1 - As alterações introduzidas no Regime de Permanência na Habitação (RPH) pela Lei 94/2017 de 23.08, implicam dever considerar-se ter o RPH atualmente natureza mista, do ponto de vista dogmático: de pena de substituição em sentido amplo ou impróprio, na medida em que, tendo natureza privativa da liberdade, pode ser decidida na sentença condenatória em alternativa ao cumprimento da pena de prisão em meio prisional; de mera modalidade ou forma de execução da pena de prisão, uma vez que pode ser aplicada na fase de cumprimento de pena em consequência da revogação de pena não privativa da liberdade aplicada em substituição da pena de prisão, nos termos do art. 43º, nº 1, al. c), do Código Penal.
2 - Estando o arguido em cumprimento de pena de prisão em que, passados cerca de 3 meses sobre o início do cumprimento da mesma, requer que a pena seja cumprida em regime de RPH, está-se perante a apreciação deste regime na sua vertente de regime de execução da pena e não de pena de substituição, sendo competente o Tribunal de Execução de Penas para apreciação desse requerimento.
Relatório
No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Portimão - Juiz 2, no âmbito do Processo nº1742/14.9PAPTM foi, em 5 de março de 2020 proferido despacho com o seguinte teor (transcrição):
“I.
Vi, concordo e homologo a liquidação da pena de prisão aplicada a (…), nos termos constantes da promoção do Ministério Público de fls. 544 a 545, a que se adere e se dá aqui por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.
Notifique ao(à) condenado(a) e ao(à) seu/sua I. Defensor(a)/Mandatário(a) e proceda às comunicações legalmente previstas – cfr. artigo 477.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal e Portaria 114/2008, de 6 de Fevereiro – conforme promovido.
II. Fls. 457 e ss:
Veio o condenado requerer a substituição do cumprimento da pena de prisão pelo regime de permanência na habitação com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, com autorização das ausências necessárias para exercício da actividade laboral e deslocação ao hospital onde a filha realizará intervenção cirúrgica.
Nessa sequência, foi solicitada à DGRSP a elaboração de relatório a fim de apreciar da viabilidade do requerido, o qual se mostra junto aos autos.
Todavia, melhor compulsados os autos constata-se que (...) foi nos presentes autos condenado na pena única de 14 (catorze) meses de prisão, substituída pela prestação de 420 (quatro e vinte) horas de trabalho a favor da comunidade, por sentença transitada em julgado a 16.03.2016.
Sendo que, por despacho datado de 11.05.2018, após diversas diligências encetadas sem êxito pelo Tribunal com vista à localização do paradeiro do condenado e sua audição, posto que o mesmo não iniciou a prestação de trabalho a favor da comunidade e se ausentou para parte incerta, permanecendo incontactável, foi revogada a pena de substituição e determinado o cumprimento pelo condenado da pena principal de 14 (catorze) meses de prisão.
Nessa sequência, o condenado recorreu desse despacho, o qual foi mantido por acórdão do Tribunal da Relação de Évora, transitado em julgado a 18.11.2019, tendo subsequentemente sido emitidos mandados de detenção e condução do condenado a estabelecimento prisional, onde se encontra em cumprimento da pena desde 11.12.2019.
Com a entrada em vigor das alterações decorrentes da Lei n.º 94/2017, de 23 de Agosto, passou-se a prever no artigo 43.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal, verificado que se mostre o condicionalismo previsto no seu n.º 1, a possibilidade da execução em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios electrónicos de controlo à distância, da pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação de pena não privativa da liberdade ou de não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º.Este dispositivo legal já se encontrava em vigor à data do despacho proferido nos presentes autos que revogou a pena de substituição aplicada, não tendo o condenado em sede de contraditório prévio à sua prolação suscitado a eventual execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, sendo que, conforme já referimos, o paradeiro do condenado era desconhecido, de nenhuns elementos se dispunha então sequer quanto ao seu modo de vida para ponderação da aplicação deste regime, desde logo em termos de adequação e suficiência de tal regime às finalidades da execução da pena prisão, face à personalidade do arguido já revelada no seu percurso de vida e confirmada no seu absoluto desinteresse e indiferença face à condenação sofrida nos presentes autos, aspecto esse aliás salientado no douto acórdão proferido em sede de recurso, na interposição do qual também não foi suscitada pelo condenado, como podia, a possibilidade de uma eventual execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, nem equacionada foi tal possibilidade por aquela instância superior.
Como assim, atenta a força de caso julgado assim alcançada e estando o condenado nesta fase processual já em cumprimento de pena de prisão em estabelecimento prisional (sem que seja caso de aplicação do artigo 12.º da Lei n.º 94/2017, de 23 de Agosto), sendo nesta fase a matéria do regime de execução da pena, nomeadamente da sua eventual alteração, da competência do Tribunal de Execução das Penas, afigura-se-nos, salvo o respeito devido por entendimento distinto, que não poderá este Tribunal, quer por força do caso julgado, quer por força da ausência de competência material, a qual se declara, apreciar e decidir do requerido (vide neste sentido em casos paralelos o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães datado de 25.11.2019, proferido no Processo n.º 10/13.8GAGMR-J-G1 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa datado de 14.05.2019, proferido no Processo n.º 2895/11.3TXLSB.E.L1-5), tudo sem prejuízo do condenado poder dirigir requerimento ao TEP em sede de antecipação da adaptação à liberdade condicional (cfr. artigos 62.º do Código Penal e 188.º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade).
Notifique e comunique ao TEP.”
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Inconformado com a decisão, o arguido interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões:
I. O arguido requereu o cumprimento da pena de prisão de 14 meses em regime de permanência na habitação com vigilância dos meios eletrónicos de controlo à distância, nos termos do disposto no art.43º do C.P.
II. Foi proferido douto despacho, de que ora se recorre, a declarar que o Tribunal a quo se encontrava impossibilitado de apreciar e de decidir o requerido, quer por força do caso julgado quer por força da ausência de competência material.
III. No que diz respeito à competência material dos Tribunais de Execução de Penas de referir que esta matéria se encontra plasmada no artigo 114º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, Lei nº62/13 de 26 de Agosto, e no artigo 138º do Código de Execução das Penas e das Medidas Privativas da Liberdade.
IV. Da análise das enumerações exemplificativas constantes nos artigos 114º, nº3 e 138º, nº4 dos diplomas legais identificados no artigo anterior da presente motivação, é possível constatar que das mesmas não consta como sendo da competência dos Tribunais de Execução de Penas a fixação do regime de permanência na habitação.
V. Daí que, em nosso modesto entender, o Tribunal de Execução de Penas não é o tribunal competente para aplicar o disposto no art.43º, nº1, al.c) do mesmo diploma legal, pois foi com base neste artigo que o ora Recorrente requereu a fixação do RPH.
VI. Apesar do Tribunal a quo referir no douto despacho, ora objeto de recurso, que o arguido pode dirigir requerimento ao TEP em sede de antecipação à liberdade condicional, nos termos do disposto nos artigos 62º do C.P. e 188º do C.E.P.M.P.L. a verdade é que o Recorrente, de momento, encontra-se impedido de requerer a adaptação à liberdade condicional por ainda não se verificar um dos pressupostos formais exigidos pela lei, mais precisamente o cumprimento de pena de prisão no mínimo de seis meses.
VII. A propósito da competência material pata decidir sobre a aplicação do RPHVE o Tribunal da Relação de Guimarães pronunciou-se através de douto Acórdão datado de 28.10.2019, no âmbito do Proc. nº384/09.5IDBRG.G2, Juiz Desembargador Relator Pedro Cunha Lopes, considerando que a competência para fixar o regime inicial da pena de obrigação de permanência na habitação é dos Tribunais Criminais.
VIII. Foram Violados o artigo 43º do C.P. e o artigo 114º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, Lei nº62/13 de 26 de Agosto e 138º do Código de Execução das Penas e das Medidas Privativas da Liberdade.
IX. No que concerne ao caso julgado sempre se dirá que ao revogar a pena de substituição (420 horas de trabalho a favor da comunidade) o tribunal de primeira instância deveria ter equacionado a aplicação do regime de permanência na habitação, conforme estipula o art.43º, nº1, al.c) do C.P.
X. De acordo com o disposto na al.c) do nº1 do art. 43º do C.P. “Sempre que o Tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância…pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação da pena não privativa da liberdade…”
XI. Acresce que a lei não refere o momento concreto em que o Tribunal deve apreciar a fixação do regime de permanência na habitação, se no momento em que o tribunal profere o despacho que revoga a pena não privativa da liberdade ou se esta questão pode ainda ser apreciada após o trânsito em julgado deste despacho
XII. A verdade é que o RPH não foi equacionado no momento em que foi proferido o despacho a revogar da pena de substituição da pena de prisão (420 horas de trabalho a favor da comunidade), nem na altura em que foi proferido o douto acórdão do Tribunal da Relação de Évora, nem após a apresentação de um requerimento do arguido dirigido ao Tribunal de 1ª instância entregue dias depois do ora Recorrente ter iniciado o cumprimento da pena de prisão.
XIII. O cumprimento de penas de prisão de curta duração, como é o caso dos presentes autos em que o Recorrente foi condenado na pena de prisão de 14 (catorze) meses, comporta efeitos nefastos que são bem conhecidos, daí que o cumprimento deste tipo de penas deve ser evitado sempre que possível.
XIV. Para tanto, deve a pena de prisão não superior a 2 (dois) anos de prisão, em caso de revogação da pena não privativa da liberdade, ser executada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal conclua que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades de execução da pena de prisão e o condenado dê o seu consentimento.
XV. Em nosso modesto entender, e sempre com o devido respeito por melhor opinião, tal apreciação é um poder-dever do Tribunal, não estando por isso dependente da apresentação de requerimento por parte do arguido para esse efeito.
XVI. Em suma, em momento algum o Tribunal de primeira instância e o Tribunal superior equacionaram a aplicação do regime de permanência na habitação pelo que não estamos perante caso julgado.
XVII. Tal omissão consubstancia uma violação da al.c) do nº1 do artigo 43º do C.P.
Nestes termos (…), deverá o douto despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que proceda à fixação do regime de permanência na habitação.
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O recurso foi admitido e fixado regime de subida e efeito.
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O Ministério Público respondeu ao recurso interposto, pugnando pela respetiva improcedência, e formulando as seguintes conclusões:
1. Por despacho judicial proferido em 11 de Maio de 2018, transitado em julgado em 18 de Novembro de 2019, foi revogada a prestação de 420 horas de trabalho a favor da comunidade e ordenado o cumprimento, pelo condenado, da pena de catorze meses de prisão.
2. Foram emitidos mandados de detenção para cumprimento de pena, tendo em 11 de Dezembro de 2019 o condenado sido conduzido ao Estabelecimento Prisional de Braga para cumprimento da pena de prisão de catorze meses.
3. Na sequência, veio o condenado requerer a substituição do cumprimento da pena de prisão pelo regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.
4. Por despacho judicial de 5 de Março de 2020, pela Memº Juiz a quo foi entendido que o requerimento do condenado deveria antes ser dirigido ao Tribunal de Execução de Penas, porquanto o mesmo já se encontrava em cumprimento de pena. Alicerçou a decisão na força de caso julgado do despacho que revogou a pena de substituição e ordenou o cumprimento da pena principal, e bem assim a ausência de competência material do Tribunal da condenação para apreciar e decidir a pretensão do condenado.
5. Afigura-se-nos que tal despacho não merece reparo.
6. Com efeito, a Lei 94/2017 de 23 de Agosto veio, para além do mais, permitir que uma pena de prisão efectiva possa ser executada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos do controlo à distância, devendo o tribunal optar por esta forma de cumprimento da pena de prisão efectiva sempre que conclua que assim se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades de execução de pena de prisão e o condenado nisso consentir.
7. Conforme resulta da exposição de motivos da proposta que esteve na origem do citado diploma legal (Cf. Proposta de Lei n.º 90/XIII) pretendeu-se clarificar, estender e aprofundar o existente regime de permanência na habitação. Por um lado, procurou acentuar-se a sua natureza de regime não carcerário de cumprimento da pena curta de prisão e, por outro lado, alargar a possibilidade da sua aplicação aos casos em que a prisão é concretamente fixada em medida não superior a dois anos, quer se trate de prisão aplicada na sentença, de prisão resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º do Código Penal, ou de prisão decorrente da revogação de pena não privativa de liberdade ou do não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º do mesmo diploma.
8. Na fase da prolação do despacho que revoga a pena substitutiva de trabalho favor da comunidade, o tribunal deve aquilatar da viabilidade de aplicação do aludido regime, diligenciando no sentido de averiguar as condições de vida do condenado para aferir se o regime de permanência na habitação cumpre de forma adequada as finalidades da execução da pena.
9. Como bem se refere no despacho em crise, aquando da revogação da pena de substituição, o paradeiro do condenado era desconhecido, não dispondo o Tribunal de informações que permitissem aferir do seu modo de vida, sendo inviável qualquer ponderação sobre a aplicação do regime de permanência na habitação.
10. Devido à postura do condenado, apesar das diversas diligências encetadas pelo tribunal com vista à localização do seu paradeiro e sua audição, o mesmo permaneceu incontactável e ausentou-se para paradeiro incerto, frustrando tal intento.
11. De maneira que, por motivos unicamente imputáveis ao condenado, não dispunha o Tribunal de elementos referentes à condição pessoal, que lhe permitissem aferir se o regime da permanência na habitação realizaria, no caso sub iudice, de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão.
12. Quando posteriormente foi notificado do despacho que revogou a pena de substituição, o condenado veio a interpor recurso, não suscitando a aplicação do aludido regime, nem se insurgindo quanto à “omissão” dessa ponderação por banda do Tribunal a quo.
13. Com efeito, o condenado optou por se insurgir apenas quanto à dita revogação, omitindo nas motivações e conclusões do recurso qualquer referência à pretensão de cumprimento da pena em regime de permanência na habitação, como poderia ter feito, posto tratar-se de lei mais favorável.
14. O Tribunal da Relação de Évora, em acórdão de 8.10.2019, negou provimento ao recurso, mantendo a decisão que revogou a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade e que ordenou o cumprimento, pelo recorrente, da pena principal de 14 (catorze) meses de prisão.
15. No mencionado acórdão, que negou provimento ao recurso e manteve a decisão da primeira instância, o regime constante do art. 43º do Código Penal não foi ponderado, tendo o douto aresto transitado em julgado.
16. Tendo a decisão transitado em julgado, consolidou-se na ordem jurídica, afigurando-se-nos, por essa razão, que o Tribunal a quo não poderá pronunciar-se e decidir sobre o requerido.
17. O condenado, ora recorrente, encontra-se desde 11 de Dezembro de 2019 a cumprir pena de prisão, em estabelecimento prisional.
18. Trata-se, pois, de decidir acerca do regime de cumprimento da pena, sendo o Tribunal de Execução de Penas materialmente competente para apreciar o pedido atento o preceituado nos arts. 114º, nº1 da Lei de Organização do Sistema Judiciário (Lei nº 62/2013 de 26.8) e 138º, n.º 2 Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade
Termos em que importa concluir não ter sido violado qualquer preceito legal, devendo ser negado provimento ao recurso.
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No Tribunal da Relação o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Cumprido o disposto no art.417º, nº2, do CPP, não foi apresentada resposta ao Parecer.
Fundamentação
Delimitação do objeto do recurso
O âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, só sendo lícito ao Tribunal ad quem apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410º, nº2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr.Ac. do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19/10/1995, DR I-A Série, de 28/12/1995 e artigos 403º, nº1 e 412º, nºs 1 e 2, ambos do CPP).
No caso sub judice a questão suscitada pelo recorrente e que, ora, cumpre apreciar, traduz-se em saber se a decisão recorrida deve ser substituída por outra que determine que a pena de prisão em que foi condenado seja cumprida em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.
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Apreciando
Por sentença transitada em julgado a 16.03.2016 foi o arguido (...) nos presentes autos condenado na pena única de 14 (catorze) meses de prisão, substituída pela prestação de 420 (quatro e vinte) horas de trabalho a favor da comunidade.
Por despacho datado de 11.05.2018, posto que o mesmo não iniciou a prestação de trabalho a favor da comunidade, foi revogada a pena de substituição e determinado o cumprimento pelo arguido da pena principal de 14 (catorze) meses de prisão.
Nessa sequência, o arguido recorreu desse despacho, o qual foi mantido por acórdão do Tribunal da Relação de Évora, transitado em julgado a 18.11.2019, tendo subsequentemente sido emitidos mandados de detenção e condução do condenado a estabelecimento prisional, onde se encontra em cumprimento da pena desde 11.12.2019.
Vejamos:
Com a atual redação dada pela Lei 94/2017 de 23.8 ao Código Penal, entrada em vigor em 23.11.2017, o regime de permanência na habitação veio a consagrar-se também como forma de execução da pena, e não apenas como pena de substituição, cuja única natureza resultava da anterior redação dada ao art.º 44º Código Penal.
As alterações introduzidas no Regime de Permanência na Habitação (RPH) pela Lei 94/2017 de 23.08, implicam dever considerar-se ter o RPH atualmente natureza mista, do ponto de vista dogmático: de pena de substituição em sentido amplo ou impróprio, na medida em que, tendo natureza privativa da liberdade, pode ser decidida na sentença condenatória em alternativa ao cumprimento da pena de prisão em meio prisional ; de mera modalidade ou forma de execução da pena de prisão, uma vez que pode ser aplicada na fase de cumprimento de pena em consequência da revogação de pena não privativa da liberdade aplicada em substituição da pena de prisão, nos termos do art. 43º, nº 1, al. c), do Código Penal.
Estando o arguido, como acontece nestes autos, em cumprimento de pena de prisão e requerendo que a pena seja cumprida em regime de RPH, não se está perante a apreciação deste regime na sua vertente de pena de substituição, não sendo, pois, competente o Tribunal da condenação para apreciação desse requerimento. Na verdade, estando o arguido em cumprimento de pena de prisão em que, passados cerca de 3 meses sobre o início do cumprimento da mesma, requer que a pena seja cumprida em regime de RPH, está-se perante a apreciação deste regime na sua vertente de regime de execução da pena e não de pena de substituição, sendo competente o Tribunal de Execução de Penas para apreciação desse requerimento (cfr. Neste sentido, decisões individuais (conflitos negativos de competência) de 14/05/2019 e 20/01/2020, in dgsi, TRL).
Com efeito, tendo o arguido iniciado o cumprimento da pena, caberá ao Tribunal de Execução de Penas apreciar e decidir da substituição de uma pena de prisão não superior a 2 anos pelo regime de RPH, assim como da eventual verificação dos pressupostos de revogação do mesmo, nos termos do art.º 44º do Código Penal.
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Decisão
Termos em que, pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em:
- negar provimento ao recurso interposto pelo arguido (...).
- Condenar o recorrente em custas, fixando-se em 3 UC’s a taxa de justiça .
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Elaborado e revisto pela primeira signatária
Évora, 14 de julho de 2020
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Laura Goulart Maurício
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Maria Filomena Soares