ACÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DA REGULARIDADE E LICITUDE DO DESPEDIMENTO
AUDIÊNCIA DE PARTES
NOTIFICAÇÃO AO MANDATÁRIO
COMINAÇÃO
Sumário

I. Estando a empregadora em audiência de partes representada por mandatário com poderes especiais, nos termos e circunstâncias do art.º 98-F/2, e não havendo acordo, a notificação feita nesse ato nos termos do art.º 98-I, n.º 4, al. a), do CPT, mostra-se válida e eficaz, não havendo lugar a qualquer outro ato junto da empregadora.
II. Se esta depois não junta designadamente o seu articulado motivador do despedimento, há lugar à prolação imediata de decisão de harmonia com o disposto no n.º 3 do art.º 98-J, do CPT.
(Sumário elaborado pelo Relator)

Texto Integral

Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
Nesta AIJRD que AA propõe contra XX, Unipessoal, Lda., um tribunal a quo proferiu a final decisão nos seguintes termos:
“Encontrando-se a R. devidamente citada e notificada para apresentar o articulado motivando do despedimento do A., não o fez.
O A., notificado para o efeito, optou pela indemnização.
O contrato de trabalho nos presentes autos foi celebrado sem termo, com data de início em 21 de setembro de 2021.
O despedimento do A. ocorreu em 8 de outubro de 2023.
A presente ação deu entrada em Juízo em 6 de dezembro de 2023.
Assim, ao abrigo do disposto no artigo 98°J, n° 3, do CPT declara-se a ilicitude do despedimento do A. e consequentemente condena-se a R.:
a) A pagar ao A. a respetiva indemnização, a liquidar em execução de sentença, correspondente a 30 dias de retribuição por cada ano ou fração, com o mínimo de três meses;
b) A pagar ainda ao A. todas as retribuições vencidas e vincendas, nos precisos termos referidos na alínea b) do n.º 3 do artigo 98.°-J do CPT.
Custas pela R. fixando-se em 5.001,00 o valor da ação, cf. artigo 446° do CPC e 98°P do CPT.
Registe e Notifique, sendo o A. nos termos do artigo 98°J n° 3 alínea c) do CPT.
Almada, d.s.”.
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Não se conformando, a R. apelou, tendo apresentado motivação e formulado as seguintes conclusões:
1. O meritíssimo Juiz a quo errou quando despachou no sentido de considerar despiciendo ou inócuo o facto de, no dia da realização da audiência de partes, na impossibilidade de se atingir uma conciliação, apenas se limitou a marcar a data de audiência de discussão e julgamento para o dia 14 de março de 2024 pelas 14h00, sem, contudo, notificar a ora apelante, para os termos consagrados no artigo 98.-I, no 4 do CPT.
2. Contrário ao que pugnou, o juiz a quo, que no dia 21/12/2023, referência 431488894, dispondo no sistema Citius a Ata de audiência de partes, (alínea c) do artigo 562 do CPT), para consulta do ilustre mandatário do Autor, o Dr. BB.
3. A douta sentença sob recurso aplicou, pois, erradamente o preceituado nos art.º 98.-I, nº 4, alínea a), uma vez que não notificou a Ré, para esse efeito na data de audiência de partes, como lhe competiria, limitando-se apenas a marcar a data de audiência de discussão e julgamento.
4. Errou o tribunal, ao disponibilizar a ata de partes no sistema eletrónico para consulta apenas ao mandatário judicial do Autor, ferindo claramente o espírito do princípio das partes, consagrado no art.º 42 do CPC, ao obstar que a Ré, exercesse o princípio do contraditório, nos termos consagrados no n.º 3 do art.º 3º do C.P.C., que como é consabido é um dos pilares essenciais do processo civil.
5. Pelo que a questão deverá ser apreciada no âmbito da presente e modesta fundamentação que aqui se dá por integralmente reproduzida, e consagrada segundo os critérios dos artigos 98-I, n.º 4, alínea a), do CPT e art.º 3º n.º 3, e 42, ambos do CPC.
Rematou pedindo a procedência do recurso e a revogação da sentença
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Contra-alegou o A., pedindo a improcedência do recurso e concluindo:
1 - Nos presentes autos, por douto despacho datado de 11/12/2023, foi agendada a audiência de partes a ter lugar no dia 21/12/2023, pelas 13.45 m.
2 - Naquela data agendada, compareceram o A., AA e o seu mandatário, BB, bem como, o mandatário da R. (Entidade Empregadora), Dr. CC.
3 - As partes ficaram, assim, notificadas conforme consta da Ata, sendo que, a Entidade Empregadora, estando representada pelo seu Ilustre mandatário, Dr. CC, ficou notificada para apresentar no prazo de 15 dias, o respetivo articulado com a motivação do despedimento, juntar o processo disciplinar e apresentar a prova respetiva.
4 - Como decorre da legislação aplicável, não existe qualquer determinação de notificação da Ata a qualquer das partes, pelo que o Tribunal não procedeu à notificação da mesma a qualquer das partes, como a R. e Recorrente pretende fazer crer nas suas alegações.
5 - De facto, o mandatário do Trabalhador e A., Dr. BB, não foi notificado da Ata, nem tinha que ter sido, nem foi de qualquer forma privilegiado com a possibilidade de consulta exclusiva da ata em causa, pelo que, falece desde logo a fundamentação da Recorrente R.
6 - Nem se entende que, a R. Recorrente venha alegar que apenas ao mandatário da A., tivesse sido disponibilizada a Ata da audiência de partes, porquanto, a mesma, a partir do momento em que foi colocada na plataforma "Citius", ficou imediatamente disponível para consulta de que tem tenha acesso a essa mesma plataforma "Citius", nomeadamente, o mandatário da R. e Recorrente, Dr. CC.
7 - O que sucedeu foi que a R./Recorrente, não cumpriu o determinado no artigo 98°-I, n° 4, do CPT., ficando, assim precludido, pelo decurso do prazo, a possibilidade de apresentar a motivação do despedimento, o processo disciplinar e a prova.
8 - Não existiu, assim qualquer erro ou violação da douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal "a quo", devendo, por isso, improceder o recurso em causa, mantendo-se a douta sentença proferida.
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O MºPº teve vista, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso.
Não houve resposta ao parecer.
Foram colhidos os vistos legais.
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FUNDAMENTAÇÃO
Cumpre apreciar neste recurso – considerando que o seu objecto é definido pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, e exceptuando aquelas cuja decisão fique prejudicada pela decisão dada a outras, art.º 635/4, 608/2 e 663, todos do Código de Processo Civil – se foi cumprido o disposto no n.º 4), al. a) do art.º 98-I do CPT.
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A factualidade apurada nos autos corresponde ao descrito supra.
E ainda:
1°. Na Audiência de Partes, em que o mandatário da R. esteve presente, munido de procuração com poderes especiais, foi proferido despacho judicial com o seguinte teor:
"Não sendo possível a conciliação, fica a entidade empregadora notificada, nos termos do disposto no art.º 98.0-I, n.º 4, do CPT para:
- No prazo de 15 dias apresentar articulado motivando o despedimento;
- Juntar procedimento disciplinar ou documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas;
- Apresentar rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas. De acordo com o estipulado na alínea c) do art.º 560 do CPT, para realização da audiência de discussão e julgamento designa-se o próximo dia 14 de Marco de 2024, pelas 14h00, data esta obtida com o acordo dos Ilustres mandatários das partes";
2°. Esse despacho foi de imediato notificado aos presentes;
A ata em causa não foi impugnada e foi colocada no sistema Citius, ficando disponibilizada às partes.
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De Direito
Dispõe o artigo 98 - I, n.º 4, al. a)do CPT que, “Frustrada a tentativa de conciliação, na audiência de partes o juiz: a) Procede à notificação imediata do empregador para, no prazo de 15 dias, apresentar articulado para motivar o despedimento, juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, apresentar o rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas”.
Pode discutir-se, e parece ser essa a perspetiva da recorrente, se a notificação tem de ser feita incontornavelmente na pessoa da parte ou se pode ter lugar através do seu mandatário.
Ora, há que notar que a regra é a comparência pessoal da parte na audiência de partes, só podendo a mesma deixar de se apresentar em caso de justificada impossibilidade de comparência, devendo então fazer-se representar por mandatário judicial com poderes especiais (art.º 98-F/2 e 54, n.º 3, CPT).
Sendo assim, é óbvio que a comparência do mandatário com poderes especiais leva a que esteja habilitado a receber advertências como a da obrigação de apresentação do articulado em 15 dias, e que tal consubstancie a advertência referida.
Isto é, aliás, pacífico. Assim, decidiu-se, por todos, no Ac. do TRL de 27.09.2023, Proc. n° 5879/23.5T8LSB-A.L1 - "Considera-se efetuada a notificação prevista no artigo 98-1 n.04, al La) do CPT se, na audiência de partes que antecedeu a audiência final de procedimento cautelar de suspensão do despedimento, foi proferido despacho a ordenar a notificação da empregadora que se encontrava devidamente representada por mandatário com poderes especiais"; no Ac. do TRG. De 19.12.2023, Proc. n° 5969/22.1T8GMR-A.G1 —" Em processo laboral, a notificação para contestar é ato a praticar, na diligência de tentativa de conciliação, na pessoa da ré, se presente, ou na pessoa com poderes para a representar no ato"; e no ac. TRC 13-12-2011 (344/11.6TTLRA.C1) I – Tendo-se frustrado a tentativa de conciliação em acção de impugnação de despedimento promovida pelo trabalhador, a entidade patronal é imediatamente notificada nos termos e para os efeitos do disposto no nº 4 do art.º 98º-I do CPT (apresentação do articulado motivador do despedimento e junção do procedimento disciplinar…).
Entendimento diverso conduziria, aliás, a resultados absurdos: para representar a parte faltosa, o mandatário munido de procuração com poderes especiais, poderia atuar, vinculando mesmo substantivamente o representado; mas para receber uma simples notificação, já não.
De resto, as partes presentes são notificadas nesse ato nos termos do art.º 254 CPC, e tal tem lugar através dos mandatários constituídos (art.º 247/1, CPC).
Assim, assente que podia receber a notificação, e que tal consta da ata, é evidente que foi cumprido o disposto na lei, ao contrário do que afirma a recorrente.
Argumenta a R. que, ainda assim, não foi cumprido devidamente, já que a ata apenas esteve disponível para o mandatário da contra-parte.
É óbvio que isto não colhe, porquanto a ata foi lançada no Citius, podendo ser consultada por qualquer das partes.
O que parece é que a R. entende que o termo inicial da contagem do prazo seria o de uma necessária notificação da ata. Mas sem razão, porque a notificação foi feita na audiência de partes e ficou documentada em ata (o que é diferente de operar através da notificação da ata), e nada mais era necessário.
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Assim, nos termos do n.º 3 do art.º 98-J, do CPT, “se o empregador não apresentar o articulado referido no número anterior, ou não juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, o juiz declara a ilicitude do despedimento do trabalhador (…).”
Foi o que aconteceu, o que basta para que se conclua que a decisão não merece censura.
Destarte, improcede o recurso.
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DECISÃO
Pelo exposto, este Tribunal julga improcedente o recurso e se confirma a sentença recorrida.
Custas do recurso pela recorrente.

Lisboa, 3 de julho de 2024
Sérgio Almeida
Maria José Costa Pinto
Alda Martins