PROCESSO ESPECIAL PARA ACORDO DE PAGAMENTO(PEAP)
REGRA PROCEDIMENTAL
VÍCIOS
SITUAÇÃO MAIS FAVORÁVEL
Sumário

1 –  Para os efeitos previstos nos arts. 222º-F nº5 e 215º do CIRE apenas será não negligenciável a violação que se traduza numa lesão de tal modo grave dos interesses protegidos ou a proteger – nomeadamente de tutela da posição dos credores e do devedor - que, em concreto, mesmo ponderando o interesse da recuperação/reequilíbrio financeiro do devedor, o juiz não possa deixar de recusar-se a homologar o plano, inviabilizando com isso a recuperação.
2 –  O processo especial para acordo de pagamento (PEAP) tem uma natureza hibrida, judicial e extrajudicial sendo que os vícios de procedimento relativos ao processo negocial relevarão apenas no momento do juízo de homologação, dado que todo o processo negocial decorre extrajudicialmente.
3 – Constitui violação de regra procedimental a circunstância de a devedora não negociar com os credores que declararam pretender participar nas negociações, violação essa, porém, negligenciável quando nenhum dos credores desconhecia a existência e finalidade do procedimento, recaindo também sobre eles, ao abrigo dos princípios que regem as negociações, uma postura pró-ativa e a possibilidade de tomarem a iniciativa de participar, nomeadamente interpelando o devedor ou o administrador judicial provisório para o efeito.
4 - O regime imperativo dos créditos tributários não implica que não se analise comparativamente, à luz do princípio da igualdade, o tratamento dado a estes créditos e aos demais, sendo de censurar a desproporção entre a proposta de pagamento de 100% dos créditos tributários e de pagamento de 1% dos demais créditos, sequer ancorada na diferente classificação dos créditos.
5 – Mesmo num cenário impressivo como a proposta de pagamento, a determinados credores, de apenas 1% dos créditos relacionados, os credores que requerem a não homologação do acordo de pagamento com o fundamento no disposto na al. a) do nº1 do art. 216º do CIRE têm o ónus de demonstrar, em termos plausíveis, que na ausência de plano ficariam em situação mais favorável.

Texto Integral

Acordam as Juízas da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa

1. Relatório
JC intentou o presente processo especial para acordo de pagamento.
Foi nomeado Administrador Judicial Provisório e efetuadas as publicações previstas no nº5 do art. 222º-C do CIRE.
Foram reclamados créditos, nos termos do nº2 do art. 222º-D do CIRE, vindo o Administrador Judicial Provisório a apresentar lista provisória de credores, a qual foi impugnada pelos credores Banco B, SA, Banco N, SA e pelo requerente quanto aos créditos reconhecidos ao credor Banco C, SA, as quais vieram a ser julgadas procedentes.
Foi apresentada proposta de acordo de pagamento pelo devedor.
Banco B, SA veio, informando ter votado desfavoravelmente o plano, pedir a não homologação do plano de acordo de pagamento, alegando que a sua situação ao abrigo de tal plano, fica pior do que aquela que ocorreria se fosse declarada a insolvência do devedor e deliberada a liquidação do respetivo património, nos termos do disposto no artigo 216.º, n.º 1 alínea a), do CIRE, e ainda que, não obstante ter manifestado o propósito de intervir nas negociações, nunca foi ouvido ou envolvido, o que configura uma violação grosseira e não negligenciável das regras procedimentais aplicáveis.
EC, DAC, veio votar desfavoravelmente o plano e requerer a sua não homologação, alegando, em síntese, que o plano e o processo estão a ser usados pelo devedor não para negociar mas para se eximir às suas obrigações e que fica numa situação pior do que a que ocorreria se fosse declarada a insolvência do devedor e ocorresse a liquidação do respetivo ativo.
FC, Plc. veio, informando ter votado contra o plano, requerer a respetiva não homologação nos termos conjugados do n.º 2 do artigo 222.º-F e alínea a) do n.º 1 do artigo 216.º do CIRE, em síntese por, sendo proposta a liquidação de 1% dos valores devidos, ser expetável que num cenário de insolvência, liquidação do ativo e eventual exoneração do passivo restante receba mais que a proposta de pagamento do devedor de € 16.722,37 e, em cenário de encerramento retomará a ação executiva em curso e as penhoras do vencimento que já estavam a decorrer. Mais alega que a diferenciação entre a proposta de regularização dos créditos comuns e do crédito comum do Estado/Fazenda Nacional podendo não ser considerada uma violação do princípio da igualdade no plano legal, dada a especificidade da lei tributária, significa que um credor comum receberá a totalidade da dívida e os demais 1%. Também demonstrou intenção de participar nas negociações, mas apenas teve conhecimento do Plano com a respetiva junção aos autos pelo devedor, o que viola as regras procedimentais aplicáveis.
Banco C, SA veio requerer a não homologação do acordo de pagamento, informando ter votado desfavoravelmente o acordo de pagamento. Alegou, em síntese, ter manifestado a pretensão de participar nas negociações, mas não ter o devedor comunicado consigo ou respondido aos seus pedidos de contacto, não tendo consigo sido encetadas ou mantidas quaisquer negociações, o que configura violação não negligenciável de regras procedimentais. Alega ainda que o plano assenta num princípio de exclusão da responsabilidade do devedor e se antevê menos favorável que a que interviria na ausência de qualquer plano de pagamento. Acresce ser um tratamento injusto, desproporcional e injustificado, violador do princípio da igualdade, o pagamento de 100% dos créditos do Estado, incluindo os créditos comuns, mesmo considerando o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, e o pagamento subsidiário de 1% dos demais créditos.
O Sr. Administrador Judicial Provisório juntou aos autos o resultado da votação do plano, nos termos da qual o acordo de pagamento foi aprovado com os votos favoráveis de 52,51% dos créditos com direito de voto, correspondendo todos a créditos não subordinados, nos termos da al. b) do nº3 do art. 222º-F do CIRE.
Notificado para o efeito veio o devedor pedir seja homologada a proposta de plano apresentada dado que a mesma respeita todas as regras legais e é mais favorável para todos os seus credores que a que resultaria da insolvência do devedor. Alega, em síntese, que não está preenchido o disposto no art. 216º nº1, al. a) do CIRE em relação a nenhum dos credores, que os créditos do Estado são indisponíveis não estando os credores em situação de igualdade com este credor e que tentou contactar os credores, nunca tendo estes reagido, só agora, com má-fé, depois do plano aprovado vindo a alegar a violação de regras procedimentais. Alega, finalmente que o plano não excluirá a sua responsabilidade, já que assumirá o pagamento de 1% da dívida avalizada relativamente aos créditos comuns cujas devedoras originárias não estejam, elas próprias, a implementar os seus planos de recuperação.
O Sr. Administrador Judicial Provisório veio igualmente pronunciar-se, defendendo a homologação do plano aprovado.
Banco C, SA e Banco B, SA, vieram responder, reiterando o pedido de não homologação.
Após algum processado o tribunal veio a proferir o seguinte despacho:
“Pelo exposto, decide-se não homologar o acordo extrajudicial de recuperação de devedor apresentado por JC, contribuinte fiscal n.º …, residente na Estrada …., Edifício ….
Custas pelo devedor, sendo o valor da acção para efeitos de custas equivalente ao da alçada da Relação.
Registe, notifique e publicite nos termos dos arts. 37.º e 38.º, ex vi n.º 6, do art. 17.º-F, todos do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.”
Inconformado apelou o devedor pedindo a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que declare a homologação do plano de recuperação apresentado pelo recorrente e formulando as seguintes conclusões:
“DA ALEGADA INEXISTÊNCIA DE NEGOCIAÇÕES:
A) Inexistiu, “in casu”, qualquer violação não negligenciável de regras procedimentais, pois os credores declararam, nos presentes autos, pretender aderir às negociações.
B) Aquando da elaboração do plano, a sociedade a quem a competiu tal tarefa bem como a negociação respectiva, a “BLG” através do seu responsável Dr. …, bem tentou contactar os credores em causa, contactos estes que, infelizmente, nem uma resposta por parte destes mereceram, não tendo conseguido comprova-lo, conforme resulta dos seus requerimentos de 21.12.2019, referência 9160467 e de 27.07.2020, referência 9868583 decorrente de um problema informático de que esta mesma empresa padeceu.
C) De igual forma e como bem refere a Douta Sentença ora recorrida, “o Sr. Administrador Judicial Provisório consignou que os requerentes foram contatados com vista a intervir nas negociações, porém os mesmos não intervieram. O devedor, por seu turno, alegou que a empresa que contratou para encetar negociações com os credores tentou contactar os mesmos, porém sem resposta, assumindo uma posição passiva, sem que colocasse qualquer questão ou que fosse impedido de o fazer.”
D) Durante todo o processo e contrariamente ao que resulta da Douta Sentença ora recorrida, os credores em causa tiveram uma postura totalmente passiva, em momento algum reagindo aos contactos dos representantes do Devedor habilitados para o efeito nem tão pouco o contactando no sentido de lhe ser facultada alguma informação, fazer algum “ponto de situação” e/ou reclamação e/ou apresentar alguma proposta.
E) E, só depois do plano ser aprovado e com evidente má-fé, vêm invocar a alegada violação de regras procedimentais, pois estariam estes credores certos de que o Devedor não lograria aprovar qualquer plano de recuperação.
F) Em consequência do exposto, invoca-se o Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 09.02.2017 relativo ao processo 2021/16.2T8VCT.G1 igualmente disponível em www.dgsi.pt que dispõe que:
1 – A violação não negligenciável de regras procedimentais que obsta à homologação de um plano de revitalização deve entender-se como violação de normas imperativas que acarretem a produção de um resultado que a lei não autoriza.
2 – Tal não acontece quando os devedores prestam toda a informação que possuem sobre os credores e disponibilizem toda a documentação, convidando os credores a participar nas negociações e tendo estes dela conhecimento, não resultando dos autos que o credor tenha suscitado qualquer questão que não tenha sido esclarecida, ou tenha querido participar das negociações e tenha sido impedido.
G) O Devedor comunicou a todos os seus credores de que havia recorrido ao presente PEAP, convidando-os a participar nas negociações, o que estes aceitaram, não reagindo a qualquer contacto dos representantes do Devedor, nem em momento algum do processo pretenderam ter qualquer intervenção, suscitado qualquer questão que o Devedor não respondesse e/ou tenha por qualquer forma ou meio, sidos impedidos de participar nas negociações.
H) Se tal tivesse ocorrido, certamente que os credores em causa teriam participado de imediato o sucedido tanto ao Sr. Administrador Judicial Provisório como à Meritíssima Juiz “a quo” o que, manifestamente, não fizeram!
DA ALEGADA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE:
I) Refere ainda a Douta Sentença ora recorrida que “a desproporção entre o pagamento integral do crédito da Autoridade Tributária, com manutenção de juros vencidos e vincendos, e os créditos comuns que verão, na melhor das hipóteses, ser pago apenas 1% do crédito, entendemos que ocorre violação do princípio da igualdade que consubstancia violação não negligenciável das normas aplicáveis ao conteúdo do Acordo apresentado, pelo que procede este argumento para a não homologação do plano de recuperação.”, o que o Recorrente também não pode aceitar.
J) O modo de pagamento à Autoridade Tributária a partir do momento em que foi alterado, através do artigo 125º da Lei nº 55-A/2010, o artigo 30º da Lei Geral Tributária com a consequente aditamento do seu nº 3, ficou condicionado, através da instituição, em sede de processos de recuperação, do princípio da indisponibilidade do crédito tributário, o qual passa a prevalecer sobre qualquer legislação especial e assim, o modo de pagamento ao Estado autonomizou-se relativamente às regras do CIRE.
K) As regras ínsitas no Código do Procedimento e do Processo Tributário das quais se faz depender a possibilidade do plano de recuperação ser homologado, por força da mencionada indisponibilidade do crédito tributário, em momento algum podem contender com o artigo 194º do CIRE pois os credores em causa encontram-se em “patamares” diferentes, em “mundos” diferentes e por vontade expressa do Legislador nesse sentido, a partir de 2011.
L) O facto do Devedor estar obrigatoriamente vinculado aos termos do CPPT e não do CIRE no que tange à forma de pagamento à Autoridade Tributária, desde logo implica, forçosamente, a inaplicabilidade “in casu” do princípio da igualdade previsto no artigo 194º do CIRE, motivo pela qual, não pode estar este preceito legal ferido nos termos previstos no plano de recuperação aprovado pelos credores.
DA ALEGADA VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 216º Nº 1 AL. A) DO CIRE
M) Resulta ainda da Douta Sentença ora recorrida de que “A situação ao abrigo do Acordo de Pagamentos é previsivelmente muito menos favorável para os credores requerentes do que resultante da não aprovação do acordo, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 216.º, n.º 1, al. a), do CIRE, aplicável ex vi do art. 222-F, n.º 5 do mesmo código.”
N) Este entendimento resulta de um manifesto equívoco do Tribunal “a quo” na interpretação do plano de recuperação apresentado pelo Recorrente e aprovado pelos seus credores.
O) É referido na Douta Sentença de que “O património do devedor, indicado no Acordo de Pagamentos que apresentou, perfaz a quantia de € 3.215.600,00.”, o que não é verdade!
P) Recorrendo ao mapa dos ativos constante da página 17 da proposta de plano de recuperação, dele resulta um valor estimado para a totalidade dos bens de €; 0,00.
Q) Na realidade as sociedades comerciais em causa estão praticamente todas insolventes e em fase de liquidação ou inativas ou em processo especial de revitalização, pelo que as participações sociais em causa não possuem qualquer valor económico e como tal ficou refletido no mapa.
R) Assim, no mesmo mapa encontra-se o valor contabilístico das participações sociais em causa o qual é idêntico ao seu valor nominal, o qual não tem qualquer correspondência com o valor real que é, repete-se nulo.
S) Face ao exposto, evidente se torna de que todos os credores ficarão ao abrigo do plano de recuperação numa situação substancialmente mais favorável do que na sua ausência, pois certo será que, numa situação de insolvência com exoneração do passivo restante, por parte do ora Recorrente, os seus credores pouco ou nada receberão.
T) Contrariamente, implementando o plano de recuperação, o Recorrente terá de pagar a quantia de €: 177.833,13 à Autoridade Tributária, a acrescer 1% de €: 16.810.461,00 ou seja, €: 168.104,61, a todos os restantes credores num valor total de €: 345.937,74 (trezentos e quarenta e cinco mil novecentos e trinta e sete euros e setenta e quatro cêntimos).
U) Torna-se assim bem evidente que terem alguns credores peticionando a não homologação do plano de recuperação tendo por base este fundamento quando é certo que a alternativa a tal homologação os coloca objetiva e inevitavelmente numa situação pecuniária/económica pior, é um manifesto abuso de direito previsto no artigo 334º do Código Civil na modalidade do “desequilíbrio entre o exercício do direito e os efeitos dele derivados”, e nos subtipos “do exercício de direito sem qualquer benefício para o exercente e com dano considerável a outrem”, neste caso o Recorrente bem como aos seus demais credores.
A Meritíssima Juiz “a quo”, ao recusar a homologação da proposta de plano de recuperação violou assim o disposto nos artigos 194º, 215º e 216º nº 1 al. a) do CIRE, 30º nºs 2 e 3 da LGT e 334º do Código Civil.”
O Ministério Público apresentou resposta ao recurso, sustentando a manutenção da decisão recorrida.
O recurso foi admitido por despacho de 23/02/2021 (ref.ª 147485358).
Foram colhidos os vistos.
Cumpre apreciar.
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2. Objeto do recurso
Como resulta do disposto nos arts. 608º, n.º 2, aplicável ex vi art. 663º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4, 639.º n.ºs 1 a 3 e 641.º n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil, sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio e daquelas cuja solução fique prejudicada pela solução dada a outras, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objeto do recurso. Frisa-se, porém, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito –  art.º 5º, nº3 do mesmo diploma.
Consideradas as conclusões acima transcritas a única questão a decidir é a de se se estão reunidos os requisitos para a homologação da proposta de plano de pagamentos apresentada pelo devedor, o que passa pela apreciação de se no procedimento e no conteúdo do acordo ocorreram ou ocorrem:
- violação não negligenciável de regras procedimentais;
- violação do princípio da igualdade;
- se, relativamente aos credores Banco B, SA, EC, DAC, FC, Plc. e Banco C, SA, a sua situação ao abrigo do acordo é previsivelmente menos favorável que a que interviria na ausência de qualquer plano, para os efeitos da al. a) do nº1 do art. 216º do CIRE.
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3. Fundamentos de facto
Com relevância para a decisão do recurso mostram-se assentes os factos constantes do relatório e ainda os seguintes, resultantes dos termos dos autos:
1 – Com o requerimento inicial o devedor informou estarem pendentes contra si várias execuções tributárias, que discriminou, e execução intentada pelo FC, Plc., no valor de € 160.000,00, pendente no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa sob o nº 12885/15.1T8LSB-A.
2 – Juntou ainda declaração de rendimentos relativa ao ano de 2017, da qual consta ter obtido rendimentos brutos de trabalho dependente de € 14.000,00.
3 – Juntou recibo de vencimento processado em 28/02/2019 por AAC, SA, do qual resulta a categoria de administrador, um vencimento bruto de € 1.000,00, subsidio de refeição de € 121,00, sobre o qual incidem descontos para a segurança social, IRS e um desconto por ordem de tribunal de € 309,33, sendo o total a receber de € 497,67.
4 - Por requerimentos de 12/07/2019, 29/07/2019 e de 30/07/2019, Banco B, SA, FC, Plc. e Banco C, SA comunicaram aos autos terem declarado ao requerente pretender participar nas negociações, nos termos do nº7 do art. 222º-D do CIRE.
5 – Após decisão das impugnações da lista provisória de créditos, a lista definitiva de créditos ficou composta pela seguinte forma:
- Banco B, SA – crédito comum – € 1.229.487,95;
- Banco C, SA – crédito comum – € 4.306.836,68, sendo 4.304.131,99, sob condição;
- Banco S, SA – crédito comum – € 25.000,00, sob condição;
- Caixa X – crédito comum – € 2.514.539,03, sob condição;
- Caixa Y – crédito comum – € 324.801,73;
- Direção de Finanças de Lisboa – crédito comum - € 404.977,90;
- EC, DAC – crédito comum – € 404.977,90, sob condição;
- FC PLc. – crédito comum – € 41.129,77;
- LS – crédito comum – € 12.000,00;
- Banco N, SA – crédito comum – € 7. 946.995,33, sendo € 7.921.431,18, sob condição;
- RC Sucursal Portugal – crédito comum – € 4.183,00.
6 – O devedor remeteu ao administrador judicial provisório e a quatro endereços de correio eletrónico todos terminados em “@....com”, com data de 21/11/2019, comunicação de publicação do anúncio relativo ao depósito de proposta de plano de recuperação nos presentes autos, conforme documento junto pelo Administrador Judicial Provisório em 13/04/2020 (refª 35337269).
7 – Apresentado acordo de pagamento e submetido a votação foram considerados, quanto aos créditos condicionais que requereram a atribuição de direito de voto, 50% do valor dos créditos e, quanto aos créditos condicionais que não requereram a atribuição de direito de voto, não foram atribuídos direitos de voto, tendo o plano sido assim votado nos seguintes termos:
- Banco B, SA – contra;
 - Banco C, SA – contra;
- Banco S – contra;
- Caixa X – contra;
- Caixa Y – contra;
- Estado – Direção de Finanças de Lisboa – a favor;
- EC, DAC – contra;
- FC Plc. – contra;
- Banco N, SA – a favor.
8 – Desconsiderando os votos exercidos pelos credores que não requereram a atribuição de direito de voto, no caso, os votos dos credores Banco S, SA, Caixa X e EC, DAC, votaram contra credores representando 47,29% dos direitos de voto, a favor credores representando 52,51% dos direitos de voto e abstiveram-se, não votando, credores representando 0,2% dos créditos com direito de voto.
9 – O acordo de pagamento aprovado apresenta o seguinte teor:
“III – CONTEÚDO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO
3.1.1 - “O plano de recuperação deve indicar claramente as alterações dele decorrentes para as posições jurídicas dos credores do processo especial de revitalização.”
Os credores do processo especial de revitalização registarão as seguintes alterações:
1 – Estado – Fazenda Publica
Plano de Regularização:
1.1.- Pagamento da totalidade da dívida em regime prestacional, até 150 prestações mensais, iguais e sucessivas, nos termos e com os fundamentos previstos no artigo 196º nº 6 do CPPT, por se considerar demonstrada “…a indispensabilidade da medida e, ainda, (…) os riscos inerentes à recuperação dos créditos (…)”, vencendo-se a primeira no mês seguinte ao da aprovação deste plano.
1.2- A redução dos créditos fiscais só se dará, por juros de mora vencidos e vincendos, nos termos do DL 73/99 de 16/03, aceitando-se as taxas praticadas para os créditos da Segurança Social, face à renúncia dos demais credores e às garantias constituídas e/ou a constituir;
1.3- Neste sentido, a taxa de juros vincendos a aplicar será a que for aceite pela Fazenda Nacional;
1.4- Não haverá lugar à redução de coimas e custas;
1.5 – Não haverá lugar a qualquer moratória;
1.6- Requer-se a dispensa da obrigação de substituição da gerência dado que a sua manutenção em funções é vital para assegurar a credibilidade da presente recuperação, mormente e no que tange ao relacionamento com fornecedores e clientes, nos termos do nº 3 al. a) do artigo 196º do CPPT.
1.7- A revitalizanda fará demonstração do pagamento integral de todas as obrigações fiscais, após o despacho a que se refere o artigo 17º-C, nº 3, a).
1.8- Assim, considera-se notificada a Administração Fiscal do requerimento a que alude o artigo 196º, n.º 1 do CPPT.
1.9 – Para os efeitos previstos no nº 1 do artigo 17º E do CIRE, determina-se nos termos da sua parte final, que a extinção dos processos fiscais só se dará nos termos do Código de Procedimento e Processo Tributário. A suspensão prevista neste normativo cessa, conforme o que ocorrer primeiro, com o decurso das negociações ou do prazo previsto na lei para conclusão das mesmas (nº 5 do artigo 17º-D do CIRE).
1.10 - Dispensa de prestação garantia de acordo com o disposto no artigo 199º nº 13 do CPPT.
2 – Fornecedores, Banca e O. Credores: Créditos Comuns / Créditos Comuns Sob Condição Plano de Regularização: Os créditos dos quais o Devedor é fiador/avalista e são comuns, serão pagos da seguinte forma:
- No que respeita às sociedades, devedoras originárias, que não se encontram em processos de especiais de revitalização ou processos de recuperação, os créditos serão pagos de acordo com as condições em vigor e contratualizadas, ou de acordo com eventuais processos de reestruturação/recuperação futuros;
- No que respeita às sociedades, devedoras originárias, que se encontram em processos de especiais de revitalização ou processos de recuperação, os créditos serão pagos de acordo com as condições aprovadas e homologadas nos planos de recuperação respectivos ou com aquelas que porventura se venham a aprovar e homologar em planos de recuperação de processos de reestruturação/recuperação futuros.
Assim, na eventualidade de vir a ser exigido ao Devedor o pagamento de créditos contraídos pelos seus devedores originários em termos que não se enquadrem no teor dos parágrafos imediatamente anteriores, o Devedor pagará o montante de 1% correspondente ao remanescente da dívida por liquidar, nos 30 dias seguintes à data de trânsito em julgado da sentença de homologação do presente plano especial de acordo de pagamentos.
3 – Fornecedores, Banca e O. Credores com garantias Plano de Regularização: Os créditos dos quais o Devedor é fiador/avalista e sobre os quais tenham sido constituídas hipotecas por terceiros serão pagos da seguinte forma:
- No que respeita às sociedades, devedoras originárias, que não se encontram em processos de especiais de revitalização ou processos de recuperação, os créditos serão pagos de acordo com as condições em vigor e contratualizadas, ou de acordo com eventuais processos de reestruturação/recuperação futuros;
- No que respeita às sociedades, devedoras originárias, que se encontram em processos de especiais de revitalização ou processos de recuperação, os créditos serão pagos de acordo com as condições aprovadas e homologadas nos planos de recuperação respectivos ou com aquelas que porventura se venham a aprovar e homologar em planos de recuperação de processos de reestruturação/recuperação futuros.
Assim, na eventualidade de vir a ser exigido ao Devedor o pagamento de créditos contraídos pelos seus devedores originários em termos que não se enquadrem no teor dos parágrafos imediatamente anteriores, este compromete-se a pagar o remanescente em dívida, depois da alienação do bem dado de garantia pela devedora originária, nos exactos termos previstos no respectivo contrato, acordo e/ou plano de recuperação.”
10 -  Do mesmo acordo consta como inventário dos bens e direitos do devedor:

Verba nºBem ou direitoValor aquisiçãoValor liquidoAno de aquisiçãoValor estimadoCaraterísticas
1Mota de água5.000,00 € 19990.00 €Para abate
2Participação social A.A.C, SA – 49,6%1.963.500,00 €1.963.500,00 € Participações sociais - ações
3Participação social C, SA – 45,0%900.000,00 €900.000,00 € Participações sociais - ações
4Participação social A, SA – 12,9%225.000,00 €225.000,00 € Participações sociais - ações
5Participação social I, SA – 3,0%15.000,00 €15.000,00 € Participações sociais - ações
6Participação social AU, Lda – 16,7%25.000,00 €25.000,00 € Participações sociais - ações
7Participação social CT, Lda – 2,5%12.500,00 €12.500,00 € Participações sociais - ações
8 Participação social S, Lda – 50%2.500,00 €2.500,00 € Participações sociais - ações
9Participação social F, Lda – 24%72.000,00 €72.000,00 € Participações sociais - ações
10Participação social G – 0,2%100,00 €100,00 € Participações sociais - ações
TOTAL3.220.600,00 €3.215.600,00 € 0,00 €

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4. Fundamentos do recurso
O processo especial para acordo de pagamento (PEAP) é um dos processos especialíssimos previstos no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante CIRE), introduzido pelo Decreto-Lei n.º 79/2017 de 30 de junho.
Este diploma, concretizando o denominado Programa Capitalizar[1] que elegia como uma das medidas “Reservar o recurso ao PER a pessoas coletivas”[2], criou um novo regime pré-insolvencial para devedores em cuja titularidade não se encontre uma empresa, declarando no seu preâmbulo “Apostou-se na credibilização do processo especial de revitalização (PER) enquanto instrumento de recuperação, reforçou-se a transparência e a credibilização do regime e desenhou-se um PER dirigido às empresas, sem abandonar o formato para as pessoas singulares não titulares de empresa ou comerciantes.”
Ao tempo a jurisprudência divergia sobre a possibilidade de o PER poder ser usado por pessoas singulares, vindo claramente a pender para a respetiva inadmissibilidade, como resulta da jurisprudência do STJ nesta matéria, que decidiu, de forma uniforme, no sentido de inaplicabilidade às pessoas singulares, não comerciantes, não empresários, do processo especial de revitalização[3].
O Decreto-Lei n.º 79/2017 “criou” o novo PEAP por decalque do antigo PER[4] aplicando algumas medidas do PER atual (no essencial a suspensão dos prazos de prescrição e caducidade oponíveis pelo devedor, a proibição de suspensão de prestação de serviços públicos essenciais, o efeito parcialmente suspensivo da sentença do recurso de não homologação e o regime de encerramento e de cessação de funções do administrador judicial provisório), e diferenciando-o pelos respetivos sujeitos – pessoas jurídicas e singulares não titulares de empresas e por uma particularidade relativa aos devedores singulares, em caso de não aprovação, com a obrigatoriedade de concessão de oportunidade para apresentação tempestiva de plano de pagamentos ou requerimento de exoneração do passivo restante.
Tal tem a vantagem, para o intérprete-aplicador, de ter já presentes e, em muitos casos discutidos e trabalhados, os aspetos essenciais deste novo regime, como é, claramente o caso dos pressupostos de homologação do plano de pagamento aprovado, previstos no nº5 do art. 222º-F do CIRE, em termos essencialmente similares, ressalvadas as devidas diferenças, à previsão do art. 17º-F nº 7 do mesmo diploma: depois de prescrever, no nº2 do preceito que qualquer interessado pode solicitar a não homologação do plano, nos termos e para os efeitos previstos nos arts. 215º e 216º, com as devidas adaptações, o nº5 do art. 222º-F prescreve:
«O juiz decide se deve homologar o acordo de pagamentos ou recusar a sua homologação (…) aplicando, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos artigos 215º e 216º.»
No caso concreto, quatro[5] credores pediram a não homologação do acordo de pagamento apresentado pelo devedor, todos tendo votado contra o referido plano, pese embora, relativamente a um dos credores, tais votos não tenham sido contabilizados. Todos invocaram o disposto no art. 216º nº1, al. a) do CIRE, dois deles invocaram a violação do princípio da igualdade dado o tratamento dado aos créditos tributários e três invocaram a violação não negligenciável de regras procedimentais por não terem intervindo, por qualquer forma nas negociações, apesar de terem manifestado o propósito de o fazer.
A decisão recorrida compõe-se de duas partes distintas: a primeira verificou a aprovação do plano apresentado pelo devedor e, não tendo sido por qualquer forma, impugnada, encontra-se coberta pelo caso julgado[6]; a segunda considerou verificada a ausência de negociações entre as partes, configurando-a como violação não negligenciável de regras procedimentais, considerou desproporcionado o tratamento dado aos credores tributários e demais credores no plano considerando-o como violação não negligenciável das normas aplicáveis ao conteúdo do acordo e indicou que na ausência do acordo de pagamento o cenário mais provável será a insolvência do devedor e a liquidação do seu património, pelo que, tendo em conta o património indicado sempre receberão mais em rateio após liquidação do que o 1% que o plano se propõe pagar-lhes, considerando verificada a situação prevista no art. 216º, nº1, al. a) do CIRE, relativamente a todos os credores, com exceção da Autoridade Tributária e, em consequência, recusou a homologação do acordo de pagamento.
O recurso interposto argumenta que:
- a empresa responsável pelas negociações tentou contactar os credores, sem qualquer resposta da parte destes, não conseguindo, porém, comprovar tais contactos devido a um problema informático; os credores mantiveram uma postura totalmente passiva, não reagindo aos contactos, não contactando a devedora e não apresentando qualquer proposta, apenas invocando violação de regras procedimentais, com má-fé, depois do plano aprovado; comunicou aos seus credores toda a informação relevante e estes não reagiram, não suscitaram qualquer questão e não foram, por qualquer meio, impedidos de participar nas negociações, não existindo qualquer impedimento à homologação da proposta de acordo de pagamento aprovado pelos credores;
- o modo de pagamento à Autoridade Tributária, a partir do momento em que foi aditado o nº3 ao art. 30º da LGT autonomizou-se em relação ao CIRE e prevalece sobre qualquer legislação especial, pelo que, estando o devedor vinculado ao pagamento, tal implica forçosamente a inaplicabilidade, no caso, do princípio da igualdade;
- quanto ao disposto no art. 216º nº1, al. a) do CIRE, defende que o entendimento da sentença recorrida assenta num equívoco sobre o valor do património do devedor, que, no plano, se estimou sem valor, visto ser composto por participações sociais de sociedades, insolventes, inativas, ou em revitalização. Assim, todos os credores ficam em melhor situação ao abrigo do acordo de pagamento do que na sua ausência, cenário em que pouco ou nada receberão. O pedido com este fundamento, alega, corresponde a um abuso de direito por parte dos credores.
Considera, assim o devedor, que a decisão recorrida violou o disposto nos arts. 194º, 215º e 216º nº1, al. a) do CIRE e 30º nºs 2 e 3 da LGT.
Importa, pois, conhecer os fundamentos do recurso, verificando, e pela ordem por que estão previstos na lei, os motivos de recusa de homologação: violação não negligenciável de normas procedimentais, violação não negligenciável de normas aplicáveis ao conteúdo do acordo, e previsibilidade, para os credores que o arguiram, de que a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano, nos termos dos arts. 222º-F, nº5, 215º, 194º, 195º e 216º do CIRE.
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            4.1. Violação não negligenciável de normas procedimentais
A determinação do que seja uma violação não negligenciável tem sido trabalhada desde a entrada em vigor do CIRE, constituindo mais um dos conceitos indeterminados cujo preenchimento cabe ao julgador, face aos dados concretos, seguindo certos parâmetros ou linhas orientadoras.
Como escreve Menezes Cordeiro in Manual de Direito de Trabalho, pg. 819, a propósito do conceito de justa causa de despedimento, “os conceitos indeterminados põem em crise o método da subsunção: a sua aplicação nunca pode ser automática, antes requerendo decisões dinâmicas e criativas que facultem o seu preenchimento com valorações. A concretização de um conceito indeterminado como o de justa causa obriga a uma ponderação dos valores vocacionados para intervir, perante o caso concreto.”
Continuando a citar o mesmo autor, este tipo de regulamentação remete o intérprete-aplicador para casuísmos os quais, devidamente ordenados, permitem repensar a fórmula indeterminada inicial. E conclui que “os conceitos indeterminados viabilizam fórmulas concretizadoras que, depois, devem ser confrontadas com o próprio conceito básico.”
Violação não negligenciável será “apenas aquela que importe uma lesão grave de valores ou interesses juridicamente tutelados, isto é, uma lesão de tal modo grave que nem em atenção ao princípio da recuperação e aos interesses associados a este, o juiz pode deixar de recusar-se a homologar o plano, inviabilizando com isso a recuperação. Está implícito na norma o dever de o juiz proceder a uma ponderação entre o interesse da recuperação e os interesses que sejam, em concreto, visados pela norma violada com vista a decidir se, em homenagem ao primeiro a violação pode ser negligenciada.”[7]
Carvalho Fernandes e João Labareda apontam como critérios de aferição, sempre em concreto, de negligenciabilidade, numa primeira linha, a distinção entre as violações que atinjam apenas regras de tutela particular, que podem ser afastadas com o consentimento do titular da proteção e as que acarretem a produção de um resultado não autorizado por lei[8] e, de forma mais vasta, acolhendo o critério geral previsto no art. 195º do CPC, isto é, a relevância da nulidade para a boa decisão da causa, “o que significa se interfere ou não com a justa salvaguarda dos interesses protegidos ou a proteger – nomeadamente no que respeita à tutela devida à posição dos credores e do devedor nos diversos domínios em que se manifesta…”, posição que merece anotação concordante de Nuno Salazar Casanova e David Sequeira Dinis[9], frisando tratar-se sempre de uma decisão casuística.
Trata-se de posição maioritariamente acolhida na jurisprudência[10] como resulta, em amostra aleatória, dos Acs. TRP de 16/12/2015 (Inês Moura), TRP de 08/07/2015 (Manuel Domingos Fernandes), TRC de 11/10/2017 (Maria Catarina Gonçalves), TRC de 27/06/17 (Isaías Pádua), TRC de 16/03/2016 (Maria Domingas Simões), TRG de 25/05/17 (Fernando Fernandes Freitas) e TRL de 03/12/2020 (Paula Cardoso).
No caso, sendo arguida a violação de regras procedimentais, importa igualmente esclarecer o âmbito destas normas. O PEAP, tal como o PER, é um processo hibrido, decorrendo parte em tribunal, o qual intervém em momentos chave (na admissão, na decisão da impugnação da lista de créditos, na homologação do plano aprovado ou sua recusa) e parte entre o devedor e os seus credores, com a coordenação do administrador judicial provisório. Os vícios de procedimento tanto podem referir-se ao processo judicial – onde poderão inclusive cair sob a alçada das regras processuais civis, aplicáveis por via do disposto nos arts. 222º-A nº3 e 17º nº1 do CIRE – como ao processo negocial. Enquanto que os primeiros serão tratados no processo judicial nos termos “clássicos”, de arguição, contraditório e decisão, os segundos relevam apenas no momento do juízo de homologação, dado que todo o processo negocial decorreu extrajudicialmente.
“Muito embora a lei não o defina, deve entender-se que as “regras procedimentais” são aquelas que visam regular a forma como deverá desenrolar-se o processo, enquanto que as segundas (as normas de conteúdo) se reportarão ao dispositivo do plano de revitalização, bem como aos princípios que lhe devam estar subjacentes. Ou seja, as primeiras são todas aquelas que regem a atuação a desenvolver no processo, que incluem os passos procedimentais que nele devem ser dados até que os credores decidam sobre as propostas que lhes foram apresentadas – incluindo, assim, as regras que disciplinam as negociações a encetar entre os credores e o devedor e as regras que regulam a aprovação e votação do plano – e, bem assim, as relativas ao modo como o plano deve ser elaborado e apresentado, enquanto que as segundas (as normas de conteúdo) serão todas as respeitantes à parte dispositiva do plano, mas além delas, ainda aquelas que fixam os princípios a que ele deve obedecer imperativamente.”[11]
No caso concreto, as regras procedimentais em causa são as regras que regem as negociações, ou seja, tratou-se de arguição de violação de regras procedimentais relativas ao processo negocial.
Foram os seguintes os fundamentos da decisão do tribunal recorrido que considerou ter ocorrido violação não negligenciável de regras procedimentais:
“O primeiro fundamento que os credores Banco B, FC e Banco C invocam para a não homologação do plano de recuperação baseia-se na alegação de que o mesmo foi-lhes apresentado já definido e concretizado, apenas para votação, nem ter sido objecto de negociação. O devedor e o Administrador Judicial Provisório (este por remissão para o requerimento daquele) alegam que tal não é verdade uma vez houve negociações entre devedor e estes credores.
Notificado, o Sr. Administrador Judicial Provisório consignou que os requerentes foram contatados com vista a intervir nas negociações, porém os mesmos não intervieram. O devedor, por seu turno, alegou que a empresa que contratou para encetar negociações com os credores tentou contactar os mesmos, porém sem resposta, assumindo uma posição passiva, sem que colocasse qualquer questão ou que fosse impedido de o fazer.
Posteriormente, veio o Sr. Administrador Judicial Provisório juntar aos autos um e-mail que teria sido remetido para contacto com os credores o qual, na verdade, é apenas um e-mail a notificar os credores do depósito do Plano e do prazo para o votarem.
Notificado o devedor para que esclareça em que momento foram os credores Banco C, FC e Banco B contactados para negociar e de que forma tal ocorreu, concretizando com datas, documentos remetidos e contactos havidos, veio o mesmo consignar que devido a um problema informático não dispunha de comprovativos das comunicações encetadas com os credores. Notificado, novamente, sob pena de considerar que os contactos não existiram, o devedor nada consignou nos autos.
Ora, conjugando as declarações destes 3 credores (num universo de 12 credores), verifica-se que os mesmos alegam exactamente o mesmo: contactaram o devedor, mostrando interesse em participar nas negociações, porém não mais foram contactados com vista a negociar. O devedor alega que contactou, mas não dispõe de comprovativos desses contactos, o que, de todo, não se compreende, ainda que perante a alegação de problema informático. O Sr. Administrador Judicial Provisório junta o contacto com os credores o qual se consubstancia na versão final do Plano e comunicação do prazo para votar.
Como se referiu no despacho com a referência 14603898997, estamos perante factos negativos invocados pelos credores indicados (ausência de contactos ou de negociação). Cabia aos credores a invocação e prova de tais factos, nos termos do art. 342.º, n.º 1 do Código Civil. Os credores invocaram os factos em apreço porém, sendo factos negativos inexistia qualquer prova que lhes fosse permitido produzir dos autos. Assim, cabe ao devedor alegar e provar que contactou os credores com vista a negociarem nos autos, nos termos do n.º 2, do mesmo artigo. Ora, o devedor alegou não conseguir encontrar essa prova, por dificuldades informáticas. Considerando que a prova cabe ao devedor, nestes autos, nos termos supra descritos, temos que caso não o logre fazer se considerará a inexistência de negociações e, bem assim, a existência de violação não negligenciável de regras procedimentais, o que conduzirá à recusa do Acordo apresentado
Assim, perante o que fica dito, impõe-se concluir que nos autos apenas podemos ter como comprovado a apresentação do requerimento inicial pelo devedor, com todos os esclarecimentos aí prestado, bem como a comunicação destes três credores de que pretendiam participar nas negociações. Após este momento, o único contacto comprovado com estes credores reporta-se à comunicação do depósito do Plano e prazo para votar.
É verdade, que em momento algum no decurso do prazo de negociações veio qualquer um destes credores alertar aos autos de que não estava a ser contemplado nas negociações, porém, fizeram-no a final e tal tem de ser relevado.
Pelo exposto, no que tange à invocada ausência de negociações entre as partes, entende-se que a mesma se mostra verificada nos autos.
(…)
Ora, o Processo Especial para Acordo de Pagamento visa, como consta do art. 222.º-A, n.º 1, do CIRE “estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes acordo de pagamento”. Inexistindo negociações, não se pode ter por cumprida a finalidade do PEAP. Por seu turno, nos termos do nº 10 do art. 222.º-D, n.º 10, do CIRE “Durante as negociações os intervenientes devem atuar de acordo com os princípios orientadores aprovados pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 43/2011, de 25 de outubro”. Segundo esta Resolução do Conselho de Ministros “se nos casos mais simples as negociações podem envolver todos os credores, nas situações mais complexas ou com grande número de credores pode ser preferível que apenas participem os principais credores. Nestes casos, o acordo extrajudicial que venha a ser conseguido não pode, por si só, afectar os direitos de outros credores não envolvidos nas negociações ou impor-lhes qualquer obrigação que não aceitaram, podendo ser necessário recorrer, então, aos mecanismos judiciais legalmente previstos para esse efeito”. No caso concreto, com 12 credores apenas, não se logra compreender porque não foram encetadas negociações com todos. Refira-se que de acordo com o segundo princípio daquela Resolução “Durante todo o procedimento, as partes devem actuar de boa-fé, na busca de uma solução construtiva que satisfaça todos os envolvidos”, e, nos termos do oitavo princípio da mesma “Toda a informação partilhada pelo devedor, incluindo as propostas que efectue, deve ser transmitida a todos os credores envolvidos e reconhecida por estes como confidencial (…)”.
Pressupõe-se, assim, a existência de negociações entre devedor e credores, sob pena de a finalidade do mesmo ser gorada.
Note-se, igualmente, que nos termos do art. 222.º-F, n.º 8 do CIRE, a decisão de homologação vincula todos os credores e não apenas os que votaram favoravelmente o Acordo apresentado, pelo que é extremamente penalizante aprovar um acordo que vincula credores sem que a estes tenha sido dada a oportunidade de negociar. E, diga-se que a responsabilidade de conduzir as negociações é do devedor pois este é que tem o domínio das propostas a efectuar, devendo fazê-las aos credores e subsequentemente negociar as mesmas, não cabendo aos credores contactar o devedor para apurar de propostas após terem manifestado a intenção de negociar.
Entendemos, pois, assim, que inexistiu negociação conducente à aprovação do Plano, pelo menos quanto a estes 3 credores, o que configura violação não negligenciável de regras procedimentais. Veja-se neste sentido o Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 08.07.2015 (Proc. n.º 261/14.8 TYVNG.P1), in www.dgsi.pt “Aliás, embora se possa dizer que antes da votação a credora D… teve conhecimento do plano que iria ser proposto para homologação, a verdade é que da missiva enviada não se retira, ainda que de forma implícita, qualquer convite à negociação. Pelo contrário, aquela missiva limita-se a remeter à credora em causa a versão final do Plano de Revitalização unicamente para votação, ou seja, tal como se diz e bem na decisão do que se tratou foi apenas de uma verdadeira “imposição”. Não se olvida que nos parece razoável que o devedor, primeiro, obtivesse o acordo com o C… (credor que, só por si, tinha uma percentagem de créditos superior aos 66,66% necessários para a aprovação do plano de recuperação). Mas subsequentemente, impunha a boa fé nas negociações que o plano fosse enviado à credora D…, para esta se pronunciar e de fazer observações antes do plano ser submetido à votação. É esta conduta, de boa fé nas negociações, que, genericamente, é imposta designadamente pelo segundo princípio orientador da Resolução do Concelho de Ministros nº 43/2011, de 29/09 atrás referida, e que não ocorreu neste processo. A credora D… foi completamente desconsiderada no período das negociações, sendo-lhe apenas apresentado um plano de recuperação terminado e fixado um prazo para votar. Evidentemente que o devedor não cumpriu os deveres que se lhe impunham durante as negociações (cfr. artº 17º-D, nº 10, do CIRE). Verifica-se, assim, uma violação das regras procedimentais e de uma violação não negligenciável. Importa, sopesar que a credora D… é detentora de um crédito de mais de 400.000,00 euros e, portanto, não podia ter sido desconsiderada desta forma.”.
Em face do exposto, procede este fundamento para não homologação do Acordo apresentado.”
O tribunal considerou assim violado o segundo princípio orientador previsto na Resolução do Concelho de Ministros nº 43/2011, de 29/09. Embora o tribunal refira também o 8º princípio, não apontou qualquer facto do qual se possa retirar o respetivo incumprimento (ou seja, que o devedor não partilhou toda a informação com todos os credores), nem dos autos resulta qualquer indício nesse sentido.
Concordamos em absoluto com o raciocínio do tribunal recorrido quanto à base factual da decisão – três credores alegaram e provaram ter declarado pretender participar nas negociações e alegaram não terem sido contactados pela devedora (ou seu representante) para negociar. A devedora alegou ter contactado os credores e que estes é que não reagiram ao seu contacto. No entanto não logrou juntar qualquer indício desses contactos, alegando problemas informáticos. O ónus da prova quanto aos factos negativos alegados pelos credores estava do lado da devedora e esta não ensaiou, sequer, tal prova.
Frisemos, porém, que em nenhum momento nenhum credor alegou a falta de cumprimento, pelo devedor, do disposto no art. 222º-D nº1 do CIRE, nem a falta de comunicação da proposta de acordo de pagamentos (nos autos sempre denominado Proposta de plano de recuperação) que veio a ser votada.
O que temos, assim apurado é que três credores declararam pretender participar nas negociações e que não foram chamados às mesmas, tendo-o sido apenas para votar uma proposta (que votaram).
Tendo em conta que o art. 222º-F nº8 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas estatui expressamente que a decisão de homologação vincula os credores mesmo que não hajam participado das negociações, sem qualquer distinção de se não o fizeram porque não quiseram ou de se não o fizeram porque a tanto não foram chamados ou admitidos, temos uma violação negligenciável de regra procedimental (222º-D nºs 6 a 10 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas).
Não temos, porém, qualquer evidência que o devedor não tenha agido de boa-fé, apenas a realidade objetiva de que estes três credores pretenderam participar nas negociações e não foram chamados a fazê-lo. Não podemos, pois, confirmar o juízo do despacho recorrido de que foi violado o segundo princípio da Resolução do Concelho de Ministros nº 43/2011, de 29/09.
A devedora deveria ter, até porque estamos a lidar com um universo de 12 credores, negociado com todos eles. No entanto, não o tendo feito, mais uma vez não resulta dos autos qualquer relevância no resultado final, uma vez que a lei estende a eficácia a decisão de homologação também aos credores que não participaram nas negociações, de forma abstrata, ou seja, sem valorar a causa da não participação. Por outro lado, os credores em causa puderam, como o fizeram, reclamar créditos, impugnar a lista e votar a proposta de plano.
Esta violação é, no caso concreto negligenciável porquanto nenhum dos credores desconhecia a existência do PEAP (todos reclamaram créditos) e que a sua finalidade é a de negociar com os credores. Cientes da existência do processo e da sua finalidade é de exigir uma postura pró-ativa também dos credores que não podem quedar-se na inatividade enquanto decorre o prazo que a lei prevê para as negociações.
Discordamos assim, do entendimento de que só sobre o devedor recai o encargo de agir de boa-fé buscando uma solução construtiva que satisfaça todos os interessados, entendendo que também os credores estão sujeitos a estas regras e que, não sendo impedidos de participar – como sucederia se o devedor não desse cabal cumprimento ao disposto no art. 222º-D nº1[12] –, podem e devem tomar a iniciativa de participar, nomeadamente interpelando o devedor ou o administrador judicial provisório, que tem nesta fase as funções previstas no nº 9 do art. 222º-D, caso não sejam contactados durante o período de negociações, cujos termos inicial e final conhecem, por serem determinados pelo processo que corre em tribunal.
Quanto a este primeiro fundamento de recusa de homologação, entendemos, assim, não estar o mesmo verificado.
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4.2. Violação do princípio da igualdade
Uma das regras aplicável nos termos do disposto no nº5 do art. 222º-F do CIRE é o disposto no art. 194º do mesmo diploma, no qual se estabelece:
«1 - O plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas.
2 - O tratamento mais desfavorável relativamente a outros credores em idêntica situação depende do consentimento do credor afectado, o qual se considera tacitamente prestado no caso de voto favorável.
3 - É nulo qualquer acordo em que o administrador da insolvência, o devedor ou outrem confira vantagens a um credor não incluídas no plano de insolvência em contrapartida de determinado comportamento no âmbito do processo de insolvência, nomeadamente quanto ao exercício do direito de voto.»
O princípio da igualdade arranca do tratamento, por princípio, de todos os credores por igual, permitindo, porém, diferenciações justificadas por razões objetivas.
Esta dimensão material do princípio – devem ser tratadas por igual situações iguais e de forma distinta, situações distintas -, corporiza uma das mais importantes e convocadas regras aplicáveis ao conteúdo do plano ou do acordo, e tem sido tratado pela jurisprudência como uma regra imperativa, que arranca diretamente do tecido constitucional, cuja violação é, por regra, não negligenciável[13].
Perpassa quer na jurisprudência do Supremo, quer das Relações, que, exceção feita aos créditos tributários, as razões objetivas diferenciadoras têm que constar do plano. Será essa a única forma de controlo do cumprimento do princípio.
São em geral aceites noções como credores estratégicos (não no sentido das necessidades de aprovação, mas das necessidades dos devedores), como por exemplo no Ac. TRC de 17/03/15; e, em geral, a diferenciação baseada na diferente classificação de créditos é permitida (Ac. TRE de 17/03/16 e de 10/09/15; Ac. TRP de 07/04/16; Ac. TRL de 28/01/16); ainda assim, quando baseadas na diferente classificação de créditos, a jurisprudência não tem deixado de censurar excessos: como no caso do Ac. TRE de 21/04/16, no qual todos os créditos eram perdoados à exceção do credor hipotecário, ou no caso do Ac. TRG de 25/02/16, em cujo plano o credor hipotecário recebia integralmente o seu crédito, enquanto os demais se viam reduzidos a 15%, apontando-se que a revitalização estava a ser integralmente suportada por estes últimos credores.
No caso dos autos, a diferenciação apontada como excessiva e desproporcionada é a provisão no acordo de pagamento de 100% do crédito devido à Autoridade Tributária e o pagamento de 1% dos demais créditos relativamente aos quais o devedor é fiador ou avalista e cujo pagamento lhe venha a ser exigido.
Do teor da proposta resulta que, quanto aos demais créditos, comuns e relativamente aos quais o devedor não é, nem fiador, nem avalista, não serão afetados pelo plano, sendo exigíveis por inteiro. E note-se que, embora não sendo significativos, tais créditos foram relacionados – por exemplo, quanto ao credor Banco B o crédito por saldo a descoberto ou o credor LS por empréstimo. Não sendo, quanto a estes estabelecida qualquer proposta, tal implica que tais créditos ficam intocados por este acordo.
O que implica que a distinção traçada é, quer entre o pagamento de 100% à Autoridade Tributária e o pagamento de 1% aos demais credores cujos créditos resultam de fiança/aval, quer, com mais exatidão, entre os créditos de que o devedor é devedor principal (que incluem os créditos à AT) e os créditos em que é devedor na qualidade de fiador/avalista[14].
Quanto aos credores que ficam sujeitos à cláusula de 1% diremos, em primeiro lugar que, dada a natureza do aval, a parte do acordo que prevê o pagamento pelos devedores principais é, nesta sede, para este efeito, e neste processo especial para obtenção de acordo de pagamento, irrelevante.
O aval é uma garantia pessoal das obrigações, característica dos títulos de crédito, que, à semelhança da fiança, coloca o património do avalista a responder solidariamente por dívidas alheias, mas diverge daquela na medida em que não constitui uma obrigação acessória da dívida avalizada - o avalista passa a responder como devedor de uma obrigação própria - arts. 30.º ss. LULiv e 25.º ss. LUcheq.
Assim sendo, ao propor o pagamento de 1% caso venha a ser-lhe exigido o pagamento, prevendo previamente que as obrigações serão cumpridas pelo devedor principal nos termos que lhes sejam aplicáveis, o devedor está a propor, literalmente, e sob pena de violação de regras imperativas[15], pagar 1% das suas obrigações próprias, como avalista.
Feitas estas considerações, verifiquemos os argumentos em disputa.
A decisão recorrida entendeu que “Se é certo que condições objectivas justificam a tutela dos créditos do Estado com base no Princípio da indisponibilidade dos Créditos Tributários, constante do art. 30.º, n.º 2 e 3 da Lei Geral Tributária, a verdade é que não se pode considerar justificada uma tutela que implique uma desproporção desmedida com o pagamento dos demais créditos, como sucede no caso concreto. Neste ponto, concordamos, pois, com a decisão do Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 30.04.2019 (Proc. n.º 2385/18.9T8CBR-E.C1), in www.dgsi.pt, segundo a qual (…). Nos presentes autos, a desproporção entre o pagamento integral do crédito da Autoridade Tributária, com manutenção de juros vencidos e vincendos, e os créditos comuns que verão, na melhor das hipóteses, ser pago apenas 1% do crédito, entendemos que ocorre violação do princípio da igualdade que consubstancia violação não negligenciável das normas aplicáveis ao conteúdo do Acordo apresentado, pelo que procede este argumento para a não homologação do plano de recuperação.”
O devedor e recorrente defende que, dada a especial natureza dos créditos tributários, não se aplica sequer o princípio da igualdade, dado que o devedor está vinculado ao pagamento nos termos previstos.
Nos termos do art. 30º nº2 da LGT o crédito tributário é indisponível só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e legalidade tributária.
A Lei nº 55-A/2010 de 31/12 aditou a este preceito um nº3 estabelecendo que o disposto no nº2 prevalece sobre qualquer legislação especial, em clara tomada de posição quanto à jurisprudência uniforme que se havia formado desde a entrada em vigor do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Temos, assim, uma regra clara no sentido da indisponibilidade do crédito tributário e como únicas exceções a esta regra os princípios da igualdade e legalidade tributária.
O facto de, e como já referimos, os créditos tributários serem a única exceção identificada pela jurisprudência à necessidade de fazer constar do plano ou do acordo as razões objetivas que justificam um tratamento diferenciado, não tem impedido a discussão destes créditos à luz do princípio da igualdade, que, como princípio fundamental que é, se aplica a todos os créditos, públicos e privados.
É assim que encontramos, precisamente à luz do princípio da igualdade, no Ac. STJ de 25/03/14 (relator Fonseca Ramos)[16] uma extensa análise do diferente tratamento dado aos créditos tributários à luz do princípio da igualdade, na vertente do princípio da proporcionalidade e da adequada ponderação de interesses, tendo por referência o tratamento dado, no mesmo plano, a créditos laborais. Foi considerado que os créditos tributários visam a implementação de um sistema previdencial, situando-se num patamar diferente, supra individual, o que objetivamente justifica a diferença de tratamento.
De facto, o princípio da igualdade não está arredado na análise comparativa entre o tratamento dado aos créditos tributários e o tratamento dado aos demais créditos. É ainda o princípio da igualdade que explica o regime dos créditos tributários, concorde-se ou não com a extensão da tutela. Mas a análise do excesso ou desproporção é comparativo e engloba o tratamento dado a estes créditos e aos demais.
O que se censurou na decisão recorrida não foi o tratamento dado aos créditos tributários, que está plenamente justificado pelo respetivo regime legal imperativo, por sua vez ancorado na sua diferente natureza. O que se censurou na decisão recorrida foi a desproporção entre o tratamento (legal) dado aos créditos tributários na proposta de acordo de pagamentos e o tratamento dado aos créditos não tributários resultantes de avais/fianças, prestadas pelo devedor. O que se censurou não foi o pagamento de 100% dos créditos tributários, mas sim a diferença de 99% entre o pagamento previsto para os créditos tributários e o pagamento previsto para os créditos relativamente aos quais o devedor surge como avalista. E por ter sido essa a censura efetuada, com a qual, adiante-se, se concorda, a decisão recorrida não violou, por qualquer forma os nos 2 e 3 do art. 30º da LGT, improcedendo tal argumento do recorrente.
Este é exatamente um daqueles casos relatados pela jurisprudência como revelando o traço de excesso ou desproporção que reclamam a intervenção do princípio da igualdade. A diferente natureza dos créditos justifica o tratamento dado aos créditos tributários, mas não justifica o tratamento dado aos demais créditos. E não pode deixar de se notar que não há qualquer justificação, sequer ensaiada, que radique na diferente classificação dos créditos até porque os créditos do Estado se mostram também relacionados como comuns.
E tal desproporção sai agravada pelos números concretos: o devedor propõe-se pagar 100% de € 177.833,13 à Autoridade Tributária, e 1% de € 16.810.461,00, ou seja, € 168.104,61 aos demais credores em relação aos quais é avalista. Temos que nos perguntar o que releva mais no diagnóstico do devedor como estando em situação económica difícil ou insolvência iminente: uma dívida de cerca de 170 mil euros à AT, ou quase dezassete milhões em dívida a outros credores?
Sem o relevar, por não terem sido objeto de análise na decisão recorrida e por, de facto, serem irrelevantes no universo creditício do devedor, não pode deixar de se referir que se é assim em relação aos créditos tributários, mais o é em relação aos demais créditos comuns que saem intocados deste acordo de pagamentos.
A proposta de acordo de pagamento revela, assim, violação não negligenciável de norma imperativa aplicável ao conteúdo do plano, o disposto no art. 194º do CIRE, que justifica a não homologação da proposta de acordo de pagamento, nos termos dos arts. 215º e 222º-F nº5 do mesmo diploma.
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4.3. Não homologação a solicitação dos interessados, ao abrigo do disposto no art. 216º, nº1, al. a) do CIRE
Passemos à análise de se a situação dos credores que requereram a não homologação com este fundamento ao abrigo deste plano é previsivelmente menos favorável do que a que teriam na ausência de qualquer plano.
Estabelece o art. 216º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, na versão aplicável aos autos:
«1. O juiz recusa ainda a homologação se tal lhe for solicitado pelo devedor, caso este não seja o proponente e tiver manifestado nos autos a sua oposição, anteriormente à aprovação do plano de insolvência, ou por algum credor ou sócio, associado ou membro do devedor cuja oposição lhe haja sido comunicada nos mesmos termos, contanto que o requerente demonstre, em termos plausíveis, em alternativa que:
a) A sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano, designadamente face à situação resultante de acordo já celebrado em procedimento extrajudicial de regularização de dívidas;
b) O plano proporciona a algum credor um valor económico superior ao montante nominal dos seus créditos sobre a insolvência, acrescido do valor das eventuais contribuições que ele deva prestar.
(…).»
Como escrevem João Labareda e Carvalho Fernandes[17]  “O modo como se acha formulada a alínea a) - (…) – implica que na prova da situação nele referenciada se procede a um exercício intelectual de prognose, frequentes vezes complexo, que se traduz em comparar o que se antevê resultar da homologação do plano, para o reclamante, com aquilo que aconteceria na ausência dele.
Relativamente aos credores, isto reconduz-se a cotejar quanto recebem com o plano e quanto se estima receberiam sem ele.”
A adaptação desta norma quer ao PER, quer ao PEAP, que deve ser feita com as devidas adaptações, impõe desde logo, como refere Catarina Serra[18] excluir do universo de potenciais interessados legitimados para formular este pedido, o próprio devedor, já que a proposta foi necessariamente apresentada por ele (o que pode não suceder em processo de insolvência). Também resulta do cotejo do regime legal respetivo com o da aprovação de plano de insolvência que bastará, como manifestação de oposição ao plano ou proposta de acordo, o voto desfavorável dirigido ao Administrador Judicial Provisório[19] - circunstâncias não postas em crise na presente apelação.
Mas a adaptação mais importante a fazer será a de imposição de um outro pré-juízo, dada a natureza pré-insolvencial do procedimento. O cenário de liquidação é conatural na previsão do art. 216º porque tratamos de um devedor que já está declarado insolvente. Mas em procedimento preventivo a que um devedor tem acesso em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente, a probabilidade de, findo o procedimento, o devedor já estar insolvente e ser mais provável que se lhe siga a declaração de insolvência e a liquidação universal convive com a hipótese de o devedor, mesmo sem obter a aprovação do acordo, não estar em situação de insolvência atual[20].
Assim sendo, o credor que requer a não homologação com este fundamento deve, no mínimo, alegar a indiferença das duas possibilidades e, em caso de distinção, as consequências num e noutro cenário, não nos parecendo exigível a alegação (e muito menos a demonstração) que que um dos cenários é mais provável que outro.
Analisemos ora os elementos do caso concreto.
O despacho recorrido indicou ser o cenário mais provável o da insolvência do devedor e a liquidação do seu património. Achou 1% do valor do património indicado pelo devedor no acordo e concluiu que, nesse cenário, os credores em causa receberiam € 1.132.534,32, que representam 19 vezes mais que os € 59.824,32 que o devedor se propõe pagar-lhes. Indicou ainda que, não sendo decretada a insolvência, os credores obterão maior satisfação em processo executivo.
Analisou a circunstância de os bens que irão satisfazer os credores serem os mesmos nos dois cenários, e que, em caso de homologação, dado que várias das sociedades estão também em processo de recuperação, existirem poucas hipóteses de valorização das participações sociais que constituem o património do devedor.
Finalmente balanceou a situação dos credores com a necessidade de permitir ao devedor a sua recuperação financeira e concluiu que, no caso concreto, tratando-se de um particular com bens de valor elevado, os prejuízos dos credores são claramente superiores ao beneficio obtido com a aprovação do plano, pelo que procedem os fundamentos invocados nos termos da al. a) do nº1 do art. 216º do CIRE.
O apelante aponta que todo o raciocínio da decisão está inquinado por um equívoco dado que o valor estimado dos bens do recorrente é de € 0,00, dado que todas as sociedades comerciais estão, praticamente, insolventes e em fase de liquidação ou inativas ou em PER, pelo que as participações sociais não têm qualquer valor patrimonial. Assim sendo, conclui, todos os credores ficam numa situação mais favorável ao abrigo do plano que na sua ausência, concordando ser o cenário da insolvência o mais provável.
A primeira nota a realçar é de que o ónus da demonstração, em termos de verosimilhança, pertence ao interessado que requer a não homologação. Este não é um fundamento de não homologação oficioso como os que vimos analisando, estando dependente de arguição pelo interessado e de demonstração por este, em termos plausíveis[21], considerando o contexto e prazos aplicáveis, de que a sua situação é previsivelmente menos favorável que a que interviria na ausência de qualquer plano[22].
Todos os credores que solicitaram a não homologação com este fundamento votaram contra a proposta de acordo de pagamento, nenhuma questão tendo sido suscitada quanto a esta condição de funcionamento do disposto no art. 216º do CIRE.
O Banco B, SA especificou que o seu credito respeita a aval prestado pelo devedor a sociedade (AAC, SA), já declarada insolvente, especificando o processo e seu estado. Considera o cenário de insolvência e liquidação do património do devedor o cenário expetável e que, nesse cenário sendo concedido o beneficio da exoneração do passivo restante, seria por si recuperado um valor superior ao contemplado na proposta.
EC, DAC alegou que o proposto não corresponde, sequer, a uma proposta de pagamento, não alegando qualquer circunstância em concreto que não os termos propostos pelo devedor.
FC Plc. alegou ser credor de € 41.129,77 relativo a aval prestado pelo devedor em letra aceite pela sociedade F – Comércio de Automóveis, Peças e Acessórios, Lda, crédito em relação ao qual já corre ação executiva contra o devedor, sendo que aquela sociedade já se encontra insolvente e com o processo de insolvência encerrado por realização do rateio final, pelo que a proposta quanto a si se analisa no pagamento de 1% no prazo de 30 dias após a homologação. Considera como cenário mais provável a insolvência do devedor, liquidação do património e exoneração do passivo restante, que defende permitirem recuperar mais que o valor em causa. Mais refere que em cenário de não insolvência retomará a penhora no vencimento, que já decorria, pelo que, em menos de dois meses receberá mais que o que o devedor se propõe pagar-lhe.
Banco C, SA expôs que parte dos créditos reclamados correspondem a aval prestado pelo devedor à sociedade AAC, SA, já declarada insolvente e parte a aval prestado à sociedade I, SA, relativamente à qual foi homologado plano de recuperação em PER, que se encontra em incumprimento e que, em termos práticos, porque prevê quanto a si um pagamento nulo, a sua situação se antevê menos favorável que a que decorreria da ausência de qualquer plano.
Concordamos que dado o nível de rendimentos e património declarado pelo devedor neste procedimento (que serão os elementos a ponderar), o cenário da insolvência e liquidação do património do devedor é o mais provável. Sendo o devedor uma pessoa singular é elegível para a exoneração do passivo restante, que, assim, pode ser considerada no cenário de verosimilhança que este fundamento de recusa de homologação exige.
Os elementos fornecidos pelos credores são, em geral, a pura evidência de que o devedor se propõe pagar-lhes 1% dos seus créditos, o que, concordemos, é bastante impressivo. Dos pedidos dos credores Banco C, FC e Banco B resultam mais elementos quanto ao valor do património do devedor, com a enumeração de várias das sociedades de cujas participações o devedor é titular em situação de insolvência ou em revitalização aprovada. Só o credor FC alegou a existência de processo executivo em curso e descontos no vencimento do devedor. O credor EO não alegou qualquer outra circunstância.
O raciocínio da decisão recorrida baseou-se no valor nominal das participações sociais indicadas pelo devedor como seu património, desconsiderando que dos autos resultavam já elementos (aliás, da própria proposta de plano) no sentido de que parte das sociedades estavam já insolventes ou em situação difícil. O próprio facto de o grosso dos créditos corresponder a avais prestados a essas sociedades ou a sociedades listadas e haver já créditos não condicionais indiciava que não se poderia eleger como cenário a valorização das participações sociais pelo seu valor nominal.
No entanto a posição oposta – defendida pelo devedor – também não se mostra apoiada. O devedor não estimou em € 0,00 o valor das participações sociais que listou, ao contrário do que alega. Limitou-se a deixar as colunas correspondentes em branco e expressamente só estimou como nulo o valor de um veículo. Se sabemos já que algumas das sociedades estão insolventes (uma delas aparentemente já extinta juridicamente antes da apresentação da proposta) não o sabemos em relação a cada uma delas. Há pelo menos uma sociedade que teve plano aprovado em PER e a entidade patronal do devedor que, à data de início deste procedimento estava ativa e a pagar o vencimento deste. Ou seja, é possível que o valor destas participações sociais não seja nulo.
Ou seja, na verdade, neste momento, não sabemos qual o valor do património do devedor, nem para estimar que 1% do valor de liquidação é mais que o que aqui iriam receber se o plano fosse homologado, nem para concluir o contrário.
O único elemento certo, neste momento, é o vencimento do devedor e a possibilidade de desconto no mesmo ou, em cenário de exoneração do passivo restante, o que exceda o montante mínimo de sobrevivência que venha a ser fixado pelo tribunal. Se sabemos o montante do vencimento, desconhecemos as despesas do mesmo em pormenor que nos permita saber, sequer, se haverá excedente. Acresce que a sociedade processadora do vencimento do devedor estará também insolvente, o que nos deixa também este cenário com mais dúvidas que certezas.
Quanto ao credor FC, tendo em conta o alegado, apenas um improvável cenário de não insolvência e não liquidação, o deixaria numa posição relativamente mais favorável, no pressuposto de possibilidade real de prosseguimento de descontos no vencimento do devedor (dependendo também da sobrevivência da sociedade em causa). Uma vez que esse cenário é, sem discussão, pouco provável, não poderá ser considerado.
Compreendemos perfeitamente que o mero facto de um devedor apenas prometer pagar 1% do que deve é deveras impressionante por si só, mas, na verdade, não temos qualquer indício seguro de que a ausência deste acordo proposto se traduzisse, para estes quatro credores numa situação mais favorável. O pressuposto de que este devedor tem um património valioso não está, de todo confirmado ou demonstrado, o que, sem afirmar que o património é nulo, nos deixa num non liquet quanto ao juízo exigido pela alínea a) do nº1 do art. 216º do CIRE.
O que implica que esta questão terá que ser decidida contra os credores que requereram a não homologação da proposta de acordo de pagamento apresentada pelo devedor, dado que sobre eles recaía o ónus da demonstração de previsibilidade de que a sua situação é menos favorável ao abrigo do acordo que na ausência deste.
Improcede, assim, o fundamento de recusa de homologação previsto no art. 216º, nº1, al. a) do CIRE, pelo que fica prejudicado o conhecimento da arguição de abuso de direito alegada pelo devedor.
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Pese embora a improcedência de dois dos fundamentos eleitos pelo tribunal a quo para a não homologação da proposta de acordo de pagamento apresentada pelo devedor, dada a verificação da existência de violação não negligenciável do princípio da igualdade, norma aplicável ao conteúdo do plano/acordo, embora com diversa fundamentação, a presente apelação improcede integralmente.
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Não são devidas custas na presente instância recursiva, porquanto se mostra paga a taxa de justiça devida pelo impulso processual do recurso, este não envolveu diligências geradoras de despesas e não há lugar a custas de parte – arts. 663.º, n.º 2, 607.º, n.º 6, 527.º, n.º 1 e 2, 529.º e 533.º, todos do Código de Processo Civil [23].
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5. Decisão
Pelo exposto, acordam as juízas desta Relação em julgar integralmente improcedente a apelação, decidindo-se manter a sentença recorrida.
Sem custas na presente instância recursiva.
Notifique.
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Lisboa, 13 de abril de 2021
Fátima Reis Silva
Amélia Sofia Rebelo
Manuela Espadaneira Lopes
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[1] Aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 42/2016, de 14/07/2016, publicado no DR. n.º 158/2016, Série I de 2016-08-18.
[2] Medida 25 do eixo de reestruturação empresarial.
[3] Acs. de 10/12/15 (relator Pinto de Almeida), de 05/04/16 (relator José Rainho), de 12/04/16 (relator Salreta Pereira), de 21/06/16 (relatora Ana Paula Boularot) e de 27/10/16 (relator Fernandes do Vale).
[4] Ver Catarina Serra em Lições de Direito da Insolvência, Almedina, 2018, pgs. 582 e 583.
[5] A decisão recorrida refere três, mas depois sumaria os pedidos apresentados por quatro credores.
[6] Veja-se, para caso absolutamente similar mas com destino diverso, dada a decisão proferida quanto à contabilização dos votos quanto aos créditos condicionais, o caso tratado nos Acs. TRL de 26/05/20 (Amélia Rebelo) e STJ de 12/01/21 (Pinto de Almeida), que o confirmou.
[7] Catarina Serra em Lições…, pg. 474.
[8] Carvalho Fernandes e João Labareda em Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª edição, Quid Juria, 2015, pg. 782.
[9] Em O Processo Especial de Revitalização – Comentário aos artigos 17º-A a 17º-I do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas, Coimbra Editora, Março de 2014, pg. 143.
[10] Todos os arestos disponíveis em www.dgsi.pt.
[11] Ac. TRC de 27/06/17 (Isaías Pádua).
[12] Neste sentido Ac. TRC de 15/10/2019 (Arlindo Oliveira), onde se escreveu: “1.- São normas procedimentais aquelas que são destinadas a garantir a efectiva possibilidade de participação de todos os credores nas negociações sobre o plano de recuperação proposto, fornecendo-lhe, com equidade, informação atempada.
2.- Verifica-se a violação não negligenciável de normas procedimentais, se um dos credores não for convocado para os termos do processo, se não lhe for dado conhecimento da existência do processo, assim, o impedindo de nele participar ou se esse credor não for indicado como tal e o seu crédito não tiver sido sequer relacionado.”, bem como o Ac. TRE de 22/11/2018 (Francisco Xavier), onde se decidiu “A omissão de comunicação ao credor do início do processo para acordo de pagamentos e do convite a participar nas negociações, bem como a falta de relacionamento do seu crédito, por parte do devedor, previstas no artigo 222º-D, n.º 1, e 24º, n.º 1, alínea a) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, além de traduzirem uma violação não negligenciável de regras procedimentais, configura, irregularidade susceptível de influir no exame e na decisão da causa, impeditiva de participação do credor nos actos de reclamação do seu crédito, nas negociações com vista à apresentação e votação do plano de pagamentos e na homologação deste.”
[13] Neste sentido, entre outros, os Acs. TRC de 17/03/15 (Henrique Antunes); TRP de 08/07/15 (Manuel Domingos Fernandes); TRL de 09/06/16 (Ondina Carmo Alves); TRL de 28/04/2020 (Paula Cardoso).
[14] Na verdade, analisando a lista de créditos definitiva concluímos que não há créditos resultantes de fiança, mas tão só de avais, o que nos permite circunscrever a questão.
[15] Neste sentido Ac. TRG de 10/10/2019 (António Sobrinho), disponível em www.dgsi.pt.
[16] Também disponível em www.dgsi.pt.
[17] em Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, já citado, em anotação ao preceito transcrito, pg.
[18] Em Lições, pg. 475.
[19] Neste sentido Nuno Salazar Casanova e David Sequeira Dinis, O Processo Especial de Revitalização…, pg. 146.
[20] Referindo a temática Nuno Salazar Casanova e David Sequeira Dinis, O Processo Especial de Revitalização…, pg. 147 e ss. e a aqui relatora em Processo Especial de Revitalização – Notas Práticas e Jurisprudência Recente, Porto Editora, 2014, pg. 65.
[21] A expressão é de Catarina Serra, em Lições…, pg. 476.
[22] Neste sentido, entre outros, ver os Acs. Ac. TRP de 11/10/2018 (José Manuel de Araújo Barros), TRP de 12/07/17 (Carlos Portela), TRP de 07/04/2016 (Carlos Querido), TRG de 27/09/2018 (Paulo Reis), TRE de 22/02/2018 (Ana Margarida Leite) e Ac. TRL de 15/10/2019 (Isabel Fonseca).
[23] Vide neste sentido Salvador da Costa in Responsabilidade das partes pelo pagamento das custas nas ações e nos recursos, disponível em https://blogippc.blogspot.com/.