REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL
QUESTÕES DE PARTICULAR IMPORTÂNCIA
MUDANÇA DE ESTABELECIMENTO DE ENSINO
PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS
GUARDA ALTERNADA
Sumário

1. As questões de particular importância para a vida dos filhos deverão, à luz do nº 1, do art.º 1906º CCivil, ser decididas em comum, por ambos os progenitores, nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, diferentemente daquelas relativas aos actos da vida corrente cuja decisão caberá ao progenitor com quem o menor reside. (cfr.n.ºs 1 e 3, cit art.º 1906º).
2. A mudança de estabelecimento de ensino privado, para estabelecimento de ensino público, pertence àquele núcleo de direitos das crianças que, reconduzindo-se a actos que são susceptíveis de determinar o seu futuro, podem assumir a natureza de questão particularmente relevante;
3. Não alcançando os progenitores acordo a respeito, e tendo sido ouvidos os menores de 15 e 12 anos respectivamente, deverão ponderar-se as suas declarações à luz da defesa do seu superior interesse;
4. O processo de regulação das responsabilidades parentais e, posteriormente, o incidente de alteração, são processos próprios para se decidir da mudança de estabelecimento de ensino dos menores;
5. O regime de guarda conjunta e de residência alternada admite o pagamento de pensão de alimentos, por parte do progenitor que tem mais rendimentos;
6. A criança tem direito a manter, após a separação dos pais, o mesmo nível de vida que tinha quando havia uma vida em comum.»

Texto Integral

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

1. Relatório
CCC, com os sinais dos autos, veio propor o presente incidente de alteração das responsabilidades parentais contra,
ACCC, também com os sinais dos autos,
referente aos seus filhos:
- VICCC;
- DCCC; e
- VCCC;
pedindo,
-se declare que o requerente fica desvinculado do pagamento da pensão de alimentos por motivo de ter sido decidido o regime de guarda partilhada dos filhos;
-se declare que o requerente fica desobrigado do pagamento de qualquer prestação ao Colégio MB, devendo os filhos ingressar na escola pública.
Para tanto alega, em síntese:
1. No acordo homologado de 2 de Maio de 2019, consta:
«(…)4ª Alimentos
4.1 - O progenitor contribuirá, a título de pensão de alimentos para cada
menor, com a quantia mensal de €70,00 (Setenta Euro) a depositar ou a
transferir para a conta da progenitora até ao dia 8 (oito) de cada mês;
4.2 - Esta quantia será actualizada anualmente, em função dos índices dos preços ao consumidor publicado pelo INE no ano anterior, sendo a primeira actualização em Janeiro de 2020;
4.3 - As despesas de educação serão suportadas por ambos os progenitores na proporção de 50% cada um, incluindo as mensalidades dos colégios dos filhos DCCC e VCCC, bem como da metade das despesas de apoio ao estudo destes menores; relativamente ao menor VICCC, a mensalidade do colégio deste é suportada pela mãe;
4.4 - As despesas de médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada pelo seguro de saúde dos menores, incluindo as lentes de contacto, serão suportadas por ambos os progenitores na proporção de 60% pelo pai e 40% pela mãe; relativamente às despesas com aparelhos dentários, essa proporção será de 50% a suportar por cada progenitor;
4.5 Sempre que for efectuada alguma despesa elencada no n.º anterior, ambos os progenitores liquidarão de imediato a respectiva percentagem e, quando se receber a respectiva comparticipação da seguradora, dividirão esse valor na respectiva percentagem. (…)»
A sua situação vai modificar-se tendo constituído uma sociedade pelo que os seus proventos vão deixar de ser certos;
A guarda dos filhos passou a ser partilhada;
Face às alterações da sua vida profissional, não será comportável continuar a contribuir para o pagamento do colégio sendo que o filho VICCC já se manifestou no sentido de querer sair;
Pede, assim que por esta via também se autorize que os dois filhos mais novos acompanhem o irmão mais velho que irá matricular-se numa escola pública.
*
Por requerimento de 16 de Fevereiro de 2021, veio o requerente dizer que foi interpelado pelo colégio para pagar quantia relativa à prestação de frequência, quantia que não se encontra em situação de satisfazer.
Pede, por esta via, que a decisão a tomar retroaja nos seus efeitos à data da propositura do presente incidente.
*
Procedeu-se a conferência de pais e, tendo sido ouvidos ambos os pais, não se alcançou qualquer entendimento pelo que, se suspendeu a diligência e determinou-se a remessa dos ais para audição por técnica especializada, ao abrigo do disposto no art.38º, al. b) do RGPTC. não tendo sido possível chegar a qualquer entendimento.
*
Só em Setembro de 2021 veio a ser junto aos autos o respectivo relatório. Do mesmo resultou que a requerida não autorizou a audição dos menores. Também não foi possível proceder a sessões conjuntas entre os pais por oposição do requerente. Cfr. fls.29 e ss.
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Junto o relatório foi designado dia para continuação da conferência.
Mantendo-se a impossibilidade de acordo, foram as partes notificadas para apresentarem alegações, juntarem documentos ou arrolar testemunhas.
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Pelo requerente foram juntas alegações, nas quais se mantém, em substância, o que já havia sido exposto em sede de petição inicial.
*
A requerida também apresentou alegações.
Defende que para se pedir a alteração o requerente tem que fundamentar a sua pretensão só o podendo fazer alegando uma de duas circunstâncias: incumprimento de ambos os pais ou circunstâncias supervenientes justificativas da alteração e in casu, nenhuma destas circunstâncias foram alegadas;
À data da propositura da acção, ou seja, 30 de Junho de 2020, o Requerente alegou que, a sua situação profissional “vai, brevemente, sofrer alterações significativas portanto, o requerente veio requerer a cessação do pagamento da pensão de alimentos com base num hipotético, não fundamentado, possível e futuro despedimento;
Desde logo e face a tal alegação deveria ter sido ordenado arquivamento do presente processo, nos termos do disposto no n.º 1 e n.º 4 do art.º 42.º do RGPTC.
Tal alteração mais de um ano desde a data da propositura da acção, as circunstâncias supervenientes que o Requerente havia invocado como fundamento de propositura da alteração de RERP não se verificaram.
Em Outubro/Novembro de 2021, na última conferência o Requerente – por sua própria iniciativa - havia alterado a sua situação profissional, passando agora a exercer um cargo de Sócio-Gerente numa sociedade que, terá sido por aquele constituída
A circunstância de o progenitor ter um Rendimento substancialmente superior ao da Requerida, numa situação de guarda partilhada, tem de ser ponderado e legitima a existência e pagamento de uma pensão de alimentos.
Além da boa condição profissional e económica do Requerente, é também do conhecimento do Tribunal que o mesmo coabita com uma companheira, a qual tem a profissão de Professora e trabalha também na PT, auferindo mensalmente (pelo menos) cerca de 1.400,00 Euros – conforme acta de 07 de Junho de 2021.
A Requerida, por outro lado, aufere o rendimento líquido de 1.200,00 Euros, vivendo sozinha com os três filhos, em residência alternada, sendo notória a disparidade de rendimentos disponíveis.
O estilo de vida adoptado pelo Requerente, não se coaduna com a alegada insuficiência económica e impossibilidade de prover alimentos aos próprios filhos;
Quanto à continuidade na frequência do Colégio MB por parte dos menores DCCC e VCCC, na falta de acordo, o procedimento correcto é a propositura de um processo de suprimento do consentimento junto deste tribunal e não um pedido de alteração do regime de exercício das responsabilidades parentais, pois não se trata de questão atinente à regulação do exercício das responsabilidades parentais.
Processualmente alega estar-se perante uma situação de erro na forma de processo e, como tal, este pedido não poderá ser conhecido nesta sede.
Quanto ao pedido de cessação da obrigação de pagamento da pensão de alimentos, não foram alegadas quaisquer circunstâncias supervenientes justificativas da procedência de tal pedido.
Conclui, pedindo, seja a presente acção julgada improcedente por não provada.
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Procedeu-se a audiência final no âmbito da qual o requerente prestou declarações de parte.
Suspendeu-se a audiência para se ouvirem os menores, DCCC e VCCC (os filhos mais novos) o que foi feito.
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A final foi proferida sentença de cujo dispositivo consta:
«VI. Decisão
Em face do exposto, vistos os princípios e preceitos legais que no caso regem, julgo os pedidos procedentes e, em consequência, declaro que:
- O Autor deixa de estar vinculado ao pagamento de pensão de alimentos por motivo de guarda partilhada de seus filhos;
- O Autor deixa de liquidar qualquer prestação de Colégio privado que os menores frequentam;
- o Autor, CCC, está autorizado matricular os filhos DCCC e VCC em estabelecimento de ensino público, de preferência na Escola Secundária de B… ou Escola Secundária VF;
- as cláusulas 4.1 e 4.2 do regime dos alimentos são revogadas e altero a redação da cláusula 4.3 nos termos seguintes:
«As despesas de educação, curriculares e extracurriculares serão suportadas por ambos os progenitores na proporção de 50% cada um, bem como da metade das despesas de apoio ao estudo dos menores, mediante prévio acordo entre os progenitores.»
No mais mantém-se o último dos regimes da regulação das responsabilidades parentais acordado entre os progenitores e homologado por sentença.
Custas a cargo da Ré – cfr. artigo 527º, nºs 1 e 2 do CPC.
Valor da ação: 30.000,01€, nos termos dos art.ºs 303º, nº 1 e 306º, nºs 1 e 2, do CPC.
Registe e notifique.»
*
Inconformada com tal sentença, dela apelou a Requerente, tendo alinhado as seguintes conclusões recursórias:
«CONCLUSÕES
Em obediência ao art.º 685.º-A do CPC, extraem-se, como resenha final, as alíneas subsequentes:
A) Foi proferida Sentença julgando procedentes as pretensões do progenitor, Recorrido de i) deixar de estar vinculado ao pagamento de pensão de alimentos por motivo de guarda partilhada de seus filhos, ii) de deixar de liquidar qualquer prestação do Colégio B) que os menores frequentam, iii) autorizar a matrícula dos DCCC e VCCC em estabelecimento de ensino público.
São estas as decisões que, em modesto entendimento, se sindicam nas presentes alegações de recurso.
FACTOS DADOS COMO PROVADOS (SALVO O DEVIDO RESPEITO, ERRONEAMENTE):
C) Foram dados como provados os factos números 7), 9), 10), 11) e 12) e 21) sem qualquer prova produzida que fundamentasse tal decisão, pelo que deverão estes factos ser dados como Não Provados.
D) O próprio Tribunal a quo, em sede de fundamentação da sentença, não indicou a prova em que suportou a sua decisão - porque de facto a mesma inexistia.
E) As declarações de parte prestadas - único meio de prova produzido pelo Recorrido - foram inócuas por “manifestamente parciais”.
F) O facto provado 21) deverá ser alterado para: a mensalidade no Colégio MB do filho DCCC cifra-se em €227,50 e a do filho VCCC. cifra-se em €212,32
G) Os documentos números 8 e 9, juntos aos autos pela Recorrente no dia 21/03/2022 infirmam o facto provado 21) e impunham decisão diversa relativamente a este facto. Qual?
FACTOS DADOS COMO NÃO PROVADOS (EM MODESTO ENTENDIMENTO, ERRONEAMENTE):
H) Os factos dados como não provados, números dois e três, devem ser eliminados por se tratar de alegações conclusivas e não factos, a saber:
“2. O requerente não tem qualquer impossibilidade ou dificuldade em pagar a pensão de alimentos aos filhos.
“3. O pretende gastar as suas economias noutras coisas que lhe dão mais satisfação e melhor o posicionam socialmente.”
DA MUDANÇA DE ESTABELECIMENTO DE ENSINO:
I) Quanto ao pedido de mudança de estabelecimento de ensino das crianças existe erro na forma de processo.
J) O erro na forma de processo constitui nulidade processual que deveria ter sido conhecida pelo tribunal a quo, ao invés de decidir como decidiu, conhecendo da questão.
K) Pretendendo o Recorrido a mudança dos menores para um concreto agrupamento da escola pública, cabia-lhe a si provar as razões, vantagens e desvantagens que impunha tal mudança, conforme o disposto no artigo 342.º n.º 1 do Código Civil, o que não fez.
L) Nenhum facto significativo foi dado como provado que pudesse sustentar a decisão de autorizar a mudança de estabelecimento de ensino das crianças.
M) A opinião das crianças, à mingua de qualquer outra razão, prova ou fundamento não pode ser quanto baste para fazer operar tal mudança.
N) As implicações e consequências da mudança de estabelecimento de ensino não foram alvo de qualquer análise por parte do tribunal e não se encontram acauteladas.
O) A progenitora juntou ao processo prova, ignorada e que deverá ser levada em linha de conta, em como no Colégio as crianças têm apoio ao estudo – documentos n.º 3 a 5 juntos com o requerimento de 21/03/2022 – e estão num ambiente vigiado e securizante até à hora a que os progenitores os podem ir buscar.
P) Pela perspetiva financeira não se entende também a decisão recorrida, atento o diminuto encargo mensal que representa a frequência do Colégio privado – conforme supra vertido - e uma vez que o Recorrido não se encontra com dificuldades financeiras, nem tão-pouco realiza o seu quotidiano com dificuldades.
Q) De acordo com a decisão acerca da matéria de facto e a total ausência de matéria de facto dada como provada para sustentar a decisão que foi tomada, a não autorização da mudança para os estabelecimentos de ensino indicados pelo Recorrido seria a decisão lógica, consequente e que melhor acautela o interesse das crianças.
R) O superior interesse das crianças tem que ser aferido casuisticamente e individualmente, o que não sucedeu no caso sub judice.
S) É flagrante a total ausência de justificação da autorização da mudança no que diz respeito a ambas as crianças, mas em particular no que diz respeito ao VCCC, tendo sido visivelmente ignorados todos os princípios e conceitos jurídicos garantísticos da salvaguarda do seus superiores interesses.
T) O superior interesse da criança não deve ser apreciado segundo critérios subjectivos da vontade dos pais ou da própria criança.
U) É totalmente contraproducente adicionar ao divórcio dos pais e ao conflito parental, mais uma instabilidade na vida das crianças.
V) Não deveria ter sido autorizada a mudança de estabelecimento de ensino
DA CESSAÇÃO DO PAGAMENTO DA PENSÃO DE ALIMENTOS
W) Nenhuma prova foi produzida, nenhuma circunstância superveniente foi alegada e nenhuma circunstância superveniente foi dada como provada que justificasse a decisão que veio a ser tomada no sentido da cessação do pagamento da pensão de alimentos.
X) O pedido do Recorrido deveria ter sido liminarmente arquivado, por total ausência de fundamento, nos termos do disposto no n.º 1 e n.º 4 do art.º 42.º do RGPTC.
Y) A alteração da situação profissional, quando imputável a uma conduta ou comportamento do Requerente (v.g. quando este decide, por si, mudar a carreira profissional, acarretando esta mudança uma alteração das condições económicas) não é  
Z) motivo legítimo para alterar, quanto mais cessar, o pagamento da pensão de alimentos previamente acordada;
AA) O Recorrido, individualmente, mas também considerando o seu agregado familiar, tem uma situação económica significativamente melhor do que a da Recorrente.
AB) Sendo o rendimento do Recorrido substancialmente superior ao da Recorrente é legitima a existência e pagamento de uma pensão de alimentos, em caso de residência alternada.
AC) A pensão de alimentos, no valor de, apenas, €70,00, a favor de cada um dos filhos foi fixada por acordo, no mesmo acordo em que os progenitores decidiram pela residência alternada.
AD) Não se verificando circunstâncias supervenientes que justifiquem a alteração, nem o acordo tendo sido incumprido por ambos os pais, levando a que o acordo deixe de ser pertinente pelo desuso – Art.º 42.º do RGPTC - não poderá a regulação vigente ser alterada pela vontade de um, com a oposição do outro.
AE) O Recorrido não se encontra com dificuldades financeiras, nem tão-pouco realiza o seu quotidiano com dificuldades.
AF) Foram violados os princípios e normas jurídicas acima assinalados.
Termos em que deverá ser revogada a douta sentença recorrida e substituída por outra que acolha o entendimento supra exposto.»
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Pelo requerido não foram apresentadas contra-alegações.
*
O Ministério Público apresentou resposta tendo concluído:
«II. Conclusões:
Em face do expendido nos pontos anteriores, conclui-se:
A. O presente recurso deve seguir os seus trâmites sob efeito devolutivo, segundo o regime regre previsto no n.º 4 do art.º 32.º RGPTC por ser o que mais acautela o interesse dos menores;
B. Não existe fundamente legal para que processo não seguisse os seus tramites no âmbito de alteração ao acordo do regime de exercício das responsabilidades parentais até então em vigor, nos termos do n.º 1 do art.º 42.º do RGPTC, sendo o processo próprio e não subsistindo qualquer nulidade processual;
C. A decisão alcançada de concessão de autorização para matrícula dos menores DCCC, nascido em 28.02.2008; e VCCC, 26.05.2010, é a que corresponde à decisão adequada neste particular momento da sua vida, atendendo à disponibilidade económica dos progenitores e, sobretudo, à vontade das crianças.
D. A decisão relativa à cessação da obrigação de pensão de alimentos, no valor de 70,00€ (setenta euros) mensais por menor por parte do progenitor é a que reflete as circunstâncias atuais do regime de residência alternada, de disponibilidade do progenitor, e da fixação de residência do filho maior .... com o progenitor, afigurando-se decisão justa e equitativa.
E. E, consequentemente, não poderiam tais decisões deixar de se refletir na nova redacção encontrada do art.º 4.º “Alimentos” do acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, com a desvinculação do progenitor às obrigações de pensão de alimentos e despesas com colégios particulares;
F. Tais decisões configuram-se como as mais adequadas a cada um dos menores e aquelas que melhor correspondem ao seu superior interesse.
G. Encontram-se adequada e devidamente fundamentadas, de facto e de direito.
Pelo exposto, e concordando-se em absoluto com os fundamentos da douta decisão, somos a concluir que a decisão recorrida, no contexto temporal e no circunstancialismo concreto em que foi proferida não merece qualquer censura ou reparo, devendo a mesma ser mantida na íntegra.»
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Corridos que foram os vistos legais, cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.
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2. Delimitação do objecto do recurso e questões a decidir
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do apelante, tal como decorre das disposições legais dos art.ºs 635º, nº 4 e 639º do CPCivil, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso (art.º 608º, nº 2 do CPCivil). Por outro lado, não está o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e é livre na interpretação e aplicação do direito (art.º 5º, nº 3 do citado diploma legal).
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São as seguintes as questões a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pela recorrente, são as seguintes:
-Do erro na forma de processo;
- Da modificação da matéria de facto fixada em 1ª instância;
- Da mudança de estabelecimento de ensino;
- Da cessação da prestação de alimentos devida pelo requerente.
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3. Fundamentação
3.1. Fundamentação de Facto em 1ª instância:
Factos considerados provados e não provados, em Primeira Instância:
«3.1 Com interesse para a decisão da causa está provado que:
1) O Autor, CCC, nascido a 06/07/1971, foi casado com a Ré, ACC, nascida a 17 - 09 -1972.
2) Na constância do casamento nasceram três filhos:
- VICCC, a 29 - 07 – 2004;
- DCCC, a 28 - 02 – 2008; e
- VCCC, a 26 - 05 – 2010.
3) Em conferência de pais datada de 11/1/2017 foram aditadas, no âmbito da ação especial de responsabilidades parentais que correu termos por apenso à ação de divórcio (Apenso A) ao regime provisório previamente estabelecido, as seguintes cláusulas:
«Cláusula 3ª
a) O pai pagará a título de alimentos a quantia de €100, para cada um dos menores;
b) O pai pagará o colégio do menor VCCC (cheque de infância) até ao final do presente ano letivo;
c) O pai aceita a frequência do colégio do menor VICCC, no corrente ano letivo, assegurando o pagamento de pelo menos 50% do custo associado ao mesmo;
d) As despesas de educação serão comparticipadas na proporção de 50% por cada um dos progenitores, assumindo o pai o pagamento da respetiva proporção, desde o início do presente ano letivo;
e) Os progenitores acordam que a frequência de ATL ao apoio ao estudo constitui despesas de educação.
f) O pai pagará na proporção de 50% de todas as despesas de saúde dos menores, incluindo o seguro de saúde de que as crianças beneficiem;
Cláusula 4ª.
Os progenitores, desde já, acordam em ponderar a inscrição no ensino público relativamente ao DCCC e ao VCCC, no próximo ano letivo;
Cláusula 5ª.
Caso se concretize a hipótese referida na cláusula anterior, o valor da pensão de alimentos, mencionada na cláusula nº 3, alínea a), passará a ser de €150, para cada um dos menores;
4) Por acordo alcançado em conferência de pais levada a efeito a 02/05/2019, no âmbito da ação especial de regulação do exercício das responsabilidades parentais, os progenitores estabeleceram, além do mais, que:
«1º - Guarda e responsabilidades
1.1 – Os menores VICCC, DCCC e VCCC ficam confiados à guarda e aos cuidados de ambos os progenitores, com quem residirão em semanas alternadas com início à 2ª feira de manhã da respetiva semana.
1.2 As responsabilidades parentais serão exercidas por ambos os progenitores, sendo que todas as decisões relativas a questões de particular importância para a vida dos filhos serão tomadas, por comum acordo, entre eles, salvo nos casos de manifesta urgência, em que qualquer dos progenitores poderá agir sozinho, devendo prestar informações ao outro, logo que possível.
1.3 Os menores jantarão na quinta feira de cada semana com o progenitor com quem não estão a residir nessa semana.
2º - Férias e Datas Festivas
2.1 – Nos dias de aniversário dos menores, estes tomarão uma refeição com cada um dos progenitores, sendo que o menor aniversariante se fará acompanhar dos irmãos;
2.2 - No dia do pai e no dia de aniversário do pai, os menores passarão esse dia com o pai; no dia da mãe e no dia de aniversário da mãe, os menores passarão esse dia com a mãe;
2.3 – Quanto ao Natal, a véspera de Natal e o dia de Natal serão passados, alternadamente, com cada um dos progenitores, alternada e sucessivamente, sendo que no corrente ano de 2019 o dia 24 de dezembro será passado com a mãe e o dia de Natal com o pai;
2.4 – Relativamente ao Ano Novo, o dia 31 de dezembro e o dia 01 de janeiro serão passados, alternadamente, com cada um dos progenitores, alternada e sucessivamente, sendo que no corrente ano de 2019 o dia 31 de dezembro será passado com o pai e o dia 01 de janeiro com a mãe;
2.5 – Cada um dos progenitores passará as suas férias com os menores, por períodos de 15 (quinze) dias de cada vez, nas férias de Verão dos menores, sendo tais períodos marcados por cada progenitor até ao dia 30 de abril de cada ano; os períodos de férias marcados foram deste período serão marcados sempre com 30 (trinta) dias de antecedência;
2.6 – Em caso de coincidência nos períodos de férias, nos anos pares prevalecerá a escolha do pai e nos anos ímpares prevalecerá a escolha da mãe;
2.7 – Na Páscoa, os menores almoçarão com um progenitor e jantarão com o outro, alternando nos anos seguintes, sendo que no ano de 2020 almoçarão com o pai;
(…)
4º - Alimentos
4.1 - O progenitor contribuirá, a título de pensão de alimentos para cada menor, com a quantia mensal de € 70,00 (setenta euros) a depositar ou a transferir para a conta bancária da progenitora até ao dia 8 (oito) de cada mês;
4.2 - Esta quantia será atualizada anualmente, em função dos índices dos preços ao consumidor publicado pelo INE no ano anterior, sendo a primeira atualização em Janeiro de 2020;
4.3 - As despesas de educação serão suportadas por ambos os progenitores na proporção de 50% cada um, incluindo as mensalidades dos colégios dos filhos DCCC e VCCC, bem como da metade das despesas de apoio ao estudo destes menores; relativamente ao menor VICCC, a mensalidade do colégio deste é suportada pela mãe;
4.4 - As despesas de médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada pelo seguro de saúde dos menores, incluindo as lentes de contacto, serão suportadas por ambos os progenitores na proporção de 60% pelo pai e 40% pela mãe; relativamente às despesas com aparelhos dentários, essa proporção será de 50% a suportar por cada progenitor;
4.5 – Sempre que for efectuada alguma despesa elencada no n.º anterior, ambos os progenitores liquidarão de imediato a respetiva percentagem e, quando se receber a respetiva comparticipação da seguradora, dividirão esse valor na respetiva percentagem.»
5) Em conferência realizada no âmbito do Apenso-E, em 10-09-2020, a Requerida autorizou a matrícula do VICCC numa das seguintes escolas públicas:
- Escola Secundária de B…;
- Escola Secundária VF;
6) O Progenitor assumiu ser o Encarregado de Educação nesse ano letivo.
7) A partir do verão do ano de 2020 o VICCC passou a residir com o progenitor.
8) No ano escolar 2020/21 passou a frequentar escola pública, no 11º ano.
9) O VICCC. estava com “décalage” negativa relativamente aos outros colegas da turma do ensino público, mas fez uma evolução positiva.
10) O rendimento escolar do DCCC tem sido negativo, ano letivo 2020/21, com 13 anos de idade, frequentou o 7º ano de escolaridade, tendo tido no primeiro período de cinco negativas.
11) Com esforço conseguiu transitar de ano, com quatro disciplinas com nível negativo (2) e as restantes com nível 3.
12) O rendimento escolar sofrível permanece no ano letivo 2021/22.
13) O VCCC tem tido um bom desempenho escolar – “média de 4”.
14) O autor auferia à data da propositura da ação cerca de 2.800,00€ no exercício da atividade de auditor financeiro para sociedade comercial.
15) Alterou a sua atividade profissional, deixando de ser um trabalhador assalariado com rendimento fixo ao final do mês, para se tornar empresário, dono de uma empresa, e como tal sujeito a rendimento variável, e da fortuna do seu negócio.
16) Paga a prestação mensal de 1.000,00€ em renda de casa.
17) Coabita com uma companheira que aufere a remuneração mensal de cerca de 1.400,00 Euros – cfr. declarações em ata de 07 de junho de 2021.
18) O Autor expõe nas redes sociais fotos da deslocação a diversos pontos de Portugal, bem como a destinos estrangeiros, bem como consumos em cafés e restaurantes – cfr. docs. 1 a 62 que se dão por reproduzidos.
19) A Ré aufere, no exercício de assistente em departamento jurídico, 1.200,00€ líquidos.
20) Paga a prestação de 600,00€/mês em renda mensal.
21) Os encargos com os dois filhos mais novos no Colégio MB cifram-se em mais de 250,00€, cada.
22) Os menores desejam prosseguir os estudos em escola pública da área de residência.
3.2 Factos não provados:
1. Recentemente o requerente adquiriu gatos, como animais de companhia, aumentando assim a despesa do seu agregado familiar com veterinários, vacinas, desparasitantes, alimentação, produtos de higiene e limpeza, o que não é compatível com um estilo de vida deficitário, como alega ter.
2. O requerente não tem qualquer impossibilidade ou dificuldade em pagar a pensão de alimentos aos filhos.
3. O pretende gastar as suas economias noutras coisas que lhe dão mais satisfação e melhor o posicionam socialmente.»
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3.2. Da modificabilidade da decisão de facto
Decorre do disposto no art.º 607º, nº 5 do CPCivil, que a prova é apreciada livremente:  o «juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto»; tal resulta também do disposto nos art.ºs 389º, 391º e 396º do CC, respectivamente, para a prova pericial, para a prova por inspecção e para a prova testemunhal, sendo que desta livre apreciação do juiz o legislador exclui os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, aqueles que só possam ser provados por documentos ou aqueles que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes (2ª parte do referido nº 5 do art.º 607º).
O referido princípio da livre apreciação da prova impõe que o julgador proceda a uma valoração de cada meio de prova produzido nos autos, interligando-o com os demais elementos probatórios do mesmo constantes, socorrendo-se dos conhecimentos científicos adquiridos e das regras de experiência comum da vida (cfr. neste sent. Lebre de Freitas, in Introdução ao Processo Civil, conceito e princípios gerais à luz do Código Revisto, Coimbra, 1996, p. 157 e seguintes e Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, vol. II, p. 209).
A prova há-de, pois, ser apreciada segundo critérios de valoração racional e lógica do julgador, com recurso às regras da experiência e critérios de lógica.
O nosso sistema processual civil garante um duplo grau de jurisdição na apreciação da decisão de facto e as obrigações que recaem sobre o recorrente que impugne tal decisão estão plasmadas no art.º 640º, do Código de Processo Civil: «1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:      
a)Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
(…)”.
O art.º 662º, do Código de Processo Civil, dispõe: «1- A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.»
Assim, apesar resultar garantido um duplo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, não cabe ao tribunal da Relação proceder a um segundo julgamento, competindo-lhe apenas reapreciar os pontos de facto que deverão ser reclamados pelas partes nos termos da disposição legal citada. Na instância de recurso igualmente se mantém o princípio da livre apreciação da prova previsto no art.º 607º, nº 5, do Código de Processo Civil, cabendo aferir sobre a razoabilidade da convicção do juiz da 1ª instância, ou seja, averiguar e decidir se tal convicção foi formada segundo as regras da ciência, da lógica, da experiência comum e da normalidade da vida.
O Tribunal da Relação, no âmbito da reapreciação da matéria de facto deve socorrer-se de todos os meios probatórios constantes dos autos, e recorrer, se necessário, a presunções judiciais, e caso venha a proceder à alteração de qualquer facto terá de aferir sobre a necessidade de alterar outro ou outros factos concretos, que não obstante não tenham sido objeto de impugnação, exijam também alteração em consequência e por força das alterações introduzidas na matéria de facto que tinha sido objeto de impugnação.
Neste sentido, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 8 de Janeiro de 2019 (proferido no processo 3696/16.8T8VIS.C1.S1, acessível no sítio da internet www.dgsi.pt), segundo o qual «A reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância pois só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição (…).
Com efeito, embora não se tratando de um segundo julgamento, mas antes de uma reponderação, até porque as circunstâncias não são as mesmas, nas respetivas instâncias, não basta que não se concorde com a decisão dada, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova (…)», o que, não obstante,  prossegue o dito acórdão, «(…) não limita o segundo grau de sobre tais desconformidades previamente apontadas pelas partes, se pronuncie, enunciando a sua própria convicção, não estando, de todo em todo, limitada por aquela primeira abordagem pois não podemos ignorar que no processo civil impera o principio da livre apreciação da prova (…)».
Também como assinala acórdão do mesmo Tribunal, proferido em 31 de Maio de 2016 no âmbito do processo nº 1572/12.2TBABT.E1.S1, acessível igualmente em www.dgsi.pt, «I. O Tribunal da Relação dever exercer um verdadeiro e efectivo 2º grau de jurisdição da matéria de facto e não um simples controlo sobre a forma como a 1ª instância respondeu à matéria factual, limitando-se a intervir nos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, pois que só assim se assegurará o duplo grau de jurisdição, em matéria de facto, que a reforma processual de 1995 (DL nº 329-A/95, de 12-12) visou assegurar e que o actual Código confirmou e reforçou.
II.Desde que o recorrente cumpra as determinações ínsitas no art.º 640º, o tribunal da Relação não poderá deixar de fazer a reapreciação da matéria de facto impugnada, podendo alterar o circunstancialismo dado como assente na 1ª instância».
A impugnação da decisão de facto atém-se pois, à fundamentação de facto da 1.ª instância, sendo sobre tal decisão que o Tribunal da Relação apreciará se ocorreu qualquer erro na formação da convicção do julgador ou se deve concluir-se pela razoabilidade da sua convicção, quando analisada e avaliada à luz das regras da lógica, da ciência e da experiência de vida.
Conforme defende Manuel de Andrade (vide, Noções Elementares de Processo Civil, Reimpressão, 1993, p. 384) «segundo o princípio da livre apreciação da prova o que torna provado um facto é a íntima convicção do juiz, gerada em face do material probatório trazido ao processo (bem como da conduta processual das partes) e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento dos homens; não a pura e simples observância de certas formas legalmente prescritas».
A prova idónea a alcançar um tal resultado, é assim a prova suficiente, que é aquela que conduz a um juízo de certeza; a prova «não é uma operação lógica visando a certeza absoluta (a irrefragável exclusão da possibilidade de o facto não ter ocorrido ou ter ocorrido de modo diferente) (…) a demonstração da realidade de factos desta natureza, com a finalidade do seu tratamento jurídico, não pode visar um estado de certeza lógica, absoluta, (…) A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto» (cfr. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Revista e Actualizada, p. 435 a 436). Está por isso em causa uma certeza jurídica e não uma certeza material, absoluta.
A «livre apreciação da prova» não se traduz, porém, numa «arbitrária apreciação da prova», pelo que se impõe ao juiz que identifique os concretos meios probatórios que serviram para formar a sua convicção, bem como a «menção das razões justificativas da opção pelo Julgador entre os meios de prova de sinal oposto relativos ao mesmo facto» (cfr. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, obra cit., p.  655); o «juiz [de 1ª Instância] explicará por que motivo deu mais crédito a uma testemunha do que a outra, por que motivo deu prevalência a um laudo pericial em detrimento de outro, por que motivo o depoimento de certa testemunha tecnicamente qualificada levou à desconsideração de um relatório pericial ou por que motivo não deu como provado certo facto apesar de o mesmo ser referido em vários depoimentos. E é ainda assim por referência a certo depoimento e a propósito do crédito que merece (ou não), o juiz aludirá ao modo como o depoente se comportou em audiência, como reagiu às questões colocadas, às hesitações que não teve (teve), a naturalidade e tranquilidade que teve (ou não)» (Paulo J. Pimenta, Processo Civil Declarativo, Almedina, 2014, p. 325).
É, por isso, comumente aceite que o juiz da 1ª Instância, perante o qual a prova é produzida, está em posição privilegiada para proceder à sua avaliação, e, designadamente, surpreender no comportamento das testemunhas elementos relevantes para aferir da espontaneidade e credibilidade dos depoimentos que frequentemente não transparecem da gravação.
Alteração da matéria de facto só deverá, assim, ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando este conclua, com a necessária segurança, que a prova produzida aponta em sentido diverso e impõe uma decisão diferente da que foi proferida em 1ª instância, quando tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento na matéria de facto. Veja-se a este propósito a posição de Ana Luísa Geraldes que refere «Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte.». Cfr. Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Volume I, p. 609.
O dever de fundamentação da matéria de facto provada e não provada, com a indicação dos meios de prova que levaram à decisão, assim como a fundamentação da convicção do julgador, impõem-se ao juiz como garante da legalidade do acto, da sua correcção e justiça.
Conforme se decidiu em Ac. STJ, de 26-02-2019, Proc. nº 1316/14.4TBVNG-A.P1.S2, Relator, FONSECA RAMOS: «I. A fundamentação da matéria de facto provada e não provada, com a indicação dos meios de prova que levaram à decisão, assim como a fundamentação da convicção do julgador, devem ser feitas com clareza, objectividade e discriminadamente, de modo a que as partes, destinatárias imediatas da decisão, saibam o que o Tribunal considerou provado e não provado e qual a fundamentação dessa decisão reportada à prova fornecida pelas partes e adquirida pelo Tribunal.
II. A exigência de fundamentação das respostas negativas aos quesitos constituiu inovação na revisão do Código de Processo Civil de 1995/96: não era requisito no Código de Processo Civil de 1939 e só passou a sê-lo, quanto aos factos provados no Código de Processo Civil de 1961, mantendo-se até ao DL. 329-A/95, de 12.12, o dever, quanto aos factos julgados provados, de especificar os fundamentos decisivos para a formação da convicção do Tribunal.» Ac. STJ, disponível in www.dgsi.pt.
A esta luz, cumpre apreciar.
Começa a apelante por argumentar que sobre os factos dados como provados sob os nº7, 9, 10, 11 e 12, não foi produzida qualquer prova que fundamentasse tal decisão e, não tendo tal prova sido produzida, a mesma não foi motivada em sede de motivação da decisão de facto. Pede, assim, que tal factualidade passe a integrar a factualidade não provada.
Analisada a motivação da 1ª instância resulta que, o Tribunal, para além de tecer comentários gerais doutrinários e jurisprudenciais, relativos aos critérios de apreciação da prova, na análise do caso concreto, limitou-se a referir que «louvou-se na análise ponderada e crítica da prova documental constante de vários processos que correm ou correram termos por apenso à acção de divórcio (…) tomaram-se em consideração prestadas pelos progenitores e pelas crianças», tendo-se referido as declarações dos primeiros como parciais e tendo-se referido às declarações dos menores como manifestando a vontade de deixarem de frequentar o colégio.
Referiu também ter-se atentado no Relatório das Técnicas da Unidade de Supervisão e Qualificação da Assessoria do Tribunal da SCML do qual resulta que os menores não foram ouvidos nesse âmbito por indisponibilidade da mãe para permitir tal audição sendo que, o relatório foi redigido suportado nas declarações de ambos os pais que evidenciam narrativas divergentes em quase todos os pontos. Mais tarde e já no decurso da audiência final, os menores foram ouvidos.
Daqui decorre que, analisada a motivação da 1ª instância, não se vislumbra como foi formada a convicção do tribunal relativamente aos factos cuja reapreciação ora se requer.
A este respeito estabelece o art.º Artigo 662.º, sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”:
1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
(…)
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
(…)»
Assim atento o disposto na supra transcrita al. 2, b) a contrario sensu deverá entender-se que constando dos autos os elementos que permitem a este tribunal da Relação suprir os vícios, assim se procederá, analisando os elementos probatórios que dos autos constam a respeito.
 Facto dado como provado sob o nº 7:
De tão objectivo não deveria merecer dúvidas ou quezílias, porém, verifica-se que não é assim, sendo a posição dos dois progenitores divergente quanto a tal. Porém, em sede de audiência e no âmbito das declarações de parte prestadas pelo requerente, foi esclarecido que o VICCC passou a residir na sua casa (ainda que com alguns interregnos) a partir de Agosto de 2020.
Na sequência das suas declarações, não foi produzida qualquer prova infirmativa e a requerida nem sequer questionou tal declaração em sede de audiência. Assim se entende, que tal facto deve ser dado como provado, ainda que com fundamento nas declarações do progenitor tal como foi decidido em 1ª instância.
Facto dado como provado sob o nº 9:
«O VICCC. estava com “décalage” negativa relativamente aos outros colegas da turma do ensino público, mas fez uma evolução positiva»
Dos autos não resulta provado a existência da sobredita décalage e que na sequência da mesma a evolução foi positiva.
Com efeito, ao contrário do facto dado como provado sob o nº 7 que é um facto objectivo, este encerra claramente matéria conclusiva a qual deveria resultar do aporte de outros factos ao processo. Tais factos não foram trazidos aos autos sendo que, sobre os mesmos poderia ser feita prova documental ou até mesmo testemunhal, o que não aconteceu.
Na verdade, para efeitos processuais, tudo o que respeita ao apuramento de ocorrências da vida real é questão de facto e é questão de direito tudo o que diz respeito à interpretação e aplicação da lei.
Conforme se decidiu em acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, «Saber se um concreto facto integra um conceito de direito ou assume feição conclusiva ou valorativa constitui questão de direito, porquanto não envolve um juízo sobre a idoneidade da prova produzida para a demonstração ou não desse mesmo facto enquanto realidade da vida.» Cfr. Ac.STJ, de 29.9.2017, Proc. Nº659/12.6TVLSB.L1.S1, disponível in, www.dgsi.pt.
Aqui está, pois, em causa, avaliar se matéria considerada como não provada sob os nºs 2 e 3 reflecte, indevidamente, um juízo conclusivo, ao invés de factos, ou, no dizer de Miguel Teixeira de Sousa, se envolve «qualquer valoração segundo a interpretação ou aplicação da lei, ou qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica». Cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Código de Processo Civil, Lex, 1997, pág. 312.
Ora, sendo certo que a redacção actual do Código de Processo Civil não contém norma absolutamente equivalente à do art.º 646º, nº4, do Código de Processo Civil de 1961, a verdade é que, analisando o disposto no artigo 607º nº 4 do actual Código de Processo Civil, concluímos que consagra o mesmo princípio quando prevê que da fundamentação da sentença devem constar os factos julgados provados e não provados. A expressa menção aos factos reconduz-se ao velho princípio de que a fundamentação de facto deve ser expurgada de toda e qualquer matéria susceptível de ser qualificada como de direito, conceito que abarca de igual modo juízos conclusivos.
Assim, cumpre expurgar este ponto da matéria de facto dada como provada, não podendo, igualmente, integrar a matéria de facto dada como não provada pelas razões apresentadas.

Facto Dado como Provado sob o nº10)
«O rendimento escolar do DCCC tem sido negativo, ano letivo 2020/21, com 13 anos de idade, frequentou o 7º ano de escolaridade, tendo tido no primeiro período de cinco negativas.»
Relativamente a este facto, a prova revelava-se fácil: bastaria juntar aos autos a informação escolar do menino, o que não foi feito. Nestes termos, também não se vislumbra qualquer prova que pudesse levar a considerar estes factos como provados.
Facto Dado como provado sob o nº 11:
«Com esforço conseguiu transitar de ano, com quatro disciplinas com nível negativo (2) e as restantes com nível 3.»
A este respeito valem as considerações expendidas quanto ao facto dado como provado sob o nº 10. Assim, evidente se torna que, por não contestado, apenas temos como certo que o DCCC transitou de ano: Assim, apenas parcialmente assiste razão à apelante pelo que dos factos provados passará a constar: «O DCCC, no ano lectivo de 2020/21, com esforço conseguiu transitar de ano» e dos não provados: «O DCCC transitou de ano com quatro disciplinas com nível negativo e as restantes com nível 3»
Facto provado sob o nº 21:
«Os encargos com os dois filhos mais novos no Colégio MB cifram-se em mais de 250,00€, cada.»
Questiona a apelante a motivação que sustentou tal prova. Não logramos alcançar, compulsada a prova produzida, neste apenso e nos demais, como se chega a tais valores.
Na verdade, o requerente alegou que a mensalidade no colégio ascenderia a cerca de €400,00 para cada um. Não juntou qualquer documento corroborando o alegado. Anote-se que na conferência de pais realizada em 7.6.2021, o requerente refere que a mensalidade do colégio ascende a cerca de €250,00 para cada um dos filhos sendo certo que esta conferência se realizou cerca de um ano após a entrada dos autos em juízo.
Existe prova documental nos autos relativa à mensalidade do colégio (docs. de fls.131, 132, 133) da qual se pode concluir que a mensalidade relativa ao DCCC ascendeu no mês de Dezembro de 2021 a €227,50 e a relativa ao VCCC ascendeu a €212,32 nos meses de Setembro de 2021 e Dezembro de 2021.
À falta de melhor prova, será essa a factualidade a considerar considerando que dos autos não consta prova bastante a respeito que permita dar como provado que os encargos com o colégio ascendam a cerca de €250,00.
Assim se acorda na alteração da matéria de facto passando a constar:
«21. A mensalidade do Colégio MB relativa ao DCCC ascendeu no mês de Dezembro de 2021 a €227,50 e a relativa ao VCCC ascendeu nos meses de Setembro de 2021 e Dezembro de 2021 a €212,32.»
Factos Dados como não provados sob os nºs 2 e 3:
«2. O requerente não tem qualquer impossibilidade ou dificuldade em pagar a pensão de alimentos aos filhos.
3. O pretende gastar as suas economias noutras coisas que lhe dão mais satisfação e melhor o posicionam socialmente.»
 Defende a apelante que encerram matéria conclusiva e que por tal não deve constar da factualidade não provada. Assiste-lhe razão, valendo aqui as considerações expendidas a propósito do facto nº9, que acima se deixou apreciado.
Por tais fundamentos cumpre expurgar os pontos 2 e 3, da matéria de facto dada como não provada, alteração que não vai ter qualquer efeito na decisão de direito.
No mais, a matéria de facto a considerar é a enformada nos autos, assim,

3.3. Fundamentação de Facto em 2ª instância:
Em face do ora decidido, os factos a considerar são os seguintes:
1) O Autor, CCC, nascido a 06/07/1971, foi casado com a Ré, ACC, nascida a 17 - 09 -1972.
2) Na constância do casamento nasceram três filhos:
- VICCC, a 29 - 07 – 2004;
- DCCC, a 28 - 02 – 2008; e
- VCCC, a 26 - 05 – 2010.
3) Em conferência de pais datada de 11/1/2017 foram aditadas, no âmbito da acção especial de responsabilidades parentais que correu termos por apenso à acção de divórcio (Apenso A) ao regime provisório previamente estabelecido, as seguintes cláusulas:
«Cláusula 3ª
a) O pai pagará a título de alimentos a quantia de €100, para cada um dos menores;
b) O pai pagará o colégio do menor VCCC. (cheque de infância) até ao final do presente ano lectivo;
c) O pai aceita a frequência do colégio do menor VICCC, no corrente ano lectivo, assegurando o pagamento de pelo menos 50% do custo associado ao mesmo;
d) As despesas de educação serão comparticipadas na proporção de 50% por cada um dos progenitores, assumindo o pai o pagamento da respectiva proporção, desde o início do presente ano lectivo;
e) Os progenitores acordam que a frequência de ATL ao apoio ao estudo constitui despesas de educação.
f) O pai pagará na proporção de 50% de todas as despesas de saúde dos menores, incluindo o seguro de saúde de que as crianças beneficiem;
Cláusula 4ª.
Os progenitores, desde já, acordam em ponderar a inscrição no ensino público relativamente ao DCCC e ao VICCC, no próximo ano lectivo;
Cláusula 5ª.
Caso se concretize a hipótese referida na cláusula anterior, o valor da pensão de alimentos, mencionada na cláusula nº 3, alínea a), passará a ser de €150, para cada um dos menores»;
4) Por acordo alcançado em conferência de pais levada a efeito a 02/05/2019, no âmbito da acção especial de regulação do exercício das responsabilidades parentais, os progenitores estabeleceram, além do mais, que:
«1º - Guarda e responsabilidades
1.1 – Os menores VICCC, DCCC e VCCC ficam confiados à guarda e aos cuidados de ambos os progenitores, com quem residirão em semanas alternadas com início à 2ª feira de manhã da respectiva semana.
1.2 As responsabilidades parentais serão exercidas por ambos os progenitores, sendo que todas as decisões relativas a questões de particular importância para a vida dos filhos serão tomadas, por comum acordo, entre eles, salvo nos casos de manifesta urgência, em que qualquer dos progenitores poderá agir sozinho, devendo prestar informações ao outro, logo que possível.
1.3 Os menores jantarão na quinta feira de cada semana com o progenitor com quem não estão a residir nessa semana.
2º - Férias e Datas Festivas
2.1 – Nos dias de aniversário dos menores, estes tomarão uma refeição com cada um dos progenitores, sendo que o menor aniversariante se fará acompanhar dos irmãos;
2.2 - No dia do pai e no dia de aniversário do pai, os menores passarão esse dia com o pai; no dia da mãe e no dia de aniversário da mãe, os menores passarão esse dia com a mãe;
2.3 – Quanto ao Natal, a véspera de Natal e o dia de Natal serão passados, alternadamente, com cada um dos progenitores, alternada e sucessivamente, sendo que no corrente ano de 2019 o dia 24 de Dezembro será passado com a mãe e o dia de Natal com o pai;
2.4 – Relativamente ao Ano Novo, o dia 31 de Dezembro e o dia 01 de Janeiro serão passados, alternadamente, com cada um dos progenitores, alternada e sucessivamente, sendo que no corrente ano de 2019 o dia 31 de Dezembro será passado com o pai e o dia 01 de Janeiro com a mãe;
2.5 – Cada um dos progenitores passará as suas férias com os menores, por períodos de 15 (quinze) dias de cada vez, nas férias de Verão dos menores, sendo tais períodos marcados por cada progenitor até ao dia 30 de Abril de cada ano; os períodos de férias marcados foram deste período serão marcados sempre com 30 (trinta) dias de antecedência;
2.6 – Em caso de coincidência nos períodos de férias, nos anos pares prevalecerá a escolha do pai e nos anos ímpares prevalecerá a escolha da mãe;
2.7 – Na Páscoa, os menores almoçarão com um progenitor e jantarão com o outro, alternando nos anos seguintes, sendo que no ano de 2020 almoçarão com o pai;
(…)
4º - Alimentos
4.1 - O progenitor contribuirá, a título de pensão de alimentos para cada menor, com a quantia mensal de €70,00 (setenta euros) a depositar ou a transferir para a conta bancária da progenitora até ao dia 8 (oito) de cada mês;
4.2 - Esta quantia será actualizada anualmente, em função dos índices dos preços ao consumidor publicado pelo INE no ano anterior, sendo a primeira actualização em Janeiro de 2020;
4.3 - As despesas de educação serão suportadas por ambos os progenitores na proporção de 50% cada um, incluindo as mensalidades dos colégios dos filhos DCCC e VCCC, bem como da metade das despesas de apoio ao estudo destes menores; relativamente ao menor VICCC, a mensalidade do colégio deste é suportada pela mãe;
4.4 - As despesas de médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada pelo seguro de saúde dos menores, incluindo as lentes de contacto, serão suportadas por ambos os progenitores na proporção de 60% pelo pai e 40% pela mãe; relativamente às despesas com aparelhos dentários, essa proporção será de 50% a suportar por cada progenitor;
4.5 – Sempre que for efectuada alguma despesa elencada no n.º anterior, ambos os progenitores liquidarão de imediato a respectiva percentagem e, quando se receber a respectiva comparticipação da seguradora, dividirão esse valor na respectiva percentagem.»
5) Em conferência realizada no âmbito do Apenso-E, em 10-09-2020, a Requerida autorizou a matrícula do VICCC numa das seguintes escolas públicas:
- Escola Secundária de B…;
- Escola Secundária VF;
6) O Progenitor assumiu ser o Encarregado de Educação nesse ano lectivo.
7) A partir do Verão do ano de 2020 o VICCC passou a residir com o progenitor.
8) No ano escolar 2020/21 passou a frequentar escola pública, no 11º ano.
9) O DCCC, no ano lectivo de 2020/21, com esforço conseguiu transitar de ano;
10) O rendimento escolar sofrível permanece no ano lectivo 2021/22.
11) O VCCC tem tido um bom desempenho escolar – “média de 4”.
12) O autor auferia à data da propositura da acção cerca de 2.800,00€ no exercício da actividade de auditor financeiro para sociedade comercial.
13) Alterou a sua actividade profissional, deixando de ser um trabalhador assalariado com rendimento fixo ao final do mês, para se tornar empresário, dono de uma empresa, e como tal sujeito a rendimento variável, e da fortuna do seu negócio.
14) Paga a prestação mensal de 1.000,00€ em renda de casa.
15) Coabita com uma companheira que aufere a remuneração mensal de cerca de 1.400,00 Euros – cfr. declarações em atá de 07 de Junho de 2021.
16) O Autor expõe nas redes sociais fotos da deslocação a diversos pontos de Portugal, bem como a destinos estrangeiros, bem como consumos em cafés e restaurantes – cfr. docs. 1 a 62 que se dão por reproduzidos.
17) A Ré aufere, no exercício de assistente em departamento jurídico, 1.200,00€ líquidos.
18) Paga a prestação de 600,00€/mês em renda mensal.
19) A mensalidade do Colégio MB relativa ao DCCC ascendeu no mês de Dezembro de 2021 a €227,50 e a relativa ao VCCC ascendeu nos meses de Setembro de 2021 e Dezembro de 2021 a €212,32.
20) Os menores desejam prosseguir os estudos em escola pública da área de residência.
3.2 Factos não provados:
1. Recentemente o requerente adquiriu gatos, como animais de companhia, aumentando assim a despesa do seu agregado familiar com veterinários, vacinas, desparasitantes, alimentação, produtos de higiene e limpeza, o que não é compatível com um estilo de vida deficitário, como alega ter.
2. O rendimento escolar do DCCC tem sido negativo, ano lectivo 2020/21, com 13 anos de idade, frequentou o 7º ano de escolaridade, tendo tido no primeiro período de cinco negativas;
3) O DCCC transitou de ano com quatro disciplinas com nível negativo (2) e as restantes com nível 3.
*
4. Reapreciação da decisão de mérito da acção
Apreciemos agora as questões de direito suscitadas, levando em atenção a factualidade agora definitivamente fixada.
Nos termos do disposto no art.º 1877º do Código Civil, “os filhos estão sujeitos às responsabilidades parentais até à maioridade ou emancipação”.
Determina nessa senda o art.º 1878º, nº 1 do mesmo Código que «compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens».
Não logrando os progenitores chegar a acordo, o regime do exercício das responsabilidades parentais deve ser fixado pelo Tribunal em conformidade com o que prevê o art.º 1906º do CCivil:
«1 – As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
2 – Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores.
3 – O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente; porém, este último, ao exercer as suas responsabilidades, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes, tal como elas são definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente.
4 – O progenitor a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício.
5 – O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro.
6 – Ao progenitor que não exerça, no todo ou em parte, as responsabilidades parentais assiste o direito de ser informado sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação e as condições de vida do filho.
7 – O tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles”.
Dispõe o artigo 42.º do RGPTC, com a epígrafe «Alteração de regime» que:
«1 - Quando o acordo ou a decisão final não sejam cumpridos por ambos os pais, ou por terceira pessoa a quem a criança haja sido confiada, ou quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, qualquer um daqueles ou o Ministério Público podem requerer ao tribunal, que no momento for territorialmente competente, nova regulação do exercício das responsabilidades parentais. (…).
4 - Junta a alegação ou findo o prazo para a sua apresentação, o juiz, se considerar o pedido infundado, ou desnecessária a alteração, manda arquivar o processo, condenando em custas o requerente.
5 - Caso contrário, o juiz ordena o prosseguimento dos autos, observando-se, na parte aplicável, o disposto nos artigos 35.º a 40.º.
6 - Antes de mandar arquivar os autos ou de ordenar o seu prosseguimento, pode o juiz determinar a realização das diligências que considere necessárias.».
Para lançar mão deste procedimento, torna-se necessário pois, que a alteração de regime se funde em incumprimento do acordo ou decisão final que fixou o regime a alterar, ou em circunstâncias supervenientes que imponham essa alteração.
Conforme se decidiu no Ac. da Relação de Guimarães, «para que uma obrigação parental seja modificável, com base na alteração das circunstâncias, aquele que pretende a alteração deve alegar as circunstâncias existentes no momento em que aquela obrigação foi contraída e as circunstâncias presentes no momento em que requer a modificação dessa mesma obrigação. Se o juízo de relação mostrar uma variação de contexto, então deve autorizar-se a alteração da obrigação. No caso contrário, a alteração deve, naturalmente, recusar-se.» Cfr. Ac. da Relaçao de Guimarães de 8.6.2017, Proc. nº 7380/03.4TBGMR-C.G1.
No caso sub judice, o requerente invocou no seu requerimento inicial a impossibilidade de pagamento da mensalidade dos dois filhos no colégio privado defendendo a sua transição para o ensino oficial. Pede, igualmente, em face da fixação da guarda alternada, que seja dispensado do pagamento fixado a título de pensão de alimentos já que foi fixada a guarda alternada, residindo os menores semanalmente com cada um dos progenitores com excepção do irmão mais velho que vive permanente com o pai.
Paralelamente corre incidente de incumprimento e execução, processos intentados pela mãe em face do incumprimento do ora requerente no pagamento de despesas que se prendem com a educação dos menores, designadamente, as mensalidades do colégio. Outras despesas prendem-se com despesas conexas com a educação, tal como material escolar, despesas de saúde e outras.
Sendo o processo de alteração da regulação das responsabilidades parentais um processo de jurisdição voluntária, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo adoptar, em cada caso, a solução que julgar mais conveniente (art.º 987º do Cód. Processo Civil), tendo em vista os interesses dos menores.
Tratando-se de um processo de jurisdição voluntária, tem aqui aplicação o critério estabelecido no artigo 988.º, n.º 1 do CPC: «dizem-se supervenientes tanto as circunstâncias ocorridas posteriormente à decisão, como as anteriores que não tenham sido alegadas por ignorância ou outro motivo ponderoso».
Consagra-se, assim, tanto a superveniência objectiva (factos ocorridos posteriormente à decisão), como a subjectiva (factos anteriores não alegados por ignorância ou outro motivo ponderoso).
A este propósito defendem Helena Boliero e Paulo Guerra que a a alteração da regulação das responsabilidades parentais pode fundar-se na alteração superveniente de circunstâncias tanto nos casos de superveniência objectiva, como nos casos de superveniência subjectiva, sendo que neste último caso, cabe ao requerente alegar e provar os factos concretos que objectivamente justificam o conhecimento tardio dos fundamentos da alteração. Sobre tal matéria se produzirá prova, a menos que o requerido confesse ou não impugne tais factos. Finalmente, haverá que ponderar que o próprio incumprimento configura uma forma qualificada de alteração superveniente das circunstâncias, na medida em que resulta de factos ocorridos em data posterior à decisão alteranda. Cfr. neste sent.“A Criança e a Família - Uma Questão de Direito(s)”, 2.ª ed., Coimbra Editora, 2014, pp. 269-270.
No caso dos autos, a transferência dos menores para estabelecimento de ensino público já tinha sido objecto de ponderação pelos progenitores na conferência de pais de 11/01/2017.
Essa mudança efectivou-se relativamente ao VICCC, o mais velho dos três irmãos, no início do ano lectivo de 2020/21, não resultando que tal alteração tenha resultado em prejuízo do menor (hoje já maior) referindo-se até, os irmãos mais novos ao exemplo do VICCC para também eles saírem do colégio.
O DCCC tem tido um rendimento escolar sofrível e o VCCC, ainda que o percurso escolar seja médio/alto, referem não querer continuar no colégio.
De ponderar é também e nesta sede, que o requerente incorreu em incumprimento no pagamento da prestação de alimentos, mormente a mensalidade escolar, correndo processos de incumprimento e execução.
Assim e apesar de ter ocorrido homologação de acordo de regulação de responsabilidades parentais é manifesto que se alteraram os condicionalismos de facto em que a decisão foi proferida.
Sendo a obrigação alimentícia uma obrigação duradoura que assenta em dois parâmetros fundamentais - as necessidades económicas do alimentando e as disponibilidades financeiras do devedor (art.º 2004 do Código Civil). Qualquer destes dois factores pode alterar-se.
No caso dos autos poder-se-ia questionar se à data da propositura da acção já se haviam alterado as condições económicas do requerente, porém, os elementos carreados para os autos evidenciam tal alteração com a mudança de emprego do pai.
Vejamos, assim, a esta luz, o caso dos autos.
A primeira questão que se impõe resolver é a do erro na forma de processo:
Estará o pedido de mudança de estabelecimento de ensino fora das questões a decidir no âmbito do processo de alteração das responsabilidades parentais?
A resposta terá naturalmente de ser negativa atendendo ao disposto no citado art.1906º, do CCivil.
A decisão das questões de particular importância para a vida do filho à luz do nº 1, do art.º 1906º CCivil, são decididas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, diferentemente daquelas relativas aos actos da vida corrente  cuja decisão caberá ao progenitor com quem o menor vive. (cfr.n.º1 e 3, cit art.º 1906º).
A este propósito defendem PEREIRA COELHO e GUILHERME OLIVEIRA e no que concerne às  questões de particular importância: “embora nunca possa dar-se por encerrada a lista dos atos que merecem caber num conceito ou noutro – e esta é uma vantagem da indeterminação – as sugestões provindas de todas as fontes mostram que as «questões de particular importância» não ocorrerão com frequência; mostra, portanto, que a frequência dos casos em que a nova lei impõe o exercício conjunto é baixa (…) os tribunais, com a sua autoridade, são o local próprio para se obter uma definição consistente que estabilize a prática e desdramatize o assunto”. Cfr. FRANCISCO PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA (2016), “Curso de Direito da Família, Volume I – Introdução Direito Matrimonial”, 5.ª edição, Imprensa da Universidade de Coimbra, pp-. 797 a 798, http://www.centrodedireitodafamilia.org/sites/cdb-dru7-ph5.dd/files/eBook_-_Curso_de_Direito.pdf .
“As questões de particular importância serão sempre acontecimentos raros. Os dois progenitores, assim, apenas terão a necessidade de cooperar episodicamente, e sempre à volta de assuntos que, por serem importantes para a vida do filho, porventura os chamarão à sua responsabilidade de pais”. Cfr. Ac.  TRL. 02-05-2017, disponível in, www.dgsi.pt.
TOMÉ D’ALMEIDA RAMIÃO, destaca que o conceito não é novo, porque já constava dos arts. 1901.º, n.º 2 e 1902.º, n.º 1, e considera que “deverá relacionar-se com questões existenciais graves, centrais e fundamentais para o seu desenvolvimento, segurança, saúde e formação da criança, todos os atos que se relacionem com o seu futuro, a avaliar em concreto e em função das circunstâncias”. Cf. TOMÉ D’ALMEIDA RAMIÃO, “Divórcio e Questões Conexas – Regime Jurídico Atual (De acordo com a Lei n.º 61/2008)”, Quid Juris, p. 147. 
Devem, assim, integrar-se neste conceito, as intervenções cirúrgicas que possam fazer perigar a saúde ou a vida da criança; a prática de desportos radicais; a saída do menor para o estrangeiro para países em conflito de que resultem riscos acrescidos para a sua segurança; a educação religiosa do menor; a frequência de actividades extracurriculares, como a música ou o teatro; matrícula em colégio privado; mudança de residência do menor para local distinto da do progenitor a quem foi confiado; as decisões relativas à administração dos bens do filho que impliquem disposição ou oneração. Cfr.neste sent. TOMÉ D’ALMEIDA RAMIÃO, ob cit.. (sublinhado nosso)
Para HELENA BOLIEIRO e PAULO GUERRA, questões de particular relevância serão questões existenciais graves e raras na vida de uma criança, que pertencem ao núcleo essencial dos direitos que lhes são reconhecidos, tais como: «decisão sobre intervenções cirúrgicas no filho (inclusive as estéticas); saída do filho para o estrangeiro, não em turismo mas em mudança de residência, com algum caráter duradouro; saída do filho para países em conflito armado que possa fazer perigar a sua vida; obtenção de licença de ciclomotores; escolha de ensino particular ou oficial para a escolaridade do filho; decisões de administração que envolvam oneração; educação religiosa do filho (até aos seus 16 anos); prática de atividades desportivas que representem um risco para a saúde do filho; autorização parental para o filho contrair casamento; orientação profissional do filho; uso de contraceção ou interrupção de uma gravidez; participação em programas de televisão que possam ter consequências negativas para o filho». Cfr. HELENA BOLIEIRO E PAULO GUERRA, “A Criança e a Família – Uma Questão de Direito(s): Visão Prática dos Principais Institutos do Direito da Família e das Crianças e Jovens”, Coimbra Editora, pág. 175-176. (sublinhado nosso)
Concretamente sobre a mudança de estabelecimento de ensino escreve Clara Sottomayor: «(…) Em caso de falta de acordo, a noção de referência para decidir da importância de um acto que exige intervenção judicial, deve ter um conteúdo uniforme e limitado, por razões de segurança jurídica e apara reduzir a conflitualidade entre ex-cônjuges. Este conceito de acto de particular importância deve ser, portanto, interpretado restritivamente sob pena de se criar demasiada incerteza para o progenitor residente e para terceiros. A propósito das inscrições em estabelecimentos de ensino, mesmo que se trate de um colégio privado e de decisões em transferência do ensino público para privado ou vice-versa, e da orientação profissional do/a jovem, julgamos necessário proteger a estabilidade da sua vida, conferindo poderes de decisão ao progenitor residente, que melhor conhece as necessidades da criança e o seu desenvolvimento, não distinguir, consoante a inscrição seja num estabelecimento público ou particular, sendo ambas as decisões consideradas usuais na vida da criança e devendo ser tomadas pelo progenitor que cuida da criança no dia-a-dia. A escolha de colégios privados pode ser necessária, para que as crianças beneficiem e actividades extra-curriculares e de um acompanhamento mais personalizado nas actividades extra-curriculares e de um acompanhamento mais personalizado nos estudos. Por outro lado, facilita às famílias a conciliação do trabalho com a vida familiar, sobretudo, ao /à progenitor/a residente, que se encontra sozinho/a a cuidar dos/as filhos/as. Implicando a inscrição em colégios privados maiores despesas, corre-se o risco de que o progenitor sem guarda utilize a noção de particular importância para se recusar a pagar as propinas dos colégios, como consequência de não ter dado o seu consentimento para a inscrição, situação em que nada promove o superior interesse da criança (…)». Cfr.«Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais», Almedina, 2011, pág. 165)
Em anotação ao art.º 1906º do Código Civil, a mesma autora, a propósito do nº 3 do mesmo artigo, escreve: « A lei consagra um princípio de actuação concorrencial de ambos os pais. Contudo, o progenitor não residente não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes (p. ex. a escolha do estabelecimento de ensino a frequentar, métodos educativos…), tal como elas são definidas pelo progenitor residente (art.º 1906º/3).»
Da análise da doutrina resulta, assim, que se há quem defenda que a mudança de escola e a escolha do estabelecimento de ensino (escola pública ou privada) a frequentar devem ser vistos, em princípio, como actos da vida corrente dos filhos, que não carecem de acordo entre os progenitores atento, até, o disposto no art.º 1906º, nº 3 do Código Civil, que (implicitamente) atribui ao progenitor residente a definição das orientações educativas mais relevantes (como é o caso da inscrição dos filhos no estabelecimento de ensino a frequentar), impondo ao progenitor que se opuser a alegação e prova, que a escola que o outro escolheu não é adequada envolve custos insuportáveis, ou outras razões que se prendem com a qualidade do ensino que envolvam uma situação de perigo para a educação ou desenvolvimento das crianças.
Como também há quem defenda que a escolha de ensino particular ou oficial para a escolaridade do filho pertence àquele núcleo de direitos das crianças que, reconduzindo-se a actos que determinam o seu futuro podem assumir a natureza de questão particularmente relevante.
Pode até entender-se que por questões de natureza económica a mudança de um estabelecimento provado para um público não seja questão de particular importância já o sendo a transferência de uma instituição pública para uma instituição provada, por determinar maiores despesas e implicações de carácter patrimonial para os progenitores.
Temos para nós, analisadas as diversas posições que esta constitui questão que deverá ser avaliada e decidida caso a caso em função das circunstâncias. Na verdade, devendo ser estas questões em que os progenitores devem alcançar acordo tendo em vista o superior interesse das crianças, o que se verifica é que vêm a tribunal para que seja o Juiz a decidir o que se deve entender casuisticamente por questões de particular importância ou actos da vida corrente e para, que fazendo uso da sua autoridade, decidam situações que deveriam ser decididas mediante acordo, em família.
In casu, é manifesto o desacordo dos progenitores   relativamente a esta questão: a mãe defende a continuação da frequência dos dois filhos mais novos do casal no colégio que frequentam desde os três anos e o pai defende a sua saída para a escola pública.
A mãe argumenta a favor da escola privada circunstâncias que se prendem com acompanhamento mais personalizado e qualidade do ensino; o pai argumenta com questões de carácter financeiro e considerando que os resultados escolares dos filhos não reflectem a superior qualidade do ensino que a mãe alega para a defesa do privado.
Dos factos dados como provados e considerando que, apenas dois dos filhos do casal, ainda frequentam o colégio, encontrando-se o filho mais velho, mediante acordo do casal, a frequentar estabelecimento oficial público, não se nos afigura que sejam as razões económico-financeiras que justificam o interesse do pai em que os filhos transitem para estabelecimento escolar oficial.
Na verdade, considerando o que se apurou relativamente aos rendimentos de ambos os progenitores e o apurado valor da mensalidade do colégio relativamente a cada um dos filhos não se pode concluir pela incapacidade do pai pagar tais quantias, porém,  nem só as questões patrimoniais relevam neste caso.
Porém o requerente também põe em questão o facto dos meninos não terem o rendimento escolar que seria de expectar frequentando um colégio privado de renome e quanto a esse item resultou provado que o DCCC, no ano lectivo de 2020/21, com esforço conseguiu transitar de ano e que o rendimento escolar “sofrível” permanece no ano lectivo 2021/22. Já quanto ao VCCC, tem tido um desempenho escolar bom, com uma média de 4 valores.
Nada foi provado no sentido de que a mudança de estabelecimento de ensino do colégio privado para o oficial possa vir a prejudicar o rendimento escolar do VCCC ou do DCCC Na verdade, o que se pode concluir designadamente da audição dos menores ocorrida no âmbito dos autos é que, o DCCC hoje com 15 anos e o VCCC prestes a fazer 13 anos, não têm qualquer interesse em permanecer no colégio, manifestando a vontade inequívoca de aí não prosseguirem os estudos manifestando o desejo de transitarem para a escola pública, á semelhança do que aconteceu com o irmão mais velho, o VICCC, que hoje maior de idade, transitou para o ensino oficial com cerca de 16 anos.
Manifesta-se a mãe de modo totalmente contra tal mudança, apesar de bem saber que os filhos não pretendem continuar não podendo deixar de considerar-se a este respeito que obstou a que as Técnicas da Unidade de Supervisão e Qualificação da Assessoria ao Tribunal da SCML, no exercício das funções cometidas pelo Tribunal, chegassem à fala com os menores. A sua audição foi determinado já em sede de audiência final, pelo Mmo Juiz a quo.
Aliás, são os próprios menores (já adolescentes) que revelam que já pediram à mãe para sair do colégio, mas que esta não permite.
O DCCC e o VCCC têm hoje, respectivamente, 15 anos e 12 anos (sendo que o VCCC completará 13 anos em Maio.).
Muitas vezes existe a tendência de se desvalorizar a capacidade de decisão e de avaliação do risco por parte dos adolescentes. Nesta fase da vida dos jovens é necessário que a relação pais/filhos se paute por uma comunicação aberta e próxima de modo a que num ambiente familiar favorável os jovens sintam que neles os pais depositam confiança e compreendam as suas opções.
Muito importante se torna, pois, que os pais, ainda que divorciados, mantenham um canal de comunicação salutar fomentando o desenvolvimento dos filhos num ambiente familiar seguro de forma a que estes se sintam protegidos, mas também confiantes na certeza da confiança dos progenitores nas suas opções. Tal confiança e a própria autonomia, poderá ficar prejudicada se a situação de stress forem estímulos constante na sua vida.
Assim, não pode simplesmente ignorar-se a vontade do DCCC e do VCCC, vontade essa que já havia sido manifestada anteriormente pelo irmão mais velho, o VICCC, e acedendo os progenitores a essa mudança, não resultou nos autos que se tenha revelado prejudicial para o mesmo. Desvalorizar as suas vontades na tentativa de criar um ambiente demasiadamente securitário e altamente protectivo não é a melhor preparação para a sua inserção na sociedade.
O presente processo de regulação das responsabilidades parentais é um processo de jurisdição voluntária em que o que está em causa é o superior interesse dos menores, não havendo vencedores nem vencidos. Trata-se de encontrar a solução mais conveniente atendendo ao princípio fundamental que deve nortear todas as decisões atinentes à regulação do exercício das responsabilidades parentais que é o do bem-estar e desenvolvimento harmonioso dos menores.
No caso dos autos as responsabilidades parentais são exercidas em comum por ambos os pais, o que abrange as situações previstas nos art.ºs 1901.º, n.º 2 e 1906.º, n.º 1, ambos do CCivil pelo que, não logrando estes chegar a acordo, defendendo o pai a mudança para o ensino oficial e opondo-se a mãe veementemente, sendo patente as relações conflituosas entre ambos, e movendo-se este tribunal pela salvaguarda do interesse dos menores,  que aqui manifestaram a vontade inequívoca de sair do colégio, entende-se, tal como foi decidido pelo tribunal da 1ª instância, que o DCCC e o VCCC deverão transitar para a escola pública no próximo ano lectivo de 2023/2024, assim se protegendo o seu normal desenvolvimento.
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Cumpre agora apreciar o pedido do requerente no sentido de ficar desvinculado do pagamento da pensão de alimentos uma vez que foi fixado o regime de guarda partilhada dos filhos.
Nos termos do disposto no art.2003.º, n.º 1, CCivil, «por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário», sendo a sua medida determinada nos termos do disposto art.º 2004.º: «os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los», atendendo-se ainda na respectiva fixação «à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência».
Nos termos do disposto no art.º 1874, nº 2, do CCivil, os alimentos devem ser proporcionais aos meios daquele que houver de prestá-los pelo que, havendo uma desproporção evidente de meios entre os progenitores, aquele que tem mais tem de pagar mais do que o outro, mesmo que seja fixado o regime de guarda conjunta e residência alternada.
Com vista à concretização da noção legal de alimentos à luz de uma existência digna, a doutrina e a jurisprudência têm concretizado o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 2004.º, ponderando a necessidade do alimentando versus a possibilidade do obrigado.
Conforme se anota na sentença recorrida, cada um dos pais tem dever de, segundo as suas possibilidades, alimentar o filho, tal como imposto pelo artigo 27.º n.º 2 da Convenção Sobre os Direitos da Criança adoptada pela Assembleia Geral nas Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990; pelo artigo 36.º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa e pelo artigo 1874.º n.º 1 do CCivil.
A obrigação de alimentos dos pais em relação aos filhos resulta do disposto no artigo 1878.º n.º 1 do CC que, fixando o conteúdo das responsabilidades parentais, nele inclui, além do mais, o dever de prover ao sustento dos filhos menores, de velar pela sua segurança e saúde e de dirigir a sua educação.
Dado que o regime de guarda conjunta e de residência alternada admite o pagamento de pensão de alimentos, por parte do progenitor que tem mais rendimentos, deverá decidir-se se, in casu, deverá manter-se a obrigação do pai continuar obrigado a tal pagamento.
 É posição unânime na jurisprudência e doutrina que a criança tem direito a manter, após a separação dos pais, o mesmo nível de vida que tinha quando havia uma vida em comum.  Nesse conspecto, é justo que o progenitor que mais ganha pague uma pensão de alimentos para que a criança não seja afectada com a discrepância entre as realidades económicas vividas na casa de um ou outro dos progenitores, assim se providenciando estabilidade e ambiente são ao menor.
Anote-se que o acordo cuja alteração se visa, foi alcançado e homologado em 02/05/2019. Ficou acordado que o requerente ficaria obrigada a pagar à requerida a título de pensão de alimentos com a quantia de €210,00/mês (€70 para cada um dos filhos). Ficou também fixado que ambos suportariam as despesas de educação na proporção de 50% cada um, incluindo as mensalidades dos colégios dos filhos DCCC e VCCC, bem como da metade das despesas de apoio ao estudo destes menores; sendo que relativamente ao menor VICCC, a mensalidade do colégio deste é suportada pela mãe.
Já relativamente a despesas médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada pelo seguro de saúde dos menores, incluindo as lentes de contacto, seriam suportadas por ambos os progenitores na proporção de 60% pelo pai e 40% pela mãe; relativamente às despesas com aparelhos dentários, essa proporção será de 50% a suportar por cada progenitor.
Ora, resulta dos autos que, tendo o VICCC transitado para o ensino público, a requerida deixou de ficar onerada com o pagamento da mensalidade do colégio privado que este frequentava. Mais resulta que este, desde Agosto de 2021 passou a residir com carácter de permanência com o pai, provendo este a satisfação das suas despesas na sua casa.
Já no que concerne às despesas de educação com o DCCC e o VCCC, ordenada a transição para a escola pública, ficam desobrigados do pagamento das mensalidades do Colégio, que ascendiam a cerca de €225,00 para cada um dos pais.
Assim e considerando que o direito a alimentos é um direito actual pelo que os alimentos têm que corresponder às possibilidades do obrigado e às necessidades do alimentado no momento em que são fixados; que cabe a ambos os progenitores, no interesse dos filhos, prover ao seu sustento; que na determinação das necessidades do menor, deverá considerar-se o padrão de vida a que sempre se habituaram; considerando, ainda, que as possibilidades do obrigado devem ser aferidas pelos seus rendimentos e não pelo valor dos seus bens, devendo atender-se às receitas e despesas do obrigado, ponderando não só os rendimentos dos bens como quaisquer outros proventos, os provenientes do trabalho ou as remunerações de carácter eventual, considera-se não ser de fixar qualquer prestação de alimentos. (Cfr. neste sent. Moutinho de Almeida, Os Alimentos no Código Civil de 1966, Revista da Ordem dos Advogados, 1968, pág. 99).
Assim, os progenitores, na sequência da decidida residência alternada, deverão suportar as despesas e encargos com os filhos durante os períodos em que estes se encontram a residir consigo, solução que se afigura adequada na medida em que os rendimentos globais de cada um dos agregados familiares não justificam divisões de encargos de forma diversa, nessa vertente.
Assim se mantém, também nesta vertente, a decisão recorrida.
5. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente por não provada a presente apelação, mantendo-se, consequentemente, a sentença recorrida.
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Lisboa, 23 de março de 2023
Ana Paula Nunes Duarte Olivença
Rui Manuel Pinheiro Oliveira
Teresa Prazeres Pais