acórdão do STJ de 16/12/2020 (Proc.º n.º 2282/15.4T8ALM-A.L1), bem como o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 13/10/2020 (Proc.º n.º 15367/17.3T8SNT-A.L1).


Por fim e rebatendo o que foi referido pela Apelante no final das suas conclusões recursivas (cfr. pontos XVIII a XXII), resta acrescentar que os procedimentos que possam ter sido seguidos subsequentemente ao envio em 07/12/2021 das cartas de extinção do PERSI por parte da Apelante aos Apelados não constitui forma de solucionar e/ou legitimar a patologia diagnosticada em sede de comunicação da extinção do PERSI acima apreciada, por, desde logo, estar em causa a inobservância de normas com carácter imperativo.


Do exposto resulta a ineficácia da comunicação de extinção do PERSI feita pela ora Apelante aos ora Apelados através das cartas enviadas aos mesmos em 07/12/2021, o que conduz à verificação de uma excepção dilatória inominada que tem como consequência jurídico-processual a absolvição dos Apelados da instância e consequente extinção da presente acção executiva, nos termos decididos pelo Tribunal a quo na sentença recorrida.


Destarte, improcedem as conclusões recursivas não sendo a decisão recorrida merecedora de censura, devendo, como tal, manter-se.


*


V - DECISÃO


Pelo exposto, nega-se provimento ao presente recurso de Apelação apresentado por Novo Banco, S.A. e, em consequência, decide-se:


a) Confirmar a sentença recorrida;


b) Condenar em custas a Apelante, atendendo ao disposto no artigo 527º, nº 1- e 2- do CPC.


*


DN.”


*


2-Notificada da decisão acima reproduzida a Apelante Novo Banco, S.A. veio apresentar em 26/12/2024 peça processual de reclamação para a conferência descriminando no final as seguintes conclusões.


“CONCLUSÕES:


A. O ora Reclamante, inconformado com a decisão sumária, vem requerer a intervenção do colectivo de juízes, pedindo que seja revogada a decisão singular e substituída por outra que ordene o prosseguimento dos autos de execução até efectivo e integral pagamento da quantia exequenda.


B. Com efeito, a douta Decisão Singular afirma que, a extinção do PERSI com o fundamento legal de terem decorrido 91 dia subsequentes à data da integração do cliente bancário nesse procedimento, não exime a entidade bancária de lhe comunicar, para além daquele fundamento legal, as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento, sob pena de ineficácia da comunicação da extinção do PERSI.


C. O argumento essencial reside na interpretação dos n.ºs 3 e 4 do art.º 17.º, entendendo-se que não basta a comunicação do fundamento legal para a extinção do PERSI, sendo exigível a comunicação das razões pelas quais se considera inviável a manutenção do procedimento.


D. Ora, o Tribunal da Relação de Évora já decidiu (e decide) em sentido diverso.


E. Veja-se o acórdão de 09/02/2023, da mesma Relação de Évora, no proc. n.º3358/20.1T8ENT.E1, Relatora: Maria João Faro, nos termos do qual basta a menção ao decurso de tal prazo após a data da integração do cliente bancário neste procedimento.


F. Neste sentido também o acórdão de 26/05/2022, da mesma Relação de Évora, no proc. 18/22.2T8ENT.E1, Relator: Mário Coelho.


G. No nosso caso concreto, houve, inclusivamente, cartas anteriores – de integração no PERSI - onde os executados foram expressamente informados que o PERSI se extinguia no 91.º dia após o seu início; cfr. docs. 2 e 3 juntos ao requerimento do Exequente de 23/05/2024, pág. 2, na rubrica intitulada «extinção do PERSI», onde se lê: «O PERSI extingue.se no 91.º ia após o seu início, se não for prorrogado por acoro entre as partes, ou com a declaração e insolvência o cliente bancário. (…).»


H. Como resulta do citado artigo 17º um dos motivos para que o PERSI se extinga é simplesmente o decurso do prazo de 91 dias desde a data da integração do PERSI


I. Nada mais é aqui exigido para que a extinção deste Procedimento ocorra, isto é, basta que tenham decorridos 91 dias desde a data da integração do cliente bancário em PERSI para que o procedimento se extinga, salvo se as partes acordarem por escrito a respetiva prorrogação, o que aqui não sucedeu.


J. Das cartas enviadas é bem explícito que o motivo da extinção do PERSI é o decurso do prazo legal exigido desde a data da integração dos executados em PERSI.


K. Isso resulta de imediato da leitura do segundo parágrafo das referidas cartas, no qual se lê “O PERSI foi


extinto por terem ocorrido mais de 90 dias desde a integração em processo de PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo.”


L. Isto é, o PERSI está extinto pois ultrapassou os 90 dias em que o cliente obrigatoriamente tem de estar integrado neste procedimento.


M. Trata-se, até, de uma forma de extinção automática do procedimento.


N. Como, aliás, o afirma jurisprudência de outras Relações, como a Relação do Porto, no acórdão de 19/11/2020, no proc. 978/19.0T8AGD-A.P1, o acórdão da Relação de Coimbra de 19/06/2018, no proc. n.º


29358/16.8YIPRT e acórdão da Relação de Lisboa de 07/05/2020, no proc. 2282/15.4T8ALM-A.L1-6


O. Pelos expostos fundamentos, requer-se a prolação do acórdão, em conferência, que ordene o prosseguimento dos autos de execução até efectivo e integral pagamento da quantia exequenda.


NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE


DIREITO,


Depois de ouvida a parte contrária, deverá ser o caso submetido à apreciação da conferência a fim de, sobre a questão concreta decidida, ser proferido um acórdão, que ordene o prosseguimento dos autos de execução até efectivo e integral pagamento da quantia exequenda.


Só assim se decidindo, será


CUMPRIDO O DIREITO E FEITA JUSTIÇA”


*


Os Apelados não responderam à reclamação.


*


Correram Vistos.


*


3-Apreciando a Reclamação


Resulta do artigo 652.º, n.º 3, do CPC, o seguinte:


“Salvo o disposto no n.º 6 do artigo 641.º, quando a parte se considere prejudicada por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente, pode requerer que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão; o relator deve submeter o caso à conferência, depois de ouvida a parte contrária.”


A Apelante Novo Banco S.A. reclamou para a conferência da decisão singular de relator, que recaiu sobre o recurso que aquela apresentou da decisão proferida no Tribunal a quo em 26/09/2024 e que negou provimento ao dito recurso.


Fê-lo estribando-se essencialmente no que já carreara para o aludido recurso.


A nosso ver a decisão sumária, ora objecto de reclamação, proferida em 12/12/2024, pronunciou-se sobre toda a matéria relevante suscitada nas conclusões recursivas, com argumentação que nos cumpre neste momento reiterar na sua totalidade por se manter válida para o caso vertente, o que naturalmente implica refutar a argumentação apresentada pela ora Reclamante que não foi acolhida na reapreciação feita na decisão sumária.


Sublinhe-se que não ignoramos a subsistência de tese oposta àquela que se defende neste aresto, afigurando-se, porém, do apanhado de arestos acessíveis para consulta proferidos, designadamente neste Tribunal da Relação de Évora, que a tese retratada na decisão sumária objecto da reclamação apresentada tende, mais recentemente, a consolidar-se em detrimento da tese contrária defendida pela Apelante/Reclamante, bastando para se chegar a essa conclusão confrontar as datas em que foram prolatados vários dos acórdãos/decisões a que aludimos expressamente na decisão sumária, a que acrescentamos neste momento o acórdão proferido neste Tribunal da Relação de Évora em 21/11/2024 (Proc.º n.º 360/17.4T8ENT-A.E1 de que fomos relator), acessível para consulta in www.dgsi.pt e o, ainda mais recente, acórdão proferido também por este Tribunal da Relação de Évora em 19/12/2024 (Proc.º n.º 2500/22.2T8ENT.E1), com as datas dos arestos salientados pela ora Reclamante, mormente dos dois acórdãos proferidos igualmente neste Tribunal da Relação de Évora mencionados nas conclusões E e F.


*


4- DECISÃO


Termos em que, face a todo o exposto, acordam os Juízes desta Relação em decidir o seguinte:

a. A) Julgar improcedente a reclamação apresentada em 26/12/2024 pela Apelante/Reclamante Novo Banco S.A. da decisão singular de relator proferida nestes autos em 12/12/2024;


B) Fixar custas a cargo da Apelante/Reclamante (artigo 527º, nº 1- , 1ª parte e nº 2, do CPC).


*


DN


*


Notifique.


*


ÉVORA, 30/01/2025


(José António Moita-Relator)


(Filipe César Osório - 1.º Adjunto)


(Filipe Aveiro Marques - 2.º Adjunto)