RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO
DANOS CAUSADOS PELAS PARTES COMUNS
Sumário

Nos termos dos arts. 483.º e 493.º/1 CC, cabe ao condomínio responder extracontratualmente pelos danos causados a terceiros (mormente ao arrendatário de uma das frações) pelos danos causados pelas partes comuns do prédio constituído em propriedade horizontal, estando aquele onerado com uma presunção de ilicitude e de culpa que decorre do segundo dos normativos mencionados.

Texto Integral

Processo n.º 1762/21.7T8AVR.P1

Sumário do acórdão elaborado pela sua relatora nos termos do disposto no artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil:

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Acordam os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:

RELATÓRIO

AUTORA: A..., LDA., com sede na Rua ..., ... Aveiro.

RÉU: CONDOMÍNIO DO PRÉDIO sito à Rua ..., ..., ... Aveiro, representado por B..., LDA., com sede na Rua ..., ..., Aveiro.

Por via da presente ação declarativa, pretende a A. obter a condenação do R. a pagar-lhe a quantia de € 15.166,10.

Para tanto, alega ser arrendatária de uma fração destinada a comércio em prédio administrado pelo R.

No interior da fração existe uma caixa de saneamento que recolhe e concentra os detritos das demais frações, caixa essa que transbordou, alagando o espaço arrendado pelo A., assim causando danos no soalho, paredes, móveis, etc…

Assim, as instalações sofreram danos no pavimento flutuante e rodapés em madeira e nas divisórias de seis gabinetes e em três portas que necessitam de ser substituídas, danos nas paredes, que ficaram manchadas e a necessitar de picagem do reboco, nova aplicação de reboco e pintura. Também a instalação elétrica, que passa junto ao rodapé, necessita de ser verificada e testada. Foi necessário o desentupimento da caixa de esgotos e limpeza do chão, trabalhos avaliados em € 9.261,90.

Mesas e cadeiras compradas pela A. necessitam de substituição, o que foi orçado pela peritagem em € 895,10.

Ademais, a A. teve a sua laboração parada, apesar de pagar renda, água luz e salários a trabalhadores, assim pretendendo uma indemnização por danos não patrimoniais.

Contestou o R., dizendo ser a A. parte ilegítima porque, entretanto, já não é arrendatária da fração. Segundo o contrato de arrendamento, a arrendatária não poderia efetuar benfeitorias sem autorização do senhorio, revertendo aquelas para o locado.

Além disso, no momento em que a A. refere ter ocorrido o sinistro, por força da pandemia verificada, o local encontrava-se encerrado por imposição das leis sanitárias excecionais que vigoraram na época. Não foi comunicado ao R. – que tem serviço de limpeza e manutenção contínuo e permanente – o incidente, a fim de que verificasse o ocorrido e procedesse à limpeza, como sucedeu em 2018, altura em que ocorreu sinistro na mesma caixa de saneamento e foi dado conhecimento imediato ao R.

Impugna, por isso, a factualidade alegada pela A.

Exercendo contraditório quanto à exceção dilatória, disse a A. que, não sendo atualmente já arrendatária da fração, o era à data do sinistro e que sofreu os prejuízos relativos ao mobiliário, divisórias amovíveis que mandou fazer à partida e que contava retirar no final do contrato e outros materiais de escritório. Além disso, para pôr termo ao contrato, a A. teve que o deixar no estado em que o encontrou quando o arrendou, tendo tido que limpar, pintar paredes e remover o chão danificado.

Entretanto, entendeu o tribunal chamar à ação, como R., um outro condomínio, por se terem levantado dúvidas quanto ao condomínio que administraria a fração mencionada pela A.

A 17.4.2023, foi elaborado despacho saneador, julgando improcedente a exceção de ilegitimidade ativa da A.

Tendo sido realizado julgamento, veio a ser proferida sentença, datada de 5.4.2024, a qual contém o seguinte dispositivo:

Em face do exposto, o tribunal decide:

A) Julgar procedente a invocada exceção da ilegitimidade substantiva passiva do réu Condomínio do Prédio sito na Rua ..., ..., representado pela sua administradora C... Unipessoal, Lda., absolvendo-o dos pedidos;

B) Declarar verificada a ilegitimidade substantiva passiva do réu Condomínio do Prédio sito na Rua ..., ..., representada por D... Unipessoal, Lda., absolvendo-o dos pedidos;

C) Julgar a presente ação totalmente improcedente quanto ao réu Condomínio ... sito na Rua ..., ..., administrado por D... Unipessoal, Lda., absolvendo-o dos pedidos.

Desta sentença recorrem agora AA, BB e CC, na qualidade de sócios-liquidatários da sociedade A., entretanto dissolvida, com dissolução e encerramento da liquidação registados a 30.6.2023, conforme decisão constante da sentença recorrida.

Visam os recorrentes a revogação da sentença e a condenação do primitivo R. no pedido.

Para tanto, aduziram as seguintes conclusões:

I. Houve um efetivo impedimento do administrador do condomínio para a resolução urgente do sinistro.

1. Resultou provado que, por estarmos em plena pandemia, a sociedade que administrava o condomínio e que tem um serviço de 24 horas de urgência ao conjunto dos condomínios que administra, se encontrava incomunicável.

2. Pois não foi dada qualquer resposta às várias tentativas de contacto por escrito comprovadamente efetuadas por várias pessoas, nem o administrador não estava disponível para atendimento nas instalações da empresa de administração de condomínio.

3. Fundamentando-se tal facto, a acrescentar aos factos provados, nas declarações supra transcritas de DD, que representou a arrendatária, sua mãe, tanto nas negociações do contrato de arrendamento como na gestão do sinistro ocorrido e que confirmou que o inquilino lhe comunicou o sinistro.

4. O que, cruzado com as declarações do recorrente A..., da funcionária da Administração de condomínio EE e do perito da seguradora FF (nas partes dessas declarações transcritas supra) se confirma: a empresa de condomínio não estava a fazer atendimento ao público, o administrador GG não estava presente nas instalações da empresa administradora de condomínio – uma vez que a funcionária EE estava lá sozinha a trabalhar (segundo a própria) - e o e-mail que supostamente os condóminos podiam usar para comunicar com a administração (e que tanto o representante da usufrutuária condómina como o inquilino e a perito da seguradora tentaram usar) esteve sem funcionar até Julho de 2020. 5. E, juridicamente, no disposto no artigo 1427.º do Código Civil quando exige, para a realização de reparações indispensáveis e urgentes, que haja impedimento do administrador nomeado.

6. Requisito que ficou efetivamente preenchido face ao facto de empresa de administração de condomínios não estar a fazer, na altura, atendimento ao publico e ao facto de o e-mail de contacto disponibilizado aos clientes da sociedade administradora não estar a funcionar, como confirmado pelas declarações da testemunha HH, funcionária da sociedade.

7. Que afirmou ainda que ia trabalhar sozinha para as instalações da empresa, o que significa que não estava lá presente o administrador, Sr. GG, na altura sócio gerente da empresa de condomínios.

8. O que é confirmado pelas declarações do Recorrente II que afirmou ter deixado por diversas vezes recado com a secretária da administração do condomínio relativamente ao sucedido, face à ausência do administrador.

9. E tendo, como consequência, que seja reembolsado aos Recorrentes o valor despendido a título de obras urgentes para desentupimento da conduta de águas sanitárias comuns do prédio cuja caixa de visita fica situada no interior da fração que lhes estava arrendada na altura.

II. Houve um efetivo investimento efetuado pela Sociedade Autora na fração por ela arrendada que ainda não estava totalmente amortizado aquando do sinistro dos Autos e que ficou totalmente inutilizado com o sinistro

10. Os Recorrentes pretendem que se dê como provado que o investimento efetuado pela Sociedade Autora na fração por ela arrendada e que ficou danificado com o sinistro ainda não estava totalmente amortizado, implicando o empobrecimento dos Recorrentes na exata medida do valor necessário à sua reparação.

11. Fundamentando-se tal facto, a acrescentar aos factos provados, nas declarações da testemunha DD, acima transcritas, que confirmou, que em representação de sua mãe, senhoria no contrato de arrendamento, negociou com os arrendatários um período de contrato superior ao inicialmente por ele idealizado e um valor de renda diferenciado para os primeiros 2 anos de renda e para os últimos 3 porque os inquilinos pretendiam fazer obras que adequassem o espaço ao exercício da atividade para a qual estavam a arrendá-lo.

12. Fundamenta-se ainda nas declarações do recorrente II, também acima transcritas, que confirmou as referidas declarações da testemunha DD.

13. E ainda nas declarações da testemunha JJ, acima transcritas, que afirmou, resumidamente, que a partir do momento em que as instalações sofreram o sinistro, não voltou lá a trabalhar pese embora a passagem do negócio de uma empresa imobiliária para outra incluísse a transferência da totalidade dos ativos da empresa que vende para a que compra, o que deveria ter incluído, além dos consultores imobiliários (como ele próprio) e do know how, a totalidade das instalações.

14. Tal significando que, com a ocorrência do sinistro, a empresa imobiliária comparadora perdeu o interesse naquelas instalações, não mais as utilizando e deixando de pagar o valor que estava, antes de ocorrer tal sinistro, disposta a pagar pela sua transferência.

15. E, juridicamente, no facto de o direito às indemnizações reclamadas nos presentes autos decorrer da condição, à época, de arrendatária da sociedade Autora cujo regime jurídico (arrendamento) tem uma natureza mista ou dualista que o aproximam do ius re.

16. Devendo reconhecer-se expressamente que as indemnizações foram reclamadas ao abrigo do regime da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos.

17. E que, apesar do dever de indemnizar recair sobre o sujeito de um direito real, não estamos perante uma obrigação propter rem, desde logo porque tal dever não decorre diretamente do estatuto de um direito real, mas sim de um comportamento culposo do titular do direito.

18. Conforme fundamentação ao Ac. do TRPorto de 22.01.2015, Proc. 355/12.4TBSJM.P1 disponível in www.dgsi.pt: “(…) Concluindo, parece-nos ser de entender que, tal como na propriedade horizontal, o proprietário da cada fração autónoma, enquanto titular de um direito real (absoluto) e com fundamento no estatuto deste, pode exigir (pretensão real) de qualquer terceiro, como tal se considerando o próprio condomínio, enquanto conjunto dos titulares agrupados do direito de propriedade sobre as partes comuns e, por isso, sujeito passivo, independente de qualquer atuação culposa, de um dever (obrigação propter rem ou ob rem) de manutenção, conservação e reparação dessas partes comuns, que este lhe assegure continuamente a intangibilidade da fração e se abstenha de a lesar, também o locatário da fração autónoma, enquanto titular de um direito de natureza e com regime mistos ou dualistas que o aproximam do ius in re, pode exercer idêntica pretensão contra o condomínio terceiro, como entidade coletiva sobre a qual impende obrigação similar.”

19. Fundamentando a natureza mista ou dualista do regime jurídico do arrendamento que o aproximam do ius re com a melhor doutrina, a saber “Obrigações Reais e Ónus Reais”, Manuel Henrique Mesquita, página 175.

20. O que se distingue da possibilidade de exigir a realização de obras de conservação e ou reparação necessárias a garantir a normal fruição das partes comuns que apenas pode ser exigido pelos condóminos/proprietários.

21. Referindo-se o artigo 1427.º do Código Civil à realização de obras de reparação nas partes comuns por forma a garantir a normal fruição dessas partes comuns e não à realização de obras de reparação nas partes comuns por forma a garantir a normal fruição de cada fração individualmente considerada.

22. Não podendo, por isso, os recorrentes senão respeitosamente discordar da fundamentação de direito da douta sentença ora em crise quando refere que “(…) estamos no domínio das obrigações/direitos propter rem, cujo titular é o proprietário, não constituindo, assim, a indemnização respetiva um direito dos autores.”

23. Pois tal interpretação do direito colocaria a arrendatária sociedade Autora totalmente à mercê da vontade da senhoria de reclamar os danos, já que só esta, enquanto titular dos direitos propter rem, estaria em posição de os reclamar.

24. Senhoria a quem é, compreensivelmente, indiferente que o soalho seja em mosaico ou em parquet e a quem é indiferente que existam ou não divisórias no local, pese embora tenha tolerado/ autorizado a sua colocação e compreendido o motivo da sua colocação no locado por parte da locatária, não tendo, por isso, qualquer interesse em exigir a sua reparação ou indemnização pela sua perda.

25. Não sendo comparável a situação dos presentes autos à do citado e douto acórdão do TR Porto de 25.01.2024, proferido no processo 2367/20.5T8VLG.P1 pois uma situação de comodato não é comparável a uma situação de um contrato de arrendamento, desde logo porque o comodato, sendo gratuito, confere ao comodante o direito de reaver o imóvel a todo o tempo sem ter de aguardar pelo fim do contrato, visto que este não está a obter nenhuma contrapartida financeira pela cedência do local.

26. O que deixa o comodatário numa posição muito menos segura relativamente aos investimentos que queira fazer no local comparativamente ao arrendatário.

27. Já que este último que tem a justa expectativa, protegida por lei e pelos termos do contrato, de ficar no locado até ao final do termo estabelecido contratualmente, podendo inclusivamente negociar com o proprietário um valor a atribuir às benfeitorias que se proponha realizar no local e tendo direito a receber do proprietário indemnização pelo valor das benfeitorias realizadas nos termos do disposto no artigo 1074.º/ 5 do C.Civil que o equipara a um possuidor de boa-fé para efeitos desse ressarcimento.

28. Ao passo que o comodatário é equiparado, para efeitos de indemnização por benfeitorias, ao possuidor de má-fé (cfr. Artigo 1138.º do C. Civil).

29. Devendo, neste ponto, além de ser dado como provado o supra exposto, corrigido o vício de raciocínio que levou à equiparação de um sinistro num local objeto de comodato à de um sinistro, como o dos autos, num local arrendado.

III. Do sinistro resultaram danos morais para a Sociedade Autora

30. Os Recorrentes pretendem que seja reconhecido que dos danos no investimento por eles reconhecidamente efetuado resultaram, além de prejuízos materiais para a Sociedade Autora, prejuízos morais que levaram, em última análise, à venda do negócio por valor inferior ao que que estava a ser negociado e à extinção da sociedade.

31. Já que a adquirente do negócio, apercebendo-se que naquele local, no espaço de 2 anos, ocorreram dois sinistros semelhantes, preferiu comprar o negócio sem a cedência daquele espaço, acabando por deslocalizar os trabalhadores para um outro espaço de trabalho.

32. Decorrendo tal facto das declarações da testemunha JJ, confirmadas pelo Recorrente II, ambas transcritas supra, que afirmou que a partir do momento em que as instalações sofreram o sinistro, não voltou lá a trabalhar pese embora a passagem do negócio de uma empresa imobiliária para o outra, incluísse a transferência da totalidade dos ativos da empresa que vende para a que compra, o que deveria ter incluído, além dos consultores imobiliários (como ele próprio), e do know how, a totalidade das instalações.

33. Assim, pese embora reconheçam que o fundamento para o seu pedido de indemnização por danos morais em sede de Petição Inicial tenha sido a sua impossibilidade de utilizar as instalações e não a impossibilidade da empresa imobiliária compradora do negócio fazer essa utilização, o certo é que as instalações deixaram de ser utilizadas, quer para atendimento a clientes quer para qualquer outro serviço.

34. Isto pese embora os esforços dos recorrentes em minimizar os danos por forma a possibilitar que a atividade para a qual o local tinha sido arrendado ficasse em condições de ser utilizado, nomeadamente limpando.

35. E a ocorrência do sinistro fragilizou a sua posição negocial numa altura crucial de um negócio, prejudicando-o em montante que os Recorrentes não conseguem demonstrar contabilisticamente, mas que trouxe inequivocamente prejuízos morais ao bom nome da sociedade Autora e dos seus sócios que merece a proteção do direito.

36. Já que subsumível aos critérios estabelecidos no artigo 496º, n.º 1 do Código Civil.

37. Recorrendo, por isso, também da decisão de improceder a indemnização por danos morais e mantendo integralmente o peticionado face à prova de factos que justificam o seu arbitramento.

Contra-alegou o R., opondo-se à procedência do recurso.

Objeto do recurso:

- da alteração dos factos demonstrados;

- do pedido de indemnização pela arrendatária ao condomínio.

FUNDAMENTAÇÃO

Fundamentos de facto

Em primeira instância, deram-se como provados os seguintes factos:

1) A sociedade A..., Lda. foi, desde 1 de fevereiro de 2018 até data não concretamente apurada do primeiro semestre do ano de 2021, arrendatária da fração “A” do prédio urbano sito na Rua ..., ... Aveiro, artigo matricial ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Aveiro sob o n.º ....

2) O prédio onde a fração se insere encontra-se dividido em regime de propriedade horizontal com condomínio constituído.

3) A fração identificada em 1) é um espaço comercial com entrada e saída direta para a rua, onde a sociedade A..., Lda. exerceu a sua atividade de mediação imobiliária.

4) A fração referida tem no seu interior, sensivelmente a meio do espaço comercial, uma caixa de saneamento de “visita” onde passa uma conduta comum de águas residuais do prédio.

5) A conduta referida em 4) recolhe e concentra os detritos de esgoto das frações da entrada n.º ... para as levar até à Rua, à rede de saneamento público.

6) Em data não concretamente apurada anterior e próxima do dia 15 de abril de 2020, quando, de manhã, abriam os escritórios localizados nas instalações referidas em 1), constataram que o pavimento se encontrava alagado com águas residuais que transbordavam da caixa de visita da rede comum de esgotos referida em 4) e 5).

7) Nas circunstâncias referidas em 6), a sociedade A..., Lda. chamou empresa da especialidade, para pôr termo ao transbordar de águas que saíam da caixa de saneamento e impedir o alastrar de danos no soalho, paredes, móveis, divisórias e material elétrico e eletrónico existentes no espaço, que se deslocou ao local e procedeu ao desentupimento e limpeza da caixa de esgotos e do pavimento do escritório, e elaborou orçamento de reparação para os danos que desde logo eram visíveis[1].

8) Após o referido em 7), a sociedade A..., Lda. participou a situação à sua companhia de seguros, acionando a apólice Multirriscos Comércio com o n.º ... que detém junto da E..., SA, que procedeu à averiguação do sinistro, mandando avaliar os prejuízos através de empesa de engenharia independente que a si presta serviços.

9) Na sequência da averiguação referida em 8), a Seguradora concluiu que os danos provieram de uma conduta comum e que a responsabilidade caberia ao condomínio.

10) O perito designado pela seguradora para averiguar o sinistro tentou por diversas vezes contactar o réu, através da sua administradora, para que fornecesse os dados relativos à ou às apólices de seguro de partes comuns do edifício, cópia de participação de sinistro enviada a essa ou essas companhias e descrição de propriedade horizontal com listagem de frações e identificação dos seus proprietários e contactos.

11) Na sequência do descrito em 6), o chão ficou manchado e abaulado, as paredes ficaram manchadas, as divisórias e os móveis ficaram manchados e a desfazer-se.

12) O pavimento flutuante, rodapés em madeira, divisórias de seis gabinetes e três portas necessitam de ser removidos do local e substituídos, e as paredes necessitam de picagem do reboco, nova aplicação de reboco e pintura.

13) A instalação elétrica, que passa junto ao rodapé, necessita de ser verificada e testada.

14) Os trabalhos descritos em 12) e 13) e o desentupimento da caixa de esgotos e limpeza do chão foram avaliados em 9.261,90€.

15) As mesas e cadeiras que necessitam de substituição foram avaliadas em 895,10€.

16) Os móveis referidos em 14)[2] tinham sido adquiridos pela sociedade A..., Lda. em 2018.

17) Nas instalações referidas em 1) tinham sido realizadas obras em 2018.

18) A D... Unipessoal, Lda. apenas administra o condomínio referente à Rua ..., ... onde estão inseridas as Frações “A” e “B” respetivamente os números de polícia ... e ..., Rua ..., onde está inserida a Fração “U” com o número de polícia ..., e o número de polícia ... correspondente a uma escadaria que se encontra fechada e à qual não se tem acesso.

19) A administradora do condomínio D... Unipessoal, Lda. tem serviço de manutenção e limpeza 24/24 horas, todos os dias da semana.

20) A autora tem conhecimento do descrito em 19).

21) A 23 de junho de 2018, ocorreu um sinistro na mesma fração advindo da caixa de saneamento de “visita”.

22) O sinistro referido foi verificado pela administradora do condomínio D... Unipessoal, Lda., dado ter-lhe sido comunicado de imediato, tendo a mesma procedido à limpeza imediata da caixa.

23) O Réu Condomínio do Prédio sito na Rua ..., ..., é constituído pelas frações K, L, M, N, O, P, Q, R, S e T, com entrada independente.

24) A fração referida em 1) não está inserida no réu Condomínio da Rua ..., ..., não partilhando com o mesmo a rede de esgotos referida em 4) e 5).

Foram dados como não provados os factos seguintes:

A) A fração identificada em 1) localiza-se no n.º ... da rua indicada no mesmo ponto.

B) A conduta referida em 4) recolhe e concentra os detritos de esgoto de todas as frações situadas no prédio, tendo algumas caixas de saneamento de acesso à conduta geral.

C) Os factos descritos no ponto 6) ocorreram no dia 20 de abril de 2020.

D) As paredes, móveis, divisórias e material elétrico e eletrónico referidos em 7) eram propriedade de A..., Lda.

E) A deslocação referida em 7) ocorreu pouco depois e ainda durante a manhã.

F) A sociedade A..., Lda. participou a situação ao condomínio.

G) Na sequência do referido em 10) não foi obtida qualquer resposta.

H) Os trabalhos de reparação e limpeza obrigaram à paragem de atividade da A..., Lda. durante vários dias até secagem, arejamento e reparação das instalações.

I) A A..., Lda. não pode, durante vários meses, usar as suas instalações para receber clientes ou realizar tarefas administrativas ligadas à atividade.

J) O descrito em 11), bem como o cheiro nauseabundo proveniente das águas residuais que vazaram da tampa de saneamento e que se infiltraram nos materiais, não permitiu a utilização do espaço, pelos funcionários e clientes da autora, no tempo que mediou entre a data do sinistro e a realização de algumas reparações.

K) A situação descrita nos autos colocou em causa as boas condições de trabalho que a autora proporcionava aos seus colaboradores e a sua imagem junto de clientes.

L) Em consequência da inundação sofrida na fração, esta permaneceu vários dias sem quaisquer condições de habitabilidade, o que perturbou fortemente o quotidiano da atividade da A..., Lda.

M) O descrito em L) foi fonte de preocupação e de desgaste para os sócios gerentes e de receio de perda de colaboradores e clientes.

N) A administradora do condomínio D... Unipessoal, Lda. tem vindo, desde o sinistro de 2018, a alertar os condóminos para terem cuidado e evitarem depositar lixo ou objetos na canalização e sanitários.

O) Situação como a dos autos não ocorre de um dia para o outro, começa a notar-se um cheiro desagradável e água a começar a transbordar das caixas.

P) Desde o sinistro de 2018, que a Administradora de condomínio D... Unipessoal, Lda. solicitou à A. que informasse caso verificasse qualquer irregularidade, o que nunca aconteceu.

Q) A administradora do condomínio D... Unipessoal, Lda. transmitiu os cuidados a ter em assembleias de condóminos e verbalmente em conversa mantida com os condóminos e com a A..., Lda.


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A recorrente pretende, em primeiro lugar, se dê como provado que, no dia do sinistro, por nos encontrarmos em época de pandemia, a administradora do condomínio, aqui Ré, se achava incomunicável.

Invoca prova testemunhal que corroboraria tal facto.

Contudo, veja-se que este facto, essencial à pretensão da A., não foi alegado por si em qualquer articulado e, pior do que isso, o que esta alegou na petição inicial foi exatamente o oposto.

Disse, nos arts. 7.º e 8.º da pi, que na manhã do dia em que constatou o vazamento da tampa de saneamento, “de imediato, chamou um canalizador para avaliar o sucedido e, face à situação de urgência, solucionar e pôr termo ao constante trasbordar de águas…”.

E, em 11.º da pi, ainda explicitou que, só depois, a A. participou a situação ao condomínio e à sua companhia de seguros.

Foi exatamente isso que seu deu como provado no ponto 7.º da sentença, em total consonância com o alegado pela própria A.

Sendo assim, o facto novo que a recorrente pretende ver aditado e que contraria o facto dado como provado em 7, é um facto essencial que importa à sua causa de pedir, não podendo o tribunal convocar facto distintos – não alegados pelas partes (que alegaram exatamente o oposto) e, por isso, não contraditados pela parte contrária – como se se tratasse apenas de um facto instrumental, complementar ou concretizador daquele, uma vez que o não é, sendo exatamente o contrário do que alegou a A.

Improcede, por isso, a pretensão nesta parte.

Depois, pretende a A. ver dado como provado que “o investimento efetuado pela sociedade A. na fração por ela arrendada e que ainda não estava totalmente amortizado, ficou danificado com o sinistro, implicando o empobrecimento da sociedade A. na ação na exata medida do valor necessário à sua reparação”.

Como se vê, o que se pretende se dê como provado é, a todos os títulos, conclusivo: qual foi o investimento realizado pela A. na fração? De que empobrecimento estamos a falar?

O mesmo se diga quando se afirma se pretende dar como provado que o arrendado não era compatível com o exercício da atividade de mediação imobiliária, uma vez que é manifestamente conclusivo. Impunha se alegasse, logo na pi, como se encontrava o espaço e o que era necessário que nele existisse para se executar aquela atividade.

Do mesmo modo, não se vê – nem é alegado na pi – o que se pretende afirmar quando se diz que a renda acordada teve em consideração a necessidade de investimento em obras. Teve em consideração em que termos? Que renda deveria ter sido acordada e qual a diferença entre esta e que a efetivamente ficou estabelecida?

É igualmente conclusivo o que se afirma no recurso segundo o qual o investimento efetuado pela A. (em valores e bens não discriminados) ficou danificado (o que teria ficado danificado foram objetos e não investimentos) e que isso implicou o empobrecimento da A. na exata medida da reparação (que medida foi esta?), sendo certo que a reparação não foi efetuada.

Recorde-se o alegado pela A. na pi a este respeito e que foi, apenas e tão-só, o seguinte:

- art. 29.º da pi: Note-se que as instalações da A. tinham sido objeto de obras em 2018 e que estes valores não haviam sido ainda amortizados.

Não foi junto qualquer documento quanto à alegada não amortização dos valores despendidos em 2018.

Também não foi alegado e demonstrado que a A. tenha procedido à reparação do espaço e com isso, despendido a quantia estimada no orçamento e, ainda, que tenha substituído mesas e cadeiras.

Em lado algum da pi, a A. alega ter procedido às reparações do chão, divisórias, portas, etc… e, menos ainda, que tenha substituída cadeiras e mesas. Aliás, AA, então depondo como representante da A., disse expressamente não ter reparado danos, nem móveis, sendo ainda certo que, em 22.5.2021, altura em que a ação foi proposta, ainda tal não havia sido feito, como resulta do alegado em 24.º, 25.º e 28.º da pi.

Na verdade, o apurado em audiência foi algo muito distinto: as testemunhas JJ, KK e LL, que foram colaboradores da imobiliária aqui A., disseram ter prestado ali serviço até fevereiro de 2020, isto é, antes do sinistro dos autos e que, nessa data, a A. transmitiu o estabelecimento a outra empresa, tendo tudo (obras e secretárias) aí sido deixado para esta nova empresa.

Do mesmo modo, a pessoa que depôs como representante da A., em 25.9.2023, AA, afirmou que estava na época (aludiu a fevereiro de 2020) de passagem do negócio e teve que reduzir o preço da venda.

Ora, tudo isto, é substancialmente diferente do alegado na pi.

O que disse na pi é, por um lado, que a A. sofreu danos com as instalações e móveis que necessita de reparar, depois acrescentou-se que a reparação e a limpeza implicaram a paragem da atividade da A. (art. 17.º e 30.º da pi), durante vários meses, tendo a A. demandante deixado de receber clientes e de realizar tarefas administrativas (art. 18.º), cifrando a sua paragem num prejuízo de € 5.000,00, que erradamente apelida de dano não patrimonial (o que seriam danos não patrimoniais seria o prejuízo da imagem referido em 33..º da pi, mas sem que se discrimine em que tal consistiu), sem que aí especifique quais os lucros que deixou de receber e quais as despesas com custos fixos que continuou a ter durante o tempo de paragem (10 dias? – cfr. art. 31.º da pi).

Outra coisa distinta – a concitar uma petição inicial absolutamente diversa – é a alegação da existência de uma nova empresa que tenha pretendido adquirir o estabelecimento da A. em determinado momento, por determinado preço (e qual?) e, afinal, o tenha vindo a adquirir por valor inferior por força dos danos causados por este sinistro. Muito menos, como refere aquele AA, que a A. tenha sofrido um dano correspondente à redução do preço da venda do estabelecimento. Não se alega nunca que o estabelecimento tenha sido negociado por um preço e que, por força dos danos do sinistro, tenha sido vendido por outro inferior e inferior em quanto.

Ou seja, o prejuízo que o legal representante da A. efetivamente refere ter tido é diferente dos factos alegados na pi e corresponde, afinal, a uma ação com causa de pedir diferente daquele que ficou descrita na pi.

Por consequência, é de julgar improcedente toda a impugnação da matéria de facto.

Fundamentos de Direito

A sentença inicia a sua exposição sobre o que é a propriedade horizontal e a obrigação do condomínio no que tange às partes comuns.

Faz, depois, menção ao art. 1427.º, n.º, 1 do CC, segundo o qual, as reparações indispensáveis e urgentes nas partes comuns do edifício podem ser levadas a efeito por qualquer condómino, na falta ou impedimento do administrador.

Disse, depois, que não sendo a A. condómina, mas arrendatária, haveria que compatibilizar as regras da propriedade horizontal com as do arrendamento, fazendo depois apelo à regra do art. 1306.º, segundo a qual, estando o senhorio em mora quanto a obras e sendo estas urgentes, pode o arrendatário fazê-las, com direito a reembolso (n.º 1). Se se tratar de obras urgentes que não admitam dilação, o locatário poderá efetuá-las, com o mesmo direito a reembolso, avisando a tempo o senhorio (n.º 2).

Concluiu, contudo, que, não tendo a A. tentado entrar em contacto com o condomínio, não se verificaram os pressupostos do art. 1427.º, pelo que soçobraria o pedido da A. de reembolso dos trabalhos de desentupimento e limpeza da caixa e do pavimento da loja arrendada.

Ora, afigura-se-nos que a questão tem que ser colocada do ponto de vista das relações contratuais subjacentes.

A relação contratual da A. surge, em primeiro lugar, com a locadora – a usufrutuária da fração arrendada – e não com o condomínio, sendo que este, no que respeita a danos causados por partes comuns (e a caixa existente na fração arrendada, onde passa uma conduta comum de águas residuais do prédio, será parte comum – art. 1421.º, n.º 1 d CC) responde perante os condóminos e não perante a arrendatária.

E as reparações urgentes mencionadas em 1427.º CC são admitidas aos condóminos e não a outro utilizador da fração (arrendatário, comodatário, etc…).

Assim, intercedendo um contrato de arrendamento entre a A. e um condómino, é ao locador que cabe, nos termos do art. 1031.º b) do CC, assegurar ao arrendatário o gozo da coisa para os fins a que se destina.

Entre os deveres acessórios que cabem ao locador conta-se o dever de reparação (art. 1036.º e 1074.º/1 CC).

Em relação aos arrendamentos não habitacionais o legislador vai mais longe e refere mesmo que as regras relativas à responsabilidade pela realização das obras de conservação ordinária e extraordinária, requeridas pela lei ou pelo fim do contrato, são livremente estabelecidas pelas partes (n.º 1 do artigo 1111.º). Acrescentando o n.º 2 que se as partes nada convencionarem, cabe ao senhorio executar as obras de conservação, considerando-se o arrendatário autorizado a realizar as obras exigidas por lei ou requeridas pelo fim do contrato.

O arrendamento dos autos era um arrendamento não habitacional, pelo que se lhe aplica o disposto no art. 1111.º, sendo certo que no contrato dos autos – exceto quanto a benfeitorias – nada se previu relativamente a obras urgentes ou não urgentes destinadas a garantir o gozo da coisa locada.

Todavia, a ação não foi intentada contra a senhoria da fração em causa com base no contrato de arrendamento.

A ação foi instaurada contra o condomínio invocando-se a responsabilidade civil extracontratual, com base no art. 483.º do CC e 493.º, n.º 1 do CC.

No que concerne aos danos causados por coisas móveis ou imóveis rege o disposto no art. 493.º/1 do CC. O normativo em análise não estabelece nunca a obrigação do condomínio, mas sim de quem tem o dever de vigiar a coisa.

Quem responde, nos termos do art. 493.º, nº 1, não é apenas o proprietário da coisa, bastando a mera detenção, isto é, responde quem tem o controlo material da coisa e o dever da sua vigilância, dever este que pode ter origem legal ou negocial.

Em regra, quanto a danos causados por coisas, responde o proprietário, mas há detentores obrigados ao dever de vigilância, como, por ex.:

- o comodatário (art. 1135.º a) CC);

- o depositário (art. 1187.º, n.º 1 a);

- o credor penhoratício (art. 671.º a).

- o usufrutuário

Podem responder singularmente estes últimos ou cumulativamente com o proprietário se este permanecer vinculado à vigilância da coisa. Se o detentor está na posse exclusiva da coisa, só este responde.

Ora, situando-se a caixa em causa, de onde se originou a inundação, no interior da fração, não cabia ao condomínio o dever de vigiar a coisa, mas sim ao locatário e ao locador, no âmbito dos poderes e deveres que lhe incumbem enquanto senhorio e detentor da coisa, vigiar para que a mesma cumprisse o seu desiderato.

Isto é, mesmo tratando-se de coisa comum, a caixa em análise encontrava-se dentro da fração e, sendo assim, o condomínio não poderia exercer o dever de vigilância.

Em todo o caso, a A. alegou que a Ré não curou da limpeza e manutenção das condutas e, sendo certo caber ao R. a demonstração do cumprimento deste dever, o que o mesmo alegou a este respeito – alertou os condóminos para que se evitasse depositar lixo ou objetos na canalização e sanitários e que esta situação não poderia ocorrer de um dia para o outro, começando por se sentir cheiro e transbordando as caixas de forma lenta – não resultou demonstrado, não tendo a administração do condomínio feito prova da falta de ilicitude e de culpa da sua parte.

Recorde-se que o condomínio responde, aqui, na qualidade de responsável pelos danos causados pelas partes comuns e que o faz a título de responsabilidade extracontratual – por ter o dever de vigiar e de controlar os seus efeitos danosos na esfera jurídica de terceiros, sejam eles vizinhos do prédio ou utilizadores (não proprietários/não condóminos de qualquer fração), e sendo assim, é de ponto de vista extracontratual que a sua responsabilidade emerge.

Deste modo, por não interceder entre a A. e o condomínio qualquer tipo de relação emergente da propriedade horizontal, não tem aqui aplicação a norma do art. 1427.º CC – a A. deveria previamente informar o condomínio antes de encetar a reparação da caixa e limpeza do espaço – e, porque ao condomínio é estranha a relação que intercee entre a A. e o condómino/senhorio que permite à A. a utilização daquela fração (poderia nem ser sequer a título de arrendamento, mas, por ex., a título de comodato), não podem invocar-se as regras do arrendamento – que não regulam a relação entre a A. e o R. – para afastar a responsabilidade extracontratual do segundo.

De modo que são aqui inaplicáveis as normas relativas às obras a efetuar no âmbito do contrato de arrendamento, menos ainda do arrendamento habitacional, por estar aqui em causa em arrendamento comercial.

Assim, deparando-se a A. com uma inundação do seu espaço, quando, de manhã, procedia à abertura do escritório, a sua intervenção imediata, para debelar o problema e evitar maiores prejuízos é perfeitamente justificável. A A. não tinha que convocar, primeiro, a administração do condomínio porquanto nenhuma relação intercedia entre si e aquele e, quanto ao condomínio, é indiferente o título pelo qual a A. ocupava o espaço que ficou danificado por força de um defeito de uma parte comum do imóvel constituído em propriedade horizontal.

Por outro lado, tratando-se de intervenção urgente, nada tendo sido convencionado no contrato de arrendamento quanto a tais casos de força maior, o art. 1111.º. n.º 2 do CC, não impedia a intervenção imediata da A. para debelar a situação que, afinal, era da responsabilidade do condomínio.

Sendo assim, cabe ao condomínio ressarcir a A. pelo que esta pagou pela desentupimento da caixa de esgotos e limpeza do chão, em valor que se encontra discriminado em 14, correspondendo ao primeiro segmento do serviço orçado, no montante de € 470,00, mais IVA de 23%.

O demais peticionado refere-se à reparação dos danos causados nas instalações que, em 2018, a A. havia benfeitorizado e, ainda, à substituição de mesas e cadeiras.

Mais uma vez, neste segmento, a defesa do R. é imprestável. Mesmo a verificar-se que as benfeitorias, findo o contrato, reverteriam para a o imóvel locado, a verdade é que, enquanto o arrendamento durasse e a A. dele fizesse uso, tinha necessidade de ter esse espaço em condições para laborar, o mesmo se diga com as mesas e cadeiras que não integram, obviamente, a noção de benfeitorias prevista no art. 216.º CC.

Todavia, aqui chegados, verificamos que a A. compôs uma narrativa e efetuou um pedido que não corresponde à realidade ocorrida.

Certo que a A. manteve o arrendamento até ao primeiro semestre de 2021, tendo o sinistro ocorrido em abril de 2020.

Alegou que, durante esse lapso de tempo não pôde funcionar, nem os seus funcionários laborar, mantendo custos fixos com renda, luz, água, luz e salários dos trabalhadores.

Todavia, o que se apurou é que a A. não procedeu à reparação do espaço, nem à substituição do mobiliário, razão pela qual se não deu como provado que as paredes, divisórias, móveis, etc…, fossem propriedade da A.

Como referiram os funcionários ou colaboradores desta, assim como o então legal representante da A., já em fevereiro, o estabelecimento havia sido transmitido, tendo então aí deixado de manter atividade a A., pelo que o prejuízo desta – nas palavras de AA – correspondeu ao que descontou no preço da venda do estabelecimento que teria negociado por maior valor e, após o sinistro, teve que vender por menos.

De modo que, não é o preço da reparação do espaço ou da substituição dos móveis que deve ser objeto de indemnização e, menos ainda, o que se alega serem danos não patrimoniais avaliados em € 5.000,00 - sem que se alegue qualquer facto objetivo donde tenha resultado a perda de credibilidade da A., e ligando-se, ao invés, aqueles € 5.000,00, a danos materiais (preço de custos fixos mantidos durante dez dias úteis em que terá tido que encerrar, matéria que não se provou) – o que afirmou o atual A. e recorrente é que a perda da A. se cifrou na diminuição do preço pelo qual transmitiu este estabelecimento, o que é diferente do que foi alegado pela A.

Neste ponto, a ação terá que soçobrar, sem prejuízo de a A., se assim o entender, formular noutra ação pretensão que corresponda ao prejuízo real que terá sofrido.

Dispositivo

Pelo exposto, decidem os Juízes deste Tribunal da Relação julgar o recurso parcialmente procede e revogar parcialmente a sentença, condenando o R. a pagar aos ora AA. a quantia de € 470,00, mais IVA, de 23%, absolvendo-o do demais contra si peticionado.

Custas por ambas as partes, na proporção do decaimento.


Porto, 13.1.2025
Fernanda Almeida
Miguel Baldaia de Morais
Ana Paula Amorim
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[1] Para melhor especificação reproduzimos o orçamento a que se refere este n.º 7 e que se encontra junto com a pi:

[2] Trata-se e lapso pois aos móveis refere-se o ponto 15 e não o 14.