CONDUÇÃO DE VEÍCULO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
TAXA DE ÁLCOOL NO SANGUE
RISCO DE ACIDENTE
MEDIDA DA PENA
Sumário

I. A aplicação das penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. Dentro da moldura legal da pena, o máximo desta será dado pela medida da culpa do agente; sendo as exigências de prevenção geral que traçam o seu mínimo; determinando-se o seu quantum exato mediante as necessidades de prevenção especial.
II. Vários estudos vêm demostrando que o risco de acidente rodoviário aumenta exponencialmente com a quantidade de álcool consumido, como sucede com Blomberg et al. (2005), indicando que «comparativamente com condutores com TAS = 0,0 g/L, condutores com TAS de 0,50 g/L têm 1,4 vezes mais risco de ter um acidente, com TAS de 0,80 g/L o risco acrescido é de 2,7 vezes, com TAS de 1,20 g/L o risco acrescido é de 8,9 vezes e com TAS de 1,80 g/L o risco aumenta para 51 vezes.»
III. Sendo «o risco de morrer na sequência de um acidente rodoviário também mais elevado em condutores sob o efeito de álcool: condutores com TAS de 0,10 - 0,50 g/L têm uma probabilidade de 1 a 3 vezes superior de ter um acidente mortal, comparativamente com condutores sóbrios; a probabilidade acrescida é de 20 vezes para condutores com TAS de 0,50 - 0,80 g/L e de 30 vezes para condutores com TAS de 0,80 -1,20 g/L» (Ecorys, 2014).
IV. Na medida em que quanto mais elevada é a taxa de alcoolémia registada por um condutor, maior é o risco de acidente, para si próprio e para os demais utentes da via pública, esse fator não poderá deixar de ser muito relevante na graduação da pena concreta.

Texto Integral


I – Relatório

a. No Juízo Local Criminal de … procedeu-se a julgamento, em processo sumário, de AA, nascido a …/…/1962, com os demais sinais dos autos, ao qual fora imputada a autoria, na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto nos artigos 292.º, § 1.º do Código Penal (CP), com referência ao artigo 69.º, § 1.º, al. a) do mesmo código.

A final o tribunal proferiu sentença, na qual condenou o arguido como autor de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto nos artigos 292.º, § 1.º e 69.º, § 1.º al. a) CP, na pena de 100 dias de multa à razão diária de 6€; e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 meses.

b. Inconformado com a medida das penas principal e acessória, o arguido interpôs o presente recurso, finalizando a respetiva motivação com as seguintes conclusões:

«1. A douta sentença recorrida viola o disposto nos art.os 40º, 47º, 69º. e 71º, do Código Penal.

2. Pois, não considerou, conforme obriga o disposto no art.º 71.º, do Código Penal - aplicável quer à pena principal, quer à acessória que o comportamento do Recorrente não pôs em perigo a vida de terceiros; que não se pode sequer considerar que o Recorrente tenha agido com dolo, quanto mais dolo direto pois aquele sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas, não sabendo, porém, que tinha ingerido o suficiente para ultrapassar o limite estabelecido no artigo 292º do Código Penal;

3. O comportamento do recorrente foi manifestamente negligente, nunca doloso;

4. Não se mostra provado o dolo em qualquer das suas modalidades, conforme o art.º 14º do C. P., sendo certo que não podemos presumir o dolo;

5. A negligência verifica-se sempre que o agente, colocando a possibilidade de ter atingido valores elevados de alcoolemia, parte do princípio de que tal não terá acontecido.

Ou quando nem sequer coloca a possibilidade de ter atingido tais valores, porque desconhece totalmente o teor alcoólico das bebidas que ingeriu, ou porque a certa altura perdeu a total noção da sua incapacidade;

6. O Recorrente não pode assim concordar que terá agido com dolo, a sua conduta foi meramente negligente;

7. Ao determinar a concreta medida da pena, o Tribunal a quo assentou na prevenção do crime, alheando-se da recuperação e ressocialização do ora recorrente e da sua sobrevivência;

8. O Tribunal está vinculado, ou deveria, nos termos do art.º 71 ° do Código Penal a determinar a medida da pena em função da culpa do agente e as exigências de prevenção. Deveriam ter sido, então, ponderadas todas as circunstâncias que fossem a favor do arguido tal como prescreve o art.º 71° n.º 2 do Código Penal e sido cumpridas as exigências de prevenção especial que constam do art.º 47° aplicável por força do art.º 44º nº 1;

9. A medida da pena acessória obedece aos mesmos fatores da pena principal, isto é, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção;

10. Para a sua determinação concreta a pena acessória encontra-se, deste modo, sujeita às finalidades da pena enunciadas no art.º 40° e aos critérios estabelecidos no art.º 71º, ambos do Código Penal;

11. Tal como na aplicação da pena de multa, esses critérios não foram tidos em conta na aplicação da medida acessória, como já se demonstrou nos n.ºs 2 a 8 destas conclusões;

12. A douta sentença do Tribunal a quo deve ser revogada e substituída por outra em que ocorra a redução do seu quantum punitivo da multa, do quantitativo diário da multa e ainda a redução da sanção acessória, ajustando assim a pena com a alegada culpa do recorrente e tendo em conta todas as atenuantes.»

c. Admitido o recurso respondeu-lhe o Ministério Público, pugnando pela sua improcedência, sintetizando-se deste modo a sua posição:

Arguido apresentava TAS de 2,35 g/l.

Apesar de ter referido não se recordar do período em que conduziu sob o efeito do álcool, após ter ingerido bebidas alcoólicas, agiu com dolo direto.

Já foi anteriormente condenado pela prática do mesmo crime. Possui outras condenações, por outros tipos de ilícito. E atuou com grau de ilicitude elevado.

As necessidades de prevenção geral são elevadas. Sendo medianas as de prevenção especial - pese embora os seus antecedentes criminais - porque se encontra profissional, social e familiarmente inserido na sociedade.

Sendo as penas aplicadas justas, adequadas e proporcionais, considerando as finalidades das penas e a culpa do arguido.

d. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ministério Público junto desta instância elaborou douto parecer secundando a posição já sustentada no recurso.

e. Cumprido o disposto no artigo 417.º, § 2.º CPP, o arguido nada respondeu.

f. Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir.

II – Fundamentação

1. O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (artigo 412.º, § 1.º CPP).1

Coloca-se à apreciação desta instância de recurso uma única questão: i) proporcionalidade da medida das penas de multa e de proibição de conduzir.

2. Da sentença recorrida

Com base no nas declarações parcialmente confessórias do arguido em sede de audiência de julgamento, do teor do auto de notícia, do talão do alcoolímetro quantitativo, do certificado de registo criminal do arguido e do depoimento de duas testemunhas (militares da GNR com intervenção na ocasião em que se depararam com o arguido na via pública e sequente realização do teste de alcoolémia), o Juízo recorrido considerou provados os seguintes factos:

1. No dia 21.12.2021, pelas 01h50m, na Rua …, na Urbanização …, em …, o arguido AA, depois de ter ingerido bebidas alcoólicas, conduzia o veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula …, tendo sido interveniente num acidente de viação.

2. Submetido ao teste quantitativo de alcoolémia apresentou uma taxa de álcool de 2,35g/l.

3. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente.

4. O arguido sabia que a qualidade e a quantidade de álcool que havia ingerido momentos antes de iniciar a dita condução lhe determinariam, necessariamente, uma taxa de álcool no sangue superior a 1,2 g/l.

5. Não obstante, e apesar de saber que havia ingerido bebidas alcoólicas em quantidade superior à legalmente permitida, o arguido não se absteve de conduzir o referido veículo na via pública, bem sabendo que não estava em condições de o fazer com segurança.

6. O arguido tinha conhecimento que a sua conduta era proibida e punida por lei, todavia, não se absteve de a prosseguir.

(…)

7. O arguido é empresário em nome individual, na área …;

8. Aufere mensalmente 500€, após impostos;

9. Vive sozinho em casa própria;

10. Suporta 250€ de despesas de um filho, maior, que se encontra a estudar;

11. Tem como habilitações literárias o 2.º ano do ensino superior da escola agrária.

12. Admitiu a prática dos factos.

(…)

a. O arguido foi condenado por sentença proferida no âmbito do processo sumário n.º 150/13.3… Tribunal Judicial de …, proferida 26-11-2013 e transitada em julgado em 26-12-2013, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, praticado em 17-11-2013, na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de 6€, que perfaz o total de 540€ e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 4 meses, ambas já extintas.

b. O arguido foi condenado por sentença proferida no âmbito do processo comum (tribunal singular) n.º 416/16.0… do Tribunal Judicial de …, Juízo local criminal Juiz …, proferida 11-07-2018 e transitada em julgado em 7-01-2020, pela prática de um crime ameaça e um de ofensa à integridade física, praticado em 2016/05/20, na pena de 125 dias de multa, à taxa diária de 8€, que perfaz o total de 1 000§, extinta a 17-12-2020.

c. O arguido foi condenado por sentença proferida no âmbito do processo abreviado n.º 35/20.7… do Tribunal Judicial de …, Juízo local criminal Juiz …, proferida 7-7-2020 e transitada em julgado 24-9-2020, pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, praticado em 1-05-2020, na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de 6€, que perfaz o total de 540€, extinta a 10-03-2022.

3. Apreciando

3.1 Da medida das penas principal e acessória

O recorrente considera que a medida da pena de multa aplicada, bem assim como a duração fixada à pena acessória são excessivas, desajustadas dos princípios e regras que norteiam a determinação da medida das penas, mormente a medida da culpa. Considerando que desrespeitam os princípios e regras constantes dos artigos 40.º, 47.º, 69.º e 71.º CP. Por seu turno o Ministério Público, na sua resposta, considera que a medida das penas (principal e acessória) são justas, tendo sido criteriosamente fixadas, em resultado da ponderação feita sobre as circunstâncias do caso.

Importa traçar os parâmetros que devem nortear a escolha e graduação da medida das penas, que são essencialmente os seguintes:

a) A finalidade das penas é a de proteger bens jurídicos e reintegrar o agente na sociedade, não podendo a pena exceder a medida da culpa do infrator (artigo 40.º CP); b) Sendo o crime cometido punível alternativamente com pena de prisão ou com pena de multa, o tribunal deverá dar preferência a esta, desde que a mesma realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (artigos 70.º e 40.º CP); c) No concernente à determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, esta faz-se em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (artigo 71.º do CP). Breve: dentre os limites fixados pela medida da culpa (que traça o máximo de pena) e pelas exigências (comunitárias) de prevenção geral (que fixam o mínimo da pena), são as necessidades de prevenção especial que determinam o quantum concreto da pena.

Depois destas considerações concernentes aos referentes normativos, aplicáveis à pena principal e à pena acessória, atentemos agora nas circunstâncias particulares do caso, apara aferirmos se o resultado a que chegou o Juízo a quo no processo de escolha e determinação das penas concretas se ajusta aos princípios e regras ínsitos no referido enquadramento normativo. Não sem antes recordar que os recursos não são segundos julgamentos da mesma causa, antes meios de correção de eventuais erros de procedimento ou de julgamento, que têm de ser demonstrados. A jurisprudência vem lembrando isso mesmo: nomeadamente no sentido de que «o tribunal ad quem não julga de novo, não determina a pena como se inexistisse uma decisão de primeira instância, e a sindicância dessa decisão (de primeira instância) pelo tribunal superior não abrange a fiscalização do quantum exato de pena que, decorrendo duma correta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionada. E não inclui a compressão da margem de apreciação livre reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do ato de julgar. E a margem de liberdade do juiz de julgamento nos limites expostos, abrange todo o processo prático de decisão sobre a pena.»2

Volvamos ao caso e aos princípios relativos à escolha e determinação das penas concretas. Anotando, porém, de introito, que a atuação do arguido foi dolosa, conforme cristalinamente deflui dos factos provados («6. O arguido tinha conhecimento que a sua conduta era proibida e punida por lei, todavia, não se absteve de a prosseguir), os quais se não mostram impugnados (artigo 412.º, § 3.º CPP). O juízo de censura nos crimes dolosos (como nos negligentes), representa a relação do agente com o facto ilícito, imputado como seu. No dolo o facto é imputado ao agente enquanto previsto e querido (artigo 14.º CP); e na negligência é-lhe imputado enquanto, embora não diretamente querido, era previsível e em razão dessa previsibilidade deveria o agente atuar com o cuidado a que está obrigado e é capaz para evitar a produção do facto injusto (artigo 15.º CP).3 Nas circunstâncias do presente caso, a conduta do arguido foi (indubitavelmente) dolosa, sendo a moldura abstrata prevista na lei para a punição do ilícito em referência a mesma quer a ação seja dolosa ou negligente (prisão até 1 ano ou multa até 120 dias - artigo 291.º, § 1.º CP - e pena acessória de proibição de conduzir entre 3 meses e 3 anos – artigo 69.º, § 1.º CP). O tribunal recorrido optou pela pena de multa, não divergindo da orientação preferencial, prevista no artigo 70.º CP, o que se mostra ajustado, pese embora os antecedentes criminais já registados pelo arguido/recorrente e da sua inserção social e profissional.

A moldura da pena de multa aplicada a título principal é de 10 a 120 dias (artigos 292.º, § 1.º e 47.º, § 1.º CP), tendo o Juízo a quo graduado em 100 dias à razão diária de 6€, isto é, aproximando-a do limite máximo da referida moldura; mas em quantitativo diário encostado ao mínimo legal, em razão das condições económicas do arguido (artigo 47.º, § 2.º CP). A aplicação das penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. A culpa limita o máximo da pena concreta, sendo depois as exigências de prevenção geral e as necessidades de prevenção especial que intervêm para determinar o quantum da pena (artigo 40.º, § 1.º e 2.º CP). A culpa é inarredavelmente elevada em razão da TAS registada, que se aproxima do dobro da prevista para a verificação do ilícito criminal em referência; sendo mais de 4 vezes superior ao limite traçado na lei para a ilicitude (artigo 81.º, § 3.º do Código da Estrada). As necessidades de prevenção geral impõem o limite mínimo da pena exigido para tutela da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma que foi violada. Esse limite mínimo deverá corresponder à neutralização do efeito negativo do crime na comunidade e fortalecer o seu sentimento de justiça e de confiança na validade das normas que foram violadas. Por seu turno a prevenção especial reporta-se à vertente positiva ou de socialização do agente do crime, a qual fixará em última instância a medida concreta da pena (na medida que seja necessária à prevenção da reincidência4 - ajustando-se às necessidades de reintegração social do agente). Para concretizar a medida da pena de multa o tribunal recorrido valorou a taxa de álcool no sangue registada (que sendo já significativamente alta implica que a medida da pena tenha de se afastar significativamente do mínimo legal), a confissão dos factos sendo fator positivo, não foi sequer integral e sem reservas. Registando já o arguido um antecedente criminal por crime da mesma natureza e outros dois.

Favorece o arguido, relevantemente, apenas o facto de a anterior condenação por crime de igual natureza ter ocorrido há mais de 10 anos e a sua boa integração social e familiar. A medida fixada à pena de multa mostra-se, pois, bem fundada nos seus pressupostos, e funcionará também como lembrete de que numa eventual reincidência a opção pela pena de multa dificilmente logrará sustentação. A decisão recorrida mostra-se bem alinhada com os indicadores mais recentes nesta matéria da influência da Taxa de Álcool no Sangue (TAS) na condução rodoviária. Porquanto vários estudos mostram que o risco de acidente rodoviário aumenta exponencialmente com o aumento de álcool consumido. Por exemplo, Blomberg et al. (2005) concluem que: «comparativamente com condutores com TAS = 0,0 g/L, condutores com TAS de 0,50 g/L têm 1,4 vezes mais risco de ter um acidente, com TAS de 0,80 g/L o risco acrescido é de 2,7 vezes, com TAS de 1,20 g/L o risco acrescido é de 8,9 vezes e com TAS de 1,80 g/L o risco aumenta para 51 vezes.» 5 Sendo que «o risco de morrer na sequência de um acidente rodoviário é também mais elevado em condutores sob o efeito de álcool (ECORYS, 2014): condutores com TAS de 0,10 - 0,50 g/L têm uma probabilidade de 1 a 3 vezes superior de ter um acidente mortal, comparativamente com condutores sóbrios; a probabilidade acrescida é de 20 vezes para condutores com TAS de 0,50 - 0,80 g/L e de 30 vezes para condutores com TAS de 0,80 -1,20 g/L.»6

Relembremos que a TAS registada pelo recorrente era de 2,35 g/l.7

Já quanto à razão diária da multa, o tribunal recorrido atendeu às condições económicas e sociais do arguido, fixando-se esta encostada ao mínimo legal, nada justificando a sua alteração. Em suma: a medida concreta da pena de multa aproximou-se do máximo da moldura, mostrando-se justificada pela elevada taxa de alcoolémia registada (e o risco daí decorrente para todos os demais utentes da via pública) e a ausência de um de verdadeiro rebate de consciência – de arrependimento (que funcionaria como sinal de que a comunidade poderia confiar, como passo no sentido de um arrepiar de caminho). Podendo sempre o arguido – desde que reunidos os requisitos necessários - requerer o cumprimento desta pena em prestações (artigo 47.º, § 3.º CP) ou fazê-la substituir por trabalho (artigo 48.º CP).

O tribunal graduou a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, a que se reporta o artigo 69.º, § 1.º, al. a) CP, em 6 meses, dentro de uma moldura legal de 3 meses a 3 anos. Ora, a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, sendo uma pena (ainda que acessória) visa também a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. Neste contexto da circulação rodoviária, a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, constituindo uma sanção (uma pena) adicional à pena principal, prossegue também especiais finalidades de prevenção geral negativa - de intimidação (visando aportar um contributo significativo «para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano»).8

A sua graduação obedece às regras gerais, atribuindo a lei larga margem ao julgador para eleger os fatores relevantes a atender para a determinação da medida da pena (cf. corpo do artigo 71.º, § 2.º CP). Se bem se atentar, se verá que o tribunal recorrido graduou esta pena acessória pouco acima do limite mínimo da moldura abstrata, desse modo conferindo ao arguido um (enorme) sinal de confiança de emenda no porvir. Na certeza de que a elevada taxa de alcoolémia registada justificaria (só por si) uma medida concreta significativamente mais elevada.

Nenhum reparo nos merece, pois, a decisão recorrida, pelo que o recurso improcederá.

III – Dispositivo

Destarte e por todo o exposto, acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora, em:

a) Negar provimento ao recurso e, em consequência, manter integralmente a douta sentença recorrida.

b) Custas pelo arguido/recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (artigo 513.º, § 1.º e 3.º do CPP e artigo 8.º Reg. Custas Processuais e sua Tabela III).

c) Notifique-se.

Évora, 14 de janeiro de 2025

Francisco Moreira das Neves (relator)

Anabela Simões Cardoso

António Condesso

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1 Em conformidade com o entendimento fixado pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no DR I-A de 28dez1995.

2 Por todos, cf. DSum. TRÉvora 20/2/2019, relatora Ana Brito, proc. 1862/17.8PAPTM.E1 e também acórdão do TRÉvora, de 16jun2015, proc. 25/14.9GAAVS.E1, relator Clemente Lima; e acórdão do TRCoimbra, de 5abr2017, proc. 47/15.2IDLRA.C1, relatora Olga Maurício.

3 Germano Marques da Silva, Problemas Fundamentais de Direito Penal, Homenagem a Claus Roxin, Univ. Lusíada Editora, Lisboa 2002, p. 151.

4 «Por reforço dos standards de comportamento e de interação na vida comunitária (condução da vida “de forma socialmente responsável”)» - Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, pp. 74, 110 e 238 ss., Aequitas – Editorial Notícias, 1993. Também Maria João Antunes, Penas e Medidas de Segurança, Almedina, 2020, pp. 42 e ss.

5 https://prp.pt//wp-content/uploads/2021/07/Conducao_sob_Efeito_do_Alcool_em_Portugal.pdf

6 Idem.

7 Sobre a relevância da TAS na graduação da medida da pena cf. neste mesmo sentido o acórdão deste Tribunal Relação de Évora, de 9mai2023, proc. 388/22.2GBTNV.E1, em que foi relatora a Desemb. Ana Bacelar.

8 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas – Editorial Notícias, 1993, p. 165.