ARECT
AÇÃO DE RECONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DE CONTRATO DE TRABALHO
Sumário

Sumário elaborado pelo relator (artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil):
I – É de qualificar como contrato de trabalho o contrato entre a ré – que presta serviços para os CTT, num Centro de Distribuição Postal, efetuando as tarefas de recolha e organização de encomendas desse Centro de Distribuição e entrega na morada do destinatário final – e um prestador de atividade/estafeta, no circunstancialismo em que se pura, no essencial, (i) que o prestador tem que se apresentar no local indicado pela ré, (ii) presta a atividade, por regra, no horário indicado pela ré, das 9.00 horas às 17.00 horas, de segunda a sexta-feira, (iii) recebeu da ré uma carrinha para transportar as encomendas, bem como t-shirts com o logotipo da ré para usar quando se desloca para entregar as encomendas, (iv) e recebe da ré um valor certo por cada dia de atividade.

II – A tal não obsta o facto de caso o prestador de atividade procedesse à entrega mensal de mais de 80 encomendas receber também uma comissão, e de poder faltar, embora devesse avisar o trabalhador responsável da ré para que pudesse ser substituído ou o serviço fosse redistribuído, e ainda de quando entrava ao serviço dever contactar a ré ou ser contactado por esta para registo da sua comparência.

Texto Integral

Proc. n.º 378/23.8T8SNS.E1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora1:


I. Relatório


O Ministério Público instaurou ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho contra Arraial D´ Ingredientes, Lda., pedindo, a final, que se declare a existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado, com antiguidade reportada a 10 de julho de 2023, entre o trabalhador AA e a ré.


Alegou, para o efeito e no essencial, que a ré se dedica à atividade, entre outras, de entregas ao domicílio e serviço de estafetas urbanos, que no âmbito dessa atividade presta serviços para o CTT - Correios de Portugal, S.A., no Centro de Distribuição Postal de ... (CDPG), efetuando as tarefas de recolha e organização das encomendas naquele CDP de ....


Para tanto contratou, além de outros, o referido AA, o qual presta/ou a atividade para a ré em local e com horário por ela indicados, recebendo da mesma, como contrapartida, uma prestação mensal fixa e utilizando equipamentos de trabalho postos à sua disposição pela ré.


Em conformidade, concluiu que não obstante entre a ré e AA ter sido celebrado um contrato que denominaram de prestação de serviço, tendo em conta as caraterísticas do exercício de atividade e a presunção constante do artigo 12.º do Código do Trabalho deverá o contrato ser qualificado como de trabalho.


Após vicissitudes processuais que ora não relevam, a ré contestou a ação, a pugnar pela sua improcedência, sustentando, em síntese, que AA presta/va a atividade com total autonomia, sendo ele que planeava as rotas, os horários e os dias do “giro”, recebendo por tal atividade uma quantia em função do número de entregas, sem periodicidade, não tendo que justificar qualquer falta.


Procedeu-se a audiência de julgamento e no seguimento veio a ser proferida sentença, que julgou a ação procedente, declarando a existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado entre AA e a ré “Arraial D’Ingredientes, Lda.”, com início a 10 de julho de 2023.


Inconformada com o assim decidido, a ré interpôs recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões:


«1) Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida a final nos presentes autos, tendo por objeto a reapreciação da matéria de facto e de Direito.


2) Relativamente ao ponto 3 da matéria de facto provada, apenas se coloca em causa que se utilize a palavra pessoal, uma vez que a verdadeira relação jurídica entre a R. e AA é a subcontratação, devendo ser corrigido para:


3. Para a prestação desse serviço, a ré tem necessidade de subcontratar prestadores de serviços no âmbito da sua organização, mediante pagamento de contrapartida monetária, os quais procedem às tarefas de recolha, organização e encomendas do CDPG e distribuição e entrega nas moradas dos destinatários finais.


3) O ponto 5., por igual razão, entende-se que deverá ser corrigido para:


5. Por contrato de prestação de serviços entre a R. e AA encontrava-se no CDPG, recolhendo as encomendas nesse Centro e procedendo à sua distribuição nas moradas dos destinatários finais em área geográfica determinada pelos CTT.


4) Dos pontos 5 a 15, 24 a 30 e da matéria de facto não provada, A) a D), a sentença ora colocada em crise refere ter-se em consideração, além da testemunha AA, o depoimento dos inspetores do ACT, sendo que estes últimos não revelaram qualquer conhecimento direto à exceção dos pontos 4 e 12.


5) O depoimento da testemunha AA foi bastante sugestionado pela Digníssima Magistrada do Ministério Público, com o devido respeito, o que é muito, apresentando um depoimento atabalhoado, confuso, revelando não saber factos essenciais – valor base da retribuição – entrando em contradição consigo próprio e com os recibos de vencimento juntos aos autos, como aliás até foi constatado pelo seu “suspiro final”.


6) Deve o ponto 6. Ser eliminado por falta de prova, pois a testemunha AA sempre referiu que eram os CTT que lhe indicavam as encomendas e rotas, referindo-se aos Srs. BB e CC como seus superiores, referindo igualmente que trabalhava em exclusivo para os CTT.


7) Sendo o único beneficiário da atividade os CTT e não a R.


8) O ponto 7. Deve igualmente ser eliminado pois descreve um horário, igualmente não encontra suporte na prova produzida, nem sequer existe uma única referência a horário de almoço.


9) AA ora refere 8h, ora refere 9h como hora de início, confirmando que nem sempre se deslocava ao CDP a essas horas, e que saía logo que as encomendas terminassem.


10) O horário do CDP é das 9h às 17h, não se podendo confundir o horário de funcionamento com um horário de trabalho.


11) Igualmente a testemunha afirma que chegava mais cedo para terminar mais cedo, bem como ficou provado que nem sempre havia entregas para fazer.


12) Já o ponto 9. Apenas na parte relativa a “mediante a emissão de um único recibo verde”, encontra-se em contradição com os recibos juntos com a contestação (os número 6/7/8 das finanças têm a data de 2 e 3 de janeiro), bem como com as próprias declarações da testemunha AA, que confirma emitir dois recibos, um para “o valor combinado” e outro para o valor das comissões.


13) Devendo ser este ponto alterado para:


9. Essas quantias eram pagas, respectivamente, por transferências bancárias, mediante a emissão vários recibos verdes.


14) Quanto ao ponto 11. Não pode ser dado como provado que utilizava um suporte de telemóvel, uma vez que este expressamente referiu não lhe ter sido entregue.


15) No ponto 12. Deverá ser alterada a palavra obrigatório pela palavra necessário, por não resultar da prova produzida qualquer obrigatoriedade, mas antes necessidade.


16) Já o ponto 13. Deve igualmente ser eliminado, por não encontrar conexão com o depoimento da testemunha AA, pois este sempre referiu que as instruções, segundo este, eram-lhe dadas pelos seus superiores dos CTT.


17) Sobre o vestuário, a testemunha AA refere que nem sempre utilizava as t-shirts, até porque eram “2 para 5 dias da semana”, e que utilizava casacos quando chovia, referindo ainda DD que apenas entregaram as t-shirts por falta de identificação do AA.


18) A testemunha DD e EE referiram igualmente que nunca foi solicitado qualquer comprovativo aos prestadores de não poderem comparecer, bem como AA referiu nunca lhe terem dito que não poderia tirar férias.


19) Ou seja, verifica-se claramente não existir uma subordinação jurídica, uma vez que, por um lado não era a R. que lhe indicava o serviço que existia, sendo o percurso livremente escolhido pela testemunha, bem como era este que tinha a total autonomia para decidir se iria ou não prestar o seu serviço.


20) Quanto ao ponto 14., apenas se impugna a palavra “supervisores”, pois apenas foi utilizada pela testemunha, não tendo qualquer outra prova que o sustente.


21) Já o ponto 15. Padece de um manifesto lapso, pois AA apenas refere um encontro no dia 10 de julho de 2023 e não que iniciou funções nesse dia.


22) O primeiro recibo por este emitido, no montante de € 106,67, o facto de apenas ter aberto atividade no dia 25/07/2024, bem como o contrato celebrado indica o dia 25/07/2024, sendo essa a data de início da prestação de serviço.


23) Já quanto ao término do serviço, refira-se que o último recibo emitido (de € 533,00 inferior aos demais) é de 16 de fevereiro, referente a serviço prestado no dia 2 de janeiro de 2024, admitindo ainda a testemunha AA, que poderá ter terminado o serviço no final de janeiro de 2024.


24) Deve pois o ponto 15. da matéria de facto ser alterado para:


15. AA prestava ininterruptamente actividade para a ré desde 25.07.2023 até final de Janeiro de 2024.


25) Os ponto 25. a 29. Da matéria de facto ilustram bem as contradições patentes na sentença ora colocada em crise, uma vez que admitem que o prestador pudesse iniciar o seu serviço não sujeito a uma horário de entrada, e que nem sempre o mesmo prestava serviço diariamente, podendo ainda terminar a atividade mais cedo.


26) Dá-se ainda como provado que a testemunha AA poderia faltar, o que não sucede nas relações laborais, reafirmando que era este que definia a atividade que prestava.


27) Já no atinente ao ponto 30., refira-se que, quando perguntado, a testemunha AA refere que poderia, caso entendesse ter outra ocupação e que apenas não o fazia por gostar de treinar e precisar desse tempo, devendo ser retiradas as palavras “em exclusividade”.


28) Sobre os factos não provados B e D, devem os mesmos ser dados como provados, por resultarem do depoimento de DD, bem como a testemunha AA confirmou que o questionaram por viatura própria e que não lhe referiram que era obrigatório o uso de t-shirts, sendo ainda indiciador o facto da relação ter sido curta, de apenas 6 meses.


29) Deve ainda ser dado como provado, por resultar das declarações de AA que:


31. A relação contratual entre a R. e AA terminou no final de janeiro de 2024, por acordo entre ambos.


30) Não resulta assim, qualquer presunção a que se referem as alíneas do n.º 1 do artigo 12.º do CT;


31) Não obstante de se considerar não existir presunção, entende-se igualmente, nos termos acima referidos, que essa presunção (por mera cautela de patrocínio) foi ilidida pela R.


32) Entende-se assim que, não existe qualquer fundamento para se classificar a relação entre AA e a R. como contrato de trabalho, devendo o presente recurso ser considerado procedente».


Contra-alegou o Ministério Público, a pugnar pela improcedência do recurso.


Admitido o recurso na 1.ª instância – como de apelação, com subida imediata e efeito devolutivo – subidos os autos a esta Relação, elaborado projeto de acórdão, colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.


II. Objeto do recurso


Face às conclusões das alegações de recurso, que, como é sabido, delimitam o objeto deste (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho), são as seguintes as questões colocadas à apreciação deste tribunal:


1. da impugnação da matéria de facto;


2. se o contrato que vigorou a partir de 10 de julho de 2023 entre AA e a ré/recorrente deve ser qualificado como de trabalho.


III. Factos


A) A 1.ª instância deu como provada a seguinte factualidade:


1. A ré dedica-se entre outras, à atividade de entregas ao domicílio e serviço de estafetas urbanos; transportes rodoviários de mercadorias exclusivamente por meio de veículos ligeiros; serviços de organização do transporte exclusivamente por meio de veículos ligeiros; outras atividades auxiliares dos transportes terrestres exclusivamente por meio de veículos ligeiros; gestão de infraestruturas de transportes terrestres exclusivamente por meio de veículos ligeiros.


2. No âmbito de tal atividade, a ré presta serviços para “CTT – Correios de Portugal, S.A.”, no Centro de Distribuição Postal de ... (CDPG), efetuando as tarefas de recolha e organização de encomendas desse Centro e distribuição e entrega na morada do destinatário final.


3. Para a prestação desse serviço, a ré tem necessidade de contratar pessoal no âmbito da sua organização, mediante pagamento de contrapartida monetária, o qual procede às tarefas de recolha, organização e encomendas do CDPG e distribuição e entrega nas moradas dos destinatários finais.


4. Em 17.11.2023, a R. tinha a prestar atividade como distribuidor postal de encomendas “courier”, no Centro de Distribuição Postal de ... (CDPG), AA, nascido em ........1983, de nacionalidade portuguesa, titular do cartão de cidadão n.º ..., contribuinte fiscal n.º ..., beneficiário da ... n.º ..., residente na Rua ..., ... ....


5. Por determinação da ré, AA encontrava-se no CDPG desenvolvendo a atividade para a ré, recolhendo as encomendas nesse Centro e procedendo à sua distribuição nas moradas dos destinatários finais em área geográfica determinada pelos CTT.


6. Esta atividade era levada a cabo em benefício e no interesse da ré.


7. Por determinação da ré, por regra, essa atividade era prestada das 09:00 às 17:00 horas, com pausa para almoço das 12:00 às 13:00 horas, de segunda a sexta-feira, com descanso aos sábados e domingos. (este facto é alterado infra)


8. Como contrapartida da atividade prestada, AA recebia mensalmente da ré um valor certo de pelo menos €26,66/dia, correspondente a 8 horas de disponibilidade de segunda a sexta feira, acrescido de comissão a partir das 80 entregas realizadas no mês.


9. Essas quantias eram pagas, respetivamente, por transferências bancárias, mediante a emissão de um único recibo verde. (este facto é alterado infra)


10. Após efetuar a seleção, organização e carga das encomendas, no CDPG, AA procedia ao início do giro de entregas nas moradas dos destinatários, em veículo automóvel fornecido pela ré e alugado por esta, com cartão para abastecimento de combustível.


11. AA utilizava, duas t-shirts com o logo “delivery express” e um suporte de telemóvel fornecidos pela ré.


12. Utilizava também PDA dos CTT para registo de entregas, o que era obrigatório para registo de recebimento das encomendas.


13. AA recebia ordens e orientações de trabalhador da ré quanto ao local onde se tinha de apresentar ao trabalho, horário de trabalho a praticar e vestuário que tinha de utilizar.


14. Recebia também ordens e orientações de supervisores, responsáveis dos CTT quanto à distribuição do trabalho e área geográfica de entregas. (este facto é alterado infra)


15. AA prestava ininterruptamente atividade para a ré, naqueles moldes, desde 10.07.2023 e pelo menos, até final de fevereiro de 2024.


16. AA encontrava-se então inscrito na Segurança Social como trabalhador independente, desde 26.07.2023.


17. Com data de 25.07.2023 e entrada em vigor nesta data, entre a ré, na qualidade de “Angenciador” e AA, na qualidade de “Prestador de Serviço”, foi assinado documento escrito intitulado “Contrato de Prestação de Serviço de Estafeta (Profissional Independente – (Artigo 1154.º CC)” pelo qual este se comprometeu a prestar serviços àquela relativos a estafeta, sob a modalidade de serviço de entrega de mercadorias.


18. Consta da cláusula 2.ª desse acordo:


«1.O presente contrato entra em vigor a, 25 de Julho de 2023, e realizados nas zonas de estabelecimentos comerciais, na Região da ... ou outra região, soba orientação do agenciador, por critério de organização, assim, sendo o termo final desta convenção, a dia 01 de Dezembro de 2023, podendo ser prorrogada por aditamento deste e por comum acordo dos outorgantes, caso contrário, o mesmo renovar-se-á automaticamente.


2. O Agenciador e o Prestador de Serviços estão interligados pelo dever de colaboração mútua, nomeadamente no tocante a prestação recíproca de informações necessárias à boa e atempada execução do presente contrato.»


19. Consta da cláusula 3.ª desse acordo:


«1.O prestador de Serviço, prestará os serviços ora contratados sem subordinação ou dependência hierárquica, cabendo-lhe em exclusivo a preparação e planificação dos serviços, sendo remunerado no valor de €26,66 dia.


2.O valor referido no número anterior é sujeito a IVA, quando aplicável, e pressupõe a realização de pelo menos 8 horas diárias de disponibilidade ativa e apenas aos sábados e domingos.


3. Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, o Prestador de Serviço prestará o serviço ora contratados com zelo, dedicação, diligência e em colaboração com o Agenciador, com foco á plena obtenção dos objetivos visados com a prestação de serviço.»


20. Consta da cláusula 4.ª desse acordo:


«O serviço de profissional estafeta, para o caso presente, dependerá de material de trabalho que este disponha e que se encontra na lista em infra, ou caso este não disponha de todos ou de algum material, este será fornecido pelo Agenciador, mediante a prestação de caução:


 Uma mota 110cc ou 125cc e Cartão Combustível


 Capacete


 Power Bank


 Suporte para telemóvel


 Capa de chuva.»


21. Consta da cláusula 5.ª desse acordo:


«O pagamento será realizado via depósito bancário a cada dia primeiro do mês subsequente à prestação de serviço, considerando, não atraso, até ao quinto dia útil de cada mês de referência.»


Consta da cláusula 6.ª desse acordo


«1. O presente contrato pode ser resolvido por qualquer das partes, com um pré-aviso de 15 (quinze) dias, ficando sempre salvaguardado os percentuais concernentes à proporção dos dias trabalhados.


2. O não cumprimento do prazo acordado no inciso anterior, acarreta uma multa no valor de 200,00 (duzentos Euros, sem prejuízo de qualquer das partes que efetivamente incumprir.


3. A rescisão do contrato, com fundamento em justa causa não obedece a qualquer aviso prévio, devendo ser comunicada á contraparte, via e-mail ou através de contactos alternativos.


4. O incumprimento de horários, maus comportamentos, má utilização da viatura ou dos respetivos equipamentos fornecidos pelo Agenciador, constituiu justa causa da prestação de serviços.»


22. Com a mesma data de 25.07.2023 entre a ré e AA foi assinado documento escrito intitulado “Anexo I – Contrato de Entrega de Material Para Serviço de Estafeta”, pelo qual este se comprometeu a utilizar o material e fardamento na sua atividade profissional, a partir do dia da assinatura desse documento, especificando os bens entregues.


23. Mais consta desse Anexo que «na cessação do contrato ou término do mesmo, todos os bens têm de ser devolvidos nas mesmas condições que foram entregues. Caso não se venha a ser devolvido o material será deduzido o respetivo valor por cada item em baixo mencionado:


Material 20,00€


Farda Delivery Express – Casaco 50,00€


Farda Delivery Express – Calças 25,00€


Cartão de Combustível – 20,00€


Bota de Segurança – 40,00€


Telemóvel completo (com carregador) – 250,00€


Suporte telemóvel – 25,00€


Power Bank – 30,00€


Equipamento chuva – 50,00€


24. Pelos CTT não foram fornecidos coletes a AA com identificação deste.


25. Ocasionalmente, AA apresentava-se no CDPG mais tarde que as 09:00 horas, podendo, neste caso, ter ou não encomendas para entregar.


26. AA organizava a sua rota/giro diária(o), podendo acabar a atividade mais cedo que as 17 horas, caso tivesse terminado todas as entregas.


27. Embora pudesse faltar, quando entrava ao serviço deveria contactar a ré ou ser contactado por esta para registo da sua comparência e teria de avisar o trabalhador responsável da ré para que pudesse ser substituído ou o serviço pudesse ser redistribuído.


28. Caso não procedesse a entregas, faltando, AA não recebia contrapartida monetária.


29. A ré monitorizava as entregas feitas por AA pelos comprovativos de entrega que os CTT dispõem.


30. AA prestava a atividade para a ré em exclusividade.


B) A 1.ª instância deu como não provada a seguinte factualidade:


a. A ré definia ao prestador de atividade a forma de desenvolver a sua atividade e giro a efetuar.


b. A ré forneceu equipamento ao prestador, por este na altura não dispor de equipamento próprio, tratando-se de ajuda inicial, de modo a que o prestador pudesse posteriormente adquirir o seu próprio equipamento.


c. A ré apenas forneceu as T-shirts ao prestador porque pelos CTT não foram fornecidos coletes a AA com identificação deste.


d. O uso das T-shirts era opção de AA.


IV. Fundamentação


1. Da impugnação da matéria de facto


1.1. Como se extrai das conclusões das alegações de recurso, a recorrente impugna diversos factos dados como provados e não provados, indica a decisão que deve ser proferida sobre os mesmos, com base nos concretos meios probatórios que também indica (aqui na alegação de recurso).


Mostra-se, por isso, cumprido o ónus quanto à impugnação da matéria de facto, constante do artigo 640.º do Código de Processo Civil, pelo que nada obsta ao seu conhecimento.


Consigna-se que procedemos à audição de toda a prova testemunhal gravada, que nalgumas passagens se apresenta dificilmente percetível (julga-se que por as testemunhas falarem afastadas do microfone ou em tom de voz muito baixo), sendo que, importa desde já adiantar, o depoimento que se afigura particularmente relevante é o do “prestador de atividade” AA, por ter conhecimento direto dos factos, pese embora, aqui e ali, dado o passar do tempo tivesse alguma imprecisão de memória, mas sem que daí se possa concluir, como o faz a recorrente, que o depoimento terá sido “sugestionado pela Digníssima Magistrada do Ministério Público”.


Com efeito, dessa audição, não retirámos quaisquer indícios que pusessem em causa a sinceridade, objetividade e, enfim, a credibilidade do depoimento.


Analisemos os diversos factos impugnados.


1.2. Quanto ao facto dado como provado sob o n.º 3


Entende a ré/recorrente que se deve substituir a palavra “pessoal”, por “subcontratar prestadores de serviços”.


A 1.ª instância motivou assim a resposta a tal factualidade:


«Os pontos 2 e 3 embora respeitem a matéria de facto impugnada pela ré, a mesma obteve inteira confirmação pelos depoimentos das testemunhas que apresentou, FF, Director Operacional da ré, desde Junho/2018 e DD, auxiliar de escritório ao serviço da ré, desde Dezembro/2023, tendo também resultado dos depoimentos dos Inspectores do Trabalho GG e HH.


Assim, com base naqueles depoimentos, o tribunal não poderia deixar de dar como provada a matéria em causa».


Já a recorrente entende que deve alterar-se a referida palavra “pessoal” por “subcontratar prestadores de serviço”, por nos autos se encontrar um contrato de prestação de serviços assinado por AA, em que se discrimina o serviço contratado e que a que a contração daquele pela ré (…) é na verdade uma subcontratação no âmbito da relação contratual entre a R. e os CTT”.


Não acompanhamos o entendimento da recorrente: o que deve constar da matéria de facto são “factos”, enquanto ocorrências da vida, e não qualificações ou conceitos jurídicos.


Ora, o pretendido pela recorrente insere-se neste último âmbito: saber se havia um contrato de prestação de serviços, ou de outra natureza, é uma questão jurídica, que não pode constar diretamente na matéria de facto.


Além disso, o que releva para efeito de qualificação do contrato não é a designação escolhida pelas partes, nem os termos em que foi redigido, mas sim os termos em que o mesmo foi executado: no dizer de João Leal Amado (O contrato de trabalho entre a presunção legal de laboralidade e o presumível desacerto legislativo, in Temas Laborais 2, Coimbra, 2007, p. 12), “os contratos são o que são e não o que as partes dizem que são”.


No caso, o que está em causa é que para o exercício da atividade a ré/recorrente necessitava de “pessoal”, ou seja, de pessoas: é esse o facto que se fez constar, e bem, na factualidade apurada na 1.ª instância.


1.3. Quanto aos n.ºs 5 a 15, 24 a 30 dos factos provados e a) a d) dos factos não provados.


Atente-se que a 1.ª instância motivou assim a resposta a tal factualidade:


«Os pontos 5 a 15, 24 a 30 e A) a D) referentes ao exercício da actividade tiveram desde logo em consideração que o conhecimento dos mesmos por parte dos Inspectores do Trabalho GG e HH advém das declarações prestadas por AA aquando da visita inspectiva, pelo que importa agora considerar o depoimento deste também nesse contexto.


O depoimento de AA não obstante algumas imprecisões e/ou falhas de memória e até mesmo desconhecimento, foi prestado com evidente sinceridade e espontaneidade, com desapego à situação, resultando do mesmo em síntese que: (i) teve conhecimento através do OLX do recrutamento de estafetas pela “Delivery Express” (designação comercial da ré); (ii) após ter recebido mensagem de responsável da ré (Sr. II), tendo de estar em frente ao CDPG, pelas 08:45h, para falar com o mesmo, foi-lhe então entregue uma carrinha alugada pela ré à Sixt, cartão para abastecimento de combustível com plafond de €170,00, dois polos com a identificação da “Delivery Express” e um suporte para telemóvel”; (iii) foi-lhe então explicado que teria de se apresentar no CDPG, entrando às 08:45h para iniciar a distribuição de encomendas às 09:00 e até às 17:00 horas, sendo que se antes desta hora entregasse todas as encomendas a seu cargo, podia sair mais cedo do que as 17h.; (iv) auferia entre os €700,00/€800,00/mês, correspondente a um valor fixo que não logrou precisar, admitindo poder tratar-se de €26,66/dia e de uma componente varável correspondente a um prémio/comissão que era atribuído(a) a partir das 80 encomendas entregues no mês, sendo em valor que também não logrou precisar e não recebendo subsídios de Natal e de férias; (v) estas quantias eram pagas mensalmente pela ré, por transferências bancárias, separadamente, e pelo seu recebimento emitia um único recibo, inexistindo qualquer valor que recebesse da ré pelo qual não emitisse recibo; (vi) chegou a realizar entregas em dois sábados, embora trabalhasse de segunda a sexta-feira e caso chegasse mais tarde que as 09:00h (em rigor deveria comparecer antes, às 08:45h), poderia ter ou não o seu contentor com encomendas para entregar; (vii) quando entrava ao serviço deveria contactar a ré ou ser contactado por esta para registo da sua comparência e caso não comparecesse, deveria avisar o Sr. II para que pudesse ser substituído ou redistribuído o seu serviço a outro, sendo também com aquele que resolvia qualquer problema/questão; (viii) recebia ordens e instruções de dois supervisores dos CTT quanto à atribuição de encomendas; (ix) organizava o seu próprio giro, a sua rota, isto é, por onde começar e acabar; (x) tinha cartão de identificação, o que era exigido pelos CCT e estes forneceram-lhe PDA para as entregas; (xi) exerceu esta actividade em exclusividade, desde 10.07.2023 e durante cerca de um ano, admitindo que até Janeiro/Fevereiro/2024, sendo que a partir de determinada altura passou a auferir uma quantia fixa de €950,00/mês, tendo vindo depois a saber que lhe descontavam penalizações por entregas não realizadas e que deveriam ser feitas das 09:00 às 11:00 horas, o que desconhecia.


Precisou ainda que aquando da entrega da viatura automóvel, compareceu no local com o seu próprio veículo automóvel, nunca lhe tendo sido dito que o teria de utilizar e nunca o tendo mesmo utilizado para fazer entregas. Por outro lado, a viatura automóvel que lhe foi entregue pela ré podia ser utilizada na sua vida pessoal, o que por vezes ocorreu, tendo sempre tal comunicado ao Sr. II e nunca ultrapassou o plafond de combustível atribuído.


Por fim, confrontado com o teor do contrato junto pela ré com a contestação (fls. 54/55 v.º) embora tivesse reconhecido no mesmo a sua assinatura, mencionou desconhecer as circunstâncias em que terá assinado esse documento, revelando mesmo desconhecimento quanto ao seu conteúdo.


Por seu turno, por FF foi referido ter sido proposto à R. pelos CTT a colocação de um prestador de serviço para entregas, sendo o mesmo gerido no dia a dia pelos CTT, pelo que comunicou a necessidade da contratação a II, que se deslocou a ... para contratar AA.


Disse desconhecer qual a contrapartida pela prestação dessa actividade, mas sendo pago um valor base, acrescido de comissão consoante o número de encomendas entregues (a partir de 65), o que era informado pelos CTT à R.


Mencionou que o prestador geria o seu horário, inexistindo horas de início e fim, dependendo de como exercia a actividade, sendo que, como os serviços dos CTT encerram ás 17 horas, o prestador teria até então de se apresentar. Em caso de falta, o prestador deveria avisar para que pudesse ser substituído, mas não teria de justificar a sua ausência, sendo sua a decisão de ir ou não trabalhar.


Ainda assim, quanto à assiduidade, esta testemunha referiu com muito relevo, que uma vez que a partir de determinada altura AA passou a faltar muito, entregando poucas encomendas, pelos CCT foi pedido á ré que o substituísse, o que é demonstrativo de que a prestação da actividade de “courier” pressupunha que se apresentasse para prestar actividade e não que faltasse.


Disse a testemunha que a R. entregou ao prestador uma viatura automóvel alugada, pois o carro do prestador não tinha condições para transportar as encomendas, não sabendo mesmo, sequer, se o prestador tinha carro. Foi também fornecido ao prestador um cartão de combustível, com plafond de €400,00 (que nunca foi ultrapassado), podendo o veículo e o cartão ser utilizados para a vida pessoal do prestador.


Adiantou que era o prestador que decidia as rotas e locais de entrega, a que a ré não tem acesso, não controlando a ré o seu trabalho e apenas lhe sendo comunicadas as ausências e o número de encomendas entregues, cuja confirmação junto dos CTT era depois obtida.


Por fim, disse desconhecer o teor do contrato junto a fls. 54/55 v.º.


Já o depoimento de DD foi considerado no que concerne especificamente aos registos das entregas feitas pelo prestador e informadas pelos CTT á R. para efeitos de atribuição da comissão, bem como quanto á comunicação das faltas pelo prestador a II e, na impossibilidade deste, ao depoente.


No mais, DD afirmou desconhecer horários para a realização da actividade, bem como o teor do contrato junto a fls. 54/55 v.º.


Quanto aos equipamentos disse ter sido entregue ao prestador uma viatura automóvel alugada pela ré, mas temporariamente, pois o prestador deveria ter viatura própria para realizar o serviço e quanto às T-shirts estas foram fornecidas pela ré, pois esta recebeu a comunicação que não havia identificação do prestador, servindo o vestuário para esse fim. Esta afirmação não faz muito sentido, atendendo a que o prestador teria de ter identificação de cartão dos CTT.


Ora, neste preciso enquadramento e tendo ainda presente todos os documentos juntos aos autos, afigura-se de segura verosimilhança o depoimento de AA quanto ao acordado entre si e a ré e à concreta execução desse acordo, isto é, da actividade para a qual foi contratado, sendo certo que se desconhecem as circunstâncias em que terá assinado o documento de fls. 54/55 v.º.


Este desconhecimento não significa que o tribunal deva desconsiderar a existência desse documento na ordem jurídica, devendo, no entanto, enquadra-lo naquela que foi a execução do acordado e tendo presente que a actividade teve início em 10.07.2023, isto é, anteriormente à data do contrato.


Por conseguinte, tendo por base o depoimento de AA, é possível concluir como provado sob os pontos 5 a 15 e 24 a 30 e como não provado sob os pontos A) a D)».


1.3.1. Quanto ao facto provado sob o n.º 5


No entendimento da recorrente, no facto deve constar por “contrato de prestação de serviços” entre a R. e AA encontrava-se no CDPG…”.


Vale aqui, mutatis mutandis, o que se afirmou quanto ao facto n.º 3: da matéria de facto devem constar factos e não qualificações ou conceitos jurídicos.


E o facto, nu e cru na expressão de Manuel de Andrade (Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 194), é o que consta do n.º 5, sendo irrelevante aqui consignar se era por contrato de prestação de serviços, ou por qualquer outro contrato, pois o que releva é como o contrato era executado.


Aliás, mais adiante, na matéria de facto (v.g. n.ºs 17 a 21) até consta o denominado contrato de prestação de serviços que as partes assinaram, com menção de algumas cláusulas.


Mantém-se, pois, o facto em causa.


1.3.2. Quanto ao facto n.º 6


Recorde-se neste facto consta que a atividade de AA era levada a cabo em benefício e no interesse da ré.


O recorrente pretende que seja eliminado, por falta de prova.


Não anuímos a tal entendimento.


AA, recorde-se prestador da atividade, afirmou ter conhecimento através do OLX do recrutamento de “estafetas” pela “Delivery Express”, designação comercial da ré, tendo, após contacto por escrito que estabeleceu com um responsável da ré (Sr. II) se encontrado com o mesmo junto ao Centro de Distribuição Postal de ... onde lhe foram comunicadas as condições da contratação (como bem se encontram explicitadas na motivação da resposta à matéria de facto fixada pela 1.ª instância) e lhe foram entregues alguns equipamentos.


Afirmou também que quase todos os dias falava (intui-se que por contacto telefónico) com o referido Sr. II para saber se estava tudo a correr bem e que sempre considerou este como seu superior hierárquico, apesar de no dia-a-dia, no CDPG, responsáveis dos CTT (Sr. BB e Sr. CC) lhe darem indicações sobre as entregas de encomendas a fazer, sendo ele que organiza a rota (“giro”) a seguir para essas entregas.


Afirmou também não ter conhecimento que os CTT tivessem tido qualquer intervenção na sua contratação pela ré e que quando faltava devia avisar com antecedência a ré, por intermédio do referido Sr. II.


Ora, se foi a ré que contratou AA, lhe definiu as condições de prestação da atividade (ainda que no dia-a-dia pudesse receber orientações no local de responsáveis dos CTT) e era esta que lhe pagava a contrapartida por essa atividade, só pode concluir-se que a atividade era levada a cabo em benefício e no interesse da ré.


Mantém-se, pois, o facto n.º 6.


1.3.3. Quanto ao facto n.º 7


Este facto tem a seguinte redação:


«Por determinação da ré, por regra, essa atividade era prestada das 09:00 às 17:00 horas, com pausa para almoço das 12:00 às 13:00 horas, de segunda a sexta-feira, com descanso aos sábados e domingos».


No entendimento da recorrente não se fez prova do horário.


Porém, o depoimento da testemunha foi bem explicito, ao referir que estava junto ao CDPG pelas 8.45h e trabalhava, em regra das 9.00 horas às 5 (17.00) horas, mas se terminasse a entrega das encomendas mais cedo, podia sair mais cedo (o que se encontra refletido no facto n.º 26), tendo por vezes saído pela 3 (15.00) horas da tarde.


Aliás, note-se que no próprio contrato que as partes subscreveram consta um horário de 8 horas diárias.


Já quanto à hora/pausa de almoço, não localizamos qualquer referência à mesma, pelo que, nesta parte, se entende eliminar.


Assim, o facto passará a ter a seguinte redação:


«Por determinação da ré, por regra, essa atividade era prestada das 09:00 às 17:00 horas, de segunda a sexta-feira, com descanso aos sábados e domingos».


1.3.4. Quanto ao facto n.º 9


De acordo com a recorrente, o facto refere-se à emissão de um único recibo verde pela prestação da atividade mensal, mas face aos recibos juntos aos autos e às declarações de AA haveria vários recibos emitidos.


Como consta do facto n.º 8 que como contrapartida da atividade AA recebia mensalmente da ré um valor certo por cada dia de trabalho e ainda uma “comissão” a partir de determinado número de entregas (80).


Essa quantias eram pagas por transferência bancária – podendo ser mais que uma – e mediante a emissão de recibo verde.


No entanto, ressalvado o devido respeito por diferente entendimento, da prova produzida, maxime do depoimento de AA, não se extrai com um mínimo de segurança se emitia apenas um ou mais recibos mensais.


Assim, ao facto n.º 9 passará a ter a seguinte redação:


«Essas quantias eram pagas, respetivamente, por transferências bancárias, mediante a emissão de recibo(s) verde(s)».


1.3.5. Quanto ao facto n.º 11


O mesmo tem a seguinte redação:


AA utilizava, duas t-shirts com o logo “delivery express” e um suporte de telemóvel fornecidos pela ré».


De acordo com a recorrente não resulta da prova que tenha sido fornecido a AA o referido suporte de telemóvel.


Embora se afigure que a pretendida alteração é irrelevante para a decisão da causa, o certo é que da audição da prova também nós ficámos convictos da referida entrega, pelo que se mantém o facto.


1.3.6. Quanto ao facto n.º 12


Pretende a recorrente que seja substituída a indicação de “obrigatório” por “necessário”


Não vislumbramos qualquer relevância na pretendida alteração.


Mas seja como for, impõe que se diga que para o registo do recebimento das encomendas era necessário utilizar PDA dos CTT, por obrigatoriedade de serem registadas por essa via as entregas, pelo que inexiste fundamento para a pretendida alteração.


1.3.7. Quanto ao facto n.º 13.


O mesmo tem a seguinte redação:


«AA recebia ordens e orientações de trabalhador da ré quanto ao local onde se tinha de apresentar ao trabalho, horário de trabalho a praticar e vestuário que tinha de utilizar».


Entende a recorrente que o facto deve ser eliminado.


Ora, como resulta do já afirmado supra, maxime a propósito da apreciação do facto n.º 6, foi a ré que contratou AA, lhe definiu as condições de prestação da atividade (ainda que no dia-a-dia pudesse receber orientações no local de responsáveis dos CTT), era esta que lhe pagava a contrapartida por essa atividade e era a um seu representante (Sr. II) que devia comunicar antecipadamente quando ia faltar ao trabalho.


Além disso, foi a ré que lhe indicou o vestuário identificativo a utilizar e o local de trabalho (CDPG), ainda que no dia-a-dia o giro a fazer pudesse variar, dependendo da comunicação de responsáveis dos CTT.


Aliás, acentue-se, a testemunha AA referiu que quase todos os dias era contactado pelo Sr. II para saber se estava tudo a correr bem, o que significa que não só foi a ré que o contratou, como também a ela se mantinha vinculado e, embora à distância, controlava a atividade por ele exercida pagava-lhe a contrapartida por essa atividade.


Neste contexto, e independentemente do contrato que terá sido celebrado entre a ré e os CTT – que se desconhece –, ao abrigo do qual AA exercia a atividade/fazia a entrega de encomendas, as orientações que lhe eram dadas no local por responsáveis dos CTT, designadamente sobre o giro a efetuar, mais não representam que uma espécie de delegação de poderes da ré nos CTT em relação ao AA.


Por consequência, entende-se ser de manter o facto em causa.


1.3.8. Quanto ao facto n.º 14


De acordo com a recorrente deve ser eliminada a expressão “supervisores”.


Trata-se de mais uma pretendida alteração que se afigura irrelevante para a decisão: saber se os responsáveis dos CTT eram ou não supervisores.


Não obstante, por não se extrair da prova produzida que os mesmos fossem supervisores, o facto passa a ter a seguinte redação:


«Recebia também ordens e orientações de responsáveis dos CTT quanto à distribuição do trabalho e área geográfica de entregas».


1.3.9. Quanto ao facto n.º 15


O mesmo tem a seguinte redação:


«AA prestava ininterruptamente atividade para a ré, naqueles moldes, desde 10.07.2023 e pelo menos, até final de fevereiro de 2024».


Pretende a recorrente que o início da atividade se fixe em 25-07-2023 e o termo em final de janeiro de 2024.


Quanto ao início de atividade, o depoimento de AA foi esclarecedor, no sentido que se verificou em 10-07-2023.


Já quanto ao termo, não resulta claro, seja dos depoimentos seja dos documentos (o último recibo foi emitido em fevereiro de 2024, o que parece intuir que se refere a atividade de janeiro) quando cessou a atividade: o que se afigura seguro é que ocorreu pelo menos em final de fevereiro de 2024.


Por consequência, mantém-se o facto.


1.3.10. Quanto aos n.ºs 25 a 29


A recorrente afirma que os mesmos ilustram as contradições da matéria de facto, mas sem que se detete que impugne os mesmos, pelo que, nesse âmbito, nada há a conhecer.


Quanto à alegada contradição, diga-se que o que consta do n.º 7 da matéria de facto é que “por regra”, a atividade se iniciava às 9.00 e terminava à 17.00 horas:


Mas isso não significa que não existissem as exceções contempladas nos n.ºs 25 e 26: sublinhe-se que o n.º 25 se inicia precisamente com a expressão “ocasionalmente”.


1.3.11. Em relação ao facto dado como provado sob o n.º 30


O mesmo é do seguinte teor:


«AA prestava a atividade para a ré em exclusividade».


Pretende a recorrente que dele seja retirado “em exclusividade”.


Mas sem razão, diga-se.


Afigura-se que o depoimento de AA é incontroverso no sentido de trabalhar em exclusivo para a ré/recorrente.


E é isso que consta do facto.


O saber o motivo - se era por AA pretender ter tempo para a sua atividade pessoal, como treinar, ou por qualquer outro motivo – não é objeto do facto, pelo que inexiste fundamento para alterar o mesmo.


1.3.12. Quanto aos factos dados como não provados sob as alíneas b) e d).


Os factos têm a seguinte redação:


[b)] «A ré forneceu equipamento ao prestador, por este na altura não dispor de equipamento próprio, tratando-se de ajuda inicial, de modo a que o prestador pudesse posteriormente adquirir o seu próprio equipamento».


[d)] «O uso das T-shirts era opção de AA».


Sustenta a recorrente que estes factos devem ser dados como provados, por do depoimento de DD resultar que foi entregue viatura a AA por ele não dispor de viatura própria para esse efeito e ainda por do depoimento deste não resultar ser obrigatório o uso de t-shirts.


Também quanto a esta matéria não podemos sufragar o entendimento da recorrente: por um lado, porque o depoimento de AA foi impressivo ao referir que aquando da entrega da carrinha pela ré compareceu no local no seu próprio veículo, nunca lhe tendo sido dito que tinha que utilizar um veículo automóvel pessoal, ou que lhe entregavam a carrinha por não dispor de veículo para esse efeito, sendo que até lhe foi permitido utilizar a carrinha na sua vida pessoal; por outro lado, a testemunha DD afirmou que foram entregues a AA as t-shirts porque os CTT comunicaram não ter identificação.


Ora, o que retira do depoimento de AA é que os CTT só lhe forneciam um cartão de identificação, mas não t-shirts, sendo estas fornecidas pela ré: e compreende-se da necessidade de utilizar estas, pois só assim os destinatários das entregas podiam facilmente identificar o que estava em causa e qual a entidade de quem provinha a pessoa que estava a proceder à entrega.


Mantêm-se, pois os referidos factos como não provados.


Refira-se ainda que no n.º 4 das conclusões a recorrente alude que impugna os factos dados como não provados sob as alíneas a) a d), mas no n.º 28 das conclusões restringe essa impugnação às alíneas b) e d).


Mas seja como for, não se verifica qualquer interesse que teria na prova do facto que consta da alínea a) dos não provados, e, além disso, resulta do referido anteriormente a não prova do mesmo, já que não era a ré que definia o giro a efetuar pelo prestador de atividade.


E também a alínea c) a não prova sempre teria motivação que se explicitou quanto às alíneas b) e d).


1.3.13. Quanto ao aditamento aos factos provados


Sustenta a recorrente que se dê como provado que a relação contratual estabelecida entre si e AA terminou no final de janeiro de 2024, por acordo entre ambos.


Quanto à data do termo da relação, já se referiu supra que não se podendo afirmar a data/mês concreto em que terminou a prestação da atividade é possível afirmar que foi pelo menos em fevereiro de 2024.


Já quanto à forma como terminou essa prestação de atividade – alegadamente por acordo das partes –, para além de não se retirar da prova produzida, não se lobriga que tal tenha qualquer relevância para a decisão da causa (cfr. artigo 130.º do Código do Trabalho).


Inexiste, pois, fundamento para a pretendido aditamento.


1.4. Em consequência, quanto à impugnação da matéria de facto: alteraram-se os factos provados sob os n.ºs 7, 9 e 14, nos termos referidos supra, mantendo-se quanto aos restantes.


2. Da qualificação ou não do contrato que vigorou entre a ré e AA como de trabalho


A 1.ª instância concluiu que o vínculo que se estabeleceu entre o prestador da atividade/AA e a ré se enquadra no âmbito de um contrato de trabalho.


Para tanto, considerou que se verificam as caraterísticas previstas nas alíneas a) a d) do artigo 12.º do Código do Trabalho, pelo que se presume a existência de contrato de trabalho, presunção essa que não se mostra ilidida, porquanto:


«-AA recebia ordens e orientações de trabalhador da ré quanto ao local onde se tinha de apresentar ao trabalho, horário de trabalho a praticar e vestuário que tinha de utilizar (13)


«-Recebia também ordens e orientações de supervisores, responsáveis dos CTT quanto à distribuição do trabalho e área geográfica de entregas (14).


-AA prestava ininterruptamente actividade para a ré, naqueles moldes, desde 10.07.2023 e pelo menos, até final de Fevereiro de 2024 (15).


-Embora pudesse faltar, quando entrava ao serviço deveria contactar a ré ou ser contactado por esta para registo da sua comparência e teria de avisar o trabalhador responsável da ré para que pudesse ser substituído ou o serviço pudesse ser redistribuído (27).


-AA prestava a actividade para a ré em exclusividade (30)».


E rematou assim: «[e]sta factualidade não permite ilidir a presunção de laboralidade, pois do cotejo de todos os indícios negociais internos invocados pelo autor e sua avaliação global entende o Tribunal que dos mesmos decorre provada a subordinação jurídica».


A ré/recorrente rebela-se contra tal entendimento, argumentando, ao fim e ao resto, que não se verifica a presunção de cotrato de trabalho constante do artigo 12.º do Código do Trabalho, e que ainda que assim se não entenda sempre a mesma se tem por ilidida.


A 1.ª instância fez já suficientes e adequadas considerações em torno da noção de contrato de trabalho, bem como da presunção de existência do mesmo, pelo que a fim de evitarmos ser tautológicos com o aí afirmado, diremos apenas que a subordinação jurídica do trabalhador ao empregador é o elemento essencialmente caracterizador e diferenciador da existência de um contrato de trabalho em relação a outros afins, como seja o contrato de prestação de serviço.


Mas como salienta Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, 22.ª edição, 2023, Almedina, passim a págs..147 a 149), «[a] determinação da subordinação não se pode, na maioria dos casos, fazer por mera subsunção nesse conceito. A subordinação é um conceito-tipo que se determina por um conjunto de características [] que podem surgir combinadas, nos casos concretos.


(…)


A circunstância de essa noção de subordinação não ter uma correspondência empírica precisa e só raramente permitir a subsunção, isto é, o estabelecimento de uma identidade clara entre a situação concreta e o tipo legalmente estabelecido, não exclui a possibilidade de se referenciarem características de facto – ou indícios – correspondentes à “normalidade” das relações de trabalho subordinado.


(…)


Deste modo, a determinação da subordinação, feita através daquilo que alguns caricaturam como uma «caça ao indício»[], não é configurável como um juízo subsuntivo ou de correspondência biunívoca, mas como um mero juízo de aproximação[] entre «dois modos de ser» analiticamente considerados: o da situação concreta e o modelo típico da subordinação.


E mais adiante (pág. 151) identifica o mesmo autor como indícios de subordinação a vinculação a horário de trabalho, a execução da prestação em local definido pelo empregador, a existência de controlo externo do modo de prestação, a obediência a ordens, a sujeição à disciplina da empresa, “tudo elementos retirados da situação de integração numa organização técnico-laboral predisposta e gerida por outrem”.


E para além destes indícios, acrescenta outros, como referentes à modalidade de retribuição (em função do tempo, em regra), à propriedade dos elementos de trabalho e à disponibilidade dos meios complementares da prestação.


Também indícios existem, de caráter formal e externo, como a observância dos regimes fiscais e da segurança social próprios do trabalho por conta de outrem, ou a denominação atribuída pelas partes ao contrato e o teor do clausulado.


Mas quanto a estes últimos, adverte o referido autor, “não merecem grande atendibilidade, pela circunstância de que se trata, de acordo com a experiência existente, de meio correntemente utilizados na dissimulação do contrato de trabalho”.


Anote-se, porém, que os indícios não deverão ser apreciados de forma atomística, antes deverão ser apreciados numa ponderação global, conjugados entre si, tendo sempre em vista o critério diferenciador e típico do contrato de trabalho, a subordinação jurídica.


O Código do Trabalho contempla alguns indícios/caraterísticas que conduzem à presunção da existência de contrato de trabalho.


Sob a epígrafe “Presunção de contrato de trabalho”, estipula o artigo 12.º:


«1-Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma actividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características:


a) actividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;


b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade;


c) O prestador da actividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma;


d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador da actividade, como contrapartida da mesma;


e) O prestador de actividade desempenhe funções de direcção ou chefia na estrutura orgânica da empresa».


Assim, àquele que invoca a existência de um contrato de trabalho compete provar, no mínimo, duas das caraterísticas referidos no artigo 12.º do Código do Trabalho para que beneficie da presunção de existência de contrato de trabalho.


Porém, sendo tal presunção ilidível – pois trata-se de uma presunção juris tantum (artigo 350.º do Código Civil), cabe à parte contrária demonstrar que, não obstante a verificação dessas caraterísticas, existem factos e contraindícios indicadores de autonomia, que permitam afastar aquela presunção.


No caso em apreço, com referência à alínea a) do n.º 1 do artigo 12.º, verifica-se que AA se apresentava no CDPG, local indicado pela ré, para prestar a atividade que consistia na entrega de encomendas.


Assim, ainda que a entrega se efetuasse através da realização do giro e em várias locais, o local onde ele se apresentava, por determinação da ré e para prestar a atividade, era no Centro de Distribuição Local de ....


Era, pois, um local determinado pela ré, pelo que se verifica a caraterística da alínea a) do n.º 1 do artigo do 12.º do Código do Trabalho.


E o mesmo se verifica quanto à alínea b) do mesmo número e artigo: os equipamentos e instrumentos de trabalho pertencerem à ré/beneficiária da atividade.


Com efeito, como se extrai da matéria de facto, AA para proceder à entrega das encomendas deslocava-se em carrinha que lhe foi fornecida pela ré, que abastecia mediante utilização de cartão fornecido pela ré, utilizava t-shirt com o logotipo “Delivery Exress”, designação comercial da ré e por ela fornecido, e um suporte de telemóvel também fornecido pela ré.


É certo que também utilizava um TPA dos CTT, obrigatório para registo e entrega das encomendas: porém, tal não afasta a conclusão de que a maioria e o mais importante instrumento de trabalho – a carrinha – terem sido postos à disposição de AA pela ré e, por consequência, a verificação da caraterística em causa.


Perante as referidas caraterísticas das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 12.º, tem-se desde logo por verificada a presunção de contrato de trabalho.


Mas há mais.


Da matéria de facto decorre que por determinação da ré, por regra, a atividade era prestada das 9.00 horas à 17.00 horas, de segundo a sexta-feira, o que vale por concluir pela verificação também da alínea c) do número e artigo em causa.


Como de modo assertivo se escreveu na sentença recorrida, «(…)muito embora ocasionalmente, AA se apresentasse no CDPG mais tarde que as 09:00 horas, certo é que neste caso, também como provado, poderia ter ou não encomendas para entregar (25) o que é demonstrativo da existência de um horário de início da actividade, como aliás, não poderia deixar de ser mesmo de acordo com as regras da experiência comum, atento o tipo de tarefa executada.


Efectivamente, caso o prestador pudesse, com toda a liberdade e sistematicamente, escolher o horário de início e até de termo de actividade, não se vê como poderia fazer entregas em período/horas escolhido pelos destinatários finais, nem como poderia dar por findo o giro juntos dos CTT quando os seus serviços encerram pelas 17:00 horas, nem porque razão constaria do contrato o “incumprimento de horários” como justa causa para a resolução do contrato.


Nesta precisa medida, embora também se prove que AA organizava a sua rota/giro diária(o), podendo acabar a actividade mais cedo que as 17 horas, caso tivesse terminado todas as entregas (26), tal não elimina a existência de um horário».


Finalmente, quanto à caraterística prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 12.º – pagamento, com determinada periodicidade, de uma quantia certa ao prestador de atividade, como contrapartida da mesma –, consta da matéria de facto que como contrapartida da atividade prestada, AA recebia mensalmente da ré um valor certo de pelo menos € 26,66/dia, correspondente a 8 horas de disponibilidade de segunda a sexta feira, acrescido de comissão a partir das 80 entregas realizadas no mês, e que essas quantias eram pagas, respetivamente, por transferências bancárias, mediante a emissão de recibo(s) verde(s).


Daqui decorre que havia uma quantia certa a AA por cada dia de atividade (pelo menos € 26,66/dia) e que essa quantia era paga mensalmente.


Assim, ele era pago pelo trabalho realizado, ainda que em função desse trabalho/número de encomendas entregue pudesse vir a ter um prémio/comissão.


Mas, segundo entendemos, o que releva da alínea é o pagamento de uma quantia certa, como contrapartida pela atividade desenvolvida, que no caso era de € 26,66/dia, ainda que também se pudesse verificar um prémio ou comissão quando atingisse determinado resulta de entregas.


Deste modo, embora aqui numa solução não totalmente isenta de dúvidas, concluiu-se que também se verifica a presunção constante da alínea d) do n.º 1 do artigo 12.º do Código do Trabalho.


Aqui chegados, a questão que se coloca consiste em saber se a ré ilidiu a presunção de laboralidade.


Assim não entendemos.


Expliquemos porquê.


Para ilidir a presunção, a ré parece arrimar-se em idênticos argumentos aos que invocou para afastar a verificação de presunção de laboralidade, maxime que AA não tinha horário de trabalho – apenas teria que prestar a atividade durante o período de funcionamento do CDPG –, que apenas recebia nos dias em que prestava o trabalho, pelo que a sua retribuição dependia do serviço prestado.


Como se escreveu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-09-2024 (Proc. n.º 12510/19.1T8SNT.L1.S1), «(…) não existe propriamente uma fronteira entre trabalho subordinado e trabalhos autónomos, mas antes uma “mancha”, uma “terra-de-ninguém” onde existem contratos que apresentam traços de autonomia e de dependência em diferentes variações de intensidade. Há muito que se entende que o método subsuntivo é frequentemente incapaz ou pelo menos insuficiente para a qualificação de tais relações contratuais, tendo-se desenvolvido, em alternativa, o método indiciário. Em suma, sem que se possa afirmar uma subsunção total de uma relação ao tipo legal de trabalho subordinado, uma relação contratual será, no entanto, qualificada como tal se apresentar traços ou características na sua execução que a aproximam mais do contrato de trabalho do que do contrato de prestação de serviços».


No caso em apreciação, resulta, a propósito e no essencial, da matéria de facto que:


- por determinação e em benefício da ré, AA encontrava-se no CDPG a desenvolver a atividade para aquela, procedendo e entregando encomendas na área geográfica determinada pelos CTT (n.ºs 5 e 6);


- por regra prestava a atividade das 9.00 horas às 17.00 horas, de segunda a sexta-feira, embora ocasionalmente se pudesse apresentar se pudesse apresentar depois das 9.00 horas, caso em que podia ou não ter encomendas para entregar, e podia também terminar a atividade antes das 17.00 horas, caso tivesse terminado todas as entregas (n.ºs 7, 25 e 26);


- AA recebeu ordens e orientações da ré quanto ao local onde se apresentar (CDPG), horário de trabalho e vestuário que tinha que utilizar, recebendo ordens e orientações de responsáveis dos CTT especificamente quanto à distribuição do trabalho e área geográfica de entregas (n.ºs 13 e 14);


- embora pudesse faltar, quando entrava ao serviço deveria contactar a ré ou ser contactado por esta para registo da sua comparência e teria de avisar o trabalhador responsável da ré para que pudesse ser substituído ou o serviço pudesse ser redistribuído (n.º 27);


- ré monitorizava as entregas feitas por AA pelos comprovativos de entrega que os CTT dispõem (n.º 29);


- AA recebia uma quantia certa por cada dia de trabalho prestado, correspondente a 8 horas de disponibilidade de segunda a sexta-feira, e a partir de terminado número de entregas mensais (80) recebia ainda uma comissão (n.º 8);


- Caso não procedesse a entregas, AA não recebia contrapartida monetária.


Ora, face a tal factualidade, verifica-se que AA se encontrava inserido na estrutura organizativa da ré, dela recebendo orientações e, como contrapartida da atividade, um valor certo por cada dia de trabalho prestado.


Tal significa, no dizer do artigo 11.º do Código do Trabalho, que AA se obrigou, mediante o recebimento de um valor certo, a prestar a atividade à ré, no âmbito da organização e sob a autoridade da mesma.


E embora pudesse faltar, devia avisar o trabalhador responsável da ré para que pudesse ser substituído ou o serviço pudesse ser redistribuído, assim como quando entrava ao serviço deveria contactar a ré ou ser contactado por esta para registo da sua comparência.


Desta factualidade decorre que não só a presunção de laboralidade não se mostra ilidida pela ré, como até, ressalvado o devido respeito por diferente entendimento, que a ponderação dos vários indícios aponta decisivamente para a qualificação do contrato como de trabalho.


Nesta sequência, e em jeito de conclusão, impõe-se reafirmar que a factualidade provada e, com ela, os indícios de existência de contrato de trabalho, apreciados numa ponderação global, conduzem, forçosamente à conclusão da existência de um contrato de trabalho entre a ré e AA, com início em10 de julho de 2023.


Improcedem, por consequência, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso, sendo, pois, de confirmar a decisão recorrida.


3. Não obstante a recorrente ter obtido parcial êxito na alteração da matéria de facto, ficou vencida quanto à questão essencial objeto do recurso – da existência ou não de contrato de trabalho –, pelo que deve ser condenada nas custas respetivas (artigo 527.º do Código de Processo Civil).


V. Decisão


Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em:


1. alterar a matéria de facto, nos termos referidos supra;


2. quanto ao mais, negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.


Custas pela ré/recorrente.


Évora, 30 de janeiro de 2025


João Luís Nunes (relator)


Paula do Paço


Emília Ramos Costa

1. Relator: João Nunes; Adjuntas: (1) Paula do Paço, (2) Emília Ramos Costa.↩︎