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NULIDADE DA SENTENÇA
INTERPRETAÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL
PRAZO DA OBRIGAÇÃO
Sumário
I - As nulidades da decisão, são vícios intrínsecos da própria decisão, deficiências da estrutura da sentença que não podem confundir-se com o erro de julgamento que se traduz antes numa desconformidade entre a decisão e o direito (substantivo ou adjectivo) aplicável. II - Na formação da convicção do julgador, quanto à ocorrência dos factos que aprecia, há que proceder a uma análise conjugada da prova produzida, extraindo dos factos apurados as presunções impostas por lei ou por regras da experiência, por forma a formar-se no espírito do julgador a convicção de que com muito elevado grau de probabilidade os factos em análise ocorreram. III - Ocorre contradição quando dois ou mais segmentos da resposta ou duas ou mais respostas conjugadas entre si são incompatíveis, no sentido de que a verificação de uma determinada realidade de facto exclui a outra. IV - A declaração negocial valerá de acordo com a vontade real do declarante, se esta for conhecida do declaratário – art.º 236.º, n.º 2, CC. V - Não o sendo, valerá com o sentido que possa ser deduzido por um declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (teoria da impressão do destinatário). VI – O sentido atribuído pelo “declaratário normal” deverá estar expresso, ainda que de forma imperfeita, no próprio texto do documento que corporiza a garantia prestada. VII - Se as partes pretendem que a prestação seja efectuada dentro do prazo estipulado, sob pena de o negócio caducar por nela perder o credor o interesse, verifica-se um “negócio fixo absoluto”/“termo essencial”; caso contrário estar-se-á perante um “negócio fixo relativo ou simples.” IX – Para a hipótese de as partes acordarem que o devedor cumprirá quando puder, a prestação só será exigível quando o devedor tiver possibilidade de cumprir
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:
I. Relatório
EMP01... - Comércio e Distribuição de Painéis Lda, com sede na Rua ..., ..., ... ..., veio instaurar procedimento de injunção contra a Ré EMP02..., Lda, com sede naRua ..., ..., ... ..., , peticionando a sua condenação no montante de € 70.183,24 (setenta mil cento e oitenta e três euros e vinte e quatro cêntimos), acrescido de juros de mora vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento.
Alega que no âmbito da sua actividade vendeu à Requerida, a pedido desta, produtos do seu comércio, e que, apesar da indicação de possível atraso na sua entrega, veio a Requerida proceder ao cancelamento da encomenda, sem que antes tivesse indicado quaisquer compromissos assumidos com terceiros, no sentido de que o eventual incumprimento de um qualquer prazo de entrega poderia acarretar prejuízos ou, inclusivamente, o cancelamento da encomenda.
Refere que, apesar das tentativas de entrega da encomenda, veio a mesma a ser recusada, bem como o respectivo pagamento.
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Deduzida oposição, a requerida, para além de invocar a falta de causa de pedir, veio alegar encontrar-se há muito a Requerente em incumprimento, o que levou à resolução do contrato celebrado com a Requerente, cancelando e considerando a encomenda feita à Requerente sem efeito, procedendo à sua anulação na totalidade,
Invocou, ainda, que os sucessivos atrasos e incapacidade da Requerente em cumprir com a entrega dos materiais, teve como consequência directa e imediata o seu total descrédito e bom nome junto da sua cliente e do dono da obra.
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Após exercício do contraditório quanto à excepção deduzida que foi julgada improcedente em sede de despacho saneador, foi seleccionado o objecto do litígio e os temas de prova.
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Realizado o julgamento foi proferida sentença que julgou a acção posterior de processo comum procedente por provada, sendo a Ré condenada a pagar à A. a quantia de 70.183,24€, acrescida de juros de mora, contados desde a data de vencimento da factura até integral pagamento, à taxa aplicável às dividas comerciais, ascendendo os vencidos, a 10.1.2022, a 592,23€, assistindo à R., o direito de proceder ao levantamento dos produtos cujo fornecimento está em causa nos autos.
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II- Objecto do recurso
Não se conformando com a decisão proferida veio a Ré interpor recurso, juntando, para o efeito, as suas alegações, e apresentando, a final, as seguintes conclusões:
I. A Apelante considera, salvo melhor e douta opinião de Vossas Excelências, incorrectamente julgado e decidido o caso ora em apreço, porquanto os meios probatórios constantes do processo e da gravação dos depoimentos das testemunhas, impunham ao julgador decisão diversa da recorrida.
II. Neste particular, não podemos deixar de citar um trecho de um recente acórdão proferido por este Alto Tribunal da Relação de Guimarães no dia 31.03.2017, no Proc. 1600/13.4TBVRL.G1, disponível em www.dgsi.pt., com o qual concordamos na íntegra que refere: face às limitações do princípio da livre apreciação da prova plasmado no art. 607º nº 5 do CPC: “ … tem vindo a formar-se uma nova corrente no sentido de que na reapreciação da matéria de facto, a Relação está sujeita aos mesmos princípios do julgador daquela instância, como vem sendo ultimamente afirmado, por alguma jurisprudência que começa a sedimentar-se (que entende que na reapreciação da prova, as Relações têm a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância, devendo proceder à audição dos depoimentos e fazer incidir as regras da experiência, como efetiva garantia de um segundo grau de jurisdição, não podendo limitar-se a aferir da bondade da convicção do julgador “a quo” plasmada na fixação da matéria de facto, competindo-lhe sim valorar toda a prova ali produzida de acordo com o princípio da livre convicção a que o julgador da 2ª instância também está sujeito …”
III. Como primeiro segmento deste Recurso, está convicta a recorrente que ocorreu um erro de julgamento passível de ser superado nos termos do artigo 607.º, n.º 4, 2.ª parte, aplicável aos acórdãos dos tribunais superiores por via dos artigos 663.º, n.º 2, e 679.º do CPC.”
IV. O tribunal recorrido deu como provado os seguintes factos, constantes da motivação deste recurso e que aqui se dão por reproduzidos por uma questão de economia processual, a saber: 1;2º,3º,4º,5º,6º,7º,8º,9º,10º e 15º - devidamente transcritos na motivação do presente recurso.
V. Do mesmo modo, foram aceites e dados por assente os documentos cosntantes dos autos, a saber: A nota de encomenda/proforma de fls. 37.; o e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v,; e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09; email de 16h29 a R.. – ver fls. 15 ; e.mail ver fls. 15 - pelas 16h38, ; e.mail ver fls. 15 - pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83 e e.mail de fls. 55e 55v- devidamente indicados na motivação do presente recurso e constante dos factos provados..
VI. Em face dos factos provados indicados na antecedente conclusão IV, e em face aos documentos que fazem parte do processo e dos factos dados como provados indicados na conclusão antecedente, outra decisão deveria ter sido proferida.
Senão vejamos:
VII. O Tribunal a quo dá como provado o facto vertido em 3, mormente que: . Aquando das negociações o legal representante da R. transmitiu ao comercial da A. que precisaria da mercadoria em 30 dias.
VIII. Do mesmo modo dá por assente o ponto 4., a saber: Atentas os constrangimentos relacionados com o transporte marítimo o comercial da A. transmitiu que o melhor prazo que conseguia para entrega era 45 dias, mas que podia haver atrasos.
IX. Dá-se por assente o ponto 10., onde se refere: Pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83. – no qual constam os 45 dias.
X. E ainda, o ponto 19, onde consta “19. Em 04.10.2021, - ver e.mail de fls. 55e 55v - a R. comunicou à A. o cancelamento da encomenda por parte do cliente final, com base nos sucessivos atrasos na entrega, referindo que face a tal só lhe restava “ fazer o mesmo e por isso considerem a encomenda na sua totalidade sem efeito. Ou seja, anulada na sua totalidade.”
XI. Parece-nos humildemente que tínhamos prazo fixado. O Tribunal a quo deveria ter interpretado o estipulado entre as partes, quando necessário recorrendo às regras de interpretação das declarações negociais previstas no artigo 236º do CC, no qual se consagrou a teoria da impressão do destinatário – "a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele"
Contudo, se assim não se entender,
XII. Humildemente entende a apelante que a Sentença é nula, o que expressamente se invoca, por verificação da violação do artigo 662º nº 1 e nº 2º alinea b); c) d) do C.P.Civil.
XIII. NULIDADE DA SENTENÇA, A QUE ALUDE A AL. b), DO N.º 1, DO ART. 615º DO C.P.C:
Humildemente, está convicta a recorrente que o Tribunal a quo ao ter proferido sentença de condenação da forma com o fez, não especificou detalhadamente os fundamentos de facto ou de direito relevantes para essa decisão, violando o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208º, n.º 1, C. R. P. e art. 154º, n.º 1, do C. P.Civil
XIV. Resulta da fundamentação da douta sentença que, passa-se a citar: “A jamais se comprometeu com a R. com uma data concreta mas com uma mera previsão/estimativa de data de entrega, com possíveis atrasos, neste ponto, imediatamente antes da confirmação da encomenda pela R. ( encomenda confirmada pela R. pelas 17h32 do dia 5.8.2021) a R, havia remetido e.mails pelas 16h09 e 16h38 onde referia que apenas poderia dar um prazo aproximado, escrevendo expressamente que era o melhor que conseguia dar na situação actual e que a data de entrega que constava na nota de encomenda/proforma para a R. carimbar, era uma previsão de entrega, e que poderia haver atrasos
XV. Com base nesta fundamentação, o Tribunal a quo dá à acção procedente e condena a aqui recorrente a pagar o valor de uma encomenda que nunca recebeu e que cancelou antes com comunicação à recorrida.
XVI. Foram aceites e dados por assente os documentos cosntantes dos autos, a saber: A nota de encomenda/proforma de fls. 37.; o e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v,; e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09; email de 16h29 a R.. – ver fls. 15 ; e.mail ver fls. 15 - pelas 16h38, ; e.mail ver fls. 15 - pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83 e e.mail de fls. 55e 55v- constante dos factos provados..
XVII. O Tribunal a quo dá como provado o facto vertido em 3, mormente que: . Aquando das negociações o legal representante da R. transmitiu ao comercial da A. que precisaria da mercadoria em 30 dias. Do mesmo modo dá por assente o ponto 4., a saber: Atentas os constrangimentos relacionados com o transporte marítimo o comercial da A. transmitiu que o melhor prazo que conseguia para entrega era 45 dias, mas que podia haver atrasos. Dá-se por assente o ponto 10., onde se refere: Pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83. – no qual constam os 45 dias. E ainda, o ponto 19, onde consta “19. Em 04.10.2021, - ver e.mail de fls. 55e 55v - a R. comunicou à A. o cancelamento da encomenda por parte do cliente final, com base nos sucessivos atrasos na entrega, referindo que face a tal só lhe restava “ fazer o mesmo e por isso considerem a encomenda na sua totalidade sem efeito. Ou seja, anulada na sua totalidade.”
XVIII. Verifica-se assim que os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão, violaram o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208º, n.º 1, C. R. P. e art. 154º, n.º 1, do C. P. Civil, oque expressamente se invoca.
XIX. NULIDADE DA SENTENÇA, A QUE ALUDE A AL. c), DO N.º 1, DO ART. 615º DO C.P.C: Entende a apelante que a douta sentença padece de ambiguidade e/ou obscuridade.
XX. O Tribunal a quo dá como provado o facto vertido em 3, mormente que: . Aquando das negociações o legal representante da R. transmitiu ao comercial da A. que precisaria da mercadoria em 30 dias. Do mesmo modo dá por assente o ponto 4., a saber: Atentas os constrangimentos relacionados com o transporte marítimo o comercial da A. transmitiu que o melhor prazo que conseguia para entrega era 45 dias, mas que podia haver atrasos. Dá-se por assente o ponto 10., onde se refere: Pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83. – no qual constam os 45 dias. E ainda, o ponto 19, onde consta “19. Em 04.10.2021, - ver e.mail de fls. 55e 55v - a R. comunicou à A. o cancelamento da encomenda por parte do cliente final, com base nos sucessivos atrasos na entrega, referindo que face a tal só lhe restava “ fazer o mesmo e por isso considerem a encomenda na sua totalidade sem efeito. Ou seja, anulada na sua totalidade.”
XXI. Sustenta o Tribunal a quo a fundamentação da Sentença nos documentos cosntantes dos autos, a saber: A nota de encomenda/proforma de fls. 37.; o e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v,; e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09; email de 16h29 a R..– ver fls. 15 ; e.mail ver fls. 15 - pelas 16h38, ; e.mail ver fls. 15 - pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83 e e.mail de fls. 55e 55v- constante dos factos provados..
XXII. Contudo, De forma contraditória, ambígua e obscura, o Tribunal fundamenta que, passa-se a citar: “a A jamais se comprometeu com a R. com uma data concreta mas com uma mera previsão/estimativa de data de entrega, com possíveis atrasos, neste ponto, imediatamente antes da confirmação da encomenda pela R. ( encomenda confirmada pela R. pelas 17h32 do dia 5.8.2021) a R, havia remetido e.mails pelas 16h09 e 16h38 onde referia que apenas poderia dar um prazo aproximado, escrevendo expressamente que era o melhor que conseguia dar na situação actual e que a data de entrega que constava na nota de encomenda/proforma para a R. carimbar, era uma previsão de entrega, e que poderia haver atrasos”
XXIII. Entedem muito humildemente os AA que falta uma corerencia logica no desenrolar da Sentença. A nulidade da sentença a que se refere a 1.ª parte da alínea c), do n.º1, do art. 615.º do C. P. Civil, remete-nos para o princípio da coerência lógica da sentença, pois que entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica.
XXIV. NULIDADE DA SENTENÇA, A QUE ALUDE A AL. d), DO N.º 1, DO ART. 615º DO C.P.C: Entende também muito humildemente a apelante que o Tribunal a quo, na verdade, deixou de se pronunciar sobre questões que eram determinantes para o desfecho da demanda.
XXV. O Tribunal a quo dá como provado o facto vertido em 3, mormente que: . Aquando das negociações o legal representante da R. transmitiu ao comercial da A. que precisaria da mercadoria em 30 dias. Do mesmo modo dá por assente o ponto 4., a saber: Atentas os constrangimentos relacionados com o transporte marítimo o comercial da A. transmitiu que o melhor prazo que conseguia para entrega era 45 dias, mas que podia haver atrasos. Dá- se por assente o ponto 10., onde se refere: Pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83. – no qual constam os 45 dias. E ainda, o ponto 19, onde consta “19. Em 04.10.2021, - ver e.mail de fls. 55e 55v - a R. comunicou à A. o cancelamento da encomenda por parte do cliente final, com base nos sucessivos atrasos na entrega, referindo que face a tal só lhe restava “ fazer o mesmo e por isso considerem a encomenda na sua totalidade sem efeito. Ou seja, anulada na sua totalidade.”
XXVI. Sustenta o Tribunal a quo a fundamentação da Sentença nos documentos cosntantes dos autos, a saber: A nota de encomenda/proforma de fls. 37.; o e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v,; e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09; email de 16h29 a R..– ver fls. 15 ; e.mail ver fls. 15 - pelas 16h38, ; e.mail ver fls. 15 - pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83 e e.mail de fls. 55e 55v- constante dos factos provados..
XXVII. Ora, não se vislumbra que o Tribunal quo se tivesse pronunciado sobre o que foi interpretado verdadeiramente e estipulado entre as partes, não tendo recorrido às regras de interpretação das declarações negociais previstas no artigo 236º do CC, no qual se consagrou a teoria da impressão do destinatário – "a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele"
XXVIII. Não o fez, pelo que, ocorre uma manifesta omissão de pronuncia por um lado, e além disso ocorre nulidade da sentença, uma vez que o Tribunal a quo deixou de se pronunciar sobre questões que devia conhecer, o que expressamente se invoca.
DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
XXIX. Será objeto de impugnação o que consta dos factos provados em 12 e 20, e, ainda, os factos não provados.
XXX. A M.mo Juiz “a quo” formou a sua convicção para a resposta a estas matéria sem ter em devida conta aos documentos juntos pelas partes e aceite, mormente a nota de encomenda/proforma de fls. 37.; o e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v,; e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09; email de 16h29 a R.. – ver fls. 15 ; e.mail ver fls. 15 - pelas 16h38, ; e.mail ver fls. 15 - pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83 e e.mail de fls. 55e 55v- constante dos factos provados e junto as autos que se dão aqui integralmente reproduzido, bem como e essencialmente do depoimento do legal represente da recorrente e das testemunhas arroladas sobre a mesma, e, que impunham respostas diversas das que foram proferidas
XXXI. A Recorrente enumerará de seguida os concretos factos que considera mal avaliados, individualizará as divergências com referência aos concretos meios de prova que constam do processo, e indicar a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre os mesmos.
XXXII. O Tribunal dá como provado o ponto 12 ) da matéria dado como provada, mormente que FACTO PROVADO 12.: A R não referiu à A. a existência de quaisquer prazos específicos, data concreta a cumprir por si ou por terceiros no âmbito da empreitada a que o material se destinava.
XXXIII. Este facto dado como provado deveria ter sido dado como não provado.
XXXIV. Os concretos meios probatórios constante do processo e registo de gravação nele realizada, nos termos da alínea b) do mesmo artigo, em clara salvaguarda do nº 2, a), com indicação com exatidão das passagens da gravação, que, na opinião da recorrente, leva à alteração deste facto, passando a ser dado como não provado são: OS DOCUMENTOS: nota de encomenda/proforma de fls. 37.; o e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v,; e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09; email de 16h29 a R.. – ver fls. 15 ; e.mail ver fls. 15 - pelas 16h38, ; e.mail ver fls. 15 - pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada – ver fls. 83 e e.mail de fls. 55e 55v- E O DEPOIMENTO De: AA - SESSÃO DO DIA 23 DE FEVEREIRO DE 2024 DE VOLTA 00:03:45 A 00:45:19; das horas 14:39 MT A 15 h 30 MT; DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA BB - SESSÃO DO DIA 13 DE MARÇO DE 2024DE VOLTA 15:32: A 15:40:19; de voltas 00:03:45 A 00: 19:34 e DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA CC – SESSÃO DO DIA 13 DE MARÇO DE 2024DE VOLTA 14:32:45 A 14:56:19; DE VOLTAS DE 00:01:23 A 00:23:12 cujas transcrições e depoimentos se encontram devidamente transcritos na motivação do presente recurso e que aqui por uma questão de economia processual se dão por integralmente reproduzidos.
XXXV. Em face dos concretos meios probatórios aqui identificados, humildemente entende a recorrente que o factos constantes do ponto 12 dado como provado deveria ser dado como não provado, isto porque, em face dos concretos meios probatórios aqui indicados – documental e testemunhal – resulta evidente que foi fixado um prazo, máxime 45 dias, a encomenda chegou passados mais de 120 dias, já quando a recorrente havia cancelado a mesma.
XXXVI. Só em final de Novembro foi tentado entregar a mercadoria, facto que nem sequer é assente no processo, quando o dono de obra já tinha cancelado a encomenda à recorrente.
Para a recorrente era essencial a entrega antes da obra acabar, tendo ficado bem vincado nos mails que servem aqui de prova e que não foram impugnados o seu conteúdo.
XXXVII. Aliás, é dado como assente em 19 dos factos dados or provados que, em 04.10.2021, - ver e.mail de fls. 55e 55v - a aqui recorrente comunicou à recorrida o cancelamento da encomenda por parte do cliente final, com base nos sucessivos atrasos na entrega, referindo que face a tal só lhe restava “ fazer o mesmo e por isso considerem a encomenda na sua totalidade sem efeito. Ou seja, anulada na sua totalidade.”
XXXVIII. A aqui recorrente aguardou tudo o que era por demais razoável, tendo deixado bem vincado a essencialidade da entrega da encomenda antes do término da obra.
XXXIX. O Tribunal dá como provado o ponto 20 ) da matéria dado como provada, mormente que FACTO PROVADO 12.: FACTO 20 DADO COMO PROVADO: “ .Nessa altura, parte da encomenda já estava a caminho de Portugal e disso a R. estava ciente. “ Este facto dado como provado deveria ter sido dado como não provado.
XL. Os concretos meios probatórios constante do processo e registo de gravação nele realizada, nos termos da alínea b) do mesmo artigo, em clara salvaguarda do nº 2, a), com indicação com exatidão das passagens da gravação, que, na opinião da recorrente, leva à alteração deste facto, passando a ser dado como não provado são: OS DOCUMENTOS: nota de encomenda/proforma de fls. 37.; o e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v,; e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09; email de 16h29 a R.. – ver fls. 15 ; e.mail ver fls. 15 - pelas 16h38, ; e.mail ver fls. 15 - pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada – ver fls. 83 e e.mail de fls. 55e 55v- E O DEPOIMENTO De: AA - SESSÃO DO DIA 23 DE FEVEREIRO DE 2024 DE VOLTA 00:03:45 A 00:45:19; das horas 14:39 MT A 15 h 30 MT; DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA BB - SESSÃO DO DIA 13 DE MARÇO DE 2024DE VOLTA 15:32: A 15:40:19; de voltas 00:03:45 A 00: 19:34 e DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA CC – SESSÃO DO DIA 13 DE MARÇO DE 2024DE VOLTA 14:32:45 A 14:56:19; DE VOLTAS DE 00:01:23 A 00:23:12 cujas transcrições e depoimentos se encontram devidamente transcritos na motivação do presente recurso e que aqui por uma questão de economia processual se dão por integralmente reproduzidos.
XLI. Este ponto não poderia ter sido dado como provado dado que não constam dos autos nenhum documento que comprove a mercadoria ter chegado à alfandega, nenhum documento que comprove que tem guias de remessa para o local, nenhum documento de encomenda ao transitário, enfim, apenas e só valorou o tribunal testemunhas parciais da recorrida, seus funcionários, sem atentar sequer onde se encontra a mercadoria.
XLII. Mais, dar como provado que “ já estava a caminho” quando a recorrente cancela a encomenda sem que se tenha preenchido o conceito de” já estava a caminho”, redundou numa conclusão sem suporte documental ou testemunhal.
XLIII. Mais, Entende a recorrente que do mesmo modo, o Tribunal a quo não podia ter dado como não provado que, passa-se a citar: - que aquando das negociações e formalização da encomenda tenha a A. garantido que a mercadoria chegaria em 30 dias;- que a A. tenha garantido à R que a mercadoria chegaria a 19.9.2021 – 45 dias após a encomenda; - que não tenha a A usado de zelo e dado a devida atenção à encomenda efectuada pela R, não lhe conferindo a celeridade que deveria.
XLIV. Os concretos meios probatórios constantes do processo e registo de gravação nele realizada, nos termos da alínea b) do mesmo artigo, bem como em clara salvaguarda do nº 2, a), indicação com exatidão das passagens da gravação, que, na opinião da recorrente, leva à alteração destes factos para provados, são:: OS DOCUMENTOS: nota de encomenda/proforma de fls. 37.; o e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v,; e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09; email de 16h29 a R.. – ver fls. 15 ; e.mail ver fls. 15 - pelas 16h38, ; e.mail ver fls. 15 - pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83 e e.mail de fls. 55e 55v- E O DEPOIMENTO De: AA - SESSÃO DO DIA 23 DE FEVEREIRO DE 2024 DE VOLTA 00:03:45 A 00:45:19; das horas 14:39 MT A 15 h 30 MT; DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA BB - SESSÃO DO DIA 13 DE MARÇO DE 2024DE VOLTA 15:32: A 15:40:19; de voltas 00:03:45 A 00: 19:34 e DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA CC – SESSÃO DO DIA 13 DE MARÇO DE 2024DE VOLTA 14:32:45 A 14:56:19; DE VOLTAS DE 00:01:23 A 00:23:12 cujas transcrições e depoimentos se encontram devidamente transcritos na motivação do presente recurso e que aqui por uma questão de economia processual se dão por integralmente reproduzidos.
XLV. A recorrida é uma empresa que tem como objeto social precisamente o fornecimento de bens e faz disso o seu escopo lucrativo.
XLVI. Recaía na recorrida uma obrigação de resultado claro na entrega do material à recorrente, tendo a mesma deixado bem claro nos mails que troca que o faria num prazo aproximado de 45 dias.
XLVII. Ficou dado por assente que aquando das negociações o legal representante da Ré recorrente transmitiu ao comercial da Autora recorrida que precisaria da mercadoria em 30 dias. – FACTO 3 DADO COMO PROVADO
XLVIII. Dado por provado está também em 4 que, “ Atentas os constrangimentos relacionados com o transporte marítimo o comercial da A. transmitiu que o melhor prazo que conseguia para entrega era 45 dias, mas que podia haver atrasos”
XLIX. Do mesmo modo ficou dado por assente que em 10.09.2021, a Requerida solicitou informação sobre o estado da entrega, uma vez que se aproximava o termo do prazo estimado pela Requerente (45 dias), tendo esta última informado que só foi possível agendar transporte marítimo à terceira tentativa, com data estimada de chegada a Portugal em 14.10.2021 – ver e.mails de fls. 18v e 19. – FACTO 14 DADO COMO PROVADO
L. O Tribunal a quo dá como não provado que, passa-se a citar: que aquando das negociações e formalização da encomenda tenha a Autora aqui recorrida garantido que a mercadoria chegaria em 30 dias ,E EM CONTRADIÇÃO INSANAVEL, dá como provado – FACTO 3 DADO COMO PROVADO que, passa-se a citar: Aquando das negociações o legal representante da R. transmitiu ao comercial da A. que precisaria da mercadoria em 30 dias.
LI. O recurso que venha a ser interposto da sentença abrange, obviamente, a decisao sobre a materia de facto ( cfr. artigo 662.º do C.P.Civil), que haja ou não reclamaçao, não ficando precludido esse mesmo legitimo direito.Pelo que, a recorrente pretende a alteraçao da materia de facto, ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º1 e nº 2 als. a) b) , c) e d) do C.P.Civil .
LII. Ora, tendo havido gravação da prova, o que é o caso, o Tribunal da Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em conta o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido dc fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados (cfr. artigo 662.°, do C.P.Civil)
LIII. A completa apreciação do presente recurso - mesmo em termos de recurso da matéria de facto - não termina sem que se ponderem e analisem também alguns factos sob a perspectiva do direito aplicável e que se passaram a expor:
LIV. O Tribunal a quo qualifica o contrato entre recorrente e recorrida como um contrato de compra e venda mercantil (vide artigo 463º do C.Com.), já que tanto A. como R. atuaram no âmbito da sua atividade comercial, destinando a A. o bem adquirido a revenda. A este contrato são aplicáveis as disposições legais do CC no que não esteja especialmente previsto neste código (vide artigo 3º do C. Com.). A compra e venda tem como efeitos essenciais a transmissão da propriedade da coisa ou titularidade do direito objeto do contrato; a obrigação de entregar a coisa e a obrigação de pagar o preço (vide artigo 879º do CC).
LV. Ora ao ter feito este enquadramento o tribunal a quo nunca podia deixar de ter em consideração que entre as partes foi celebrado também um um contrato de prestação de serviços, na modalidade de entrega de encomenda que a recorrida tinha de entregar em determinado local e até determinada data.
LVI. É inequívoco que a recorrida assumiu uma obrigação de resultado, e não apenas de meios. Tal é a conclusão que se extrai de diversos elementos que podem ser coligidos e que se enunciam de seguida: A nota de encomenda/proforma de fls. 37.; o e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v,; e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09; email de 16h29 a R.. – ver fls. 15 ; e.mail ver fls. 15 - pelas 16h38, ; e.mail ver fls. 15 - pelas
17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83 e e.mail de fls. 55e 55v
LVII. Com efeito, para além da notória integração da recorrida no leque de empresas cuja actividade essencial consiste na entrega de mercadorias e encomendas, a referida qualificação decorre ainda do modo como normalmente exerce a referida actividade e do conjunto de meios humanos e materiais que disponibiliza para o efeito, procurando corresponder às solicitações dos clientes que não pretendam recorrer a outros serviços.
LVIII. A recorrente bem alertou a Recorrida para a necessidade de ser dado um tratamento específico à concreta encomenda que acautelasse a sua entrega oportuna, recebendo desta, se não uma resposta que, com toda a certeza, garantisse tal desiderato, ao menos sucessivas informações de que, malgrado as vicissitudes que foram ocorrendo, aquele resultado não estaria comprometido e isto em mais ou menos 45 dias.
LIX. O que aconteceu é que o prazo ultrapassou quatro meses, ou seja mais de 120 dias, o que à luz das regras de experiencia e da boa fé extravasa o expetável dentro de um critério do homem médio
LX. Veja-se que o Tribunal a quo não apuou qual a diligência que a recorrida usou, não apurou quais as circunstâncias alheias à sua vontade, insuperáveis ou dificilmente superáveis, que fossem determinantes para a não obtenção do resultado contratado.
LXI. O tribunal deveria ter qualificado a obrigação, para assim aumentar o nível de exigência quanto ao comportamento da recorrida, levando a desconsiderar determinadas justificações que porventura pudessem ser apresentadas. Tornar-se-ia, assim, mais exigente para a Recorrida a elisão da presunção de culpa relativa ao incumprimento do contrato que decorre do art. 799º do CC, pois que não lhe basta invocar o uso dos meios que uma entidade normalmente diligente empregaria para a execução da tarefa, exigindo-se a prova de uma actuação ajustada aos padrões de exigência adequados a uma empresa especializada nos serviços que contratou, no sentido de evitar as contrariedades que se verificaram, de procurar superar as que vieram a ocorrer ou de remediar situações extremas, por forma a conseguir o resultado final acordado.
LXII. E se assim não fosse entendido, sempre estaríamos numa situação de força maior cujo resultado final da demanda nunca poderia ser a imputação da responsabilidade do pagamento à aqui recorrente. No caso concreto, o nexo de causalidade adequada relativamente ao incumprimento encontra-se seguramente na esfera de actuação da Recorrida, mas, se assim não fosse entendido pelo tribunal, sempre teria de se fundar antes na ocorrência de uma cadeia de eventos não imputáveis a qualquer das partes e que, a final, se reconduzem a um caso de força maior.
LXIII. Sendo seguro, que, foram as vicissitudes que levaram à falta de entrega da encomenda pela recorrida, a tempo que acabou por despoletar o incumprimento da obrigação, nada fazia prever, em tal momento, esse resultado.
LXIV. Com efeito, de acordo com a experiência da Recorrida, se nada de anormal se tivesse passado, a encomenda chegaria dentro dos 45 dias. Porém, tal não foi possível devido a circunstâncias alheias à vontade porventura de recorrente e recorrida. Então, nunca o desfecho e o enquadramento de direito poderia ser aquele que o Tribunal a quo determinou.
LXV. A considerar o enquadramento que o Tribunal a quo dá sempre se deve dizer o seguinte:
A compra e venda tem como efeitos essenciais a transmissão da propriedade da coisa ou titularidade do direito objeto do contrato; a obrigação de entregar a coisa e a obrigação de pagar o preço (vide artigo 879º do CC).Uma vez aceite a encomenda e assim celebrado o contrato, ficou a recorrida obrigada a proceder à entrega do bem vendido, pelo menos em torno dos 45 dias.
LXVI. Nos termos do artigo 473º do C.Com.:“Se o prazo para a entrega das cousas vendidas não se achar convencionado, deve o vendedor pô-las à disposição do comprador dentro das vinte e quatro horas seguintes ao contrato se elas houverem sido compradas à vista.§ único.
Se a venda das cousas se não fez à vista, e o prazo para a entrega não foi convencionado, poderá o comprador fazê-lo fixar judicialmente.”
LXVII. Assim e salvo se tiver sido convencionado entre as partes prazo para a entrega da coisa vendida, são aplicáveis a este contrato as regras deste artigo 473º do C.Com..
LXVIII. In casu e de acordo com os documentos junto aos autos e que não foram impugnados – A nota de encomenda/proforma de fls. 37.; o e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v,; e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09; email de 16h29 a R.. – ver fls. 15 ; e.mail ver fls. 15 - pelas 16h38, ; e.mail ver fls. 15 - pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada – ver fls. 83 e e.mail de fls. 55e 55v a recorrida obrigou-se efetivamente à entrega da encomenda num determinado prazo.
LXIX. Perante a obrigação assim assumida, entendeu o tribunal a quo, interpretando esta cláusula contratual, que a recorrida jamais se comprometeu com a Recorrente com uma data concreta mas com uma mera previsão/estimativa de data de entrega, com possíveis atrasos, neste ponto, imediatamente antes da confirmação da encomenda pela R. (encomenda confirmada pela R. pelas 17h32 do dia 5.8.2021) a R, havia remetido e.mails pelas 16h09 e 16h38 onde referia que apenas poderia dar um prazo aproximado, escrevendo expressamente que era o melhor que conseguia dar na situação actual e que a data de entrega que constava na nota de encomenda/proforma para a R. carimbar, era uma previsão de entrega, e que poderia haver atrasos
LXX. Atendendo ao que consta em 1 a 10 dos factos provados, bem como em 15, 16, 17 e 18 dos factos provados (e subsequentes comunicações entre as partes trocadas) não restam dúvidas que entre recorrida e recorrente foi efetivamente estabelecido um prazo para a entrega do bem a fornecer.
LXXI. As negociações foram efetuadas via mail – conforme decorre dos documentos oferecidos pela recorrente com a p.i. – e das comunicações trocadas extrai-se que a Recorrente comunica/propõe à recorrida os termos em que aceitará celebrar o contrato.
LXXII. A recorrida receciona a declaração negocial da Recorrente e em resposta procede A ‘indicação dos 45 dias – vide facto 1º a 10 dos factos provados - aceitando assim os termos contratuais e produzindo o contrato os seus efeitos, tal como decorre do artigo 224º do CC
LXXIII. O contexto em que o contrato foi finalizado, permite concluir que as partes fixaram um prazo certo para o cumprimento da obrigação de entrega – os referidos 45 dias pelo menos
NESTES TERMOS EXPOSTOS E NOS MAIS DE DIREITO, CUJO DOUTO SUPRIMENTO SE REQUERER, COM A DEVIDA VÉNIA DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVE DAR-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E REVOGAR-SE A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE JULGUE A AÇÃO TOTALMENTE IMPROCEDENTE POR PROVADA, COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, ASSIM SE FAZENDO, COMO VEEMENTEMENTE SE ESPERA,
ASSIM FARÃO V/EXCIAS. INTEIRA E DESEJADA JUSTIÇA.
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A A. veio apresentar as suas contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso.
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Recebido o recurso, foram colhidos os vistos legais.
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III. O objecto do recurso
Como resulta do disposto nos arts. 608.º, n.º 2, ex. vi do art.º 663.º, n.º 2; 635.º, n.º 4; 639.º, n. os 1 a 3; 641.º, n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil, (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex. officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objecto do recurso.
Face às conclusões das alegações de recurso, cumpre apreciar e decidir essencialmente sobre o erro de julgamento que se imputa à decisão proferida, para além das nulidades arguidas.
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Fundamentação de facto
Factos provados
1. A A. dedica-se a atividades de comércio e distribuição de painéis, importação e exportação.
2. No âmbito da sua atividade comercial, a R. encomendou à A., para vender a terceiros, 1034 placas de compacto fenólico (HPL) da marca ..., de dimensão 06x1220x2440mm, com o preço unitário de € 79,63 + IVA e de 8 cores diferentes: 9 unidades "light pink"; 5 unidades "electric green"; 5 unidades "..."; 5 unidades "polar blue"; 5 unidades "azure"; 5 unidades " ..."; 272 unidades "florescent green"; e 728 unidades "DD".
3. Aquando das negociações o legal representante da R. transmitiu ao comercial da A. que precisaria da mercadoria em 30 dias.
4. Atentas os constrangimentos relacionados com o transporte marítimo o comercial da A. transmitiu que o melhor prazo que conseguia para entrega era 45 dias, mas que podia haver atrasos.
5. A R. fez a encomenda a 3.8.2021.
6. Recebida a nota de encomenda/proforma de fls. 37, pela R. para carimbar – ver e.mail de 5.8.2021 pelas 15h22, junto a fls. 15v, - esta recusou carimba-la, uma vez que não continha qualquer menção a prazo de entrega.
7. Por e.mail que consta de fls. 15v, pelas 16h09, a A. remeteu a nota de encomenda/proforma, que consta de fls. fls. 82, onde consta “ prazo de entrega 45 dias” mencionado expressamente no e.mail “ Quero apenas realçar que devido à instabilidade dos transportes marítimos poderá haver atrasos na entrega.”
8. Pelas 16h29 a R.. – ver fls. 15 – questionou a A quanto a previsão de entrega nas instalações do seu cliente, pretendendo saber a data mais concreta.
9. A esse e.mail respondeu a A. - ver fls. 15 - pelas 16h38, referindo o seguinte:
“ Devido à instabilidade dos transportes marítimos e a Bookings muitas vezes não confirmados por falta de espaço nos pucos navios disponíveis, é praticamente impossível dar uma data de entrega concreta…Portanto, e não querendo arranjar desculpas, este prazo aproximado é o melhor que conseguimos dar na situação actual.” – sublinhado e destacado nosso.
10. Pelas 17h32 desse mesmo dia 5.8.2021, a R, remeteu à A. a nota de encomenda de fls. 82 assinada e carimbada - ver fls. 83.
11. Na nota de encomenda consta como morada de entrega da mercadoria as instalações da sociedade EMP03..., Lda, em ....
12. A R não referiu à A. a existência de quaisquer prazos específicos, data concreta a cumprir por si ou por terceiros no âmbito da empreitada a que o material se destinava.
13. Nem da essencialidade de ter a mercadoria na sua posse em determinada data.
14. Em 10.09.2021, a Requerida solicitou informação sobre o estado da entrega, uma vez que se aproximava o termo do prazo estimado pela Requerente (45 dias), tendo esta última informado que só foi possível agendar transporte marítimo à terceira tentativa, com data estimada de chegada a Portugal em 14.10.2021 – ver e.mails de fls. 18v e 19.
15. Em 22.09.2021, a Requerente informou a Requerida de que teria havido novo adiamento do embarque da mercadoria, tendo esta a nova data estimada de chegada a Portugal em 21.10.2021 – ver fls. 18 e 18v.
16. Tendo a R. informado que tais datas não eram compatíveis com o decorrer da obra, referindo que “ Já sabiam que este material tinha muita urgência: quando vos fizemos a encomenda foi-nos garantido que o material chegaria em setembro e agora só irá chegar em finais de outubro. Serão imputadas multas por parte do Dono da Obra, pelo atraso dos trabalhos, fiquem cientes, que estas multas ser-vos-ão imputadas. Ficamos a aguardar novas datas para avisarmos o n/cliente e posteriormente o dono da obra” –ver e.mail de fls. 18.
17. Em 30.09.2021, a A. toma conhecimento de que apenas parte da mercadoria teria embarcado, por decisão exclusiva do armador do navio comercial de transporte – ver e.mails de fls. 51 e 51v - tendo informado a R. do sucedido e fornecido a nova estimativa de entrega da restante parte da mercadoria: 01.11.2021.
18. Em resposta a essa informação, a R. deu conhecimento da existência de prazos a cumprir na obra durante os meses de outubro e novembro, mais referindo, pela primeira vez, que existia o risco de cancelamento da encomenda por parte do cliente final – ver doc. 4 da oposição, aludindo a prazos estipulados numa reunião de 29.9.2021.
19. Em 04.10.2021, - ver e.mail de fls. 55e 55v - a R. comunicou à A. o cancelamento da encomenda por parte do cliente final, com base nos sucessivos atrasos na entrega, referindo que face a tal só lhe restava “ fazer o mesmo e por isso considerem a encomenda na sua totalidade sem efeito. Ou seja, anulada na sua totalidade.”
20.Nessa altura, parte da encomenda já estava a caminho de Portugal e disso a R. estava ciente.
21. A A. respondeu à R, pelo modo que consta de fls. 54 v., e.mail de 12.10.2021, referindo em suma, que sempre deu um prazo estimado de entrega, alertado sempre para a possibilidade atrasos, tendo informando sempre do estado em que se encontrava o envio, e jamais a R. lhe tendo transmitido que precisava dos artigos em determinada data em virtude de prazos definidos na empreitada a que se destinavam os materiais encomendados, informando , ainda, que iriam ser entregues os produtos nas datas antes indicadas uma vez que estavam já em trânsito.
22. Em 20.10.2021, - ver e.mail de fls 54v - a A informou a R. da chegada do 1º contentor ao Porto ... a 21.10.2021, esclarecendo que iriam efectuar a entrega logo que possível na morada indicada na encomenda EMP03..., Lda, em ....
23. Em meados de novembro de 2021, a A. tentou efetuar a entrega da mercadoria nas instalações da sociedade EMP03..., Lda,, tendo esta última entidade recusado a respetiva descarga, sem qualquer justificação para o efeito – ver fls. 58.
24. A A. enviou então comunicação escrita – ver e mail de fls. 58v - à R. dando conta do sucedido, mais informando que a mercadoria aguardaria a sua recolha nas instalações de um parceiro, atenta a recusa de recebimento no local previamente combinado.
25. Tendo a A. emitido a fatura nº ...73, no valor de € 71.540,75, vencida a 18.11.2021 (ver fls. 60), que enviou à R. nesse mesmo e.mail de 18.11.2021.
26. Que a R. não liquidou, nada dizendo/respondendo à A., desde ../../2021.
27. A A retificou o valor da factura aludida em 21., através da emissão da Nota de Crédito nº ...2, no valor de € 1.357,51, com data de 07.12.2021 (ver fls. 62v), atendendo a lapso incluído na fatura emitida, que atribuía 20 placas a mais que não foram fornecidas, disso dando conta à R. através do e mail de fls. 61v.
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Factos não provados
- que aquando das negociações e formalização da encomenda tenha a A. garantido que a mercadoria chegaria em 30 dias;
- que a A. tenha garantido à R que a mercadoria chegaria a 19.9.2021 – 45 dias após a encomenda;
- que não tenha a A usado de zelo e dado a devida atenção à encomenda efectuada pela R, não lhe conferindo a celeridade que deveria.
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Fundamentação jurídica
Nulidades
Importa começar por apreciar e decidir sobre as nulidades da sentença arguidas pela recorrente, que considera não se ter especificado detalhadamente os fundamentos de facto e de direito, carecer o decidido de coerência lógica e omissão de pronúncia.
Vejamos.
Os vícios determinantes de nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões que deveria conhecer (omissão de pronúncia) — als. a) a e) do n.º 1 do art.º 615 do CPC.
Quanto à nulidade prevista na alínea b), desse preceito, diz-se que a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
Corresponde, assim, à sanção pelo desrespeito do disposto no art. 154.º, n.º 1 do mesmo diploma legal que estabelece que “as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”, o qual assenta no princípio constitucional da obrigatoriedade de fundamentação de todas as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente (art. 205º, n.º 1 da CRP).
Mas, como refere Teixeira de Sousa “apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão” [In “Estudos sobre o Processo Civil”, pg. 221], tal como aponta Lebre de Freitas, ao mencionar que só “há nulidade quando falte em absoluto indicação dos fundamentos de facto da decisão ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação” [In CPC, pg. 297].
Pois, como constitui entendimento dominante na doutrina e na jurisprudência, tal nulidade apenas se verifica quando haja falta absoluta, ausência total de fundamentação de facto e de direito que justifiquem a decisão e não quando a fundamentação seja simplesmente deficiente, incompleta, medíocre ou mesmo errada, pois neste caso afecta apenas o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a tão só ao risco de ser revogada ou alterada em sede de recurso, mas não produz nulidade (cf. Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 140 e Prof. Lebre de Freiras, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, pág. 707; acórdãos do STJ de 21/12/2005, proc. nº. 05B2287 e de 19/09/2006, proc. nº. 06A2230; acórdãos da RE de 8/04/2014, proc. nº. 1166/13.5TBABT-C e de 19/06/2014, proc. nº. 70/09.6TBMMN, todos acessíveis em www.dgsi.pt).
Relativamente à fundamentação de facto, só a falta de concretização dos factos provados que servem de base à decisão, permite que seja arguida a nulidade da sentença.
Quanto à fundamentação de direito, o julgador não tem de analisar, um por um, todos os argumentos ou razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões por elas suscitadas; não se lhe impõe, por outro lado, que indique cada uma das disposições legais em que se baseia a decisão – nesta parte, a fundamentação da sentença contenta-se com a indicação das razões jurídicas que servem de apoio à solução adoptada pelo julgador (cf. Pais do Amaral, Direito Processual Civil, 11ª ed., Agosto de 2013, Almedina, pág. 399 e Juiz Conselheiro Francisco Manuel Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, Abril de 2015, Almedina, pág. 369 e 370).
Relativamente à concreta nulidade prevista na alínea c), do n.º 1 do art.º 615.º do C.P.C., exige-se, para a sua verificação, a oposição entre a decisão e os fundamentos em que assenta ou que ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
A sentença enfermará deste vício se na fundamentação o juiz seguir uma determinada linha de raciocínio, que aponta para uma determinada conclusão, mas acaba por decidir em sentido oposto ou, pelo menos, divergente, remetendo-nos para o princípio da coerência lógica da sentença, pois que entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica. Não está em causa o erro de julgamento, quer quanto aos factos, quer quanto ao direito aplicável, mas antes a estrutura lógica da sentença, ou seja, quando a decisão proferida seguiu um caminho diverso daquele que apontava os fundamentos.
Como escrevem Luís Correia de Mendonça e Henrique Antunes, “Dos Recursos”, Quid Júris, pág. 117: “A observação da realidade judiciária mostra que é vulgar a arguição da nulidade da decisão … E a verdade é que por vezes se torna difícil distinguir o error in judicando – o erro na apreciação da matéria de facto ou na determinação e interpretação da norma jurídica aplicável – e o error in procedendo, como é aquele que está na origem da decisão”.
No mesmo sentido o Ac. do S. T. J. de 30/9/2010, Proc. n.º 341/08.9TCGMR.G1.S2, in www.dgsi.pt, refere que “o erro de julgamento (error in judicando) resulta de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error júris), para que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa”.
Porque assim é, as nulidades da decisão, são vícios intrínsecos da própria decisão, deficiências da estrutura da sentença que não podem confundir-se com o erro de julgamento que se traduz antes numa desconformidade entre a decisão e o direito (substantivo ou adjectivo) aplicável. Nesta última situação, o tribunal fundamenta a decisão, mas decide mal; resolve num certo sentido as questões colocadas porque interpretou e/ou aplicou mal o direito (cf. Ac. RC de 15.4.08, Proc.1351/05.3TBCBR.C1).
Já segundo o disposto no art. 615.º, n.º 1 al. d) do CPC, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
A previsão deste art. 615º, n.º 1, al. d) está em consonância com o comando do n.º 2 do art. 608.º do mesmo Código, em que se prescreve que «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras».
Ora, como decorre da decisão proferida foram apontados os fundamentos de facto e de direito de suporte ao que foi decidido.
Concretamente refere-se o que foi reportado entre as partes aquando das negociações, a concretização da encomenda, a indicação de poder haver atrasos na entrega devido à instabilidade dos transportes marítimos, sendo apenas indicado um prazo aproximado, por ser praticamente impossível dar uma data concreta, as posteriores informações dadas até ao cancelamento da encomenda, posicionamento da A., até à recusa do seu recebimento e não pagamento do valor facturado.
Em conformidade entendeu-se não existir um prazo certo e determinado e, assim, uma qualquer situação de mora debitoris.
Nesse sentido apontou-se as razões e prova que levaram a dar a factualidade como provada e a concluir no sentido apontado.
Não se pode considerar, como tal, ocorrer nulidade da decisão por ausência de fundamentação fáctica e jurídica ou mera insuficiência ou deficiência.
No caso concreto, a sentença recorrida, para além de apresentar os fundamentos de facto, aponta a motivação que levou o tribunal a quo a dar os factos alegados pelas partes como provados e não provados, sendo posteriormente indicadas as normas jurídicas julgadas aplicáveis, de acordo com o sentido da decisão proferida, pelo que se considera não inexistir absoluta falta de fundamentação a justificar a procedência da nulidade prevista na alínea b) do artº 615º do C.P.C.
Diferente é já não se concordar com o sentido da decisão.
Daqui decorre igualmente do exposto e da leitura da totalidade dos factos, que não apenas da factualidade vertida nos pontos 3, 4, 10 e 19, da matéria de facto provada, não existir oposição entre a decisão e os fundamentos em que assenta ou ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Pois, para além da recorrente ter percebido bem o que foi decidido, a linha de raciocínio seguida pelo juiz vai de encontro ao que foi decidido, de forma lógica e coerente, de acordo com o que se entendeu ser o direito aplicável aos factos apurados.
Aliás, como se referiu não está em causa o erro de julgamento, quer quanto aos factos, quer quanto ao direito aplicável, mas antes a estrutura lógica da sentença, ou seja, saber se a decisão proferida seguiu, ou não, um caminho diverso daquele que apontava os fundamentos.
Pois, tal nulidade importa um vício intrínseco da própria decisão, uma deficiência da sua estrutura que não se confunde com uma decisão errada, resultante de uma interpretação e/ou má aplicação do direito ao caso.
Assim, a nulidade em questão não se verifica quando o tribunal, na apreciação das questões suscitadas pelas partes, tenha utilizado argumentos, razões ou fundamentos diversos dos invocados pelas partes.
Pois, na sua função jurisdicional, ao tribunal compete determinar qual a norma ou normas jurídicas aplicáveis e interpretá-las e aplicá-las, sendo livre nessa tarefa, em conformidade com o disposto no art. 5.º, n.º 3, do CPC, que dispõe: «O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito» (Trata-se de um princípio expresso nas velhas máximas dos romanistas: iura novit curia e da mihi factum dabo tibi ius.).
Assim, em sede da matéria de direito o tribunal não está sujeito à alegação das partes, nem sequer no que respeita à qualificação jurídica dos factos por elas efectuada, e goza da mais ampla liberdade na aplicação do Direito, daí que quanto às questões colocadas, o tribunal de recurso possa conhecer de tudo que para elas releve, não estando limitado pelo afirmado pelas partes nas alegações de recurso, tanto em matéria de direito, como em relação à matéria de facto que pode ser alterada oficiosamente»
Face a estes princípios, no caso sub judice, afigura-se-nos que não pode proceder também a arguição de nulidade invocada com base na al. c), do citado art. 615.º, n.º 1, do Cód. Civil.
Quanto à última das nulidades, conforme se refere, a respeito desta matéria, no acórdão deste Supremo Tribunal de 04.03.2015, proferido no processo 2180/09.0TTLSB.L1.S2, disponível em www.dgsi.pt, «n[N]a abordagem da omissão de pronúncia é preciso distinguir entre “questão” para este efeito, e fundamentos ou argumentos aduzidos pelas partes, pois relativamente aos fundamentos do direito importa referir que o julgador não tem de analisar todas as razões jurídicas que cada uma das partes invoque em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões suscitadas.
Na verdade, como refere Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Reimpressão, 1981, p. 143, «quando as partes submetem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão».
Deste modo, uma coisa é não tomar conhecimento de determinado facto ou de qualquer argumento invocado pela parte, outra completamente distinta é não tomar conhecimento de determinada “questão” submetida à apreciação do tribunal.».
Ora, claramente, o tribunal a quo apreciou e decidiu a questão suscitada nos autos que se prendia com o objecto do litígio, quanto ao direito da A. receber da Ré a quantia reclamada relativa à encomenda por esta efectuada, o que implicava apurar se o cancelamento comunicado posteriormente pela demandada era susceptível de obstar ao direito pretendido exercer pela A., face ao alegado incumprimento por parte desta do prazo que diz ter sido acordado para o cumprimento da prestação.
Era esta a questão a apreciar e que foi efectivamente decidida pelo tribunal a quo, embora em sentido contrário ao defendido pela Ré.
Diferente, assim, da omissão que não se verifica é saber se ao caso outra devia ter sido a interpretação dos factos e aplicação do direito a eles aplicável.
Julgando não se verificar as nulidades arguidas, importa agora proceder à reapreciação da matéria de facto impugnada pela recorrente.
*
Reapreciação da matéria de facto impugnada
São objecto dessa impugnação os factos provados constantes dos pontos 12 e 20 e, ainda, os factos não provados.
Vejamos.
Quanto ao ponto 12, entende a recorrente que ficou demonstrado ter sido fixado um prazo máximo de 45 dias e que era essencial, para si, a entrega da encomenda antes da obra acabar, o que ficou patente nos mails juntos aos autos.
Por outro lado, considera não constar dos autos nenhum documento que comprove ter a mercadoria chegado à alfândega.
Como tal, conclui que tal factualidade devia ser dada como não provada.
Por outro lado, aponta uma contradição insanável entre a factualidade vertida no ponto 14, dos factos provados, e a que consta do ponto 3, dos factos não provados.
A este respeito, o tribunal a quo fundou a sua convicção na documentação junta aos autos, valorando os e-mails e missivas trocadas entre as partes, no sentido de se considerar ter sido a Ré elucidada pela A. que se tratava de um prazo meramente estimativo, ao alertar que poderia haver atrasos devido à situação vivida nos transportes marítimos.
Conjugadamente, atentou-se nos depoimentos prestados, concretamente, do legal representante da R., na medida em que, apesar de ter aludido aos termos do negócio celebrado com a A., assegurando ter comprado com a condição do material chegar em determinado prazo (refere os tais 45 dias), resultar dos e.mails trocados a 5.8.2021, ter sido esclarecido antes da confirmação da encomenda, e por duas vezes, que se tratava de uma mera previsão/estimativa de entrega, sujeita a atrasos, atentas as contingências vividas no âmbito do transporte marítimo, daí não resultando qualquer comunicação que havia prazos concretos para a utilização do material, e que a partir de x data não mais teria interesse no negócio.
Teve-se, ainda, em conta o depoimento das testemunhas:
- EE, administrativo na A, desde agosto de 2019, que acompanhou a encomenda, esclarecendo nunca ter sido informado da necessidade de entrega numa data concreta e limite, mais elucidando o tribunal acerca das diligências encetadas pela A junto do fabricante e transitário, comprovando-se que a 5.8.2021, data da confirmação da encomenda, a A estava já a pedir cotação para o transporte – cfr. email de fls. 46v, bem como das informações transmitidas à R., detalhando os problemas subjacentes ao embarque do material da India para Portugal;
- FF, comercial da A., há 8 anos, que angariou o negócio e ter alertado para atrasos nos transportes marítimos;
- GG, administrativo na A. há 6 anos, que explicou nunca darem prazos concretos em situações de transporte marítimo, mas meras estimativas;
- HH, funcionário à época da transitária contratada pela A. para efectuar o transporte, que aludiu aos procedimentos encetados nesta situação, explicando que quando está transporte marítimo envolvido, são sempre dadas meras estimativas/previsões de chegada da mercadoria, tanto mais que persistiam restrições relacionadas com a Covid 19, e que só a viagem da India para ... demora 30 dias, a que se seguem os procedimentos junto da alfândega que, sem constrangimentos, e em situação normal, importaria pelo menos 40 dias;
- CC, funcionária da R. no departamento de compras, que referiu que não constando prazo na proforma, recusou carimbá-la, solicitando a inclusão do prazo, pese embora depois tivessem avançado com a encomenda apesar da ressalva efectuada e não se demonstrasse ter sido comunicado à A. que precisavam do material até x dia, senão não mais teriam interesse;
- II, cliente da R. para esta mercadoria, que aludiu ao negócio feito com a R., explicando que lhe prometeu entrega em final de Agosto/inicio de Setembro, sendo que, acabou por cancelar a encomenda porque com os atrasos que lhe ia comunicando a R., na altura em que chegava a encomenda já tinha que ter a obra pronta, frisando que a R. nunca antes dos atrasos tinha falado de constrangimentos relacionados com o transporte, como bem sabia.
Posto isto, importa ter em conta que na reapreciação da matéria de facto, impera o ónus de especificação de cada um dos pontos da discórdia da recorrente com a decisão recorrida, seja quanto às normas jurídicas e à sua interpretação, seja a respeito dos factos que considera incorrectamente julgados e dos meios de prova que impunham uma decisão diferente, devendo, neste caso, indicar a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (cf. Arts. 639.º, n.º 2 e 640.º, nºs 1 e 2 do NCPC).
Assim, face ao disposto no citado art.º 640.º, n.º 1, do NCPC, quando seja impugnada a decisão da matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos da matéria de facto que consideram incorrectamente julgados [alínea a)]; os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [alínea b)]; e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [alínea c)].
In casu, como decorre da impugnação apresentada, a Recorrente limita-se, nas conclusões, a remeter para a prova que indica, concluindo, sem mais, pela fixação de um prazo certo e inexistência de falta de prova documental comprovativa da chegada da encomenda à alfândega, sem apontar o erro de apreciação e julgamento por parte do tribunal a quo face à convicção espelhada na valoração da prova efectuada, de acordo com o que se expôs.
Não se procede objectivamente a um qualquer relacionamento entre a referida factualidade e a prova produzida que impunham uma decisão diferente num determinado sentido.
Não basta, pois, vir requerer-se a alteração da decisão da matéria de facto, sem se apontar a concreta e precisa divergência na apreciação e valoração da prova, apontando qual o erro de julgamento que se verificou.
Pois, há que proceder a uma análise crítica de todos os elementos probatórios e não apenas daqueles que isoladamente favorecem uma parte ou outra, sem a devida conjugação e avaliação de toda a prova.
Acontece que, a recorrente não procede a uma apreciação critica das provas, com base numa avaliação global de toda a prova produzida, indicando qual o concreto erro cometido pelo tribunal a quo na apreciação feita, em conformidade com o que se encontra explanado na motivação constante da decisão proferida.
Aliás, como se constata, nada se disse e refere quanto ao último ponto dado como não provado, no sentido de indicar as razões e fundamentos que permitiram alterar o sentido da resposta dada a essa invocada falta de zelo, atenção e cuidado da A. no tratamento da encomenda efectuada, pese embora se possa intuir que, quanto aos demais factos vertidos no elenco dos factos não provados, se pretenda que sejam dados como provados pela mesma linha de raciocínio quanto à matéria impugnada relativa aos apontados factos provados, em resultado da sua visão sobre a prova que diz ter sido por si produzida, mas não especificamente detalhada e precisa, capaz de abalar a indicada pelo tribunal a quo.
De qualquer das formas, tendo em conta o Acórdão do STJ UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA (CÍVEL), de 17-10-2023, Proc. 8344/17.6T8STB.E1-A.S1, ‘sobre o impugnante impende o dever de especificar, obrigatoriamente, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera julgados de modo incorreto, os concretos meios de probatórios constantes do processo, de registo ou de gravação nele realizado, que imponham decisão diversa da recorrida, bem como aludir a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (…), mas sem deixar de ter em vista a adequada proporcionalidade e razoabilidade, de modo a que não seja sacrificado um direito das partes em função de um rigorismo formal, desconsiderando aspetos substanciais das alegações, numa prevalência da formalidade sobre a substância que se pretende arredada.’.
Ora, analisada toda a prova, no seu conjunto, tem de se concluir ter-se feito reflectir nos factos o que resulta essencialmente da correspondência trocada pelas partes, quanto ao ponto 12, dos factos provados, e referido pelas testemunhas que trataram de todo o processo administrativo e alfandegário, quanto ao ponto 20, dos factos provados, sem que seja possível concluir-se, sem mais, em conformidade com o que resulta dos factos não provados, dado que o teor dos e-mails, após a indicação de um prazo, faz alusão a atrasos, para além do facto de não se ter logrado demonstrar a já referida falta de zelo, cuidado e atenção da A. em relação à encomenda em causa nos autos.
In casu, era sobre a parte interessada na alteração da decisão de facto que recaía o ónus de alegação e especificação dos concretos pontos de facto e meios de prova que impunham essa alteração, o que não se conseguiu.
Importa, ainda, considerar a este respeito que o princípio da livre apreciação das provas continua a ser a base, nomeadamente quando em causa estão documentos sem valor probatório pleno.
Por fim, é de realçar que embora não exigida na formação da convicção do julgador uma certeza absoluta, por via de regra não alcançável, quanto à ocorrência dos factos que aprecia, é necessário que da análise conjugada da prova produzida e da compatibilização da matéria de facto adquirida, extraindo dos factos apurados as presunções impostas por lei ou por regras da experiência (vide artigo 607.º n.º 4 do CPC) se forme no espírito do julgador a convicção de que com muito elevado grau de probabilidade os factos em análise ocorreram.
Neste contexto e na dúvida acerca da realidade de um facto ou da repartição do ónus da prova, deve a mesma ser resolvida contra a parte à qual o facto aproveita, tal como decorre do disposto nos artigos 414.º do CPC e 346º do C.C..
Por fim, importa, ainda, referir que a declaração negocial valerá de acordo com a vontade real do declarante, se esta for conhecida do declaratário – art.º 236.º, n.º 2, CC.
Não o sendo, valerá com o sentido que possa ser deduzido por um declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (teoria da impressão do destinatário).
Nos negócios formais, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto – art.º 238.º, n.º 1; dito doutra forma: para que possa valer, o sentido atribuído pelo “declaratário normal” deverá estar expresso, ainda que de forma imperfeita, no próprio texto do documento que corporiza a garantia prestada.
O sentido sem correspondência mínima no texto poderá ainda valer se traduzir a vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem e essa validade - artº 238.º, n.º 2.
Estas regras, no fundo, não são mais do que critérios interpretativos dirigidos ao juiz e às partes contratantes. E o que basicamente se retira do artº 236º é que, em homenagem aos princípios da protecção da confiança e da segurança do tráfico jurídico dá-se prioridade, em tese geral, ao ponto de vista do declaratário (receptor). A lei, no entanto, não se basta com o sentido compreendido realmente pelo declaratário (entendimento subjectivo deste) e, por isso, concede primazia àquele que um declaratário normal, típico, colocado na posição do real declaratário, depreenderia (sentido objectivo para o declaratário) – acordão do STJ de 28.10.97, BMJ 470, 597.
Há que imaginar - escreve o Prof. Paulo Mota Pinto em Declaração Tácita e Comportamento Concludente no Negócio Jurídico, 208 - uma pessoa com razoabilidade, sagacidade, conhecimento e diligência medianos, considerando as circunstâncias que ela teria conhecido e o modo como teria raciocinado a partir delas, mas figurando-a na posição do real declaratário, isto é, acrescentando as circunstâncias que este efectivamente conheceu (mesmo que um declaratário normal delas não tivesse sabido - por exemplo, devido ao facto de o real declaratário ser portador de uma cultura invulgarmente vasta e superior à média) e o modo como aquele concreto declaratário poderia a partir delas ter depreendido um sentido declarativo. Ainda segundo este mesmo autor, “… a interpretação da declaração negocial não tem em vista apurar a vontade do declarante ou um sentido que este tenha querido declarar, estando antes em causa o sentido objectivo que se pode depreender do seu comportamento”.
E, estando-se perante um contrato tipicamente sinalagmático, há que atender, simultaneamente, às declarações de ambas as partes porque ambas são, também simultaneamente, declarante e declaratário (neste sentido, Oliveira Ascensão, Direito Civil, Teoria Geral, II, 2ª edição, pág. 435).
Tudo isto significa em termos práticos que o intérprete deve, relativamente a ambos os contraentes, tentar definir a posição em que se encontram perante a declaração da contraparte, e colocar um declaratário ideal (normal) na posição de declaratário real.
No caso dos autos, como é possível constatar-se do e-mail de 5.8.21, remetido pela A. à Ré foi referido que ‘devido a instabilidade dos transportes marítimos e a Bookings muitas vezes não confirmados por falta de espaço nos poucos navios disponíveis, é praticamente impossível dar uma data de entrega concreta (sublinhado nosso)…nunca passei por uma situação igual à que se está a passar desde há cerca de 1 ano na parte marítima…não querendo arranjar desculpas, este prazo aproximado(sublinhado também nosso) é o melhor que conseguimos dar na situação actual’.
Daqui decorre não ter sido indicado um prazo certo, determinado, preciso e concreto porque não dependia da A., mas de como corresse o transporte.
Pensa-se que outra não pode ser a interpretação a dar ao conteúdo das comunicações trocadas entre as partes, considerando o que um declaratário normal, típico, que, colocado na posição do real declaratário, depreenderia.
Tanto mais que, após a Ré ter insistido pretender saber a data mais concreta (cfr. fls. 15, do p.p.) e lhe ser dada aquela informação acabou a Ré por subscrever a proforma remetida para formalizar a encomenda, com a indicação da previsão de entrega, seguida da menção que, devido à instabilidade dos transportes marítimos, poderia haver atrasos na entrega.
Apesar disso, sem qualquer ressalva ou outra informação, a Ré assinou o dito proforma respeitante à encomenda.
Perante estas estipulações contratuais, e tendo presente tudo quanto se expôs, a conclusão que retiramos é a de que, colocado na posição das partes, um declaratário normal poderia extrair o sentido negocial apurado pela 1ª instância.
Isto considerando de forma acrescida o facto de se estar perante pessoas jurídicas habituadas a este tipo de situações, pelo que face à sua qualificação e experiência profissional, deve presumir-se que sopesaram com atenção e cuidado o significado e o alcance das palavras utilizadas na fase da negociação prévia ao acordo firmado.
Certo é que, tendo, a 10.9.21, sido a Ré informada só ter sido possível agendar transporte com data estimada a 14.10.21 (cfr. fls. 18v/19), ou seja, já depois da data indicada como previsão de entrega, sujeita a atrasos, nada disse, só a 21.10.21, quando comunicado novo adiamento é que veio informar tal não ser compatível com a obra, mesmo assim referindo aguardar nova data.
Acresce, ainda, que, só após comunicação de nova data de entrega de parte da mercadoria pelas razões invocadas, é que a Ré veio informar do risco de cancelamento por parte do cliente final e, a 4.10.21, comunicar ter ocorrido esse cancelamento, dando sem efeito a encomenda e a anulação da mesma na sua totalidade.
De qualquer das formas para o caso que agora interessa, considera-se que não é possível concluir ter sido fixado um prazo certo e determinado para a entrega, em nosso entender, face às concretas circunstâncias colocadas em evidência e segundo o que se entende dever ser também a interpretação que um declaratário normal retiraria, pelo menos, do teor dos e-mails trocados entre as partes que revelam o sentido negocial possível de ser extraído daí.
Invoca ainda a recorrente existir uma contradição insanável entre a factualidade constante do ponto 3, dos factos dados como provados e a que consta do ponto primeiro dos factos dados como não provados.
A este respeito sempre se dirá que ocorre contradição quando dois ou mais segmentos da resposta ou duas ou mais respostas conjugadas entre si são incompatíveis, no sentido de que a verificação de uma determinada realidade de facto exclui a outra.
A prova de um determinado facto torna impossível ter-se verificado outro facto igualmente dado como provado, ou pelo, contrário, um facto dado provado pode ser contraditório com um facto dado como não provado, pois a existência de tal facto pressuporia o facto dado como não provado.
No ac. da RG, de 7.07.2011, processo n.º 621/07.0TBPVL.G1, consultado em www.dgsi.pt, a este propósito decidiu-se: “I - As respostas aos quesitos são contraditórias quando têm um conteúdo logicamente incompatível, isto é, quando não podem subsistir ambas utilmente (…)”
São contraditórias: “quando ambas façam afirmações inconciliáveis entre si, de modo a que a veracidade de uma exclua a veracidade da outra” (Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, Vol. III, 3ª ed., pág. 173); “quando têm um conteúdo logicamente incompatível, isto é, quando não podem subsistir ambas utilmente” (Ac. do STJ, de 04.02.97, proferido no Proc. nº 458/96, da 1ª Secção – Conselheiro Ribeiro Coelho –, in “Sumários do STJ”, nº 8, de Fevereiro de 1997, pág. 17).
In casu, o tribunal a quo deu como provado que ‘aquando das negociações o legal representante da R. transmitiu ao comercial da A. que precisaria da mercadoria em 30 dias’ (cfr. ponto 3FP) e como não provado que ‘aquando das negociações e formalização da encomenda tenha a A. garantido que a mercadoria chegaria em 30 dias’ (cfr. ponto 1 FNP).
Daqui decorre à evidência não existir qualquer contradição, tanto mais que se está perante um facto provado e outro não provado respeitante a realidades diferentes.
Pois, uma coisa é ter a Ré transmitido precisar da mercadoria em 30 dias, outra bem diferente é ter a A. garantido que a mercadoria chegaria em 30 dias, quando se sabe, até por via dos demais factos, que se comunicou não ser possível garantir esse prazo, nem sequer um outro mais longo, dado os constrangimentos relacionados com o transporte marítimo.
Inexiste, assim, qualquer contradição.
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Do erro na aplicação do direito
A recorrente discorda do decidido, para tanto defendendo que a obrigação entre as partes assumidas estava sujeita a prazo certo, pelo que uma vez ultrapassado o mesmo a recorrida se constituiu em incumprimento definitivo da obrigação, legitimador da resolução contratual.
Como referido pelo tribunal a quo, entre as partes foi celebrado um contrato de compra e venda mercantil (vide artigo 463.º do C.Com.), já que tanto A. como R. actuaram no âmbito da sua actividade comercial, destinando o bem adquirido a revenda a terceiros (ponto 2, dos FP).
Contrato este ao qual são aplicáveis as disposições legais do Cód. Civil no que não esteja especialmente previsto naquele diploma (vide artigo 3.º do C. Com.).
A compra e venda tem como efeitos essenciais a transmissão da propriedade da coisa ou titularidade do direito objecto do contrato; a obrigação de entregar a coisa e a obrigação de pagar o preço (vide artigo 879.º do CC).
Aceite a encomenda, ficou a A. obrigada a proceder à entrega do bem.
Nos termos do artigo 473.º do C.Com.: “Se o prazo para a entrega das cousas vendidas não se achar convencionado, deve o vendedor pô-las à disposição do comprador dentro das vinte e quatro horas seguintes ao contrato se elas houverem sido compradas à vista.
§ único. Se a venda das cousas se não fez à vista, e o prazo para a entrega não foi convencionado, poderá o comprador fazê-lo fixar judicialmente.”
Assim e salvo se tiver sido convencionado entre as partes prazo para a entrega da coisa vendida, são aplicáveis a este contrato as regras deste artigo 473.º do C.Com.
Tal como ensina Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. II, 4ª ed. Almedina p. 40 e segs., o momento em que a obrigação deve ser cumprida pode ser fixado por convenção das partes ou por disposição legal.
A partir do momento temporal fixado, a obrigação é exigível.
Para o caso releva a determinação do momento a partir do qual o credor pode exigir o cumprimento da obrigação.
No Cód. Civil o legislador distinguiu as obrigações, no que ao seu vencimento/ou exigibilidade respeita, em obrigações puras – aquelas que se vencem logo que constituídas “por falta de estipulação ou disposição da lei” e que assim podem ser exigidas a todo o tempo pelo credor (vide artigo 777.º n.º 1 do CC), mediante interpelação ao devedor; e obrigações a prazo – aquelas que apenas podem ser exigidas pelo credor decorrido determinado prazo ou chegada certa data.
Dentro desta categoria das obrigações a prazo cabendo ainda as obrigações de prazo natural, circunstancial ou usual, em relação às quais e na falta de acordo entre as partes é facultado o recurso aos tribunais para fixação judicial de prazo (vide artigo 772.º n.º 2 do CC).
Prazo que se tem por estabelecido a favor do devedor, quando se não mostre que o foi a favor do credor, ou do devedor e do credor conjuntamente (artigo 779.º do CC).
Está ainda prevista a hipótese de as partes acordarem que o devedor cumprirá quando puder, caso em que a prestação só será exigível quando o devedor tiver possibilidade de cumprir (778.º n.º 1 do CC) ou quando o devedor quiser “cum voluerit” (778.º n.º 2 do CC).
Na perspectiva do momento em que é convencionado o prazo, é ainda de distinguir este em originário – contemporâneo à obrigação e subsequente. Podendo tanto o prazo originário como o subsequente ser substituídos por outro que amplie ou reduza o prazo anterior.
Quando o novo prazo constitui um aditamento ao anterior, começando a contar-se só após o termo deste (ex nunc) diz-se correntemente que houve uma prorrogação do prazo.
Quando ao invés o novo prazo se conta ab initio ou ex tunc, teremos a substituição do prazo inicial por um prazo diferente.
Por último e com relevo para o que se discute nos autos, importa saber qual a finalidade visada pelas partes quando fixam um prazo.
Se pretendem que a prestação seja efectuada dentro do prazo estipulado, sob pena de o negócio caducar por nela perder o credor o interesse, verifica-se um “negócio fixo absoluto”, ou nas palavras de Brandão Proença, in Lições de Cumprimento e não Cumprimento das Obrigações (reimpressão Coimbra Editora, p. 76), “termo essencial”.
Se a fixação do prazo não envolve a caducidade do negócio, mas apenas confere ao credor - vencido que seja o prazo sem que a obrigação seja cumprida – a faculdade de resolver o contrato ou exigir indemnização pelo dano moratório, então há um “negócio fixo relativo ou simples.”
Descendo ao nosso caso, improcedente que se mostra a pretendida alteração da matéria de facto, a recorrente não logrou provar, como alegou, e cuja prova lhe competia (art. 342.º, n.º 2, do CC) a existência de qualquer prazo fixo, por parte da A. para cumprir a sua obrigação. Não se apurou a existência de qualquer termo essencial, objectivo ou subjectivo absoluto estabelecido ab initio, pelo que não pode considerar-se que a A. entrou em incumprimento definitivo da obrigação, por não efectivação da sua prestação.
Tanto basta para concluirmos que a ré não está desonerada de pagar o crédito reclamado pela A.
Na verdade, no caso dos autos, decorre dos factos que, pretendendo a Ré o cumprimento num prazo de 30 dias, a A. desde logo alertou para o facto de tal ser impossível e necessitar, pelo menos, de 45 dias, salvaguardando atrasos decorrentes dos constrangimentos relacionados com o transporte marítimo.
Foi com base nestas premissas que a Ré contratou, bem sabendo que não seria possível assegurar um prazo certo para a entrega e, mesmo assim, aceitou contratar.
Certo é que, mesmo depois de decorridos os 45 dias mínimos, a Ré veio informar que, apesar de não ser compatível com a obra, continuar a aguardar nova data (cfr. fls. 18 do p.p.), em vez de ter vindo exigir a fixação de um prazo, com base na invocação da perda de interesse daí decorrente.
E, depois, mais tarde, acabou novamente por informar do risco de cancelamento por parte do cliente final, só mais tarde vindo a cancelar a encomenda.
Daqui decorre que a Ré ao contratar nos moldes em que o fez aceitou o risco dos atrasos que pudessem vir a ocorrer, pelo que deles não se pode valer para depois vir beneficiar da sua ocorrência, invocando o cancelamento da encomenda pelo cliente final, quando devia saber que tal poderia ocorrer.
A assim não se entender estar-se-ia a premiar a Ré pela sua conduta contrária ao seu anterior comportamento em manifesto abuso de direito.
O que a realidade processualmente adquirida permite descortinar é uma situação de dificuldade de cumprimento da prestação desde logo devidamente comunicada à parte contrária como possível de se verificar, dificuldade essa com a qual, no entanto, a apelante ab initio, deveria ter contado, pelas razões já sobejamente expostas.
Se a A. desde logo alerta para possíveis atrasos, a outra conclusão não é possível chegar que não seja a de que a Ré foi imprevidente, tendo agido sem o grau de diligência a que, razoavelmente, face ao concreto circunstancialismo então existente, se encontrava obrigada, tendo em conta a obrigação por si assumida perante terceiros que obrigavam a cumprir em prazo certo.
Nestes termos entendemos, pois, que o recurso da ré não pode proceder.
*
IV. DECISÃO
Em conformidade com o exposto, acordam os Juízes que integram esta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.
Custas a cargo da apelante.
Notifique.
*
Guimarães, 7 de Novembro de 2024
(O presente acórdão foi elaborado em processador de texto pela primeira signatária sem observância do acordo ortográfico, à excepção da transcrição a que se procedeu)