1. A simples entrega do código de acesso a determinada certidão permanente (v. g., do registo comercial) não se equipara ao envio e junção (do teor dessa certidão) por via eletrónica ou em suporte de papel.
2. Se a mera indicação ou entrega dos “códigos de acesso”, para visualização e obtenção de certidão, ocorreu em audiência de julgamento, antes das alegações, poderá ocorrer violação do princípio da cooperação (art.º 7º do CPC), sobretudo, se indiciada a possibilidade da anterior junção por via eletrónica.
3. Não obstante, o juiz sempre poderá/deverá lançar mão dos poderes-deveres dos art.ºs 7º, 411º, 417º, 436º e 607º, n.º 1, do CPC.
(Sumário elaborado pelo Relator)
*
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
I. Na audiência de julgamento, de 23.4.2024, realizada nos autos de embargos de executado deduzidos por A..., Lda.[1], sendo exequente B... - Sociedade de Garantia Mútua, S. A., finda a produção da prova testemunhal, a executada requereu “a junção da certidão referente à C..., S. A., atual Banco 1..., S. A., com o NIF ...55 e código de acesso ...49, quanto à sociedade B... com o NIF ...99 e código de acesso ...65”, dizendo ainda que “a junção destes documentos afigura-se imprescindível para aferir da genuinidade e da eficácia do contrato junto ao DOC. 8”.
A embargada/exequente opôs-se.
De seguida, a Mm.ª Juíza do Tribunal a quo proferiu o seguinte despacho:
«A embargante solicitou que o Tribunal acedesse através da disponibilização de códigos de acesso a dois documentos específicos sobre a constituição das sociedades B... e C....
Note-se que os documentos não foram apresentados hoje, aqui nesta sessão de audiência final, o que foi apresentado foi, ou indicado, o respetivo código de acesso para que o Tribunal acedesse e imprimisse as duas certidões que, friso, não foram aqui juntas.
Ora bem, em primeiro lugar, não cabe ao Tribunal aceder, através do código de acesso disponibilizado, aos documentos ora mencionados, que não foram pela parte juntos.
Incumbia à parte, aqui embargante, juntar, querendo, os documentos que faz referência e solicita que o Tribunal os junte ao processo; não me parece que esta seja a correta prática, nem que se possa dizer que a parte hoje aqui apresentou a documentação que no seu entendimento seria relevante para a boa decisão da causa.
Ponto número dois, não estando aqui qualquer documento junto, cumpre-me ainda apreciar da relevância ou não da sua alegada junção no momento atual, ou seja, no final da produção de prova e já numa fase anterior às alegações finais.
Dispõe o artigo 423º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa (...) devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
No caso, a embargante referencia que acha necessária a junção das certidões permanentes da sociedade B... e da C...., mas não indica em concreto, de forma específica, qual o facto que pretende demonstrar ou qual o facto que pretende fazer contraprova, por referência à contestação apresentada pela embargada.
Desta forma, não nos parece que estejam aqui reunidos os pressupostos mínimos, para considerar, (...) por um lado, que os documentos existem e foram apresentados, e que, por outro, a sua pertinência seja aqui relevante para a boa decisão da causa.
De resto, temos ainda a dizer que, nos factos assentes, aquando do despacho saneador proferido, consta diversa materialidade, nomeadamente no ponto 24, ponto 25, ponto 26 e ponto 27, que foram dados como demonstrados com base na documentação junto ao processo, nomeadamente, pela embargada, e que não foram objeto de reclamação. O que foi sim impugnado foi a genuinidade do documento 8 e também dos documentos 9, 10 e 12, cuja produção de prova já foi realizada nesta sessão e na anterior e, deste modo, não se nos afigura que atualmente esse facto novo respeitante à falta de poderes da Dra. AA, cuja assinatura consta nos documentos 6 e 7, que lhe foram exibidos, possa ser aqui trazido e analisado.
A este propósito relembro o que nos diz as normas dos artigos 444º e 445º, n.º 2, do Código de Processo Civil, na parte em que refere que com a impugnação da genuinidade do documento é apresentado requerimento de produção de prova (o que foi feito), assim como, posteriormente, aquando da notificação dessa impugnação, a parte contrária também poderá apresentar a sua prova a esse respeito.
Tal prazo há muito foi ultrapassado e, neste particular conspecto, não se nos afigura, de todo, que exista fundamento legal para, no momento presente, ser admitida a junção de mais prova (documental), que aliás, não foi junta, como já fiz referência acima, mas apenas foi disponibilizado o código de acesso de dois documentos, que poderiam ter sido apresentados pela embargante e não foram.
Por outro lado, nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 423º do Código de Processo Civil, podia ainda a parte juntar tais documentos até 20 dias antes da data em que se realizou a primeira sessão de julgamento, o que não foi feito, assim como tal junção também não se afigura pertinente com base em alguma contradição, que não foi exatamente apontada pela embargante no que concerne aos depoimentos já prestados pelo Dr. BB e também pelo Dr. CC e ainda também hoje, nesta sessão, pela Dra. AA.
Nessa medida, não existindo contradições, que não sabemos quais são porque, desde logo, não foram apontadas em concreto, também julgo que não há pertinência no pedido efetuado, nos termos do n.º 3 do artigo 423º do Código de Processo Civil.
Assumindo-se como questões novas, não existindo relevância na sua eventual junção e não tendo sido anexo hoje qualquer documento, mas apenas o respetivo código de acesso, não se avaliando, em suma, que uma tal documentação seja ou venha a ser necessária para a boa decisão da causa, (...) ao abrigo do disposto nos artigos 423º, n.ºs 1 a 3 e 444º e 445º e ainda nos artigos 6º e 7º, do Código de Processo Civil, indefiro o solicitado pela embargante.»
Dizendo-se inconformada, a executada/embargante apelou formulando as seguintes conclusões:
1ª - A audiência de julgamento iniciou-se em 16.4.2024, e encontra-se documentada na gravação digital, efetuada na aplicação Habilus, entre as 09:55:00 horas e as 13:00:00 horas.
Nesta audiência, entre outras, depuseram como testemunhas BB e CC.
Quer nesta 1ª sessão da audiência de julgamento, quer naquela outra ocorrida no dia 23.4.2024, estiveram presentes a mesma Magistrada Judicial e os mesmos mandatários das partes.
2ª - No despacho saneador, datado de 22.10.2023, foi decidido julgar um incidente de falsidade nos termos seguintes: « »[2].
Tal incidente de falsidade, suscitado pela embargante, na impugnação de documentos juntos pela embargada com a sua contestação, visava particularmente o doc. 8 junto com tal articulado da embargada, a saber, a cópia de um contrato assinado em 30.8.2016 e outorgado pelos Presidentes do Conselho de Administração de duas sociedades: o da embargada B... e o de uma terceira entidade, a C..., S. A..
3ª - A cópia de tal contrato, foi junta aos presentes autos pela embargada, para tentar justificar a sua legitimidade para agir em nome da C..., S. A., nos autos principais, pois, a embargada havia já sido ressarcida pela própria C..., SA., em MAIO/2011, de grande parte do valor inscrito nos títulos executivos, conforme consta dos FACTOS ASSENTES com o despacho saneador, de 22.10.2023, SOB OS NÚMEROS 25. e 27.:«»[3].
4ª - A embargada, tendo perdido a legitimidade para cobrar os valores que inscreveu abusivamente nos títulos dados à execução, veio juntar tal cópia de contrato (cf. doc. 8 junto com a contestação) tentando por esta via ressuscitar a defunta!
5ª - Os termos em que o incidente de falsidade do contrato (aludido doc. 8) foi suscitado, constam do requerimento de 31.3.2023, mais precisamente no art.º 43º e subsequentes.
6ª - Donde resulta que foi requerida a identificação e a notificação dos 4 (quatro) outorgantes no contrato em apreço, nomeadamente dos dois Presidentes do Conselho de Administração das duas sociedades envolvidas em tal documento, que a aqui embargante julgava fundamentais para esclarecimento da veracidade do mesmo.
7ª - No despacho saneador, como vimos, a Mm.ª Juiz a quo ordenou a notificação dos 4 outorgantes do contrato. Todavia, inadvertidamente, em data anterior ao efetivo início do julgamento, reduziu o rol de testemunhas, desconvocando dois dos outorgantes de tal documento, nomeadamente o Presidente do Conselho de Administração e Presidente da Comissão Executiva da embargada, respetivamente o Dr. DD e o Dr. EE, cingindo a prova testemunhal, neste incidente de falsidade, apenas aos dois outorgantes que representavam a C..., SA., concretamente o Dr. BB e o Dr. CC.
8ª - O depoimento destas duas testemunhas, prestado no dia 16.4.2024, no que é relevante para o objeto do presente recurso, é o que se passa a transcrever: - 1) BB (que assina o Contrato entre a B... e a C... SA na qualidade de Presidente do Conselho de Administração da C... SA, constante do DOC 8 da contestação):[4] - 2) CC (que assina o Contrato entre a B... e a C... SA na qualidade de Procurador da C... SA, constante do DOC. 8 da contestação): [5].
9ª - Como se pode constatar pelos depoimentos atrás transcritos, ambas as testemunhas asseveraram perante o Tribunal recorrido que, à data de assinatura do contrato, 30.8.2016, o Presidente do Conselho de Administração da Embargada era o Sr. DD, que assinou o contrato investido desse pretenso poder.
Aliás, a testemunha CC chega mesmo a afirmar que tal facto seria facilmente comprovável, consultando a conservatória do registo comercial. Com efeito, após ter sido instado pelo mandatário da embargante a confirmar quando é que o Sr. DD tinha sido investido Presidente do Conselho de Administração da B..., responde perentoriamente que:[6]
Ora, atendendo à impossibilidade de inquirir o Sr. DD, oportunamente desconvocado pelo Tribunal, bem assim como às inexatidões temporais e fácticas, detetadas nos depoimentos das preditas testemunhas, a embargante, seguindo a sugestão de tal testemunha e aproveitando o tempo que decorreu entre as duas sessões da audiência de julgamento (sete dias), encetou de mote próprio diligências para obtenção das duas certidões permanentes, relativas às duas intervenientes no citado contrato, junto de uma conservatória do registo comercial, que obteve no dia 22.4.2024, cuja junção foi requerida na sessão de 23.4.2024, através da indicação dos respetivos códigos de cada uma das duas certidões permanentes, aqui dadas por integralmente reproduzidas.
Estes dois documentos, com valor de certidão, portanto documentos autênticos, cuja obtenção resultou da necessidade de aferir a veracidade das afirmações proferidas pelas duas testemunhas na audiência de 16.4.2024, no que respeita aos quatro outorgantes do contrato, suas funções e poderes nas sociedades na data concreta de assinatura do contrato, 30.8.2016, bem como da impossibilidade de inquirir as outras duas testemunhas que a embargante sempre pretendeu inquirir e que o Tribunal a quo vedou ao arrepio do que decidira no despacho saneador.
Ora, da análise do teor de tais certidões permanentes, e da linha temporal, verifica-se desde logo que, à data do contrato posto em xeque, i. é, em 30.8.2016, o Presidente do Conselho de Administração da B..., SGM, não era o DD, mas sim o BB.
10ª - Por fim, salienta-se que, compulsados os apensos A e B dos presentes autos, verifica-se que a declaração da invalidade, ineficácia e/ou mesmo inexistência do famigerado contrato, põe em crise o que foi decidido nos citados apensos.
E estamos convictos de que, na génese da recusa da Mm.ª Juiz a quo, em sequer ver tais certidões permanentes, para aquilatar da sua pertinência, esteve tal noção.
Na linha, de resto, a todos os entraves que foram colocados à inquirição das preditas testemunhas, tendo o Tribunal a quo, aprioristicamente, e sem que estivesse munido de ferramentas para tal, ou cuidado de as arranjar, tomado como boas todas as declarações daquelas testemunhas.
11ª - Os considerandos que precedem terão fatalmente de ser levados em linha de conta na análise do presente recurso porquanto, à luz do princípio da aquisição processual das provas (cf. art.º 413º do CPC), não deveria o Tribunal a quo ter feito tábua rasa do que se passara na 1ª sessão de julgamento, de 16.4.2024.
Segundo tal princípio, o Tribunal para formar a sua convicção acerca da prova - [7].
Por conseguinte, quando a embargante refere no seu requerimento que:[8]
O Tribunal a quo não pode, não deve ignorar, como sucedeu, no despacho recorrido, o que se passou na produção de prova realizada no dia 16.4.2024, atrás transcrita realizada 7 (sete) dias antes, para a qual se remeteu naturalmente no requerimento sub judicio da embargante.
A Mm.ª Juiz a quo, que se recusou a ver as certidões permanentes, cuja junção foi requerida, não pode assim concluir que não sabe quais as contradições que existem, e que não sabe quais são.
Foram duas horas e meia de inquirições (as permitidas) a duas singelas testemunhas.
12ª - Quanto ao primeiro segmento decisório do despacho recorrido, constituído por quatro parágrafos,
Ou seja, pela não junção das duas certidões permanentes em formato de papel, mas apenas em formato digital, através da indicação dos respetivos códigos de acesso.
Tal segmento decisório não foi suportado por qualquer normativo legal e, salvo o devido respeito por opinião diversa, é manifesto que não assiste razão ao Tribunal a quo.
Senão vejamos,
O art.º 368º do C. Civil dispõe que as reproduções fotográficas ou cinematográficas, os registos fonográficos e, de um modo geral, quaisquer outras reproduções mecânicas de factos ou de coisas fazem prova plena dos factos ou das coisas que representam se a parte contra quem os documentos são apresentados não impugnar a sua exatidão.
O DL n.º 116/2008, de 04.7 aprovando medidas de simplificação, desmaterialização e desformalização de atos e processos na área do registo predial e atos notariais conexos, criou condições para a promoção de atos de registo predial pela internet, bem como a existência de uma certidão permanente, disponível em sítio da internet.
Com a alteração introduzida pelo DL n.º 116/2008, o art.º 110º, n.º 1, do C. Reg. Predial passou a dispor que o registo se prova por meio de certidões e que as mesmas podem ser disponibilizadas em suporte eletrónico.
O mesmo entendimento é válido, naturalmente, para as certidões emitidas pelos serviços do Registo Comercial, como decorre do disposto no art.º 75º, n.ºs 1, 3, 4 e 5, do C. Reg. Comercial.
Com a aprovação do Programa Simplex foram adotadas medidas de desburocratização com a simplificação e eliminação de atos e procedimentos registrais e notariais, onde se incluem, entre outros, a eliminação da obrigatoriedade de celebração de escrituras públicas, a promoção on-line de atos de registo comercial e a criação da certidão permanente.
É neste contexto, e com a criação simultânea desses regimes, que o legislador estatuiu, como forma de garantia jurídica, que o registo se prova, para todos os efeitos legais e perante qualquer autoridade pública ou entidade privada, com a disponibilização da informação constante da certidão em sítio da Internet.
Assim, a entrega a qualquer autoridade pública ou entidade privada do código de acesso à certidão permanente equivale, por imperativo legal e para todos os efeitos, à entrega de uma certidão do registo comercial.
Tendo a embargante fornecido ao Tribunal a quo o código de acesso ao respetivo portal de tais certidões permanentes - o código de acesso da Certidão Eletrónica da B... SGM (NIF ...99) é ...65, e o código de acesso da Certidão Eletrónica da C..., S.A., atual Banco 1..., S.A. (NIF ...55) é ...49, conforme está vertido na ata de 23.4.2024 e na gravação atrás identificadas -
Estava a embargante desde logo dispensada de juntar aos autos as certidões em suporte de papel, não podendo, por conseguinte, o Tribunal exigi-la.
Não tendo essa apreciação sido feita pelo Tribunal a quo com o fundamento de que tais certidões permanentes deveriam ter sido juntas em papel operou-se uma violação da confiança que as partes devem depositar no tribunal e uma nítida violação do art.º 6º da CEDH e do art.º 20º, n.º 4, da CRP.
E, sem conceder, insistindo o Tribunal a quo nesse entendimento anacrónico, de pretender as duas certidões permanentes em papel, obrigando a parte já onerada com os encargos com a emissão de tais certidões a um dispêndio adicional com as respetivas impressões, muito pouco ecológico,
Deveria o Tribunal ter determinado, pelo menos, nos termos do art.º 265º, n.º 3, do CPC[9], as diligências necessárias ao apuramento da verdade e justa composição do litígio, convidando a parte a apresentar as respetivas certidões em formato de papel.
13ª - Quanto ao segundo segmento decisório do despacho recorrido, constituído por dez parágrafos, importa desde já questionar, como é que o Tribunal a quo que continua a insistir no entendimento de que (...)[10] como é que logo em seguida conclui que (...)[11].
Ou seja, desde já por aqui, teria de ser reaberta a audiência de julgamento para que tais certidões permanentes fossem convenientemente examinadas e aquilatada então a pertinência de tal junção,
Certidões permanentes estas que a embargada estranhamente não juntou, apesar de ter junto a famigerada cópia do contrato, que nem assinaturas reconhecidas continha.
Também resulta incompreensível como é que a requerida junção de tais certidões permanentes, se destinava a provar factos novos!?
As testemunhas atrás indicadas faltaram à verdade ao Tribunal a quo, segundo o que atestam as certidões permanentes, sete dias antes de formulado o requerimento sub judicio, sobre quem era o Presidente do Conselho de Administração da B..., SGM.
A amplitude do incidente de falsidade feita pela embargante, como vimos, era a que constava do seu requerimento de 31.3.2023, nos art.ºs 43º e ss., com respaldo no despacho saneador.
Atente-se, em particular, no teor dos art.ºs 44º (cf. 444º e ss. do CPC), 45º (cf. 446º e ss. do CPC) e 46º, de tal requerimento, no que para aqui importa.
Por conseguinte, o despacho recorrido viola também o disposto no art.º 410º do CPC, que determina que a instrução tem por objeto os temas da prova enunciados.
Concomitantemente, durante todo o julgamento e o despacho recorrido prolatado no dia 23.4.2024 é o espelho disso, demonstra que existiu uma flagrante violação do princípio do inquisitório (cf. art.º 411º do CPC), já que logo na sessão de 16.4.2024, perante o teor do depoimento das duas testemunhas atrás parcialmente transcrito, incumbia ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe era lícito conhecer.
E o Tribunal a quo não só não o fez em 16.4.2024, como se opôs a que uma das partes o fizesse na sessão de 23 de abril, através do despacho recorrido.
Neste sentido, veja-se igualmente o que se dispõe no art.º 436º do CPC quanto à requisição de documentos:[12]
E também incumpriu o Tribunal a quo na utilização do disposto nos art.ºs 498º, n.º 2 e 526º do CPC no que toca à inquirição oficiosa das duas testemunhas que retirou do julgamento intervenientes no famigerado contrato.
14ª - Por fim, quanto à ilisão da autenticidade ou da força probatória de documento dispõe o art.º 446º do CPC que: «»[13].
Ou seja, atento o depoimento das duas testemunhas atrás transcrito, ocorrido em 16.4.2024, e perante as duas certidões permanentes pedidas em 22.4.2024, que conflituavam com o teor do contrato junto pela embargada, a embargante ao requerer a respetiva junção na sessão de 23.4.2024, não excedeu o prazo de 10 dias contemplado no citado normativo, para requerer a respetiva junção.
Acresce que também o disposto no art.º 423º, n.º 3 do CPC não impede tal junção porquanto ao prescrever que: «»[14].
Com efeito, as divergências nos depoimentos das testemunhas que precedem na sessão de 16.4.2024 é que tornaram imprescindível a junção de tais certidões, ocorrida em prazo inferior a 10 dias, e, assim sendo, tal junção deverá ser julgada igualmente tempestiva.
15ª - Termos em que deve ser revogado o despacho oral recorrido, vertido em ata, referente à audiência de julgamento realizada em 23.4.2024, e substituído por outro que admita a junção das duas certidões permanentes nos termos atrás melhor fundamentados.
Não houve resposta.
Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objeto do recurso[15], importa apreciar e decidir, principalmente, sobre a (in)suficiência da indicação dos pretensos códigos acesso para obtenção da invocada prova documental.
- Atento o teor dos articulados, a impugnação da genuinidade do contrato vertido no “doc. 8” apresentado pela embargada/exequente na contestação e os depoimentos das testemunhas, parece-nos importante que conste dos autos “um documento de acesso público, constam dos documentos, que não trouxe em papel, trouxe o respetivo código de acesso de ambas as sociedades, com todas as inscrições de uma e de outra” (sic);
- Por concluir ter “força de certidão”, requereu “a junção da certidão referente à C..., S. A., atual Banco 1..., S. A., com o NIF ...55 e código de acesso ...49, quanto à sociedade B... com o NIF ...99 e código de acesso ...65”, junção de documentos tida como “imprescindível para aferir da genuinidade e da eficácia do contrato junto ao doc. 8”;
- A presente junção justifica-se quer porque quem apresentou o contrato não apresentou os códigos de acesso, quer em face dos depoimentos das testemunhas.
2) Decorre da mesma ata a seguinte posição da exequente/embargada:
- A executada/embargante não indica qualquer facto por si alegado que pretenda ver provado através da junção aos autos dos documentos, nem indica qualquer facto alegado pela exequente que pretenda que não fique provado, através da junção aos autos destes documentos, junção que sempre deveria ter lugar nos termos do artigo 423º, do CPC.
- Nenhum dos depoimentos das testemunhas pode tornar relevante a junção aos autos dos documentos das certidões permanentes do registo comercial da C.... e da B... e a executada nunca pôs em causa a suposta falta de poderes de quem outorgou o contrato junto como documento n.º 8. Pôs em causa a genuinidade dessas assinaturas, mas não pôs em causa a suposta falta de poderes de quem os emitiu, pelo que não pode em sede de audiência de julgamento vir apresentar um argumento diferente daquele que havia suscitado anteriormente.
- Ao parecer querer por em causa a genuinidade dos documentos 6, 7 e 8, em que baseia a sua exceção de preenchimento abusivo, a executada parece estar a desenvolver todos os esforços para que não fique provado algo que já está provado.
- Por não ser relevante para prova ou contraprova de qualquer facto e por ser tardia, irrelevante (uma vez que ninguém suscitou a questão da falta de poderes das assinaturas administradores e procuradores de qualquer das sociedades) e envolver uma questão nova, deve o requerimento da executada ser indeferido.
2. Cumpre apreciar e decidir.
Desde há muito que se afirma o poder de direção do juiz no período instrutório da ação.
Assim, por exemplo, na Reforma de 1926 (logo aí ficou estabelecido que o juiz tinha a faculdade de ordenar oficiosamente as diligências e atos que entendesse necessários para a descoberta da verdade) e, depois, em todas as subsequentes codificações e enquadramentos adjetivos (máxime, CPC de 1939, CPC de 1961 e CPC de 2013).
Instaurado o processo, tomando as partes a “barca da justiça”, estas “não podem fazer a bordo o que lhes apetecer, ficam necessariamente submetidas à direção do capitão do navio, à disciplina e ao comando que ele haja de impor, a bem do interesse comum”[16], atento o regime jurídico aplicável.
3. Salvo o devido respeito por entendimento contrário, afigura-se que, no caso em análise, a recorrente olvida, de algum modo, aquele princípio básico, além de que pretende alijar o que, nos termos da lei, lhe incumbe fazer, em sede instrutória, em matéria de apresentação da prova por documentos (cf., v. g., art.º 423º do CPC e art.ºs 444º e seguintes do mesmo diploma).
Acresce que não de poderá/deverá equiparar, ou confundir, a mera indicação de quaisquer pretensos “códigos de acesso” para visualização e obtenção de determinado documento existente em registo informático de entidades com funções de interesse público, com a efetiva junção do mesmo documento por via eletrónica ao respetivo processo judicial e/ou a sua junção em papel, ao processo físico em causa, no decurso de determinada diligência processual.
Parece-nos, assim, que a questão é bem simples.
4. Reafirmando e desenvolvendo a argumentação dita em II. 1. 1), supra, refere-se na alegação de recurso:
- A embargante encetou de mote próprio diligências para obtenção das duas certidões permanentes, junto de uma conservatória do registo comercial, que obteve no dia 22.4.2024, cuja junção foi requerida na sessão de 23.4.2024, através da indicação dos respetivos códigos de cada uma das duas certidões permanentes, com valor de certidão - cf. “conclusão 9ª”, ponto I., supra.
- A entrega a qualquer autoridade do código de acesso à certidão permanente equivale, por imperativo legal e para todos os efeitos, à entrega de uma certidão do registo comercial, pelo que estava a embargante dispensada de juntar aos autos as certidões em suporte de papel.
Insistindo o Tribunal a quo no entendimento de pretender as duas certidões permanentes em papel, deveria ter determinado as diligências necessárias ao apuramento da verdade e justa composição do litígio, convidando a parte a apresentar as respetivas certidões em formato de papel - cf. “12ª”, ponto I., supra.
- Teria de ser reaberta a audiência de julgamento para que tais certidões permanentes fossem convenientemente examinadas e aquilatada então a pertinência de tal junção.
Existiu uma flagrante violação do princípio do inquisitório (art.º 411º do CPC), já que, perante o teor do depoimento das testemunhas, incumbia ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe era lícito conhecer.
E o Tribunal a quo não só não o fez em 16.4.2024, como se opôs a que uma das partes o fizesse na sessão de 23 de abril, através do despacho recorrido - cf. “13ª”, ponto I., supra.
- As divergências nos depoimentos das testemunhas que precedem na sessão de 16.4.2024 é que tornaram imprescindível a junção de tais certidões - cf. “14ª”, ponto I., supra.
5. A executada/recorrente diz pretender a junção das mencionadas duas certidões permanentes, mas limitou-se a indicar aqueles que serão os “códigos de acesso” para a sua visualização e obtenção.
Afirma que a entrega a qualquer autoridade do código de acesso à certidão permanente equivale, por “imperativo legal” e para todos os efeitos, à entrega de uma certidão do registo comercial, pelo que estava dispensada de juntar aos autos as certidões em suporte de papel; acrescentou que, insistindo o Tribunal a quo no entendimento de pretender as duas certidões permanentes em papel, deveria ter determinado as diligências necessárias ao apuramento da verdade e justa composição do litígio, convidando a parte a apresentar as respetivas certidões em formato de papel - consequentemente, teria de ser reaberta a audiência de julgamento para que tais certidões permanentes fossem convenientemente examinadas e aquilatada então a pertinência da junção.
6. Resultando dos elementos disponíveis que a executada/recorrente terá tido a possibilidade de introduzir, nos autos, por via eletrónica (tramitação eletrónica dos processos), a certidão que pretendia juntar, não se entende por que razão o não fez.
De igual modo, também não se vê justificada a não obtenção dos documentos em causa em papel, para eventual junção na sessão seguinte da audiência de julgamento.
De resto, com aquele seu requerimento (e, agora, o presente recurso), acabou por perturbar o curso/marcha da audiência e do processo, bem sabendo que lhe cabia, sim, cooperar na condução e intervenção no processo, como se prevê nos art.ºs 7º e 8º do CPC.
7. Os princípios que norteiam o processo civil - v. g., autorresponsabilidade das partes, igualdade das partes, economia processual e celeridade processual - e o que nos é dado conhecer, neste recurso, apontam, claramente, para o dever de a executada ter assumido e demonstrado uma maior prontidão e colaboração, ao seu alcance, pois, se assim o entendesse, poderia implementar os procedimentos previstos nos art.ºs 77º, 78º-A, n.º 1 e 78º-F, n.º 1, do Código do Registo Comercial - o que não fez -, disponibilizando, por exemplo, a “informação constante da certidão em sítio da Internet” (na expressão utilizada pela recorrente).
8. Por conseguinte, no descrito circunstancialismo e atendendo, ainda, ao preceituado, nomeadamente, nos art.ºs 4º, n.ºs 1 e 2[17], 5º, 28º, n.º 1[18] da Portaria n.º 280/2013, de 26.8 (que regulamenta a tramitação eletrónica dos processos nos tribunais judiciais - na sua redação atual), 10º, n.º 1, 11º e 12º da Portaria n.º 121/2021, de 09.6 (que regulamenta o arquivo eletrónico de documentos lavrados por notário e de outros documentos arquivados nos cartórios, a certidão notarial permanente e a participação de atos por via eletrónica à Conservatória dos Registos Centrais) e 73º, 75º[19], 77º, n.ºs 1 e 3[20] e 78º-H, n.º 1, alínea a) e 115º, do Código do Registo Comercial (aprovado pelo DL n.º 403/86, de 03.12), não será de concluir que “a entrega a qualquer autoridade pública ou entidade privada do código de acesso à certidão permanente equivale, por imperativo legal e para todos os efeitos, à entrega de uma certidão do registo comercial”, ou que “estava a embargante desde logo dispensada de juntar aos autos as certidões em suporte de papel”.
9. Ademais, encontrando-se a audiência de julgamento na sua fase final e relativamente ao se, quando e como da (demais) intervenção do Tribunal a quo, a Mm.ª Juíza, ao apreciar e decidir as questões suscitadas nos autos (incidentes e mérito dos embargos), se necessário ou conveniente, sempre poderá/deverá lançar mão dos poderes-deveres dos art.ºs 7º, 411º[21], 417º, 436º e 607º, n.º 1, do CPC.
10. Soçobram, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso, não se mostrando violadas quaisquer disposições legais [nomeadamente, os art.ºs 368º do CC, 110º, n.º 1[22], do Código do Registo Predial (aprovado pelo DL n.º 224/84, de 06.7), 75º do Código do Registo Comercial, 20º, n.º 4, da CRP e 6º, 411º, 413º, 423º e 436º do CPC].
Custas pela executada/apelante.
[1] No introito da alegação de recurso, a embargante surge identificada como “D..., Unipessoal, Lda.”.
[2] O texto em causa, mera colagem, referia a admissão da prova testemunhal indicada pelas partes e, relativamente ao incidente de falsidade de documentos, determinava a inquirição das “testemunhas” mencionadas na “conclusão” anterior.
[3] O texto correspondente a tais factos foi reproduzido por simples colagem.
[4] O texto correspondente foi reproduzido na “alegação” e nas “conclusões” do recurso por simples colagem.
[5] Idem.
[6] Idem.
[7] Idem.
[8] Idem.
[9] Existe lapso manifesto na indicação deste normativo - cf. art.º 411º do CPC de 2013.
[10] O texto correspondente foi reproduzido na “alegação” e nas “conclusões” do recurso por simples colagem.
[11] Idem.
[12] Idem.
[13] Idem.
[14] Idem.
[15] Admitido a subir imediatamente, com efeito meramente devolutivo e em separado (art.ºs 627, 631, 637, 638, 639, 852, 853, n.ºs 2 e 4, 644, n.º 2, alíneas d) e h), do CPC).
[16] Vide, designadamente, J. Alberto dos Réis, Comentário ao CPC, Vol. 3º, Coimbra Editora, 1946, págs. 8 e seguintes e Antunes Varela, A Reforma do Processo Civil Português, RLJ, 130º, pág. 130 e nota (66).
[17] Art.º que estabelece: «1 - A apresentação de peças processuais e documentos por transmissão eletrónica de dados dispensa a remessa dos respetivos originais, duplicados e cópias, nos termos da lei. 2 - O disposto no n.º 1 não prejudica: a) O dever de exibição das peças processuais em suporte de papel e dos originais dos documentos juntos pelas partes por transmissão eletrónica de dados, sempre que o magistrado o determine, designadamente, quando: i) Duvidar da autenticidade ou genuinidade das peças ou dos documentos; ii) For necessário realizar perícia à letra ou assinatura dos documentos; (...)»
[18] Que estipula: «Do suporte físico do processo apenas devem constar as peças, os autos e os termos processuais que, sendo relevantes para a decisão material da causa, sejam indicados pelo magistrado competente, em despacho fundamentado em cada processo (...).»
[19] Que preceitua: 1 - O registo prova-se por meio de certidão. 2 - A validade das certidões de registo é de seis meses. 3 - As certidões podem ser disponibilizadas em suporte eletrónico, em termos a definir por portaria do Ministro da Justiça. 4 - As certidões disponibilizadas nos termos do número anterior fazem prova para todos os efeitos legais e perante qualquer autoridade pública ou entidade privada, nos mesmos termos da correspondente versão em suporte de papel. 5 - Faz igualmente prova para todos os efeitos legais e perante qualquer autoridade pública ou entidade privada a disponibilização da informação constante da certidão em sítio da Internet, em termos a definir por portaria do Ministro da Justiça. (...).»
[20] Onde se prevê: «1 - As certidões podem ser requisitadas verbalmente ou por escrito, em termos a definir por portaria do Ministro da Justiça. 3 - As requisições de certidões podem ser entregues na conservatória ou enviadas pelo correio ou ainda por via eletrónica, nos termos previstos em diploma próprio.»
[21] Sobre o âmbito da aplicação deste art.º, veja-se, por exemplo, acórdão da RC (mesmo coletivo) de 26.10.2021-processo 852/20.8T8FIG-A.C1 [assim sumariado: «1. Desde a fase da instrução do processo (art.ºs 410º e seguintes do CPC) até à sentença (art.º 607º, n.º 1 do CPC), o juiz poderá/deverá realizar ou ordenar todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer (art.º 411º do CPC). 2. Salvaguardado o dever de imparcialidade (equidistância), tal poder-dever, inerente ao indeclinável compromisso do juiz com a verdade material, emerge e justifica-se independentemente da vontade das partes na realização das diligências/produção de meios de prova (e da tempestividade dessa iniciativa). 3. Ponderados os princípios do dispositivo, do inquisitório e da auto-responsabilidade das partes, situações de conduta grosseira e indesculpavelmente negligente da parte (v. g., na junção tempestiva dos documentos) poderão ditar a inobservância daquela regra.»], publicado no “site” da dgsi.
[22] Que assim reza: «O registo prova-se por meio de certidões.»
Preveem os n.ºs 3 e 4 do mesmo art.º: «3 - As certidões podem ser disponibilizadas em suporte eletrónico, nos termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça. 4 - As certidões disponibilizadas nos termos do número anterior fazem prova para todos os efeitos legais e perante qualquer autoridade pública ou entidade privada, nos mesmos termos da correspondente versão em suporte de papel.»