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CONTRAORDENAÇÕES LABORAIS
CÚMULO JURÍDICO
SANÇÃO ACESSÓRIA
ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
Sumário
I - Nos processos de contra-ordenação em que esteja em causa a aplicação de uma única coima, em cúmulo jurídico, pela prática de várias infracções, a admissibilidade de recurso, para o Tribunal da Relação, afere-se em função de cada uma das coimas parcelares que devem ser superiores a 25 Ucs ou, independentemente desse valor, se abranger sanção acessória. II - Do teor da conjugação dos n.ºs 1 al. a) e 3 do do art. 49.º, da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro resulta a inadmissibilidade de recurso relativamente às contra-ordenações cuja coima aplicada seja inferior a 25 UC ou valor equivalente.
(Da responsabilidade da Relatora)
Texto Integral
Proc. Nº 2669/23.9T8VFR.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro Juízo do Trabalho de Santa Maria da Feira - Juiz 1
Recorrente: A..., LDA
Recorrida: ACT – Autoridade para as Condições do Trabalho
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto
I - RELATÓRIO
“A..., LDA”, com o NIPC ...32, com sede na Rua ..., ... ... e estabelecimento (estaleiro) na Rua ..., ..., ..., ... ..., impugnou judicialmente a decisão administrativa proferida pela Autoridade para as Condições de Trabalho– Centro Local de Entre Douro e Vouga, que a condenou e lhe aplicou a coima única de 62 U.C., correspondentes à quantia de €6.324,00 (seis mil trezentos e vinte e quatro euros), pela prática de quatro contraordenações, concretamente a violação do disposto no n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de outubro, que procede à revisão da regulamentação das condições de segurança e de saúde no trabalho em estaleiros temporários ou móveis, constante do Decreto-Lei n.º 155/95, de 01 de julho, o que constitui contraordenação grave, nos termos da alínea a) do artigo 26.º do mesmo diploma (falta de comunicação prévia da abertura de estaleiro à Autoridade para as Condições do Trabalho, dentro do prazo legal); a violação do disposto no n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10, conjugado com o artigo 5.º do mesmo diploma legal, que procede à revisão da regulamentação das condições de segurança e de saúde no trabalho em estaleiros temporários ou móveis, o que constitui contraordenação muito grave, nos termos da alínea a) do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de outubro (falta de apresentação do Plano de Segurança e Saúde em projeto à Autoridade para as Condições do Trabalho); a violação do disposto no n.º 1 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10, que procede à revisão da regulamentação das condições de segurança e de saúde no trabalho em estaleiros temporários ou móveis, constante do Decreto-Lei n.º 155/95, de 01/07, o que constitui contraordenação muito grave, nos termos da alínea a) do n.º 3 do artigo 25.º do mesmo diploma (a arguida, na qualidade de dono da obra, não impediu que a entidade executante iniciasse a implantação do estaleiro sem estar realizado e aprovado o plano de segurança e saúde para a execução da obra); e a violação do disposto no n.º 2 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10, conjugado com a alínea a) do artigo 17.º do mesmo diploma legal, que procede à revisão da regulamentação das condições de segurança e de saúde no trabalho em estaleiros temporários ou móveis, constante do Decreto-Lei n.º 155/95, de 01/07, o que constitui contraordenação muito grave, nos termos da alínea a) do n.º 3 do artigo 25.º do mesmo diploma (a arguida, na qualidade de dono da obra, não nomeou um coordenador de segurança em obra, antes da retoma dos trabalhos).
A condenação na coima única é ainda acrescida da sanção acessória de publicidade da decisão condenatória, nos termos do artigo 562º, n.º 1, do Código do Trabalho, no que se refere às contraordenações muito graves.
Nos termos do artigo 551º, n.º 3, do Código do Trabalho, foi ainda responsabilizado solidariamente pelo pagamento da coima o representante legal da sociedade arguida/recorrente, AA, portador do C.C. n.º ...4 válido até 17/08/2030, contribuinte fiscal n.º ...30, com domicílio na Rua ..., ..., ... ....
Pede que seja julgado procedente o recurso, com a consequente absolvição da sociedade arguida das contraordenações que lhes são imputadas e da coima única que lhe foi aplicada, fundamentando a sua impugnação, em síntese, alegando:
- que a decisão administrativa é nula por incompetência material, porquanto o poder de decisão final do processo de contraordenação em matéria laboral incumbe ao Inspetor-Geral da A.C.T., o que decorre das atribuições da A.C.T. previstas na alínea k) do nº 2 do artigo 2º, bem como assim do nº 1 do artigo 4º, ambos do Decreto-Regulamentar nº 47/2012, de 31 de Julho, e do artigo 3º, nº 1, alínea a), e nº 2, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, e que inexiste qualquer delegação de poderes da Inspetora-Geral no que concerne ao poder para proferir decisão no âmbito do presente processo de contraordenação, sendo certo que apenas foram delegados os poderes de aplicação de coimas e de sanções acessórias (cfr. artigo 5.8, do Despacho nº 8170/2021), o que não inclui o poder de decisão; a consequente incompetência material do órgão administrativo que proferiu a decisão recorrida acarreta nulidade insanável, nos termos dos artigos 32º, nº 1, e 119º, alínea e), do C.P.P., aplicável por remissão dos artigos 60º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, e 41º do R.G.C.O;
- que a decisão administrativa se encontra ferida de nulidade, por não enumerar os factos provados, o que configura uma omissão de pronúncia, e por não se encontrar devidamente fundamentada, o que configura uma nulidade insanável, pois que nos termos conjugados do disposto nos artigos 41º e 58º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, artigo 25º, nº 1, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, e 374º, nº 2, e 379, nº 1, alínea b), do C.P.P., deve constar da decisão administrativa proferida em procedimento de contraordenação a enumeração dos “factos provados” e dos “factos não provados” e da apreciação da prova;
- que, dos factos provados na decisão recorrida não constam todos os elementos objetivos e subjetivos do tipo a que aludem os artigos 6º, nº 3, 9º, nº 2, 13º, nº 2, e 15º, nº 1, todos do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro;
- que, na decisão recorrida não se mostram imputados incisivamente à sociedade arguida atos de execução material das contraordenações imputadas, pelo que não pode o Tribunal, sob pena de violação da estrutura acusatória do processo contraordenacional, alargar a investigação a outros factos que permitam a condenação;
- que na decisão recorrida não se encontram descritos os factos integrantes dos elementos subjetivo das contraordenações imputadas à sociedade arguida/recorrente, omitindo-se totalmente qualquer consideração sobre os termos em que a conduta da Arguida é tida como dolosa ou negligente, bem como assim quanto ao nexo causal entre essa conduta e a intenção, concluindo-se apenas e sumariamente que a arguida atuou com negligência, o que acarreta nulidade insanável, nos termos conjugados do disposto nos artigos 41º e 58º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, e 374º, nº 2, e 379, nº 1, alínea b), do C.P.P.;
- que a decisão administrativa condena a sociedade arguida por factos totalmente novos, que não constavam do auto de notícia, sem que para o efeito lhe tenha sido concedido previamente o competente direito de defesa, o que acarreta nulidade insanável da decisão administrativa recorrida (artigo 379º, nº 1, alínea b), do C.P.P., por remissão dos artigos 60º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, e 41º do R.G.C.O.), pois que os factos inovatórios em causa implicam uma alteração substancial do que constava no Auto de Notícia (artigo 359º do C.P.P.), o que não é admissível, configurando também inconstitucionalidade;
- que a notificação para apresentação documentos, efetuada pela inspetora autuante, foi efetuada em pessoa diversa da sociedade arguida, ou de algum colaborador desta, sem qualquer advertência ou cominação para que tal notificação fosse entregue à Arguida, que a sociedade arguida nunca teve conhecimento da mesma, e que foram preteridas as formalidades previstas nos artigos 7º, 8º, 9º, 10, nºs 3 e 4, e 11º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, pelo que a omissão desta notificação leva a que estejamos perante um ato não oponível à Arguida e faz incorrer a decisão administrativa condenatória numa nulidade insanável, consubstanciada na preterição de formalidades essenciais que inquinaram a existência da fase de inquérito e de instrução;
- que os “factos” constantes nos artigos 10, 11 e 32, do auto de notícia não foram percecionados, nem de forma imediata nem por qualquer outra via, pela Sra. Inspetora autuante, pelo que não deveria ter sido levantado um auto de noticia mas sim uma participação (artigo 8º, nº 1, Decreto-Lei nº 102/2000, de 2 de Junho), e que a prolação, no respetivo Auto de Notícia, de meras opiniões documentais e considerações jurídicas inquinam o auto, mormente quanto ao valor probatório que lhe é conferido pelo artigo 13º, nº 3, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro;
- que a sociedade arguida impugnou o teor de todos os documentos juntos com o auto de notícia;
- que a decisão administrativa não efetua um exame crítico da prova testemunhal produzida na fase instrutória, desconsiderando os depoimentos das testemunhas pelo circunstancialismo de as mesmas terem ligação à Arguida, sendo que os mesmos foram espontâneos, isentos e objetivos;
- que a decisão administrativa não atentou no teor dos documentos juntos pela sociedade arguida na fase instrutória, nomeadamente o Plano de Segurança e Saúde e a respetiva declaração de responsabilidade e conformidade;
- que o coordenador de segurança e obra foi nomeado pela sociedade arguida em data anterior à ação inspetiva, e em data anterior àquela que consta do documento n.º 6 junto com o auto de notícia, concretamente com a abertura de estaleiro a Arguida indicou um coordenador de segurança para a empreitada referida em projeto e em obra, que foram respetivamente o Eng.º BB e o Eng.º CC, sendo que pelo menos desde Março de 2022 que a Arguida já tinha efetuado tais nomeações e contratualizações, e também o diretor técnico de obra foi logo designado em Março de 2022; sendo irrelevante que a data da declaração de aceitação tenha data posterior, pois o que é determinante é o momento do efetivo início das funções;
- que a sociedade arguida comprou o imóvel em causa já com a construção bastante avançada e a uma empresa que tinha sido declarada insolvente muito tempo antes, o que até constava do Auto de Notícia, portanto, nem à Arguida nem aos demais colaboradores intervenientes na emissão da nova licença e na conclusão da obra lhes foi transmitido qualquer elemento por uma sociedade que juridicamente já não existia e com quem não foi possível contactar, e nem foi necessário iniciar todo o processo de licenciamento da construção, ou elaborar qualquer projeto de construção, tudo nos termos legais previstos para o efeito;
- que o Plano de Segurança e Saúde em projeto só é exigível quando o dono de obra intervém na fase do projeto, o que não se verificou no caso vertente, sendo certo que a arguida nunca possuiu esse documento pois que nunca contactou com a primitiva proprietária e empreiteira, que se encontrava extinta;
- que a sociedade arguida se dedica exclusivamente à atividade de “compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim; arrendamento, gestão e administração de imóveis”, correspondente ao seu CAE principal (68100), e quanto a todas as demais atividades previstas no seu objeto social, a arguida procede à contratação, junto de entidades externas, para a sua realização;
- que, na situação dos autos, a sociedade arguida não desenvolveu ou executou qualquer tarefa referente à empreitada, não possuindo conhecimentos especiais sobre essa arte, nenhum dos trabalhadores da Arguida esteve envolvido na realização das obras, sob a sua direção, orientação e fiscalização e no seu interesse, ou seja, a mesma não se assumiu como entidade empregadora, naqueles momentos e local, daí que a obra em questão nos autos tenha sido contratada, pela Arguida, junto da sociedade comercial com a firma “B..., Lda.”, ficando a arguida como Dona de Obra e a “B..., Lda.” como executante;
- que nesse contrato de empreitada estipulou-se a possibilidade de ocorrerem subempreitadas, pelo que, foi determinado pela sociedade “B..., Lda.” que a entidade “C..., Lda.”, na qualidade de subempreiteira, realizaria os trabalhos referentes a montagem, dos sistemas de climatização; que ficou previsto que os trabalhadores da sociedade “B..., Lda.”, e da entidade “C..., Lda.”, actuariam em dias e meses diferentes, de forma autónoma, com o que a Arguida delegou a abertura de estaleiro, tendo ficado consciente que tal comunicação tinha sido cumprida previamente àquela data;
- que a sociedade arguida ficou plenamente convicta que a comunicação prévia foi realizada antes do início dos trabalhos, pois assim o ajustou com a empreiteira, que a tal se obrigou, não lhe sendo exigido que, num curto espaço de tempo que medeia entre o início dos trabalhos e a fiscalização efetuada pela entidade administrativa, pudesse controlar o cumprimento dessa obrigação contratual, ainda para mais num período em que consabidamente é de férias
- que o primeiro dia de trabalho em obra ocorreu no início de Setembro de 2022, pela entidade “C..., Lda.”, e a sociedade “B..., Lda.” apenas iniciou trabalhos após a “C..., Lda.” ter saído de obra;
- que os trabalhos efetuados pela “C..., Lda.” resumiram-se à instalação, no interior da habitação, do sistema de climatização, e foram efetuados exclusivamente no interior de cada divisão, por um único colaborador e em poucos dias, sem sujeição a qualquer risco para a vida ou integridade física do mesmo, pois, para o trabalho em questão, o colaborador não teve que aceder a varandas e as escadas de acesso ao piso superior da vivenda são, maioritariamente, ladeadas por parede, possuindo uma altura máxima de 1,5 metros quando tal não ocorre;
- que não foi elaborado um “Plano de Segurança e Saúde” em projecto na medida em que a Arguida não teve qualquer intervenção nessa fase de legalização nem apresentou qualquer projeto de obra;
- que, sequencialmente, ainda em Abril de 2022, a Arguida elaborou um modelo de “Plano de Segurança e Saúde” em obra, nele prevendo os riscos profissionais e correspondentes medidas preventivas para as tarefas de construção, bem como assim o equipamento de trabalho utilizado, tarefas concretamente a executar, com indicação das medidas, propostas, recomendações e das instruções de segurança e saúde compreensíveis e adequadas à atividade desenvolvida pelos trabalhadores/colaboradores que pudessem ter implicações na prevenção de riscos profissionais associados à execução dos trabalhos/tarefas/atividades, o qual mereceu a aceitação por parte da Arguida;
- que havia visitas correntes ao imóvel e à obra por parte dos coordenadores de segurança, que inspecionaram o andamento das obras, em ordem ao controlo da respetiva concretização, em termos de segurança e que garantiram à Arguida que os planos foram implementados e estavam a funcionar corretamente, os quais eram do conhecimento de todos os colaboradores e trabalhadores em obra, que se encontravam devidamente conscientes dos mesmos desde o início da execução dos trabalhos;
- que a Arguida não respondeu à notificação da Autoridade Para as Condições do Trabalho, pois não teve conhecimento da mesma;
- que na mesma altura da inspeção, a Arguida tinha disponível, no local/estaleiro destes trabalhos os documentos tendentes ao início da execução da obra;
- que a arguida efetuou a avaliação e identificação dos riscos em toda a atividade da empresa, nomeadamente no local onde ocorreu a obra, designadamente os procedimentos de segurança e as medidas preventivas, e que no referido local de trabalho, existiam condições de segurança e saúde dos trabalhadores ao serviço da empreiteira/subempreiteira, daí não ter existido qualquer acidente durante a preparação ou execução das obras no imóvel acima identificado;
- que a sociedade arguida não tem antecedentes contraordenacionais e não obteve qualquer benefício económico com os factos em análise;
- que o artigo 35°, n°s 1 e 2, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro padece de inconstitucionalidade material, pelo que deve ser julgado inconstitucional e ser desaplicada tal norma, atribuindo-se efeito suspensivo ao presente recurso de impugnação judicial sem necessidade de prestação de caução.
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Recebida no Tribunal ora, recorrido, foi admitida a impugnação com efeito meramente devolutivo e realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença, de cujo dispositivo consta:
“Termos em que, por todo o exposto, julgo a presente impugnação judicial parcialmente procedente, por provada, em consequência do que decido: A) Absolver a sociedade arguida/recorrente “A..., LDA” da prática da contraordenação prevista e punível pelo artigo 15º, n.º 1 e 26º alínea a) do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10; B) Absolver a sociedade arguida/recorrente “A..., LDA” da prática da contraordenação prevista e punível pelos artigos 5º, 6º n.º 3 e 26º, alínea a) do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10; C) Condenar a sociedade arguida/recorrente “A..., LDA” pela prática da contraordenação prevista e punível pelo artigo 13º, n.º 2 e 25º, n.º 3, alínea c) do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10, na coima parcelar, especialmente atenuada, de 20 UC; D) Condenar a sociedade arguida/recorrente “A..., LDA” pela prática da contraordenação prevista e punível pelo artigo 9º, n.ºs 1 e 2 e 25º, n.º 3, alínea c) do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10, na coima parcelar, especialmente atenuada, de 20 UC; E) Em cúmulo, condenar a sociedade arguida/recorrente “A..., LDA” na coima única de 25 UC, correspondentes a € 2.550,00 (dois mil quinhentos e cinquenta euros); F) Manter a sanção acessória de publicidade da decisão; G) Condenar o representante legal da sociedade arguida/recorrente, AA, no pagamento da coima aplicada.
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Custas a cargo da sociedade arguida/recorrente (cfr. artigos 513.º, n.º 1 e 514.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal, artigos 93.º, n.º 3 e 4 e 94.º, n.º 3, ambos do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27-10 e tabela III anexa ao Regulamento das Custas Processuais), fixando-se a taxa de justiça em 1 UC.
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Notifique. Cumpra o disposto no artigo 45.º, n.º 3, da Lei n.º 107/2009, de 14-09. Proceda ao depósito (artigo 372.º, n.º 5, do Código de Processo Penal ex vi do artigo 41.º, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27/10).”.
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Inconformada com esta decisão a arguida interpôs recurso, nos termos da motivação junta que terminou com as seguintes CONCLUSÕES
“1 - O presente recurso vem interposto da douta sentença de fls.___, datada de 8 de Fevereiro de 2024 (referência 131490569), que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial apresentada pela Arguida a fls.___.
2 - Com relevância para a situação em análise, o Tribunal “a quo” deu por assente a matéria vertida nos pontos 1º a 29º, e como não provados os pontos a) a e), que aqui se consideram por reproduzidos para todos e os devidos efeitos.
3 - Tendo sido determinada a aplicação de sanção acessória de publicidade da decisão, o presente recurso é admissível, ao abrigo do artigo 49º, nº 1, alínea b), e nº 3, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, tendo a Arguida legitimidade.
4 - A decisão judicial recorrida padece de invalidade, porquanto não ponderou nem valorou os depoimentos das três testemunhas oferecidas pela Arguida em sede de fase administrativa, relevando, para este efeito, os actos processuais praticados nos autos e sumariamente descritos supra nos artigos 1º a 7º, do ponto II.1, que aqui se consideram como reproduzidos para todos os efeitos.
5 - É pacífico, na doutrina e jurisprudência, o entendimento de que o Tribunal deve ponderar e decidir o recurso com base na prova recolhida pela autoridade administrativa que se mostre documentada no processo.
6 - Ao processo contra-ordenacional não se aplica o artigo 355º, nº 1, do C.P.P., designadamente por remissão do artigo 60º da Lei nº 107/2009 e do artigo 41º do R.G.C.O..
7 - Analisado o teor dos três depoimentos atestados em auto, devidamente assinados por todos os intervenientes na diligência, constata-se que as declarações de qualquer uma das testemunhas são susceptíveis de influenciar e alterar quer a matéria factual quer a totalidade da decisão condenatória, que julgaria totalmente procedente o recurso de impugnação, nomeadamente poderiam os artigos 10º, 11º, 14º a 16º e 18º passar a constar como factos não provados, e os pontos b), c) e e) passar a constar como factos provados.
8 - A omissão de análise e julgamento da prova testemunhal em causa, no âmbito de um processo de contra-ordenação, configura uma nulidade insanável da decisão recorrida, nos termos conjugados do disposto nos artigos 374º, nº 2, e 379º, nº 1, alíneas a) e c), do C.P.P., "ex vi" dos artigos 60º da Lei 107/2009 e 41º, nº 1, do R.G.C.O., e ainda por aplicação do disposto no artigo 25º, nº 1, alíneas b) e c), da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro (bem como do artigo 58º, nº 1, alíneas b) e c), do R.G.C.O., e, por remissão do artigo 41º, nº 1, desse diploma, das normas dos artigos 374º, nº 2 e 379º, nº 1 do C.P.P.), configura uma manifesta insuficiência para a decisão da matéria provada (artigo 410º, nº 2, do C.P.P.), bem como configura a violação do dever geral de fundamentação e dos direitos de defesa da Arguida (artigo 17º, nº 2, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, artigo 50º do R.G.C.O. e artigos 20º, nº 4, 32º, nº 10, 266º, 268º, nºs 3 e 4, e 32º, nº 10, da C.R.P.), devendo consequentemente ser proferida decisão que declare a nulidade da sentença recorrida.
9 - A decisão administrativa condenou a Arguida por uma contra-ordenação que não constava da sua anterior decisão (no caso o Auto de Notícia), sem que para o efeito lhe tenha sido concedido previamente o competente direito de defesa.
10 - Concretamente, alterou-se o tipo de contra-ordenação do nº 1 para o nº 2 do artigo 13º do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro, tudo sem qualquer acto praticado pela Inspectora autuante.
11 - Tal situação implica uma alteração substancial do que constava no Auto de Notícia (artigo 359º do C.P.P.), o que não é admissível na medida em que da acusação devem igualmente constar o conhecimento das disposições legais com base nas quais o arguido irá ser julgado.
12 - Que implica, ao incumpri-lo, a nulidade insanável da decisão administrativa recorrida (artigo 379º, nº 1, alínea b), do C.P.P., por remissão dos artigos 60º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, e 41º do R.G.C.O.), assim como a sua inconstitucionalidade.
13 - Porque a sentença recorrida, não obstante, condenou a Arguida com base em contra-ordenação diversa, padece da nulidade prevista no artigo 379º, nº 1, alínea b), do C.P.P., o que implica que deva ser reaberta a audiência, junto da entidade administrativa autuante, para o cumprimento do disposto no artigo 359º, nºs 1 e 3, do C.P.P..
14 - Da N.A.D. constam expressamente as seguintes menções: “Designação social A..., Lda., NIF/NIPC ...32, sede Rua ..., ... ...
(…)
Pessoa Notificada DD Cargo ou função Sócio- gerente C...”.
15 - A N.A.D. foi efectuada na subempreiteira “C...”, no local da obra, em momento que não se encontrava presente nem representantes nem qualquer trabalhador da Arguida, sem qualquer advertência ou cominação para que tal notificação fosse entregue à Arguida.
16 - A Arguida não foi notificada para a apresentação de documentos (N.A.D.), nem nunca teve conhecimento da mesma, a qual foi efectuada em desrespeito pelos ditames legais.
17 - O artigo 7º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, aplica a regra geral referente à concretização das notificações, não distinguindo entre processos de contra-ordenação e processos inspectivos, até porque o seu nº 2 refere expressamente “em quaisquer procedimentos”, pelo que tal notificação para a apresentação de documentos sempre deveria ter ocorrido por carta registada (artigo 8º, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro), o que não se verificou.
18 - Em complemento dos artigos 7º, 8º e 9º, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, cabe também aplicar o artigo 41º, nº 1, do R.G.C.O., que, por sua vez, remete para o artigo 113º do C.P.P., compêndio este que exige ou a notificação pessoal ou aviso de recepção assinado pelo arguido (cfr. nº 1, alíneas a) e b) e nºs 10, 16 e 17), à semelhança do que resulta do artigo 47º do R.G.C.O..
19 - Não se tratando neste caso de uma situação de entrega imediata de documentos (artigos 11º, nº 1, alínea e), 14º, nº 3, do Decreto-Lei nº 102/2000, de 2 de Junho, e 11º, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro), dado que dessa mesma notificação até resulta prazo para a sua apresentação.
20 - Ora, conforme igualmente resulta dos factos provados (cfr. artigo 9º), no momento da acção inspectiva não foi apurada qualquer documentação, pelo que naquela data nenhum documento foi entregue pela subempreiteira à Sra. Inspectora (o que igualmente resulta do Auto de Notícia).
21 - No caso concreto inexiste qualquer presunção de notificação, nem a Arguida tem que demonstrar que não recebeu a N.A.D. ou sequer cuidar em receber notificações efectuadas em terceiras pessoas ou entidades, com quem não mantém ligação.
22 - Em processo penal e contra-ordenacional a notificação de pessoas colectivas deve operar nos mesmos termos da lei adjectiva civil.
23 - Não existe qualquer procuração ou outro documento que mandate CC a dar resposta à N.A.D.. E não existe porquanto a Arguida nunca lhe concedeu tais poderes de representação, nem tal facto foi provado, sendo insuficiente, para que a Arguida seja condenada com esse pressuposto, que um qualquer terceiro (i.e. que não é representante nem trabalhador) se arrole de poderes e responda em nome da Arguida.
24 - A omissão desta notificação e/ou a preterição de formalidades inerentes à mesma leva a que estejamos perante um acto não oponível à Arguida e faz incorrer a decisão administrativa condenatória e a decisão ora recorrida numa nulidade insanável.
25 - Tal nulidade da notificação determina, por si só e por uma questão de direito, que sejam considerados como não provados os artigos 10º e 11º dos factos provados.
26 - A decisão recorrida padece de vícios decisórios ao nível da matéria de facto, previstos no artigo 410º, nº 2, do C.P.P., designadamente uma contradição insanável da fundamentação e entre a fundamentação e a decisão, tendo sido incorrectamente mal julgados os artigos 10º e 11º dos factos provados, que deverão passar a constar como não provados.
27 - O valor do Auto de Notícia foi, a este propósito, fundamente colocado em causa, tendo sido infirmado por prova documental e testemunhal produzida na fase administrativa.
28 - Nos termos previstos no artigo 410º, nº 2, do C.P.P., a Relação pode e deve oficiosamente alterar a matéria de facto, sendo que no caso em julgamento verifica-se as situações previstas nas alíneas b) e c).
29 - No caso, constata-se existir erro notório na apreciação da prova quanto ao facto dado como provado no artigo 15º.
30 - Só os factos materiais são susceptíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados.
31 - Assim sendo, o artigo 15º dos factos considerados provados, não pode manter-se, porque o que do mesmo se fez constar é manifestamente conclusivo, reconduzindo-se às expressões usadas na lei, nela não se descreve qualquer facto, sendo, apenas, conceitos jurídicos, concretamente, os que constam da norma cuja violação vem imputada à Recorrente.
32 - Consequentemente, a decisão recorrida não contém a narração dos factos necessários ao preenchimento do elemento objectivo da infracção imputada à Arguida, possuindo apenas conclusões (contra-ordenação muito grave, prevista e punida pelo artigo 13º, nº 2, do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro), sendo manifestamente insuficiente a fundamentação de facto quanto ao elemento objectivo da infracção em causa, razão pela qual, a nosso ver, não reúne os requisitos previstos no artigo 374º do C.P.P..
33 - Quanto aos factos provados nos artigos 14º, 15º e 16º a sentença recorrida efectua um julgamento totalmente genérico, na medida em que efectua uma apreciação global de todos os meios de prova produzidos e, logo de seguida, conclui pela prova dos vinte e nove factos, o que impede a percepção dos meios de prova que serviram para a sua demonstração. Tal situação determina a aplicação da alínea b) do nº 2 do artigo 410º do C.P.P..
34 - Antes de 12 de Julho de 2022 a Arguida submeteu pedido, junto da Câmara Municipal ..., no intuito de ser emitido Alvará, para que assim pudesse iniciar obras, impondo-se para o efeito que fosse instruído, com o respectivo pedido, o plano de segurança e saúde.
35 - A Arguida elaborou, finalizou e aprovou o plano de segurança e saúde, sem o que nunca lhe tinha sido emitido o Alvará para iniciar as obras em causa nos autos.
36 - E se tal documento não foi apresentado junto da entidade administrativa autuante foi porque a Arguida não foi notificada para o efeito.
37 - O artigo 14º deve passar a não provado, e a alínea c) passar a facto provado.
38 - A sentença recorrida considerou demonstrado que:
- a Arguida não impediu que a executante “C..., Lda.” iniciasse trabalhos - cfr. artigo 15º;
- nos termos contratuais a Arguida ficou como dona da obra e a “B..., Lda.” como executante - cfr. artigo 25º;
- a “B..., Lda.” determinou que a “C..., Lda.” efectuasse os trabalhos referente à climatização - cfr. artigo 27º.
39 - Donde se infere que estes três elementos factuais estão, conjugadamente, em contradição, visto que se foi a “B..., Lda.”, enquanto empreiteira (cfr. artigo 25º dos factos provados), que ordenou a subempreitada e a realização dos trabalhos, não poderia a Arguida impedir que esses mesmos trabalhos fossem realizados, pelo menos em função dos demais factos provados, ou que resulte dos autos esse efectivo conhecimento ou que esse início dos trabalhos fosse possível prever.
40 - Quanto ao artigo 15º dos factos provados, a sentença recorrida lavra em erro de interpretação do conceito de “entidade executante”, cuja terminologia legal associa ao “empreiteiro que se obriga a executar a obra” (no caso a “B..., Lda.”) e as demais entidades participantes na obra são designados como subempreiteiros (no caso a “C..., Lda.”) ou como outros intervenientes.
41 - A que acresce que, o artigo 13º, nº 2, do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro, contrariamente ao que resulta do facto provado no artigo 15º (que reproduz o texto da lei), não tem que impedir a subempreiteira de iniciar trabalhos, pois que a mesma não é entidade executante, sendo que à Arguida, enquanto dona da obra, apenas se exige que impedisse a empreiteira de iniciar trabalhos, o que quanto muito se enquadraria no nº 1 do citado normativo, não estando sequer provado que a entidade executante estivesse a laborar.
42 - Consequentemente, o artigo 15º deve passar a não provado.
43 - Os elementos objectivos da infracção do artigo 13º, nº 2, do Decreto-Lei nº 273/2003, decompõe-se em dois elementos cumulativos, a saber: (i) existência e aprovação do Plano de Segurança e Saúde para a execução da obra; (ii) que a entidade executante não inicie a instalação do estaleiro antes de ter ocorrido a situação relatada em (i).
44 - Não se encontra provado qualquer facto referente à intervenção da dona da obra na abertura de estaleiro e início de obras.
45 - São factos assentes que a subempreiteira foi contratada pela empreiteira, tendo sido esta que deu instruções para que a subempreiteira iniciasse trabalhos.
46 - Subempreiteiro é a entidade que se relaciona com esta entidade executante. O subempreiteiro nunca poderá ser considerado como entidade executante, pois que nunca celebrou contrato de empreitada com o dono da obra.
47 - É a entidade executante que tem a obrigação de comunicar a existência do plano de segurança e saúde ao subempreiteiro e de planificar e implementar o estaleiro.
48 - Deve ser revogada a decisão recorrida, julgando-se procedente a impugnação apresentada, absolvendo-se a Arguida da prática da contra-ordenação prevista e punível pelo artigo 13º, nº 2, do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro.
49 - A Arguida efectivamente nomeou o coordenador de segurança em obra desde Abril de 2022.
50 - A Arguida não foi notificada para apresentar documento que titule a nomeação do coordenador de segurança em obra.
51 - Na fundamentação da prova do elemento subjectivo do tipo (artigo 18º) não se encontra não resulta verificado esse elemento do tipo no que concerne à nomeação de coordenador de segurança (artigo 9º do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro).
52 - Deve ser revogada a decisão recorrida, julgando-se procedente a impugnação apresentada, absolvendo-se a Arguida da prática da contra-ordenação prevista e punível pelo artigo 9º, nºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro.
53 - Considerando a factualidade, o grau de ilicitude e culpa, e tendo em conta que a Arguida não tem antecedentes, nomeou um coordenador e não existe registo de qualquer sinistralidade, é de aplicar uma coima especialmente atenuada pelo mínimo (16 UC).
54 - Ao não julgar assim o Tribunal “a quo” violou, por erro de interpretação e aplicação, quanto à não procedência da totalidade do recurso de impugnação judicial, o disposto nos artigos 7º, 8º, 9º, 10º, nºs 3 e 4, 11º, 17º, nº 2, 25º, nº 1, alíneas b) e c), 37º, 47º, nºs 1 e 2, 50º, 58º, nº 1, alíneas b) e c), e 60º, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, artigos 18º, 32º, 33º, 41º, 47º, 62º, nº 1, e 87º, nº 1, do R.G.C.O., artigos 1º, nº 1, alínea f), 113º, 119º, alíneas c) e d), 339º, nº 4, 358º, 359º, 374º, nº 2, 379º, nº 1, e 410º, nº 2, do C.P.P., artigo 72º, do C.P., artigos 551º, nº 3, 552º, nº 1, e 554º, nº 4, do Código do Trabalho, artigo 163º, nº 1, do Código Civil, artigo 261º, nºs 1 e 2, do C.S.C., artigo 223º, nº 3, do C.P.C., artigos 11º, nº 1, alínea e), e 14º, nº 3, do Decreto-Lei nº 102/2000, de 2 de Junho, artigos 9º, nºs 1 e 2, e 13º, nº 2, do Decreto-Lei nº 273/2003, e artigos 20º, nºs 1 e 4, 32º, nºs 1, 5 e 10, 202º, nºs 1 e 2, 266º, e 268º, nºs 3 e 4, da C.R.P..”.
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Admitido o recurso, com efeito suspensivo, notificado o Ministério Público para responder querendo, decorrido o prazo, sem que o fizesse os autos foram remetidos a esta Relação.
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Aqui, o Ex.mº Procurador-Geral Adjunto, emitiu parecer, no sentido de ser rejeitado o recurso, por inadmissibilidade, ou negado provimento, e, mantida a douta sentença recorrida, no essencial, considerando o seguinte, «1. Questão prévia: admissibilidade do recurso.
Como referido a Recorrente foi condenada, pela prática de duas contraordenações nas penas parcelares de 20 UC e em cúmulo na coima única de 25 UC., ou 2.550,00€.
Refere-se o art.º 49º da Lei 107/2009, de 14 de Setembro, às decisões judiciais que admitem recurso.
Neste caso seria aplicável o disposto na al. a) do n.º 1 que diz ser admissível recurso da sentença … quando for aplicada ao arguido uma coima superior a 25 UC ou valor equivalente.
Ora neste caso à arguida foi aplicada em coimas parcelares de 20 UC e na coima única de 25 UC, que corresponde ao valor de 2.550,00€.
Termos em que se entende, salvo melhor opinião, que não é admissível recurso desta decisão, ou deste segmento da decisão.
2. Refere-se o art.º 49º da Lei 107/2009, de 14 de Setembro, às decisões judiciais que admitem recurso, como se disse, admitindo-o para o Tribunal da Relação da sentença ou do despacho judicial proferidos nos termos do artigo 39.º, quando:
… … …
b) A condenação do arguido abranger sanções acessórias;
… … …
Neste caso decidiu a sentença “Manter a sanção acessória de publicidade da decisão”.
Porém, o recurso da Recorrente suscita várias questões, como nulidades, erros de julgamento da matéria de facto, mas, aparentemente, nada refere quanto à sanção acessória de publicidade da decisão que esta manteve e a recorrente não impugna.».
*
Notificada deste Parecer, a arguida veio responder, nos termos do requerimento, referência 391864, junto em 18.06.2024, invocando o seguinte:
“1º - A questão que é suscitada no parecer do M.P., que antecede a presente, diz apenas respeito à inadmissibilidade do recurso apresentado pela Arguida.
2º - Pois quanto à questão de fundo nada é dito.
3º - No ponto I.4 das alegações (cfr. páginas 3 a 5) e no artigo 3 das conclusões (cfr. página 43), a Arguida fundamentou amplamente (com doutrina e jurisprudência), as razões legais que determinam a admissibilidade do presente recurso, as quais aqui mantém na íntegra e dá por integralmente reproduzidas.
4º - Para o efeito, invocou a Arguida o disposto no artigo 49º, nº 1, alínea b), e nº 3, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro.
5º - Tal regime é, em tudo, semelhante ao disposto no artigo 73º, nº 1, alínea b), e nº 3, do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro (R.G.C.O.).
6º - O ilustre representante do M.P. entende que o recurso não é admissível uma vez que: (i) a coima não excede as 25 UC; e (ii)
a Arguida não impugnou a sanção acessória.
7º - Para o efeito, nesse mesmo parecer defende-se que se tratam de dois segmentos de decisão distintos, que são tratados autonomamente.
8º - Porém, com o devido respeito, não lhe assiste qualquer razão ou fundamento.
9º - Desde logo, porque a pena é única, ou seja, a Arguida é condenada, em simultâneo, “na coima única de 25 UC, correspondentes a € 2.550,00 (dois mil quinhentos e cinquenta euros)” e, em cumulação com a sanção principal, na “sanção acessória de publicidade da decisão”.
10º - O que significa que a sanção acessória apenas existe porquanto se verificou a condenação pela prática de duas contra-ordenações.
11º - Não se podendo dissociar as coimas principais da sanção acessória, contrariamente à tese apresentada no parecer que antecede. Seria impossível, ou quase improvável, impugnar a sanção acessória sem refutar a prática da contra-ordenação e da respectiva condenação, que igualmente pouca ou nenhuma utilidade teria; nem faria sentido impugnar apenas a sanção acessória (teoricamente menos grave) e impossibilitar o recurso quanto à matéria da condenação principal.
12º - Acresce que, do teor literal do artigo 49º, nº 1, alínea b), da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, não resulta que o recurso, nestes casos, esteja apenas limitado às sanções acessórias. O que claramente resulta da lei é que a condenação abranja sanções acessórias, em nenhum momento se restringindo o recurso somente quanto a estas.
13º - Assim sendo, quando a condenação abranja sanções acessórias, o recurso é extensível a toda a condenação e não restritivamente à aplicação da sanção acessória.
14º - Na jurisprudência podemos encontrar várias decisões nesse sentido, que das pesquisas efectuadas verificamos ser um entendimento uniforme, e que passamos a citar na parte que importa relevar:
- “Na verdade, os Recorrentes foram condenados solidariamente no pagamento das coimas parcelares de €1.000,00; duas de €250,00 cada; €750,00; €500,00; €620,00 e €1.000,00, e, em cúmulo jurídico foram condenados no pagamento da coima única, de €3.500,00, bem como na obrigação de proceder ao pagamento aos serviços sociais competentes das contribuições no valor de €1.981,49.
Ora, de acordo com o estabelecido na al. a) do n.º 1 do citado artigo 49.º só é admissível recurso para o Tribunal da Relação quando for aplicada ao arguido coima superior a 25 UC, ou seja, superior a €2.550,00 (€102,00 x 25).
Por outro lado, em conformidade com o previsto na al. b) do n.º 1 do mesmo preceito legal cabe sempre recurso para o Tribunal da Relação quando for aplicado ao arguido uma sanção acessória e isto independentemente do montante da coima concretamente aplicada.” (T.R.G., datado de 10-07-2019, processo nº 1139/18.1T9VRL.G1, acessível em www.dgsi.pt);
- “Sendo aplicada uma coima igual/inferior a 25uc desacompanhada de condenação em sanção acessória, no regime das contra-ordenações laborais não é admissível recurso, excepto se, sob requerimento do arguido ou do Ministério Público, se afigure que tal é manifestamente necessária à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência – 49º/2, RPCOLSS.” (T.R.G., datado de 23-04-2020, processo nº 2480/19.1T8GMR.G1, acessível em www.dgsi.pt);
- “Dispõe o art. 49º, nº 1, als. a) e b) da Lei nº 107/2009 de 14/09 que é admissível recurso para o Tribunal da Relação, da sentença ou do despacho proferido ao abrigo do disposto no art. 39º, quando for aplicada ao arguido uma coima superior a 25 UC ou valor equivalente ou a condenação abranger sanções acessórias.
É certo que, foi aplicada à recorrente/arguida a sanção acessória de publicidade da decisão.
Porém, essa sanção acessória foi aplicada pela prática das contraordenações muito graves, pelas quais foi condenada nas coimas de €3,500,00 – art. 562º CT.
E nos termos do nº 3 art. 49º, nº 1, als. a) e b) da Lei nº 107/2009, se a sentença ou despacho recorrido diz respeito a várias infracções e se apenas quanto a algumas infracções se verificam os pressupostos necessários, o recurso sobe com esses limites.
As situações previstas nas restantes alíneas do nº 1 do art. 49º não têm interesse para o caso em apreciação. Trata-se de casos de absolvição, de rejeição da impugnação ou decisão através de despacho.
A recorrente também nada alegou ou requereu para efeitos do nº 2 do citado art. 49º, nem o caso o justificaria.
Pelo exposto, só é admissível recurso da sentença proferida nos autos, quanto à contra-ordenação p.p. pelo art. 263º, nº 1, 2 e 3 CT (não pagamento do subsídio de Natal de 2015) e à contra-ordenação p.p. pelo art. 264º, nº 2, 3 e 4 CT (não pagamento do subsídio de férias de 2015), uma vez que as coimas são de €3.500,00 e pelas quais foi aplicada a sanção acessória de publicidade da sentença - art. 49º, nº 1, als. a) e b) da Lei nº 107/2009 de 14/09.
Não devendo ser admitido o recurso quanto às três últimas contraordenações.”.
A singeleza da questão e o bem fundado que se transcreveu tornam qualquer outra consideração desnecessária, pelo que a final se decidirá em conformidade.” (T.R.G., datado de 16-11-2017, processo nº 1570/17.0T8VCT.G1, acessível em www.dgsi.pt);
- “Significa isto que, no caso de várias infracções integradas em cúmulo jurídico, o recurso só será admitido em relação àquelas que tenham sido concretamente punidas com coima superior a 25 UC, ou a condenação do arguido abranger sanções acessórias.
Ora, no caso, a sanção acessória refere-se às outras duas contra-ordenação, e as coimas aplicadas nos processo em referência são de apenas 2 UC cada uma, ou seja, não se encontram preenchidos os requisitos legais para a admissão do recurso (veja-se o acórdão desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto de 18 de Março de 2024, processo 2065/23.8T8VFR.P1, ao que se julga não publicado).” (T.R.P., datado de 20-05-2024, processo nº 3400/23.4T8MAI.P1, acessível em www.dgsi.pt);
- “Como decorre daquele, art. 49º, 1, al.s a) e b), a admissibilidade de recurso contra-ordenacional para o Tribunal da Relação pressupõe a aplicação de coima superior a 25 unidades de conta (€2.550,00) ou, independentemente desse valor, caso abranja sanções acessórias.” (T.R.P., datado de 05-06-2023, processo nº 1597/22.0T8MTS.P1, acessível em www.dgsi.pt);
- “decisão administrativa que determina a publicação da sanção de admoestação, revestindo esta publicação a natureza de sanção acessória, é igualmente susceptível de recurso de impugnação judicial, considerando ainda o princípio da unidade do sistema jurídico” (T.R.L., datado de 26-02-2013, processo nº 119/12.5TBVFC.L1-5, acessível em www.dgsi.pt).
15º - Sem prejuízo disso, sempre se diga que as nulidades invocadas no recurso (cfr. ponto II das alegações, páginas 5 a 26, e artigos 4 a 26, páginas 43 a 47) afectam a existência da própria sanção acessória, contendo-se no pedido deduzido de revogação da decisão recorrida (cfr. ponto IV das alegações, página 40, e artigos 48 e 52 das conclusões, página 50 e 51).
16º - Não se colocando em crise que, efectivamente, no caso vertente existe a condenação pela prática de uma sanção acessória, relativamente a ambas as contra-ordenações objecto dessa mesma condenação.
17º - Acresce que, são recorríveis “a sentença e o despacho judicial que apliquem sanção inexistente ou ilegal” (Paulo Pinto de Albuquerque, em “Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações”, Universidade Católica Editora, 2011, página 300, ponto 8) (cfr. artigos 43 a 48 das conclusões, página 50).
18º - Pelo que, tudo visto, a decisão judicial proferida nos autos é recorrível, devendo o recurso interposto ser admitido e apreciada em conformidade.”.
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Foi cumprido o disposto no art. 418º do CPP, remetendo-se o processo aos vistos e o projecto de acórdão por via electrónica.
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Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso (cfr. art.s 403º, nº 1 e 412º, nº 1, do CPP), as questões colocadas pela recorrente para apreciação consistem em saber, se a decisão recorrida deve ser revogada, por, como defende aquela:
- Verificar-se nulidade da decisão recorrida por vício formal de omissão de julgamento.
- Verificar-se nulidade da decisão administrativa e da decisão recorrida por alteração substancial da contraordenação imputada no auto de notícia.
- Verificar-se nulidade da notificação emanada pela inspetora do trabalho.
- Deve julgar-se procedente a impugnação da matéria de facto.
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II - FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS:
O tribunal a quo, considerou:
“Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos:
1º- É arguida, nos presentes autos, na qualidade de dono de obra, a sociedade “A..., LDA”, com o NIPC ...32, com sede na Rua ..., ... ... e estabelecimento (estaleiro) na Rua ..., ..., ..., ... ..., com atividade de Compra e Venda de Bens Imobiliários (CAE 68100).
2º- A sociedade arguida é legalmente representada por AA, portador do C.C. n.º ...4 válido até 17/08/2030, contribuinte fiscal n.º ...30, com domicílio na Rua ..., ..., ... ..., na qualidade de Sócio-Gerente.
3º- A sociedade arguida, em 2020, apresentou um volume de negócios de € 1.606.363,00.
4º- No dia 07 de setembro de 2022, pelas 10:00 horas, foi realizada uma visita inspetiva ao estaleiro sito Rua ..., ..., ..., ... ..., relativo à edificação de uma obra de construção civil, destinada à execução da empreitada de construção de habitação unifamiliar, anexos de apoio e muros de vedação.
5º- Na obra referida em 4º encontrava-se 1 (uma) empresa com 1 (um) trabalhador, a saber: C..., LDA, com o NIPC ...20, com sede na Rua ..., ... ... e estabelecimento no local supra identificado como estaleiro, com atividade de Instalação de Climatização (CAE 43222), titular de Alvará do IMPIC de Empreiteiro de Obras Públicas n.º 71828 – PUB, de 26/12/2019, legalmente representada por DD, na qualidade de Sócio-Gerente, com domicílio na Travessa ..., ..., ..., na qualidade de subempreiteiro e, com 1 (um) trabalhador em obra a saber: DD com a categoria profissional de Instalador de ar condicionado e de sistemas de refrigeração.
6º- Em tal estaleiro estavam em curso trabalhos de instalação do sistema de climatização, mais concretamente, pré-instalação de ventilo convectores, e os trabalhos referidos estavam a ser executados dentro da habitação.
7º- No estaleiro existiam bordaduras de varandas sem qualquer proteção coletiva (guarda – corpos) e escadas de acesso interior aos vários pisos sem qualquer proteção coletiva (guarda – corpos).
8º- A abertura do estaleiro referido em 4º ocorreu pelo menos no dia 07 de Setembro de 2022.
9º- No dia e hora da visita inspetiva não havia qualquer documentação no local, nomeadamente, a comunicação prévia de abertura de estaleiro.
10º- À data da visita inspetiva, a senhora inspetora do trabalho autuante formalizou o procedimento inspetivo “Notificação para Apresentação de Documentos”, notificando a sociedade arguida, na pessoa do único trabalhador em obra, para apresentar nos serviços da Autoridade para as Condições de Trabalho, em data acordada, os seguintes documentos: Comunicação Prévia de Abertura do Estaleiro e respetivas alterações da identificação dos subempreiteiros; Plano de Segurança e Saúde em Projeto; nomeação de coordenador de segurança e respetivo termo de aceitação; aprovação do Plano de Segurança e Saúde para a execução da obra.
11º- Em cumprimento da notificação referida em 10º, a sociedade arguida apresentou à senhora inspetora do trabalho autuante, a 20 de setembro de 2022, por correio eletrónico: a “Comunicação Prévia de Abertura de Estaleiro”, efetuada a 16 de Setembro de 2022; a Declaração de nomeação do coordenador de segurança em obra, datada de 16 de setembro de 2022; Alvará de Licenciamento de Obras de Construção com data de validade de 12/07/2022 a 12/07/2024; Termo de Responsabilidade do Autor do Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde; Plano de Segurança e Saúde para Execução da Obra; Livro de obra - Termo de Abertura averbado à arguida.
12º- A comunicação prévia de abertura de estaleiro relativa ao Lote ...1 apenas foi efetuada à Autoridade para as Condições do Trabalho no dia 20 de Setembro de 2022.
13º- A sociedade arguida não apresentou o Plano de Segurança e Saúde em projeto mas apenas o Plano de Segurança e Saúde para a execução da obra.
14º- A sociedade arguida não apresentou à ACT aceitação/aprovação do Plano de Segurança e Saúde para execução da obra, por parte do dono da obra.
15º- A sociedade arguida, na qualidade de dono de obra, não impediu que a entidade executante “C...” iniciasse a implantação do estaleiro sem estar aprovado o plano de segurança e saúde para a execução da obra. (Eliminado).
16º- A sociedade arguida não procedeu à nomeação de um coordenador de segurança em obra em data anterior à abertura do estaleiro da obra referida em 4º, o que só veio a ocorrer a 16 de Setembro de 2022.
17º- Da comunicação prévia de abertura de estaleiro junta aos autos consta que a entidade executante é a empresa “B... Lda”, que se estimava a presença de seis trabalhadores por conta de outrem em simultâneo e de quatro trabalhadores independentes a trabalhar no estaleiro, que a empresa “C... Lda.” era um dos subempreiteiros já selecionados, e que as datas previsíveis de início e termo dos trabalhos no estaleiro eram, respetivamente, 01/09/2022 e 28/02/2023.
18º- Ao não nomear coordenador de segurança em obra em data anterior à abertura do estaleiro, e ao não impedir que a entidade executante “C...” iniciasse a implantação do estaleiro sem estar aprovado o plano de segurança e saúde para a execução da obra, a sociedade arguida atuou negligentemente, omitindo um dever objetivo de cuidado e diligência adequada, no sentido de evitar a produção daquele resultado, não procedendo com o cuidado a que, de acordo com as circunstâncias, estava obrigada e de que era capaz. Mais se provou que:
19º- A sociedade arguida não tem antecedentes contraordenacionais. Provou-se ainda que:
20º- A sociedade arguida é uma sociedade comercial por quotas, de direito privado, que se dedica à atividade de “compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim; arrendamento, gestão e administração de imóveis; organização, elaboração de estudos e realização de quaisquer projetos ou empreendimentos imobiliários; elaboração de projetos e realização de operações de loteamento e construção civil e realização de obras particulares; comércio de materiais de construção; comércio de máquinas industriais; importação e exportação de materiais de construção e máquinas industriais”.
21º- A sociedade arguida foi constituída em Maio de 2017.
22º- Tem como local de trabalho a sua sede, sita na Rua ..., ... ..., freguesia ..., concelho ....
23º- No exercício dessa atividade, em Março de 2022 a sociedade arguida procedeu à aquisição do bem imóvel sito em ..., freguesia ..., concelho ..., após a celebração de contrato-promessa.
24º - À data em que adquiriu o imóvel, o mesmo já se encontrava com licença de construção emitida e com a construção bastante avançada, incluindo a fase de pedreiro, a qual tinha sido efetuada ou ordenada pela anterior proprietária.
25º- Na data de 11 de Março de 2022, a sociedade arguida e a sociedade “B..., Lda.” celebraram, entre si, um acordo denominado de “Contrato de Empreitada de Acabamento de Moradias Chave na Mão”, mediante o qual, nomeadamente, a primeira adjudicou à segunda, em regime de empreitada, a execução de obras de acabamento de sete moradias, entre as quais o Lote ...1 em casa nestes autos, ficando a sociedade arguida como Dona de Obra e a “B..., Lda.” como executante.
26º- Nesse mesmo contrato de empreitada estipulou-se a possibilidade de ocorrerem subempreitadas.
27º - Pelo que, foi determinado pela sociedade “B..., Lda.” que a entidade “C..., Lda.”, na qualidade de subempreiteira, realizaria os trabalhos referentes a montagem, dos sistemas de climatização.
28º- Não foi elaborado um “Plano de Segurança e Saúde” em projeto na medida em que a Arguida não teve qualquer intervenção nessa fase de legalização nem apresentou qualquer projeto de obra.
29º - Em Abril de 2022, a sociedade arguida elaborou um modelo de “Plano de Segurança e Saúde” em obra, nele prevendo os riscos profissionais e correspondentes medidas preventivas para as tarefas de construção, bem como assim o equipamento de trabalho utilizado, tarefas concretamente a executar, com indicação das medidas, propostas, recomendações e das instruções de segurança e saúde compreensíveis e adequadas à atividade desenvolvida pelos trabalhadores/colaboradores que pudessem ter implicações na prevenção de riscos profissionais associados à execução dos trabalhos/tarefas/atividades.
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Factos não provados, com relevo para a decisão a proferir:
a) – Que a data prevista na comunicação prévia de abertura de estaleiro para o termo dos trabalhos fosse 28/03/2028;
b) – Que, desde 27 de Abril de 2022, a sociedade arguida tenha contratado com o Eng.º BB a prestação de serviços de coordenador de segurança em projeto da obra em causa nos autos, e que o tenha nomeado para o efeito; e que tenha nomeado como coordenador de segurança em obra o Eng.º CC;
c) – Que o Plano de Segurança e Saúde tenha sido validado e aprovado pela sociedade arguida;
d) – Que existissem visitas correntes ao imóvel e à obra por parte dos coordenadores de segurança, que inspecionaram o andamento das obras, em ordem ao controlo da respetiva concretização, em termos de segurança, e que garantiram à Arguida que os planos foram implementados e estavam a funcionar corretamente;
e) – Que os planos de segurança eram do conhecimento de todos os colaboradores e trabalhadores em obra, que se encontravam devidamente conscientes dos mesmos desde o início da execução dos trabalhos.
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Consigna-se que dos factos acima descritos não constam as considerações de cariz jurídico/conclusivas vertidas na decisão administrativa, bem assim os factos que não relevam no âmbito das infrações em apreço.”.
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B) O DIREITO
Aplica-se, ao caso, o regime processual das contra-ordenações laborais e de segurança social aprovado pela Lei nº 107/2009 de 14 de Setembro (designado de ora em diante RPCOL e diploma a que pertencerão os demais artigos a seguir referidos sem outra indicação de origem) e, por determinação do seu art. 60º, subsidiariamente, desde que o contrário dela não resulte, “…,são aplicáveis, com as devidas adaptações, os preceitos reguladores do processo de contra-ordenação previstos no regime geral das contra-ordenações.”, ou seja, no Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, (RGCO, forma como será designado de ora em diante) com as alterações introduzidas pelos Decretos-Lei nº 356/89, de 17 de Outubro e nº 244/95, de 14 de Setembro, e pela Lei n.º 109/2001, de 24 de Dezembro.
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Previamente, importa como questão preliminar apreciar:
- Se o recurso é inadmissível.
A recorrente pretende recorrer da sentença que a condenou em duas coimas, cada uma delas no valor de 20 UC pela prática da contraordenação prevista e punível pelo artigo 13º, n.º 2 e 25º, n.º 3, alínea c) do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10, e pela prática da contraordenação prevista e punível pelo artigo 9º, n.ºs 1 e 2 e 25º, n.º 3, alínea c) do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10, que manteve a sanção acessória de publicidade da decisão e que, condenou o representante legal da sociedade arguida/recorrente no pagamento da coima aplicada.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto, no parecer que emitiu, defende que o recurso não deve ser admitido quanto às duas primeiras coimas aplicadas, cujo valor é inferior a €2.550,00 sendo que a recorrente “nada refere quanto à sanção acessória de publicidade da decisão que esta manteve e a recorrente não impugna”.
Que dizer?
Como dissemos, é aplicável, ao caso, a Lei nº 107/2009, de 14.09, a qual dispõe no seu art. 49º sob a epígrafe “Decisões judiciais que admitem recurso” que:
“1 – Admite-se recurso para o Tribunal da Relação da sentença ou do despacho judicial proferidos nos termos do artigo 39º, quando:
a) For aplicada ao arguido uma coima superior a 25 UC ou valor equivalente;
b) A condenação do arguido abranger sanções acessórias;
(...)
2 – Para além dos casos enunciados no número anterior, pode o Tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso da decisão quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência.
3 - Se a sentença ou o despacho recorrido são relativos a várias infracções ou a vários arguidos e se apenas quanto a alguma das infracções ou a algum dos arguidos se verificam os pressupostos necessários, o recurso sobe com esses limites.”.
Transpondo, o que decorre deste, para o caso, como bem diz a recorrente, é manifesta a falta de razão do Ministério Público ao pugnar pela não admissibilidade do presente recurso.
Senão, vejamos.
Como decorre daquele, art. 49º, 1, al.s a) e b), a admissibilidade de recurso contra-ordenacional para o Tribunal da Relação pressupõe a aplicação de coima superior a 25 unidades de conta (€2.550,00) ou, independentemente desse valor, caso abranja sanções acessórias.
Verifica-se, assim, que os Tribunais de Trabalho funcionam como primeira instância de recurso - impugnação judicial - das decisões proferidas pela autoridade administrativa, cfr. art.s 32º e 33º do RPCOL e o Tribunal da Relação, por sua vez, funciona como uma instância de revista que julga em definitivo, sendo nesta matéria contra-ordenacional mais restritiva a admissibilidade de recurso, comparativamente ao que acontece no recurso penal ou civil.
Por via do que se vem a expor, no caso, foi aplicada sanção acessória, a significar que o recurso é admissível – artigo 49º, nº1, a), b) e nº3 – aliás como vem sendo defendido por esta Secção Social (Ac.s desta Relação de 08.09.2020, Proc. nº 4203/19.6T8MTS.P1, de 15.12.2021, Proc. nº 37/21.6Y3VNG.P1, de 12.09.2022, Processo n.º 118/22.4T8MTS.P1 (com intervenção como adjuntas da, agora, relatora e 1ª adjunta), in www.dgsi.pt.).
Donde, no caso concreto, tendo a condenação abrangido sanção acessória é o recurso admissível.
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Passemos, então, à análise das questões colocadas no recurso. A saber: - Da nulidade da sentença por vício formal de omissão de julgamento.
Comecemos por transcrever o seguinte trecho da decisão recorrida:
«Por sua vez, resultaram como não provados os factos descritos na alínea a) da factualidade não provada, por decorrer data diversa para o termo dos trabalhos da comunicação prévia da abertura do estaleiro, e não se provaram os factos descritos nas alíneas b) a e) da factualidade não provada, por manifesta insuficiência probatória.
Com efeito, não foram inquiridas quaisquer testemunhas que a eles aludissem, nem se encontram juntos aos autos documentos que por si só os demonstrem. Ademais, os depoimentos prestados na fase de instrução, perante a entidade administrativa, não podem ser considerados nem valorados em sede de audiência de julgamento, por imposição do disposto no artigo 355º, n.º 1 do Código de Processo Penal (aplicável por remissão do artigo 60º da Lei n.º 107/2009 e do artigo 41 do Decreto-lei n.º 433/82), que estabelece que “não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência”.
Com efeito, a produção da prova decorre no respeito de dois princípios fundamentais: o da oralidade e o da imediação. Com isso visa-se assegurar o princípio basilar do julgamento em processo penal – o princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador.
O principio da imediação pressupõe um contacto direto e pessoal entre o julgador e as pessoas que perante ele depõem (bem como restante prova produzida), cujos depoimentos irá valorar e servirão para fundamentar a decisão da matéria de facto, não podendo, deste modo, valorar depoimentos prestados perante a entidade administrativa, neste caso a ACT, na fase instrutória que precede a fase judicial, de impugnação da decisão administrativa.».
A recorrente discorda, apresentando a seguinte argumentação: “A decisão judicial recorrida padece de invalidade, porquanto não ponderou nem valorou os depoimentos das três testemunhas oferecidas pela Arguida em sede de fase administrativa, relevando, para este efeito, os actos processuais praticados nos autos e sumariamente descritos supra nos artigos 1º a 7º, do ponto II.1, que aqui se consideram como reproduzidos para todos os efeitos. É pacífico, na doutrina e jurisprudência, o entendimento de que o Tribunal deve ponderar e decidir o recurso com base na prova recolhida pela autoridade administrativa que se mostre documentada no processo. Ao processo contra-ordenacional não se aplica o artigo 355º, nº 1, do C.P.P., designadamente por remissão do artigo 60º da Lei nº 107/2009 e do artigo 41º do R.G.C.O.. Analisado o teor dos três depoimentos atestados em auto, devidamente assinados por todos os intervenientes na diligência, constata-se que as declarações de qualquer uma das testemunhas são susceptíveis de influenciar e alterar quer a matéria factual quer a totalidade da decisão condenatória, que julgaria totalmente procedente o recurso de impugnação, nomeadamente poderiam os artigos 10º, 11º, 14º a 16º e 18º passar a constar como factos não provados, e os pontos b), c) e e) passar a constar como factos provados. A omissão de análise e julgamento da prova testemunhal em causa, no âmbito de um processo de contra-ordenação, configura uma nulidade insanável da decisão recorrida, nos termos conjugados do disposto nos artigos 374º, nº 2, e 379º, nº 1, alíneas a) e c), do C.P.P., "ex vi" dos artigos 60º da Lei 107/2009 e 41º, nº 1, do R.G.C.O., e ainda por aplicação do disposto no artigo 25º, nº 1, alíneas b) e c), da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro (bem como do artigo 58º, nº 1, alíneas b) e c), do R.G.C.O., e, por remissão do artigo 41º, nº 1, desse diploma, das normas dos artigos 374º, nº 2 e 379º, nº 1 do C.P.P.), configura uma manifesta insuficiência para a decisão da matéria provada (artigo 410º, nº 2, do C.P.P.), bem como configura a violação do dever geral de fundamentação e dos direitos de defesa da Arguida (artigo 17º, nº 2, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, artigo 50º do R.G.C.O. e artigos 20º, nº 4, 32º, nº 10, 266º, 268º, nºs 3 e 4, e 32º, nº 10, da C.R.P.), devendo consequentemente ser proferida decisão que declare a nulidade da sentença recorrida.”.
Analisemos.
Cumpre iniciar, deixando, aqui, esclarecido o seguinte: a recorrente, no seu recurso de impugnação da decisão administrativa, arrolou testemunhas (3), precisamente as que tinha indicado na defesa que apresentou na fase administrativa do processo. Foi designado dia para julgamento tendo o Tribunal “a quo” admitido a inquirição dessas testemunhas. No entanto, a recorrente veio prescindir da audição das mesmas.
Em face do acabado de referir podemos afirmar que o Tribunal “a quo” não tinha de considerar o depoimento das testemunhas arroladas pela recorrente e prestados perante a Autoridade Administrativa. E as razões que justificam o acabado de afirmar são as seguintes:
- 1. O Tribunal “a quo” tinha admitido a inquirição dessas testemunhas em sede de audiência de discussão e julgamento;
- 2. Tal não ocorreu apenas por facto imputável à arguida, que acabou por prescindir dessa inquirição;
- 3. Os depoimentos prestados pelas testemunhas na fase administrativa do processo não obedeceram, como é natural, ao princípio do contraditório, o qual só é plenamente cumprido em sede de audiência de discussão e julgamento.
Em suma, se as testemunhas arroladas pela arguida não foram ouvidas pelo Tribunal “a quo”, com cumprimento do princípio do contraditório, tal ficou a dever-se, exclusivamente, à arguida, que delas prescindiu, carecendo de fundamento a sua pretensão no sentido desses depoimentos, prestados na fase administrativa, serem considerados pelo Tribunal “a quo”.
E, sem fundamento é, também, a invocação e citação, efectuada pela recorrente, para sustentar a sua pretensão, do acórdão da Relação de Évora de 30.03.2016 em cujo sumário se lê o seguinte: “I. Face ao disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 13.º do Regime Processual das Contra-Ordenações Laborais, aprovado pela Lei n.º 107/2009, de 14-09, os factos constantes do auto de notícia consideram-se provados desde que a autenticidade do auto ou a veracidade do nele relatado não for fundadamente posto em causa;
II. No referido processo de contra-ordenação, em caso de impugnação judicial, se não for necessária a produção complementar de meios de prova, o tribunal decide o recurso com base na prova recolhida pela autoridade administrativa que se encontra documentada no processo, sem necessidade de a sujeitar a debate contraditório na audiência;
III. Mas ainda que na referida fase haja lugar a produção complementar de prova requerida pela arguida/recorrente, deve também o tribunal atender, em termos de valoração de prova, ao valor probatório constante do auto de notícia e, assim, aos factos nele constantes, bem como aos documentos juntos na fase administrativa do processo.”.
Pois, no caso apreciado pelo referido acórdão, o que se verifica é que, o MP tinha apresentado o processo administrativo, acompanhado de documentação, mas não arrolou qualquer testemunha para ser inquirida. A arguida tinha arrolado testemunhas, que foram ouvidas em audiência. O Tribunal atendeu ao valor probatório do auto de notícia bem como aos documentos juntos na fase administrativa do processo, o que o acórdão considerou perfeitamente possível.
Ora, tal situação, sempre com o devido respeito, afigura-se-nos diferente da que, aqui, analisamos já que não estamos perante uma situação em que a arguida não ofereceu qualquer prova testemunhal. Pelo contrário, a arguida arrolou testemunhas para serem inquiridas mas, posteriormente, prescindiu delas, (veja-se acta de julgamento de 01.02.2023).
Assim sendo, e por todo o exposto, não merece reparo a decisão recorrida quando não considerou, para efeitos de consignação da matéria de facto, os depoimentos das testemunhas arroladas pela aqui recorrente na fase administrativa do processo.
E tal entendimento não viola qualquer dispositivo legal, nem os princípios constitucionais de dever geral de fundamentação e do direito de defesa da arguida, contrariamente ao que a mesma considera.
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Vejamos, agora: - Da nulidade da decisão recorrida por alteração substancial da contraordenação imputada no auto de notícia.
Na decisão recorrida consta, quanto a esta questão, o seguinte: «Alega a este respeito a sociedade arguida/recorrente que que a decisão administrativa condena a sociedade arguida por factos totalmente novos, que não constavam do auto de notícia, sem que para o efeito lhe tenha sido concedido previamente o competente direito de defesa, o que acarreta nulidade insanável da decisão administrativa recorrida (artigo 379º, nº 1, alínea b), do C.P.P., por remissão dos artigos 60º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, e 41º do R.G.C.O.), pois que os factos inovatórios em causa implicam uma alteração substancial do que constava no Auto de Notícia (artigo 359º do C.P.P.), o que não é admissível, configurando também inconstitucionalidade. Cumpre apreciar e decidir:
Decorre do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Penal que é nula a sentença que condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstos nos artigos 358º e 359º.
Por sua vez, decorre do disposto no artigo 358º do Código de Processo Penal que, se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, com relevo para a decisão da causa, o presidente, oficiosamente ou a requerimento, comunica a alteração ao arguido e concede-lhe, se ele o requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa, ressalvando-se o caso de a alteração ter derivado de factos alegados pela defesa, regime que se aplica quando o tribunal alterar a qualificação jurídica dos factos descritos na acusação ou na pronúncia.
Já o artigo 359º do Código de Processo Penal dispõe que uma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia não pode ser tomada em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, nem implica a extinção da instância, e que a comunicação da alteração substancial dos factos ao Ministério Público vale como denúncia para que ele proceda pelos novos factos, se estes forem autonomizáveis em relação ao objeto do processo, ressalvando-se os casos em que o Ministério Público, o arguido e o assistente estiverem de acordo com a continuação do julgamento pelos novos factos, se estes não determinarem a incompetência do tribunal.
O conceito de “alteração substancial dos factos” é o previsto no artigo 1º, n.º 1, alínea f) do Código de Processo Penal: “aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis”.
Ora, no caso dos autos, atentando no teor do auto de notícia levantado à sociedade arguida e nos factos provados elencados na decisão administrativa, não se vislumbra qualquer desconformidade nem qualquer facto novo que configure alteração substancial e que devesse ser comunicado à sociedade arguida para exercício dos seus direitos de defesa.
Os únicos factos inovadores são os que resultam da defesa escrita apresentada pela sociedade arguida e dos documentos juntos pela própria, em relação aos quais não se impõe qualquer comunicação, como expressamente resulta do artigo 358º, n.º 2 do Código de Processo Penal, aplicável ao regime das contraordenações e coimas por remissão dos artigos 60º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, e 41º do R.G.C.O
A decisão administrativa efetua apenas uma ressalva quanto à qualificação jurídica dos factos imputados à sociedade arguida a respeito da falta de impedimento da implantação do estaleiro antes da aprovação do plano de segurança e saúde, que enquadra no n.º 2 do artigo 13º do Decreto-lei n.º 273/2003, ao invés do n.º 1 do mesmo artigo 13º, atribuindo tal indicação no auto de notícia a um manifesto lapso de escrita, uma vez que porquanto, face à qualidade de dono de obra que a arguida assume, indubitavelmente, nos presentes autos, não lhe pode ser imputada a violação do disposto no n.º 1 o artigo 13º, que se aplica à entidade executante.
Tal alteração é devidamente comunicada e explicada na decisão administrativa, os factos que integram a prática da contraordenação já se encontravam descritos no auto de notícia, pelo que não se vislumbra qualquer desconformidade que possa colidir com o exercício dos direitos de defesa da sociedade arguida/recorrente.
Deste modo, não se verifica qualquer nulidade insanável da decisão administrativa, por falta de comunicação de factos novos que configurem uma alteração substancial ou não substancial dos factos descritos no auto de notícia.
Pelos mesmos motivos, não padece a decisão administrativa de qualquer inconstitucionalidade.».
A recorrente discorda afirmando o seguinte: “A decisão administrativa condenou a Arguida por uma contra-ordenação que não constava da sua anterior decisão (no caso o Auto de Notícia), sem que para o efeito lhe tenha sido concedido previamente o competente direito de defesa. Concretamente, alterou-se o tipo de contra-ordenação do nº 1 para o nº 2 do artigo 13º do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro, tudo sem qualquer acto praticado pela Inspectora autuante. Tal situação implica uma alteração substancial do que constava no Auto de Notícia (artigo 359º do C.P.P.), o que não é admissível na medida em que da acusação devem igualmente constar o conhecimento das disposições legais com base nas quais o arguido irá ser julgado.
Que implica, ao incumpri-lo, a nulidade insanável da decisão administrativa recorrida (artigo 379º, nº 1, alínea b), do C.P.P., por remissão dos artigos 60º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, e 41º do R.G.C.O.), assim como a sua inconstitucionalidade. Porque a sentença recorrida, não obstante, condenou a Arguida com base em contra-ordenação diversa, padece da nulidade prevista no artigo 379º, nº 1, alínea b), do C.P.P., o que implica que deva ser reaberta a audiência, junto da entidade administrativa autuante, para o cumprimento do disposto no artigo 359º, nºs 1 e 3, do C.P.P.”.
Que dizer?
Desde já, que a recorrente carece de razão.
Com efeito, analisando o auto de notícia podemos concluir que do mesmo constam os factos que preenchem o disposto no nº2 do artigo 13º do DL nº273/2003 e não o nº1 desse mesmo artigo, quando aí se deixou consignado “O dono da obra não impediu que a entidade executante iniciasse a implantação do estaleiro sem estar realizado e aprovado o plano de segurança e saúde para a execução da obra”.
Por isso, como dissemos, não tem razão a recorrente e a decisão recorrida não merece qualquer censura, como bem o demonstram os argumentos/fundamentos expostos naquela e que, aqui, acompanhamos e, em síntese, reiteramos o seguinte: «A decisão administrativa efetua apenas uma ressalva quanto à qualificação jurídica dos factos imputados à sociedade arguida a respeito da falta de impedimento da implantação do estaleiro antes da aprovação do plano de segurança e saúde, que enquadra no n.º 2 do artigo 13º do Decreto-lei n.º 273/2003, ao invés do n.º 1 do mesmo artigo 13º, atribuindo tal indicação no auto de notícia a um manifesto lapso de escrita, uma vez que porquanto, face à qualidade de dono de obra que a arguida assume, indubitavelmente, nos presentes autos, não lhe pode ser imputada a violação do disposto no n.º 1 o artigo 13º, que se aplica à entidade executante. Tal alteração é devidamente comunicada e explicada na decisão administrativa, os factos que integram a prática da contraordenação já se encontravam descritos no auto de notícia, pelo que não se vislumbra qualquer desconformidade que possa colidir com o exercício dos direitos de defesa da sociedade arguida/recorrente. Deste modo, não se verifica qualquer nulidade insanável da decisão administrativa, por falta de comunicação de factos novos que configurem uma alteração substancial ou não substancial dos factos descritos no auto de notícia. Pelos mesmos motivos, não padece a decisão administrativa de qualquer inconstitucionalidade.».
Desde modo, sem necessidade de outras considerações, improcede, também, este segmento da apelação.
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Continuemos com a questão:
- Da nulidade da notificação emanada pela inspetora
No que a esta respeita, na decisão recorrida consta o seguinte:
«Alega a este respeito a sociedade arguida que a notificação para apresentação documentos, efetuada pela inspetora autuante, foi efetuada em pessoa diversa da sociedade arguida, ou de algum colaborador desta, sem qualquer advertência ou cominação para que tal notificação fosse entregue à Arguida, que a sociedade arguida nunca teve conhecimento da mesma, e que foram preteridas as formalidades previstas nos artigos 7º, 8º, 9º, 10, nºs 3 e 4, e 11º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, pelo que a omissão desta notificação leva a que estejamos perante um ato não oponível à Arguida e faz incorrer a decisão administrativa condenatória numa nulidade insanável, consubstanciada na preterição de formalidades essenciais que inquinaram a existência da fase de inquérito e de instrução. Cumpre apreciar e decidir:
No que concerne ao regime das notificações no âmbito do procedimento contraordenacional laboral, estando em causa a notificação no âmbito de procedimentos inspetivos, estabelece o artigo 10º, n.º 3 da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro o seguinte: “O inspetor do trabalho ou da segurança social, consoante os casos, pode, caso assim o entenda, notificar ou entregar imediatamente ao infrator os instrumentos referidos nos n.ºs 1 e 2.”, acrescentando o n.º 4 que “A notificação ou a entrega deve ser feita com a indicação da contraordenação verificada, das medidas recomendadas ao infrator e do prazo para o seu cumprimento, avisando-o de que o incumprimento das medidas recomendadas influi na determinação da medida da coima.”
Por sua vez, decorre do artigo 11º que “No caso de entrega imediata, a notificação considera-se feita na pessoa do infrator quando seja efetuada em qualquer pessoa que na altura o represente, ou na sua falta, em qualquer trabalhador que se encontre a exercer funções no local.”. No caso dos autos, resulta expressamente do auto de notícia que não se encontrava em obra nenhum responsável nem nenhum trabalhador da mesma, o que de resto não é posto em causa pela sociedade arguida/recorrente. Em consequência, a notificação foi cumprida na pessoa do subempreiteiro que se encontrava no local, concretamente DD, sócio gerente da sociedade “C..., Lda.”.
Não foram preteridas quaisquer formalidades, pelo contrário, a Sra. Inspetora autuante atuou de acordo com o preceituado no artigo 11º da Lei n.º 107/2009, pelo que a sociedade arguida foi regularmente notificada para a apresentação de documentos, através da notificação datada de 07/09/2022, constante de fls. 15.
Ademais, a sociedade arguida deu cabal cumprimento à notificação que lhe foi efetuada, através dos emails constantes de fls. 16 e 16 verso, remetidos por CC, engenheiro civil, que refere expressamente atuar em representação da sociedade “A..., Lda”, juntando parte dos documentos solicitados, solicitando uma prorrogação para apresentação dos restantes, e apresentando justificação para a falta de junção de outros elementos documentais.
Tratam-se de documentos próprios da sociedade arguida, de cujo conteúdo esta se prevalece em sede de defesa escrita apresentada e da presente impugnação judicial, pelo que não pode alegar que nunca foi notificada para apresentação de documentos e que nunca os apresentou efetivamente, o que configura manifesto abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium. Não se verifica, pois, preterida qualquer formalidade essencial na notificação para apresentação de documentos levada a cabo pela Sra. Inspetora autuante aquando da visita inspetiva, pelo que é manifestamente improcedente o recurso nesta parte.».
Essencialmente, reiterando o já alegado em sede de impugnação judicial, discorda a recorrente dizendo:
“A N.A.D. foi efectuada na subempreiteira “C...”, no local da obra, em momento que não se encontrava presente nem representantes nem qualquer trabalhador da Arguida, sem qualquer advertência ou cominação para que tal notificação fosse entregue à Arguida. A Arguida não foi notificada para a apresentação de documentos (N.A.D.), nem nunca teve conhecimento da mesma, a qual foi efectuada em desrespeito pelos ditames legais. O artigo 7º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, aplica a regra geral referente à concretização das notificações, não distinguindo entre processos de contra-ordenação e processos inspectivos, até porque o seu nº2 refere expressamente “em quaisquer procedimentos”, pelo que tal notificação para a apresentação de documentos sempre deveria ter ocorrido por carta registada (artigo 8º, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro), o que não se verificou. Em complemento dos artigos 7º, 8º e 9º, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, cabe também aplicar o artigo 41º, nº 1, do R.G.C.O., que, por sua vez, remete para o artigo 113º do C.P.P., compêndio este que exige ou a notificação pessoal ou aviso de receção assinado pelo arguido (cfr. nº 1, alíneas a) e b) e nºs 10, 16 e 17), à semelhança do que resulta do artigo 47º do R.G.C.O.. Não se tratando neste caso de uma situação de entrega imediata de documentos (artigos 11º, nº 1, alínea e), 14º, nº 3, do Decreto-Lei nº 102/2000, de 2 de Junho, e 11º, da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro), dado que dessa mesma notificação até resulta prazo para a sua apresentação. Ora, conforme igualmente resulta dos factos provados (cfr. artigo 9º), no momento da acção inspectiva não foi apurada qualquer documentação, pelo que naquela data nenhum documento foi entregue pela subempreiteira à Sra. Inspectora (o que igualmente resulta do Auto de Notícia). No caso concreto inexiste qualquer presunção de notificação, nem a Arguida tem que demonstrar que não recebeu a N.A.D. ou sequer cuidar em receber notificações efetuadas em terceiras pessoas ou entidades, com quem não mantém ligação. Em processo penal e contra-ordenacional a notificação de pessoas colectivas deve operar nos mesmos termos da lei adjectiva civil. Não existe qualquer procuração ou outro documento que mandate CC a dar resposta à N.A.D.. E não existe porquanto a Arguida nunca lhe concedeu tais poderes de representação, nem tal facto foi provado, sendo insuficiente, para que a Arguida seja condenada com esse pressuposto, que um qualquer terceiro (i.e. que não é representante nem trabalhador) se arrole de poderes e responda em nome da Arguida. A omissão desta notificação e/ou a preterição de formalidades inerentes à mesma leva a que estejamos perante um acto não oponível à Arguida e faz incorrer a decisão administrativa condenatória e a decisão ora recorrida numa nulidade insanável. Tal nulidade da notificação determina, por si só e por uma questão de direito, que sejam considerados como não provados os artigos 10º e 11º dos factos provados.”.
Que dizer?
A recorrente não tem razão já que a sua argumentação carece totalmente de fundamento.
Com efeito, o facto de ter dado cumprimento, ainda que parcialmente, ao solicitado pela Autoridade Administrativa (pois veio ainda requerer prazo para juntar documentação em falta) indicia, sem qualquer dúvida, que a arguida tomou conhecimento do pedido de junção de documentação por parte da Autoridade Administrativa.
Isto significa que, independentemente do modo como a notificação foi feita, certo é que nenhum direito da arguida/recorrente foi preterido. Aliás, ela não veio dizer que ficou totalmente impossibilitada de dar cumprimento ao solicitado pela Autoridade Administrativa ou que o seu direito de defesa foi violado.
Acresce dizer que a existir qualquer irregularidade na comunicação para junção de documentos à arguida/recorrente, a mesma ficou sanada a partir do momento em que, a mesma, procede à junção da documentação em falta, sendo certo que, e ao contrário do referido pela recorrente, não estamos perante qualquer nulidade insanável, - art. 119º do CPP.
Assim sendo, sem necessidade de outras considerações improcede, também, este segmento da apelação e improcede a pretensão da apelante, nomeadamente a sua pretensão em ver dados como não provados os factos 10 e 11.
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Por fim, que dizer da questão: - Da impugnação dos factos dados como provados e como não provados.
Comecemos pelo facto 15 dado como provado: “A sociedade arguida, na qualidade de dono de obra, não impediu que a entidade executante “C...” iniciasse a implantação do estaleiro sem estar aprovado o plano de segurança e saúde para a execução da obra.”.
A recorrente defende que tal facto deve ser dado como não escrito, alegando:
“No caso, constata-se existir erro notório na apreciação da prova quanto ao facto dado como provado no artigo 15º, onde consta o seguinte: “A sociedade arguida, na qualidade de dono de obra, não impediu que a entidade executante “C...” iniciasse a implantação do estaleiro sem estar aprovado o plano de segurança e saúde para a execução da obra.”.
Pois, como é entendimento pacífico da jurisprudência dos Tribunais superiores, mormente do S.T.J., as conclusões apenas podem extrair-se de factos materiais, concretos e precisos que tenham sido alegados, sobre os quais tenha recaído prova que suporte o sentido dessas alegações, sendo esse juízo conclusivo formulado a jusante, na sentença, onde cabe fazer a apreciação crítica da matéria de facto provada.
Ou seja, só os factos materiais são susceptíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados. As conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas serem objecto de prova (neste sentido, vejam-se os Acórdãos do S.T.J., datados de 14-01-2015, processos nºs 488/11.4TTVFR.P1.S1 e497/12.6TTVRL.P1.S1, pesquisados em www.dgsi.pt).
E sustentando o mesmo entendimento, afirma-se, no douto Acórdão do S.T.J., datado de 12-03-2014, processo nº590/12.5TTLRA.C1.S1, consultado em www.dgsi.pt, que: “Só acontecimentos ou factos concretos podem integrar a selecção da matéria de facto relevante para a decisão, sendo, embora, de equiparar aos factos os conceitos jurídicos geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, verificado que esteja um requisito: não integrar o conceito o próprio objecto do processo ou, mais rigorosa e latamente, não constituir a sua verificação, sentido, conteúdo ou limites objecto de disputa das partes”.
Assim, conforme se decidiu no douto Acórdão do S.T.J., datado de 28-01-2016, processo nº 1715/12.6TTPRT.P1.S1, consultado em www.dgsi.pt, as afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o “thema decidendum”, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objecto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão. Daí que sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, tal ponto da matéria de facto deve ser eliminado. Significando isto, que quando tal não tenha sido observado pelo Tribunal “a quo” e este se tenha pronunciado sobre afirmações conclusivas, que essa pronúncia deve ter-se por não escrita.
Ora, atento o supra exposto, verifica-se que aquele artigo 15º dos factos considerados provados, não pode manter-se, porque o que do mesmo se fez constar é manifestamente conclusivo, reconduzindo-se às expressões usadas na lei, nela não se descreve qualquer facto, sendo, apenas, conceitos jurídicos, concretamente, os que constam da norma cuja violação vem imputada à Recorrente, sem que existam factos materiais.
Assim, impõe-se a eliminação do artigo 15º dos factos provados.”.
Que dizer?
Algumas vezes não é fácil distinguir o que é matéria de direito e o que é matéria de facto, quando os limites entre uma e outra são ténues ou se tocam.
O Professor (Alberto do Reis in CPC anotado, volume 3, pág. 212) defendia que “tudo o que sejam juízos de valor, induções, conclusões, raciocínios, valorações de factos, é actividade estranha e superior à simples actividade instrutória”.
Também o Conselheiro (Jorge Augusto Pais de Amaral in Direito Processual Civil, 9ªedição, pág. 268), refere que “os factos (matéria de facto) abrangem principalmente as ocorrências concretas da vida real. Os juízos de facto situam-se na meia encosta entre os puros factos (que ocorreram na planície terrena da vida) e as questões de direito (situadas nas cumeadas das normas jurídicas)”.
Finalmente, o Conselheiro (A. Abrantes Geraldes in Temas da Reforma do Processo Civil, volume 2, pág. 138) escreve que o juiz deve irradiar da base instrutória “as alegações com conteúdo técnico-jurídico, de cariz normativo ou conclusivo, a não ser que porventura tenham, simultaneamente, uma significação corrente e da qual não dependa a resolução das questões jurídicas que no processo se discutem”.
No caso, concretamente, o facto 15, o seu teor é a reprodução, pela negativa, do que consta do art. 13º, nº2 do DL 273/2003, que preceitua «o dono da obra deve impedir que a entidade executante inicie a implantação do estaleiro sem estar aprovado o plano de segurança e saúde para a execução da obra» com o acrescento da identificação da entidade executante.
Ora, tal afirmação não passa de um juízo conclusivo, que reproduz o teor do citado artigo 13, nº2, pela negativa.
Deste modo, declara-se não escrito o ponto 15 da matéria de facto dada como provada, concordando-se com a recorrente quando diz que o mesmo não pode manter-se no elenco dos factos provados.
No entanto, adiantando desde já, pese embora, a eliminação do ponto 15, não assiste razão à recorrente, quando de seguida, afirma que: “a decisão recorrida omite factos que permitiriam extrair tal conclusão e que se traduziriam na concreta menção de que a entidade executante iniciou a implantação do estaleiro sem estar aprovado o plano de segurança e saúde para a execução da obra, pelo que se nos afigura que a mesma não contém a narração dos factos necessários ao preenchimento do elemento objectivo da infracção imputada à Arguida, possuindo apenas conclusões (contra-ordenação muito grave, prevista e punida pelo artigo 13º, nº 2, do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro), sendo manifestamente insuficiente a fundamentação de facto quanto ao elemento objectivo da infracção em causa, razão pela qual, a nosso ver, não reúne os requisitos previstos no artigo 374º do C.P.P.”. Sem dúvida se atentarmos, na demais factualidade que se encontra provada (vejam-se factos 8º e 14º), só se pode concluir que a abertura do estaleiro ocorreu sem que a arguida (o que lhe competia, como dona da obra) tenha aprovado o Plano de Segurança para execução da obra. Donde, só é possível concluir que, a mesma, não impediu que a entidade executante iniciasse a implantação do estaleiro, sem que aquele PSS estivesse aprovado. Verificam-se, assim, os elementos objectivos da infração em causa.
Mais, se apurou, veja-se facto 18 que, actuou a arguida com negligência, o bastante para que, como bem o concluiu o Tribunal recorrido, se conclua que cometeu a mesma a contraordenação, prevista e punida pelos art.s 13º, nº 2 e 25º, nº 3, alínea a), do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29.10.
Para melhor compreensão, veja-se o que na decisão recorrida se fez constar, a propósito do cometimento desta infracção, onde se lê o seguinte: «(…).
Dispõe o artigo 13.º, na parte que ora importa considerar, que: “1 - A entidade executante só pode iniciar a implantação do estaleiro depois da aprovação pelo dono da obra do plano de segurança e saúde para a execução da obra. 2 - O dono da obra deve impedir que a entidade executante inicie a implantação do estaleiro sem estar aprovado o plano de segurança e saúde para a execução da obra”.
Este normativo deve ser conjugado com os preceitos dos artigos 6.º, 11.º e 12.º, do mesmo diploma, dos quais decorre que:
- O plano de segurança e saúde está dividido em dois subplanos: um para a fase do projeto e outro para a fase da obra.
- O plano de segurança e saúde em projeto tem como suporte as definições do projeto da obra e as demais condições estabelecidas para a execução da obra que sejam relevantes para o planeamento da prevenção dos riscos profissionais (artigo 6.º, n.º 1).
- Por sua vez, cabe à entidade executante desenvolver e especificar o plano de segurança e saúde em projeto de modo a complementar as medidas previstas (artigo 11.º, n.º 1).
- O desenvolvimento e as alterações do plano de segurança e saúde levados a cabo pela entidade executante devem ser validados tecnicamente pelo coordenador de segurança em obra e aprovados pelo dono da obra, passando a integrar o plano de segurança e saúde para a execução da obra (artigo 12.º, n.º 1).
Sobre a aprovação do PSS para a execução da obra, o artigo 12º estabelece que: 1 - O desenvolvimento e as alterações do plano de segurança e saúde referidos nos n.os 1 e 3 do artigo anterior devem ser validados tecnicamente pelo coordenador de segurança em obra e aprovados pelo dono da obra, passando a integrar o plano de segurança e saúde para a execução da obra. 2 - O plano de segurança e saúde pode ser objeto de aprovação parcial, nomeadamente se não estiverem disponíveis todas as informações necessárias à avaliação dos riscos e à identificação das correspondentes medidas preventivas, devendo o plano ser completado antes do início dos trabalhos em causa. 3 - O dono da obra deve dar conhecimento por escrito do plano de segurança e saúde aprovado à entidade executante, a qual deve dar conhecimento aos subempreiteiros e trabalhadores independentes por si contratados, antes da respetiva intervenção no estaleiro, da totalidade ou parte do plano que devam conhecer por razões de prevenção. 4 - O prazo fixado no contrato para a execução da obra não começa a correr antes que o dono da obra comunique à entidade executante a aprovação do plano de segurança e saúde. 5 - As alterações do plano de segurança e saúde devem ter em conta o disposto no artigo anterior e nos n.os 1 a 3 do presente artigo.
Conforme resulta dos factos dados como provados, a entidade executante, in casu, a sociedade “C..., Lda”, iniciou a implantação do estaleiro e estava em obra à data da inspeção, sem que o plano de segurança e saúde para a execução da obra tivesse sido aprovado pela dona da obra, ora recorrente.
Com efeito, muito embora o mesmo se encontrasse elaborado, datado de 27 de Abril de 2022, não consta do plano de segurança e saúde a sua aprovação pelo dono da obra.
Ou seja, apesar de notificada para o efeito, a sociedade arguida não apresentou à ACT a aprovação desse plano.
A recorrente não impediu, assim, que a obra se iniciasse, apesar de o PSS em obra não ter sido aprovado.
Verificam-se os elementos objetivos da infração imputada.».
E prossegue: «Mais se provou que, ao não impedir que a entidade executante “C...” iniciasse a implantação do estaleiro sem estar aprovado o plano de segurança e saúde para a execução da obra, a sociedade arguida atuou negligentemente, omitindo um dever objetivo de cuidado e diligência adequada, no sentido de evitar a produção daquele resultado, não procedendo com o cuidado a que, de acordo com as circunstâncias, estava obrigada e de que era capaz, pelo que dúvidas não restam de que a sociedade arguida praticou a contraordenação que lhe é imputada, a título de negligência. (artigo 15º do Código Penal e artigo 8º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 433/82, que aprovou o Regime Geral das Contraordenações e Coimas).
Com efeito, a negligência consiste na violação de um dever objetivo de cuidado, dever de cuidado cuja concretização pressupõe dois momentos fundamentais: a) cuidado interno, enquanto imposição sobre o agente da conduta de advertir ou prever o perigo que dela eventualmente possa resultar para os bens jurídicos protegidos, e assim tomar as precauções tendentes a evitar a correspondente lesão (previsibilidade do resultado); b) cuidado externo, traduzido na ideia de que o agente da conduta devê-la-á concretizar de forma a observar o cuidado imposto em concreto para que se não produza a lesão proibida e que pode classificar-se como omissão de atividades perigosas e como atuação prudente em situações perigosas, no âmbito do risco permitido.
E, uma vez que o conceito de cuidado a que se refere o dever em causa é ele próprio objetivo, o padrão aferidor da diligência exigível deve procurar-se, através de um juízo ex ante, no cuidado que é requerido na vida de relação social relativamente ao comportamento em causa. O que supõe a formulação de um juízo normativo, resultante da comparação entre a conduta que devia ter adotado um homem razoável e prudente, inserido no âmbito de atividade, munido dos conhecimentos específicos do agente e colocado na sua posição, e a conduta que este efetivamente observou.
Este juízo normativo é integrado por dois elementos: um elemento intelectual, segundo o qual é necessária a consideração de todas as consequências da ação que, num juízo razoável (objetivo), eram de verificação previsível (previsibilidade objetiva), e um outro, valorativo, segundo o qual só será contrária ao direito a conduta que vai além da medida socialmente adequada (risco permitido). Neste sentido, o Acórdão da Relação do Porto, de 27 de Outubro de 2004, pesquisado em www.dgsi.pt.
Conclui-se, pois, que a essência da negligência e a caracterização desta enquanto conduta ilícita pressupõe a conjugação de uma perspetiva objetiva (violação do dever objetivo de cuidado) e de uma perspetiva subjetiva (previsibilidade da ocorrência do resultado proibido como consequência do comportamento, sendo tal previsibilidade acessível ao sujeito da conduta).
O agir negligente não se dirige, portanto, à produção do resultado típico e ilícito, antes viola um dever objetivo de cuidado adequado a evitar a realização de um tipo legal de crime, ou, como no caso dos autos, de uma contraordenação.
A negligência é consciente quando o agente representa como possível a realização de um facto que preenche um tipo de crime (ou uma contraordenação) sem se conformar com essa realização; e é inconsciente quando o agente não chega sequer a representar a possibilidade de realização do facto.
E, no caso dos autos, tendo em conta a factualidade provada, dúvidas não restam de que a sociedade arguida não observou o cuidado exigível e objetivamente requerido no exercício da sua atividade, pelo que praticou a contraordenação que lhe é imputada, a título de negligência.
A negligência nas contraordenações laborais é sempre sancionável, nos termos previstos pelo artigo 550º, do Código de Trabalho.
Por tudo o exposto, a arguida incorreu na prática da contraordenação imputada, improcedendo os fundamentos do recurso apresentado.» (Fim de citação).
Em suma, diga-se, apenas, que pese embora a arguida ter celebrado um contrato de empreitada, através do qual adjudicou a execução da obra em causa, com a sociedade “B..., Ldª” que, por sua vez, celebrou contrato de subempreitada com a entidade executante “C...” e ter apresentado PSS para execução da obra, elaborado em 27.04.2022, tal não é suficiente para afastar o cometimento da contraordenação em causa. A mesma mantém todas as obrigações que sobre ela impendem na qualidade de dona da obra, como seja, o que, agora se aprecia, a aprovação daquele Plano de Segurança e Saúde para a execução da obra, o que se verifica não aconteceu.
*
Passando aos factos 14 e 16 da factualidade dada como provada (sobre o facto 15 já nos pronunciámos) e o facto da al.c) da matéria dada como não provada.
Está provado: 14º- A sociedade arguida não apresentou à ACT aceitação/aprovação do Plano de Segurança e Saúde para execução da obra, por parte do dono da obra.
16º- A sociedade arguida não procedeu à nomeação de um coordenador de segurança em obra em data anterior à abertura do estaleiro da obra referida em 4º, o que só veio a ocorrer a 16 de Setembro de 2022.
E resultou não provado: al. c) Que o Plano de Segurança e Saúde tenha sido validado e aprovado pela sociedade arguida;
Consta da fundamentação da decisão quanto à matéria de facto: «Desde logo, ponderou-se o teor do auto de notícia e respetivos anexos (cfr. fls. 5 a 110), atento o disposto no artigo 13.º, n.º 3, da Lei n.º 102/2009, de 14-09 (sobre o valor probatório do auto de notícia, vide o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 30/03/2016, proc. n.º 501/15.6T8BJA.E1, acessível in www.dgsi.pt), cujo teor foi confirmado em audiência pela Sr.ª Inspetora autuante, EE, que se reportou à visita inspetiva que realizou e ao que no âmbito desta pôde constatar.
Esclareceu que se deslocou a uma obra sita em ..., ..., e que na mesma decorriam trabalhos de instalação do sistema de climatização, executados pelo legal representante da sociedade “C..., Lda”, subempreiteira, sendo dona da obra a sociedade “A..., Lda”, ora recorrente.
Mais referiu que na obra não se encontravam quaisquer documentos, desde logo a comunicação prévia da abertura do estaleiro, e que nada lhe foi exibido, que verificou que as bordaduras das varandas e as escadas de acesso interior não possuíam guarda-corpos, e que elaborou uma notificação para apresentação de documentos à dona da obra, a qual entregou ao legal representante da sociedade “C..., Lda”, seu interlocutor, e único trabalhador em obra.
Aludiu ainda aos documentos que lhe foram remetidos e que anexou ao auto de notícia e bem ainda à circunstância de a comunicação de abertura do estaleiro ter sido efetuada pela sociedade arguida a 20 de Setembro de 2022, pelo que posteriormente à visita inspetiva e necessariamente após o início da execução dos trabalhos que a própria constatou in locu.
Tal depoimento, porque sério, isento, objetivo e desinteressado, mereceu-nos credibilidade, ainda que circunscrito aos factos que diretamente presenciou e aos que retirou da análise documental e das declarações do interlocutor. No mais, atentamos no teor dos documentos anexos ao auto de notícia, concretamente os emails remetidos à ACT pelo Engenheiro CC, atuando em representação da sociedade arguida, e dos quais retiramos que esta foi efetivamente notificada para apresentar documentos e deu cumprimento a essa notificação; a comunicação prévia de abertura de estaleiro, da qual se retirou, para além da data de elaboração, a estimativa do número máximo de trabalhadores e de empresas presentes no estaleiro em simultâneo, e as datas previsíveis de início e termo dos trabalhos no estaleiro; a declaração do coordenador de segurança em obra, elaborada ao abrigo da alínea b) do n.º 3 do artigo 15º do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de Outubro, a qual se encontra datada de 16 de Setembro de 2022; o alvará de licenciamento de obras de construção da obra em causa nos autos; e o plano de segurança e saúde para execução da obra, do qual se retira que o mesmo foi elaborado pelo Engenheiro BB, a 27/04/2022, não se encontrando, no entanto, aprovado pelo dono da obra.
Consideramos ainda o teor do contrato de empreitada, de fls. 95 a 110, e do Orçamento de fls. 94 verso, bem como o teor dos documentos juntos com a defesa escrita, nomeadamente a certidão permanente da sociedade arguida, a certidão do registo predial do imóvel onde decorreu a fiscalização, a declaração da entidade executante da obra, o termo de responsabilidade pela direção técnica da obra, e um email contendo um orçamento para fiscalização de obras, datado de 22 de Março de 2022.
Analisamos ainda o contrato promessa de compra e venda junto com a impugnação judicial.
Da conjugação dos aludidos elementos de prova documental e testemunhal, atendendo à valoração positiva do depoimento da testemunha EE e apelando às regras da experiência e da normalidade do acontecer, resultaram como demonstrados os factos descritos nos pontos 1º a 17º, e nos pontos 20º a 29º da factualidade provada.».
A apelante, diz o seguinte:
“Quanto aos factos provados nos artigos 14º, 15º e 16º a sentença recorrida efectua um julgamento totalmente genérico, na medida em que efectua uma apreciação global de todos os meios de prova produzidos e, logo de seguida, conclui pela prova dos vinte e nove factos, o que impede a percepção dos meios de prova que serviram para a sua demonstração. Tal situação determina a aplicação da alínea b) do nº 2 do artigo 410º do C.P.P.. Antes de 12 de Julho de 2022 a Arguida submeteu pedido, junto da Câmara Municipal ..., no intuito de ser emitido Alvará, para que assim pudesse iniciar obras, impondo-se para o efeito que fosse instruído, com o respectivo pedido, o plano de segurança e saúde. A Arguida elaborou, finalizou e aprovou o plano de segurança e saúde, sem o que nunca lhe tinha sido emitido o Alvará para iniciar as obras em causa nos autos. E se tal documento não foi apresentado junto da entidade administrativa autuante foi porque a Arguida não foi notificada para o efeito. O artigo 14º deve passar a não provado, e a alínea c) passar a facto provado. A sentença recorrida considerou demonstrado que - a Arguida não impediu que a executante “C..., Lda.” iniciasse trabalhos - cfr. artigo 15º; - nos termos contratuais a Arguida ficou como dona da obra e a “B..., Lda.” como executante - cfr. artigo 25º; - Donde se infere que estes três elementos factuais estão, conjugadamente, em contradição, visto que se foi a “B..., Lda.”, enquanto empreiteira (cfr. artigo 25º dos factos provados), que ordenou a subempreitada e a realização dos trabalhos, não poderia a Arguida impedir que esses mesmos trabalhos fossem realizados, pelo menos em função dos demais factos provados, ou que resulte dos autos esse efectivo conhecimento ou que esse início dos trabalhos fosse possível prever.”.
Vejamos.
Nos termos do art. 410º, nº2, alínea b) do C. P. Penal, conjugado com o disposto no art. 51º, nº1 da Lei 107/2009 de 14.09, “Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão”.
Como resulta da letra do citado artigo o referido vício tem de resultar do próprio texto da decisão recorrida.
Ora, analisando, verifica-se que o invocado pela recorrente não se enquadra, como ela defende, na situação prevista naquela al. b) do nº2 do art. 410º do CPP, mas prende-se, pelo contrário, com a eventual alteração da decisão quanto à matéria de facto, o que não cabe aqui decidir na medida em que este Tribunal apenas conhece de direito – art. 51º, nº1 da Lei 107/2009 de 14.09
Na verdade, a apreciação global de todos os meios de prova que conduziram à formação da convicção do Tribunal “a quo”, e consequentemente, à consignação da matéria de facto provada e não provada, não se traduz no alegado vício previsto no citado artigo.
E consultado o documento Plano de Segurança e Saúde dele não consta, na parte destinada à aprovação do dono da obra, qualquer declaração de aprovação deste último.
Acresce que cabia à arguida o ónus de juntar aos autos o documento a que ela se refere quando diz que, “Antes de 12 de Julho de 2022 a Arguida submeteu pedido, junto da Câmara Municipal ..., no intuito de ser emitido Alvará, para que assim pudesse iniciar obras, impondo-se para o efeito que fosse instruído, com o respectivo pedido, o plano de segurança e saúde. A Arguida elaborou, finalizou e aprovou o plano de segurança e saúde, sem o que nunca lhe tinha sido emitido o Alvará para iniciar as obras em causa nos autos,” e que, segundo a recorrente provaria que o plano de segurança e saúde para a execução da obra foi aprovado antes da data da abertura do estaleiro, o que não aconteceu.
Assim, importa, apenas reiterar que, o que a recorrente coloca a este Tribunal de recurso é o pedido de alteração da decisão quanto à matéria de facto, o que não é atribuição da Relação, como já dissemos, a não ser nos casos previstos no art. 410º, nº2 do CPP, o que não se verifica.
Improcede, assim a pretensão da recorrente.
*
Mas, diz ainda a recorrente:
“A sentença recorrida considerou demonstrado que:
- a Arguida não impediu que a executante “C..., Lda.” iniciasse trabalhos - cfr. artigo 15º; - nos termos contratuais a Arguida ficou como dona da obra e a “B..., Lda.” como executante - cfr. artigo 25º; - a “B..., Lda.” determinou que a “C..., Lda.” efectuasse os trabalhos referente à climatização - cfr. artigo 27º.
39 - Donde se infere que estes três elementos factuais estão, conjugadamente, em contradição, visto que se foi a “B..., Lda.”, enquanto empreiteira (cfr. artigo 25º dos factos provados), que ordenou a subempreitada e a realização dos trabalhos, não poderia a Arguida impedir que esses mesmos trabalhos fossem realizados, pelo menos em função dos demais factos provados, ou que resulte dos autos esse efectivo conhecimento ou que esse início dos trabalhos fosse possível prever.”.
Ora, a este propósito, tendo sido declarado não escrito o facto 15 torna-se inútil averiguar a invocada contradição, sendo certo que relativamente à contra-ordenação prevista no nº2 do art. 13º do DL 273/2003, já deixámos exposto o nosso entendimento.
*
Prossegue a recorrente, referindo, também, o seguinte:
“A Arguida efectivamente nomeou o coordenador de segurança em obra desde Abril de 2022. A Arguida não foi notificada para apresentar documento que titule a nomeação do coordenador de segurança em obra. Na fundamentação da prova do elemento subjectivo do tipo (artigo 18º) não se encontra não resulta verificado esse elemento do tipo no que concerne à nomeação de coordenador de segurança (artigo 9º do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro). Deve ser revogada a decisão recorrida, julgando-se procedente a impugnação apresentada, absolvendo-se a Arguida da prática da contra-ordenação prevista e punível pelo artigo 9º, nºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 273/2003, de 29 de Outubro.”.
Que dizer?
Quanto ao que refere, primeiramente, provou-se que a arguida apresentou: -Declaração de nomeação do coordenador de segurança em obra, datada de 16 de setembro de 2022 – facto 11.
Logo, carece de fundamento a afirmação da arguida de que não teria sido notificada para esse fim – facto 10.
Depois, provou-se ainda, que: Ao não nomear coordenador de segurança em obra em data anterior à abertura do estaleiro (….) a sociedade arguida atuou negligentemente, omitindo um dever objetivo de cuidado e diligência adequada, no sentido de evitar a produção daquele resultado, não procedendo com o cuidado a que, de acordo com as circunstâncias, estava obrigada e de que era capaz – facto 18.
Sendo deste modo, é evidente que, carece de razão a recorrente ao afirmar que, no facto 18, não se encontra descrito o elemento subjetivo da contra-ordenação, posto que a negligência nas contraordenações se traduz, como é o caso, na omissão de conduta imposta legalmente.
Por isso, nenhum reparo merece, também, a decisão recorrida ao ter concluído pela confirmação da decisão administrativa relativamente à prática, pela arguida, da contraordenação prevista no referido art. 9º, nº1 e 2 do DL 273/2003.
*
Por fim, remata a arguida com a seguinte argumentação: “Considerando a factualidade, o grau de ilicitude e culpa, e tendo em conta que a Arguida não tem antecedentes, nomeou um coordenador e não existe registo de qualquer sinistralidade, é de aplicar uma coima especialmente atenuada pelo mínimo (16 UC).”.
Vejamos.
Assim sendo, comecemos pelo que consta da decisão recorrida:
«Nos termos do artigo 554.º, n.º 4, alínea b) do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, a uma contraordenação muito grave (in casu, a violação do artigo 13º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10, e a violação do artigo 9º, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma legal) imputada a uma empresa como volume de negócios da arguida, é aplicável uma coima de 32 UC a 80 UC, em caso de negligência e de 85 UC a 190 UC, em caso de dolo.
A Autoridade para as Condições de Trabalho condenou a sociedade arguida “A..., LDA” nas coimas parcelares de 35 U.C. pela prática de cada uma das contraordenações muito graves, (e na coima única de 62 U.C., considerando as penas parcelares das duas contraordenações graves que também lhe imputou, e que aqui consideramos ser de absolver a sociedade arguida da sua prática).
Na determinação da medida concreta da coima haverá que ter consideração os critérios enunciados no artigo 18º, do RGCO (Decreto-Lei n.º 433/82, de 27-10) e no artigo 559º, do Código do Trabalho, concretamente, no que releva in casu:
- Gravidade da contraordenação;
- Gravidade da culpa;
- Situação económica do agente;
- Benefício económico que o agente retirou da prática da contraordenação;
- Permanência ou transitoriedade da infração;
- Número de trabalhadores potencialmente afetados.
Acresce que, em face dos factos apurados relevará ainda ponderar a aplicação da atenuação especial da punição, por aplicação subsidiária do artigo 72º, do Código Penal (artigo 32º, do RGCO).
Com efeito, dispõe o artigo 72º, do Código Penal, que, para além dos casos previstos na lei, quando existam circunstâncias anteriores ou posteriores à infração ou contemporâneas delas, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena, pode esta ser especialmente atenuada (veja-se, a este propósito, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 14/07/2021, proc. n.º 3226/20.7T8OAZ.P1,acessível in www.dgsi.pt).
Assim, tendo em conta a natureza das infrações verificadas, o grau de culpa (na vertente de negligência inconsciente), o grau mediano de ilicitude (considerando o reduzido lapso temporal durante o qual se iniciaram os trabalhos até à nomeação do coordenador de segurança em obra, não se tendo apurado o lapso temporal durante o qual o PSS não foi aprovado pela sociedade arguida), o facto de ter regularizado a situação na sequência da ação inspetiva, passando a designar o coordenador de segurança em obra, e de ter efetivamente elaborado um Plano de Segurança e Saúde, que apenas não aprovou, a situação económica da arguida, o facto de não ter retirado qualquer benefício económico da infração (o qual não se pode presumir), bem como a ausência de antecedentes contraordenacionais, entende-se adequado atenuar especialmente a coima a aplicar.
Nesses termos, segundo o artigo 18º, n.º 3, do RGCO, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos a metade, pelo que a moldura a considerar, quanto às contraordenações muito graves, situa-se entre 16 UC e 40 UC.
Ponderando os aludidos fatores de determinação da medida da coima, entendemos ser de fixar as coimas próximas dos respetivos limites mínimos, isto é, 20 UC pela violação do artigo 13º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10, e 20 UC pela violação do artigo 9º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29/10.
Verificando-se a existência de um concurso de infrações, impõe-se a aplicação das regras do cúmulo jurídico, conforme disposto no artigo 19º do DL 433/82 de 27 de outubro, que estabelece o Regime Geral das Contraordenações, na redação em vigor à data da prática das infrações.
Sendo assim, deverá ser aplicada uma coima única, com uma moldura cujo limite mínimo não pode ser inferior à mais elevada das coimas concretamente aplicada e cujo limite máximo resulta da soma das diferentes coimas aplicadas, ou seja, uma coima com uma moldura entre 20 UC e 40 UC.
Porém, a coima a final proposta não pode ultrapassar o dobro do limite máximo da mais elevada das coimas aplicáveis.
Tudo ponderado, entendemos ser de aplicar à sociedade arguida a coima única de 25 UC, correspondentes a €2.550,00 (dois mil quinhentos e cinquenta euros).».
O que antecede, não nos merece qualquer reparo, face à factualidade apurada e respectivo enquadramento jurídico.
Assim, aqui sufragamos o entendimento do Tribunal “a quo” relativamente às coimas aplicadas, no que respeita a cada uma das contraordenações, previstas nos art.s 13º, nº 2 e 9, nº1 e 2 do DL nº273/2003 e em concreto, à coima única aplicada, não invocando a recorrente quaisquer argumentos que justifiquem outra decisão, mantendo-se igualmente a sanção acessória de publicidade da decisão.
Na verdade, a coima aplicada, a cada uma das infracções, foi especialmente atenuada, considerando o Tribunal “a quo” todo o circunstancialismo “atenuante” e aplicando a coima muito próximo do seu limite mínimo. Não existindo, assim, nem se vendo razões para divergir desse entendimento.
Improcede, assim, a apelação.
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III - DECISÃO
Em face do exposto, acordam as Juízas desta secção em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
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Custas a cargo da recorrente.
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Após trânsito em julgado deste Acórdão, comunique à ACT, com cópia certificada do mesmo.
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Porto, 30 de Setembro de 2024
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O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos,
Relatora: (Rita Romeira)
1ª Adjunta: (Teresa Sá Lopes)
2ª Adjunta: (Eugénia Pedro)