PROCESSO PENAL
EXTRADIÇÃO
DECISÃO FINAL
RECURSO
ACORDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
NULIDADE DE ACÓRDÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário


I. Ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) que conhece de um recurso interposto de uma decisão final do processo de extradição passiva é aplicável o disposto no n.º 1 do artigo 379.º ex vi artigo 425.º, n.º 4, do CPP, em matéria de nulidades.
II. A “questão prévia” identificada em requerimento de arguição de nulidades do acórdão a propósito do trânsito em julgado da sentença condenatória no Estado requerente e não suscitada no recurso para o STJ diz respeito a facto que constitui pressuposto essencial da extradição para cumprimento de pena definitivamente fixado no acórdão da relação, sobre o qual o STJ não se pronunciou nem tinha de se pronunciar, não podendo, assim, dela conhecer no âmbito da apreciação do requerimento de arguição de nulidade do acórdão em que foi decidido o recurso da decisão final do processo de extradição.
III. As nulidades invocadas, relativas a omissão e excesso de pronúncia sobre a coabitação do extraditando com o cônjuge em território nacional e sobre o tempo da pena de prisão não cumprida, dirigidas ao acórdão do tribunal da relação e suscitadas, apreciadas e decididas no acórdão do STJ que conheceu do recurso dele interposto, não constituem nulidades do acórdão do STJ.
IV. Pelo que, não se identificando qualquer nulidade, é indeferido o requerimento de arguição de nulidades do acórdão do STJ.

Texto Integral


Acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:



I. Relatório

1. AA, vem arguir a nulidade do acórdão de 15 de março de 2023, que julgou improcedente o recurso por si interposto do acórdão de 8 de fevereiro de 2023 do Tribunal da Relação de Coimbra, mantendo a decisão recorrida que autorizou a sua extradição para o Brasil.

Alega que:

«Questão Prévia – da Inadmissibilidade da Extradição por Factos Supervenientes:

Os presentes autos baseiam-se num pedido de extradição formulado pela República Federativa do Brasil, ao Estado Português, do recorrente – AA -, para efeitos de cumprimento de pena de seis anos, seis meses e quinze dias de prisão, em regime inicialmente fechado, e quinze dias de multa, em que foi condenado por acórdão proferido pela 2.ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de ..., a 25/2/2021, alegadamente transitado em julgado a 17/5/2021, após recurso da sentença de primeira instância, publicada a 28 de Março de 2016.

Sucede que, e não obstante a documentação constante dos autos, remetida pelas autoridades da República Federativa do Brasil, a referida condenação não transitou em julgado.

Isto porque consultando a “Certidão de Antecedentes Criminais n.º ...23” do recorrente, emitida pelo Serviço Público Federal do Ministério da Justiça e Segurança Pública do Brasil a 16/3/2023 e ora junta como documento 1, constata-se que da mesma não consta qualquer sentença condenatória transitada em julgado na pessoa do recorrente.

De igual modo, o Tribunal de Justiça do Estado de ... – o mesmo que alegadamente condenou o recorrente em pena de prisão transitada em julgado – emitiu a certidão criminal e de execução negativa a 16/3/2023, que se junta como documento 2, na qual nada consta em termos de registos de distribuição e execução de acção penal em tramitação contra aquele.

Perante o exposto, constata-se que não existe qualquer decisão condenatória transitada em julgado contra o recorrente. E, em consequência, deverá ser negada a extradição, tendo em linha de conta os elementos ora apresentados. Isto sob pena de se privar a liberdade ao recorrente, que não foi alvo de sentença judicial condenatória transitada em julgado e, assim, se violar o disposto o n.º 2 do artigo 27.º da Constituição da República Portuguesa, bem como o artigo 33.º da mesma Lei.

Sem conceder, e antes da tomada de qualquer decisão definitiva, deverão as autoridades brasileiras ser confrontadas com a documentação ora carreada para os autos, e apresentar os devidos esclarecimentos, a fim de evitar uma extradição forçada e manifestamente injusta.

Ainda sem conceder:

Da Nulidade do Acórdão

Rege a alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do Código de Processo Penal, que a sentença – in casu, acórdão – é nula/o quando o tribunal deixe de conhecer de questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

Ora, ao tribunal foi levada a questão da omissão de pronúncia relativamente à documentação apresentada pelo extraditando, comprovativa de que o mesmo reside com a sua mulher em território português, facto aliás aventado na audiência que validou a sua detenção.

No entanto, o acórdão recorrido não se versou sobre tal questão, limitando-se a transcrever o anterior aresto do STJ, quanto à eventual consequência da prova da coabitação do recorrente com a sua mulher, mas não quanto à prova, ou não, da referida coabitação.

Pelo exposto, e por omissão de pronúncia quanto a tal questão, o acórdão recorrido afigura-se nulo, devendo, em consequência, ser substituído por outro, que em concreto considere provada – ou não provada – a coabitação do extraditando em território nacional com a sua mulher, perante todos os elementos carreados para os autos. E só após a análise crítica e conclusão acerca de tais factos, aplicar/realizar o Direito, explicitando a consequência da prova da alegada coabitação.

Em sentido inverso, o acórdão recorrido decidiu – sem dispor de quaisquer elementos para o efeito – que ao recorrido falta cumprir a pena integral a que foi condenado, em absoluta dissonância com o ordenado no anterior acórdão do STJ. Para alcançar tal decisão, bastou a requisição efectuada pela República Federativa do Brasil, a qual não se afigurou suficiente no acórdão antecedente… Ora, tal decisão, para além de colidir com a decisão anterior – que ordenou a notificação da República Federativa do Brasil para vir informar o tempo remanescente de pena a cumprir – e, assim, se poder aferir da (im)possibilidade da extradição do recorrente, revela-se, salvo melhor opinião, uma questão de que o Tribunal não pode tomar conhecimento. Isto porque, pura e simplesmente, não dispõe de elementos para o efeito. Quais elementos? A informação expressa, emanada pelo Estado requisitante da extradição, do tempo concreto que resta cumprir em reclusão, e não da pena a que o extraditando foi condenado.

Assim sendo, a inexistência de resposta a tal questão pelas autoridades brasileiras não confere ao Tribunal a possibilidade de decidir sobre a legitimidade, ou não, da extradição, atento o limite temporal legalmente previsto pelo n.º 2 do artigo 2.º do Tratado de Extradição outorgado entre a República Federativa do Brasil e a República Portuguesa.

Pelo que, deverá também neste ponto o acórdão ser considerado nulo e, em consequência, ser substituído por outro que ordene ao Tribunal da Relação de Coimbra o pedido às autoridades brasileiras de certidão onde conste o tempo remanescente da pena a cumprir.

Nestes termos, e nos melhores de Direito, deve ser dado inteiro provimento ao ora requerido, devendo, em consequência, ser considerado que não existe qualquer decisão transitada em julgado que possa implicar a extradição do recorrente, sob pena de violação dos artigos 27.º, n.º 2 e 33.º da CRP e/ou, considerar-se nulo o acórdão recorrido, sendo o mesmo substituído por outro que negue a extradição do recorrente.

2. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste tribunal pronuncia-se sobre o requerimento agora apresentado dizendo, em síntese:

a) Quanto à denominada “questão prévia” relativa à “inadmissibilidade da extradição por factos supervenientes”, em que vem alegado que a sentença condenatória não transitou em julgado: que consta da matéria de facto provada que a sentença condenatória proferida pelo tribunal da República Federativa do Brasil, após recurso, transitou em julgado em 17.05.2021 e que o recorrente “não contestou aquela matéria de facto nem a motivação em que assentou a respetiva convicção no recurso que interpôs da mesma, pelo que - sobre essa matéria - se formou caso julgado”.

b) Quanto à alegada nulidade por omissão de pronúncia: que a “questão”, que se traduz em “não ter [sido] considerado como provada a coabitação com a sua mulher”, foi objeto de apreciação, não se verificando a nulidade invocada.

c) Quanto à alegada nulidade da pronúncia relativamente ao tempo de prisão que falta cumprir: que “não integra a nulidade a que se reporta o segundo segmento da al. c) do n.º 1 do art.º 379.º do Código Processo Penal a circunstância de, no entendimento do Recorrente, o tribunal ter decidido sem dispor de quaisquer elementos para o efeito”.

Decidindo.

II. Fundamentação

3. Dispõe o artigo 379.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, aplicável aos acórdãos proferidos em recurso ex vi artigo 425.º, n.º 4, do mesmo diploma, que é nula a sentença:

“a) Que não contiver as menções referidas no n.º 2 e na alínea b) do n.º 3 do artigo 374.º ou, em processo sumário ou abreviado, não contiver a decisão condenatória ou absolutória ou as menções referidas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 389.º-A e 391.º-F;

b) Que condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstos nos artigos 358.º e 359.º;

c) Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.

Proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa, sendo, porém, lícito ao juiz suprir nulidades, as quais devem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário (artigos 613.º e 615.º do Código de Processo Civil, na parte aplicável, ex vi artigo 4.º do CPP).

4. Como se sintetizou no acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 15 de março de 2023, que agora pretende colocar em crise, o extraditando colocou as seguintes questões à apreciação e decisão deste tribunal:

(a) nulidade do acórdão recorrido, “ao abrigo do artigo 379.º do CPP" (da motivação) quanto ao não ter “considerado como provada a coabitação com a sua mulher” (conclusões 1 a 3);

(b) não esclarecimento “acerca da eventual prescrição do procedimento criminal”, porque “não foi esclarecida a tipificação das normas violadas à luz do ordenamento penal português, nem a verificação da interrupção da prescrição” (conclusões 4, 5 e 6);

(c) não esclarecimento sobre a “questão do tempo que falta resta cumprir pelo extraditando em reclusão, atento o facto de o mesmo ter cumprido prisão preventiva na República Federativa Brasileira” (conclusões 7, 8 e 9).

O âmbito do recurso, que circunscreve os poderes de cognição deste tribunal, como então se disse e agora se reafirma, delimita-se pelas conclusões da motivação (artigos 402.º, 403.º e 412.º do CPP), sem prejuízo dos poderes de conhecimento oficioso, se for caso disso, em vista da boa decisão do recurso, de vícios da decisão recorrida a que se refere o artigo 410.º, n.º 2, do CPP (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95, DR-I, de 28.12.1995), de nulidades não sanadas (n.º 3 do mesmo preceito) e de nulidades da sentença (artigo 379.º, n.º 2, do CPP, na redação da Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro).

Não foram identificados vícios ou nulidades que este tribunal devesse conhecer oficiosamente, pelo que a pronúncia se limitou, como se impunha, às questões suscitadas pelo recorrente.

5. No requerimento que agora apresenta, o extraditando vem, em texto sob a designação de “questão prévia - da Inadmissibilidade da Extradição por Factos Supervenientes”, dizer que não pode ser extraditado para o Brasil porque “não existe qualquer decisão condenatória transitada em julgado contra o recorrente”, que, por isso, deve ser negada a extradição, e que, “sem conceder”, deverão as autoridades brasileiras “ser confrontadas com a documentação ora carreada para os autos”, que respeita a uma “certidão de antecedentes criminais” de que “não consta qualquer sentença condenatória transitada em julgado”, e “apresentar os devidos esclarecimentos, a fim de evitar uma extradição forçada e manifestamente injusta.”

5.1. Do acórdão do tribunal da Relação, de que o extraditando interpôs recurso, consta como provado que a extradição do “cidadão brasileiro AA”, foi solicitada “para efeitos de cumprimento da pena de 6 ( seis ) anos, 6 ( seis ) meses e 12 ( dozes ) dias de prisão, em regime prisional inicialmente fechado, e 15 ( quinze ) dias de multa, em que foi condenado, por acórdão da 2ª Câmara ..., proferido em 25.02.2021 e transitado em julgado em 17.05.2021, após recurso da sentença da primeira instância publicada em 28 de Março de 2016.” E que “O Tribunal baseou a sua convicção, relativamente aos factos provados: - Nos documentos de fls. 4-41 vº dos autos (pedido de extradição onde constam os fundamentos da mesma e decisões condenatórias proferidas pelos Tribunais Brasileiros, de 1ª e 2ª instância, documentação que igualmente se mostra junta a fls. 52-102, com particular enfoque e na íntegra quanto às referidas decisões condenatórias ), e, ainda, as informações e esclarecimentos entretanto chegados aos autos e constantes de fls. 242-248– quanto aos factos provados aludidos em 1., 3., 4. e 5.; (…)”.

5.2. No recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o extraditando, podendo fazê-lo, não impugnou ou discutiu o trânsito em julgado da decisão condenatória, que constitui um pressuposto essencial de concessão da extradição para cumprimento de pena – a exequibilidade da sentença que impõe a pena a cumprir, em resultado do respetivo trânsito em julgado – nem, quanto a ele, questionou a fundamentação da decisão recorrida.

Assim sendo, tornou-se o acórdão recorrido (acórdão da Relação) definitivo quanto a este facto, o qual, em consequência, se deve considerar estabelecido.

E, não tendo o acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, quanto a ele, emitido nem devendo emitir pronúncia, não pode agora o recorrente questionar a decisão, por essa possibilidade não se comportar no âmbito de arguição de nulidades da previsão do artigo 379.º, aplicável ex vi artigo 425.º, n.º 4, do CPP (supra, 3).

Em consequência do que não pode admitir-se o requerimento nesta parte.

6. Argui o recorrente a nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia – artigo 379.º, n.º 1, al. c), do CPP “relativamente à documentação apresentada pelo extraditando, comprovativa de que o mesmo reside com a sua mulher em território português, facto aliás aventado na audiência que validou a sua detenção”, alegando que “o acórdão recorrido não se versou sobre tal questão, limitando-se a transcrever o anterior aresto do STJ, quanto à eventual consequência da prova da coabitação do recorrente com a sua mulher, mas não quanto à prova, ou não, da referida coabitação” e concluindo que “pelo exposto, e por omissão de pronúncia quanto a tal questão, o acórdão recorrido afigura-se nulo, devendo, em consequência, ser substituído por outro, que em concreto considere provada – ou não provada – a coabitação do extraditando em território nacional com a sua mulher, perante todos os elementos carreados para os autos. E só após a análise crítica e conclusão acerca de tais factos, aplicar/realizar o Direito, explicitando a consequência da prova da alegada coabitação.”

A arguição da nulidade dirige-se, pois, se bem se apreende o sentido da argumentação, ao “acórdão recorrido”, isto é, ao acórdão do Tribunal da Relação, e não ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de março de 2023, que o recorrente pretende colocar em crise.

6.1. Como se viu [supra, 4 (a)], esta foi uma das questões que o extraditando colocou nos recursos que interpôs e sobre a qual este Supremo Tribunal de Justiça se pronunciou (pontos 8 a 12 do acórdão de 15 de março de 2023), concluindo nos seguintes termos:

11. O que está em causa, na alegação do recorrente, é a omissão resultante de não aceitação e não conhecimento de documentos para pretendida prova de um facto relativo ao funcionamento da denominada “cláusula humanitária” que, como se decidiu no anterior acórdão, não constitui motivo de recusa de extradição, mas apenas de eventual adiamento de entrega, em fase de execução de decisão que concede a extradição.

Com efeito, disse-se no anterior acórdão:

«A discordância quanto ao decidido expressa-se na (…) não aceitação do facto não provado de coabitação com a sua mulher, para prova da sua situação pessoal. Tudo tendo em vista a aplicação do artigo 18.º, n.º 2, da Lei n.º 144/99, de 31 de agosto, segundo o qual pode ainda ser negada a cooperação quando, tendo em conta as circunstâncias do facto, o deferimento do pedido possa implicar consequências graves para a pessoa visada, em razão da idade, estado de saúde ou de outros motivos de carácter pessoal. (…) A aplicação desta disposição depende, desde logo, da conclusão que se possa obter sobre a falta ou insuficiência das disposições da Convenção, nos termos do artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 144/99, o qual dispõe que as formas de cooperação a que se refere o artigo 1.º, em que se inclui a extradição, se regem pelas normas dos tratados, convenções e acordos internacionais que vinculem o Estado Português e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições deste diploma. (…) Este Tribunal tem decidido que o artigo 4.º da Convenção estabelece motivos de recusa facultativa de extradição que são taxativos, não se podendo invocar, supletivamente, o motivo de denegação facultativa da cooperação previsto no artigo 18.º, n.º 2, da Lei n.º 144/99. Consignou-se, nomeadamente no acórdão de 30.10.2013 (Oliveira Mendes), Proc. n.º 86/13.8YREVR.S1 1, que a “(…) Convenção de Extradição entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa não prevê no seu artigo 4º (…), norma que, sob a epígrafe de recusa facultativa de extradição, elenca as circunstâncias em que a extradição pode ser recusada, a possibilidade de recusa da extradição, tal qual sucede com o n.º 2 do artigo 18º da Lei de Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal, quando possa implicar consequências graves para a pessoa visada, em razão da idade, estado de saúde ou de outros motivos de carácter pessoal. (…).”. No mesmo sentido se decidiu também nos acórdãos de 14.7.2022, Proc. 16/22.6YRPRT-A.S1, e de 6.9.2022, Proc. 181/22.2YRPRT.S1, anteriormente citados. (…) Esta conclusão não obsta, porém, a que, no âmbito da execução da decisão de extradição, o estado de saúde do extraditando, se for caso disso, deva ser considerado, podendo justificar o adiamento da entrega (artiga 13.º, n.º 5, da Convenção). (…) Assim sendo, o acórdão recorrido, que reflete a jurisprudência seguida neste Tribunal, não merece, nesta parte, qualquer censura».

12. Para além disto, não se reconduz a alegação do recorrente a nulidade da alínea a) (falta de fundamentação) ou da alínea b) (condenação por factos diversos da acusação ou da pronúncia), do mesmo n.º 1 do artigo 379.º do CPP.

Nesta conformidade, não ocorrendo nulidade do acórdão, improcede o recurso nesta parte.”

6.2. Trata-se, assim, de um pedido que repete o anteriormente formulado, já conhecido e decidido por este Tribunal, relativamente ao qual se esgotou o poder jurisdicional (supra, 3).

Pelo que, não se compreendendo também no âmbito de arguição das nulidades da previsão do artigo 379.º, aplicável ex vi artigo 425.º, n.º 4, do CPP, não pode ser admitido.

Mesmo que se pudesse entender que o recorrente pretende arguir a nulidade do acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 15 de março de 2023, esta arguição não tem fundamento, pois que, como resulta da transcrição efetuada, tal questão foi apreciada e decidida, não ocorrendo nulidade por omissão de pronúncia.

7. Finalmente, vem o recorrente arguir a nulidade da decisão na parte respeitante ao tempo de prisão a cumprir por, no seu entender, o tribunal conhecer de uma questão de que “não pode tomar conhecimento”, porque “não dispõe de elementos para o efeito”. Alega que, “o acórdão recorrido decidiu – sem dispor de quaisquer elementos para o efeito – que ao recorrido falta cumprir a pena integral a que foi condenado, em absoluta dissonância com o ordenado no anterior acórdão do STJ”.

A arguição da nulidade parece, pois, dirigir-se também ao “acórdão recorrido”, isto é, ao acórdão do Tribunal da Relação, e não ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de março de 2023, que o recorrente pretende colocar em crise.

7.1. A questão do esclarecimento do tempo da pena de prisão para cumprir foi suscitada pelo extraditando no recurso que interpôs do acórdão de 8 de fevereiro de 2023 do Tribunal da Relação e apreciada nos pontos 25 a 28 do acórdão de 15 de março de 2023. Pronunciou-se o acórdão nos seguintes termos:

«Por fim, prevendo-se, ainda, no artigo 2.º, n.º 1 da Convenção CPLP que “Dão causa à extradição os factos tipificados como crime segundo as leis do Estado requerente e do Estado requerido, independentemente da denominação dada ao crime, os quais sejam puníveis em ambos os Estados com pena privativa de liberdade de duração máxima não inferior a um ano”, exigindo o mesmo, por isso, que a extradição pedida para cumprimento de pena só possa ser deferida quando a parte da pena por cumprir não seja inferior a seis meses, cumpre dizer o seguinte:

No caso em vertente há que considerar que se mostra por cumprir a totalidade da pena de 6 anos, seis meses e 12 dias de prisão em que o extraditando foi condenado, porquanto, no formulário relativo ao pedido de extradição consta que o réu respondeu ao processo em liberdade, e em liberdade recorreu à segunda instância, tendo sido expedido mandado de prisão, em 4.05.2022, para fins de captura com vista ao início do cumprimento da referida pena 6 anos, 6 meses e 12 dias de prisão, conforme se vê de fls. 7 vº.».

28. O que vem decidido, suprindo a anterior omissão, mostra, por conseguinte, em conformidade com a documentação que acompanha o pedido de extradição, nomeadamente o “mandado de prisão”, que a pena a cumprir é superior a seis meses de prisão, não havendo dúvida a este respeito.

Pelo que, verificado o requisito exigido pelo n.º 1 do artigo 2.º, não há omissão que afete o decidido e que, em consequência, deva ser conhecida.

Improcedendo, pois, o recurso nesta parte.»

7.2. Tal como se referiu a propósito da questão anterior, trata-se, pois, de um pedido que repete o anteriormente formulado, já conhecido e decidido por este Tribunal, relativamente ao qual se esgotou o poder jurisdicional (supra, 3).

Pelo que, não se compreendendo igualmente no âmbito de arguição das nulidades da previsão do artigo 379.º, aplicável ex vi artigo 425.º, n.º 4, do CPP, não pode ser admitido.

Também como se consignou quanto à questão anterior, mesmo que se pudesse entender que o recorrente pretende arguir a nulidade do acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 15 de março de 2023, esta arguição não tem fundamento, pois que, como resulta da transcrição efetuada, tal questão foi apreciada e decidida, não ocorrendo nulidade por excesso de pronúncia.

III. Decisão

8. Pelo exposto, decide-se em conferência:

a) Declarar que o acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 15 de março de 2013 não sofre de qualquer nulidade, nomeadamente da nulidade resultante da omissão de pronúncia sobre questão que devesse conhecer ou de excesso de pronúncia quanto a questão de que não podia conhecer, nos termos da al. c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP, aplicável ex vi artigo 425.º, n.º 4, do mesmo diploma; e

b) Em consequência, indeferir o requerimento de arguição de nulidade do acórdão apresentado pelo recorrente AA; e ainda

c) Condenar a recorrente em custas, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC, nos termos do artigo 8.º, n.º 9, e da Tabela III do Regulamento das Custas Judiciais.


Supremo Tribunal de Justiça, 13 de abril de 2023.


José Luís Lopes da Mota (relator)

Pedro Branquinho Dias

Teresa de Almeida